Olá amigos do Dizer o Direito,
Hoje vamos tratar sobre um tema que vem
sendo cobrado a cada dia mais nos concursos públicos, em especial da
magistratura federal, e que, apesar disso, não é tratado pela maioria dos
manuais de Processo Civil. Trata-se da aplicação da boa-fé objetiva ao Direito
Processual Civil.
sendo cobrado a cada dia mais nos concursos públicos, em especial da
magistratura federal, e que, apesar disso, não é tratado pela maioria dos
manuais de Processo Civil. Trata-se da aplicação da boa-fé objetiva ao Direito
Processual Civil.
Antes de falarmos especificamente sobre
sua aplicação no processo civil, é importante fixarmos algumas noções gerais sobre
a boa-fé objetiva.
sua aplicação no processo civil, é importante fixarmos algumas noções gerais sobre
a boa-fé objetiva.
BOA-FÉ
OBJETIVA
OBJETIVA
Origem
A teoria da boa-fé objetiva surgiu na
Alemanha.
Alemanha.
Corolários
da boa-fé objetiva
da boa-fé objetiva
As quatro principais manifestações da
boa-fé objetiva são as seguintes:
boa-fé objetiva são as seguintes:
- venire
contra factum proprium - supressio
- surrectio
- tu
quoque
Vale ressaltar, contudo, que a boa-fé
objetiva vai além desses quatro institutos.
objetiva vai além desses quatro institutos.
Principais
diferenças entre boa-fé objetiva e boa-fé subjetiva
diferenças entre boa-fé objetiva e boa-fé subjetiva
Não se pode confundir boa-fé objetiva
com boa-fé subjetiva:
com boa-fé subjetiva:
Boa-fé SUBJETIVA
|
Boa-fé OBJETIVA
|
Não é um princípio, mas sim um estado
psicológico (um fato).
Muito utilizada no Direito Real (exs:
posse, usucapião, benfeitorias etc). |
É uma regra de conduta.
Significa manter uma conduta de
acordo com padrões sociais de lisura, honestidade e correção.
Tem como objetivo não frustrar a
legítima confiança da outra parte. |
Para examinar a boa-fé subjetiva,
deve-se analisar se a pessoa pensava, sinceramente, que agia ou não de acordo com o direito (é examinado se a pessoa tinha boas ou más intenções). |
Para examinar a boa-fé objetiva,
deve-se analisar se a pessoa agiu de acordo com os padrões de comportamento (standards) impostos pelo direito em determinada localidade e em determinada situação. |
Deve ser examinada internamente, ou
seja, de acordo com o sentimento da pessoa. |
Deve ser examinada externamente, ou
seja, não importa qual era o sentimento da pessoa, mas sim a sua conduta. |
Aplicação
nos ramos do direito
nos ramos do direito
Normalmente, o estudo da boa-fé
objetiva é feito no Direito Civil. No entanto, indaga-se:
objetiva é feito no Direito Civil. No entanto, indaga-se:
É possível a aplicação da boa-fé
objetiva nos demais ramos do Direito?
objetiva nos demais ramos do Direito?
SIM. A boa-fé objetiva surgiu
inicialmente no Direito Civil, mas a sua aplicação foi expandida para todos os
demais ramos do direito, inclusive para os ramos do chamado “direito público”,
como é o caso do Direito Administrativo. Assim, por exemplo, de acordo com o
STJ, a teoria dos atos próprios (venire
contra factum proprium) é aplicada ao poder público.
inicialmente no Direito Civil, mas a sua aplicação foi expandida para todos os
demais ramos do direito, inclusive para os ramos do chamado “direito público”,
como é o caso do Direito Administrativo. Assim, por exemplo, de acordo com o
STJ, a teoria dos atos próprios (venire
contra factum proprium) é aplicada ao poder público.
Em suma, a boa-fé objetiva deve estar
presente em toda e qualquer relação jurídica.
presente em toda e qualquer relação jurídica.
É possível a aplicação da boa-fé
objetiva no Processo Civil?
objetiva no Processo Civil?
SIM, com certeza.
Um dos melhores autores que trata sobre
o princípio da boa-fé processual é Fredie Didier Jr. (Curso de Direito Processual Civil. Salvador: JusPodivm, 13ª ed.,
2011, p. 66 e ss), cuja obra serve de fonte de consulta e citação indireta nesta
explicação:
o princípio da boa-fé processual é Fredie Didier Jr. (Curso de Direito Processual Civil. Salvador: JusPodivm, 13ª ed.,
2011, p. 66 e ss), cuja obra serve de fonte de consulta e citação indireta nesta
explicação:
O que é o princípio da boa-fé
processual:
processual:
Significa que os sujeitos do processo
devem comportar-se de acordo com a boa-fé, entendida como uma norma de conduta
(boa-fé objetiva).
devem comportar-se de acordo com a boa-fé, entendida como uma norma de conduta
(boa-fé objetiva).
Tem como objetivo não frustrar a
legítima confiança da outra parte.
legítima confiança da outra parte.
Uma das importantes funções da boa-fé
objetiva é impedir que a parte exerça o seu direito de forma abusiva. Por isso,
diz-se que a boa-fé objetiva serve como limitação contra os abusos de direito.
objetiva é impedir que a parte exerça o seu direito de forma abusiva. Por isso,
diz-se que a boa-fé objetiva serve como limitação contra os abusos de direito.
