Ambientalistas e parlamentares criticaram nesta quinta-feira (6) a política ambiental do presidente Jair Bolsonaro, durante sessão especial do Plenário para celebrar o Dia Mundial do Meio Ambiente. O evento integra o “Junho Verde”, iniciativa do Senado para a conscientização sobre a importância de preservação ambiental.
Os convidados questionaram medidas defendidas ou atribuídas pelo Poder Executivo, como fim de demarcações de terras e permissão para mineração em áreas indígenas; flexibilização de licenciamentos ambientais; sucateamento de órgãos de defesa ambiental; alterações no Código Florestal (Lei 12.651, de 2012); e mudanças no Fundo Amazônia. Para Carlos Rittl, secretário-geral do Observatório do Clima, o Brasil “vive tempos de obscurantismo e negacionismo”.
— Isso faz com algumas das mais altas autoridades do governo desmontem deliberadamente um legado de 30 anos de governança ambiental no Brasil, construído com imensa contribuição do Parlamento brasileiro. O Brasil sofreu prejuízos de R$ 278 bilhões nos últimos dez anos em função de eventos climáticos extremos. De 2013 a 2017, 2.706 municípios sofreram com secas severas. No mesmo período, 1.726 sofreram com alagamentos. Mudanças climáticas são reais, causam impactos — afirmou.
A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) lembrou que, antes de assumir a Presidência da República, Jair Bolsonaro admitiu a possibilidade de acabar com o Ministério do Meio Ambiente.
— Lá atrás, quando houve a possibilidade de não termos o Ministério do Meio Ambiente, já foi um sinal do que poderíamos ter para frente em relação à questão ambiental. Como não dar um grito de alerta em relação ao que estamos vivendo? Um dos grandes orgulhos do povo brasileiro é a defesa do meio ambiente e das nossas riquezas naturais. Precisamos evitar retrocessos, mas não temos muito a comemorar porque nos últimos dias não vimos nenhuma ação mais direta em relação à proteção da biodiversidade, a questão da Amazônia e a proteção dos nossos rios — lamentou.
A deputada Joenia Wapichana (Rede-RR), da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas, disse que a demarcação das terras dos povos tradicionais “influencia diretamente” na proteção do meio ambiente. Ela criticou a disposição do governo de flexibilizar as regras para os licenciamentos ambientais.
— A flexibilização coloca vidas em risco. Em Brumadinho, foi alertado que existia perigo de rompimento nas barragens. Não à mineração e não à flexibilização dos licenciamentos ambientais. O Brasil precisa mudar esse comportamento de ter um discurso “negacionista” em relação aos riscos ambientais e à proteção do meio ambiente — disse.
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, participou da sessão especial e rebateu as críticas. Ele disse que “o governo não nega a existência de mudanças climáticas” e “mantém inalteradas políticas assumidas em gestões anteriores em relação ao tema”. Salles afirmou ainda que o Poder Executivo não pretende extinguir unidades de conservação, mas defendeu “eficiência do processo de licenciamento ambiental”. Para o ministro, o governo federal não sucateia órgãos como Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
— A frase que tem sido dita do desmonte é absolutamente inverídica. Ao contrário, o desmonte foi herdado de gestões anteriores. Quem recebeu a fragilidade orçamentária fui eu. Quem recebeu um deficit gigantesco de funcionários fui eu. Quem recebeu frotas sucateadas e prédios abandonadas, fui eu. Portanto, se houve desmonte, desmonte houve antes, não agora — afirmou.
Logo após o pronunciamento, Ricardo Salles deixou o Plenário sob vaias de ambientalistas. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) classificou a postura do ministro de abandonar a sessão como “indignidade misturada com covardia”. Para o parlamentar, a política ambiental de Jair Bolsonaro ofende acordos e tratados internacionais para o combate às mudanças climáticas, o que faz do Brasil “motivo de vergonha mundial”.
— O cara-de-pau do ministro esquece de dizer que a intenção desse governo é destinar o Fundo da Amazônia para quem desmatou o meio ambiente, grileiros, ruralistas. Nunca a verdade foi tão violentada nesse Plenário como no dia de hoje. Nunca vi tanto ato de covardia, como no dia de hoje. O ministro teria feito talvez um ato melhor se nem aqui tivesse comparecido. Para comparecer, vomitar mentiras e sair fugidio, covardemente, era melhor não ter vindo — disse.
Legislação ambiental
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, também participou da sessão solene. Ela defendeu a cooperação internacional e a adoção de uma legislação homogênea entre os países para o combate efetivo dos crimes ambientais.
— Quantos rios precisarão morrer? Quantas vidas deverão estar extintas? Quanta gente poderá migrar até que o apelo seja efetivamente ouvido e todos assumam a defesa ambiental do planeta? Um dos maiores desafios do Ministério Público é garantir a efetiva responsabilização pelos crimes cometidos contra o meio ambiente. Como temos que atuar com base na legislação nacional, a punição é muitas vezes restrita, e a reparação local do dano nem sempre condiz com a dimensão do crime, o que prejudica o meio ambiente em solo doméstico e também além — afirmou.
O governo federal pretende reeditar este mês uma medida provisória (MP 867/2018) que flexibilizava o Código Florestal e perdeu a validade na última segunda-feira (3). O texto prorrogava o prazo de adesão de produtores rurais ao Programa de Regularização Ambiental. Embora não tenha citado especificamente a reedição da MP, o ministro Herman Benjamin, Superior Tribunal de Justiça (STJ), defendeu a legislação ambiental em vigor.
— Ninguém nunca está totalmente satisfeito com a legislação que tem. Mas não podemos viver em processos permanentes de alteração. E mais ainda de processos permanentes de prolongamento do cumprimento de obrigações. Qualquer um dos bancos brasileiros não dá aos devedores um dia de prazo a mais para cobrar suas obrigações. Em casa, ensinamos nossos filhos que as obrigações devem ser cumpridas. Hoje, quem defende o enfraquecimento da legislação ambiental brasileira não defende o setor produtivo. Quem defende a flexibilização não está defendendo nem o futuro nem o presente do Brasil — afirmou.