Fundamento constitucional:
Os civilistas apontam que o fundamento constitucional
está na dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/88).
está na dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/88).
Os processualistas, em geral, apontam que
o fundamento constitucional da boa-fé objetiva está no princípio do devido
processo legal. Essa é também a posição do STF: RE 464.963-2/GO.
o fundamento constitucional da boa-fé objetiva está no princípio do devido
processo legal. Essa é também a posição do STF: RE 464.963-2/GO.
Previsão legal:
CPC/Art. 14. São deveres das partes e
de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo:II – proceder com lealdade e boa-fé;
Esse art. 14, II, do CPC refere-se à
boa-fé objetiva ou subjetiva?
boa-fé objetiva ou subjetiva?
1ª corrente: boa-fé subjetiva. Doutrina
tradicional.
tradicional.
2ª corrente: boa-fé objetiva. Doutrina
contemporânea (ex: Fredie Didier).
contemporânea (ex: Fredie Didier).
Para a doutrina contemporânea, o art.
14, II, do CPC é uma cláusula geral processual que proíbe quaisquer hipóteses
de comportamento desleal pelos sujeitos do processo.
14, II, do CPC é uma cláusula geral processual que proíbe quaisquer hipóteses
de comportamento desleal pelos sujeitos do processo.
O princípio da boa-fé processual é destinado
somente às partes?
somente às partes?
NÃO. Os destinatários da norma são
todos aqueles que de qualquer forma participam do processo, o que inclui, não
apenas as partes, mas também o próprio juiz.
todos aqueles que de qualquer forma participam do processo, o que inclui, não
apenas as partes, mas também o próprio juiz.
Exemplos de aplicação da boa-fé
objetiva no processo civil (exemplos de Didier):
objetiva no processo civil (exemplos de Didier):
Ex: a parte não pode recorrer contra uma
decisão que já havia manifestado sua aceitação (art. 503 do CPC). Isso seria venire contra factum proprium.
decisão que já havia manifestado sua aceitação (art. 503 do CPC). Isso seria venire contra factum proprium.
Ex2: a parte não pode pedir a invalidação
de um ato cujo defeito foi ela própria quem deu causa (art. 243 do CPC). Isso também
seria venire contra factum proprium.
de um ato cujo defeito foi ela própria quem deu causa (art. 243 do CPC). Isso também
seria venire contra factum proprium.
Ex3: se o réu exerce seu direito de
defesa de forma abusiva, o juiz poderá, como sanção, conceder a tutela
antecipada ao autor (art. 273, II, do CPC). O réu, nesse caso, violou a boa-fé
objetiva.
defesa de forma abusiva, o juiz poderá, como sanção, conceder a tutela
antecipada ao autor (art. 273, II, do CPC). O réu, nesse caso, violou a boa-fé
objetiva.
Ex4: se a parte interpõe recurso com
intuito manifestamente protelatório, significa que violou o princípio da boa-fé
processual, podendo ser multada por litigância de má-fé (art. 17, VII, do CPC).
intuito manifestamente protelatório, significa que violou o princípio da boa-fé
processual, podendo ser multada por litigância de má-fé (art. 17, VII, do CPC).
Venire contra factum proprium
A teoria dos atos próprios, ou a
proibição de venire contra factum
proprium protege a parte contra aquele que pretenda exercer uma conduta em
contradição com o comportamento assumido anteriormente.
proibição de venire contra factum
proprium protege a parte contra aquele que pretenda exercer uma conduta em
contradição com o comportamento assumido anteriormente.
A proibição do venire contra factum proprium é um dos corolários do princípio da
boa-fé objetiva e impede que a pessoa adote posturas contraditórias. Justamente
por isso, diz-se que, no âmbito do processo civil, a proibição do venire é um dos fundamentos teóricos que
justifica a existência da preclusão lógica. Lembrando que preclusão lógica é a
perda de um poder processual em razão da prática de um ato anterior com ele incompatível.
boa-fé objetiva e impede que a pessoa adote posturas contraditórias. Justamente
por isso, diz-se que, no âmbito do processo civil, a proibição do venire é um dos fundamentos teóricos que
justifica a existência da preclusão lógica. Lembrando que preclusão lógica é a
perda de um poder processual em razão da prática de um ato anterior com ele incompatível.
Exemplo de aplicação da boa-fé objetiva
em caso julgado recentemente pelo STJ:
em caso julgado recentemente pelo STJ:
Recentemente, o STJ reafirmou a aplicação
do princípio da boa-fé objetiva ao processo civil.
do princípio da boa-fé objetiva ao processo civil.
A situação foi, com algumas adaptações,
a seguinte:
a seguinte:
“X” ajuizou ação contra “Y”.
Antes de ser publicada a sentença, “X”
e “Y” combinaram de suspender o processo pelo prazo de 90 dias. Isso é possível?
Sim, é possível, com base no art. 265, II, do CPC:
e “Y” combinaram de suspender o processo pelo prazo de 90 dias. Isso é possível?
Sim, é possível, com base no art. 265, II, do CPC:
Art.
265. Suspende-se o processo:II
– pela convenção das partes;
Essa suspensão do processo por
convenção das partes nunca poderá exceder 6 (seis) meses (§3º do art. 265).
convenção das partes nunca poderá exceder 6 (seis) meses (§3º do art. 265).
Ocorre que, no 30º dia em que o
processo estava suspenso, o juiz proferiu a sentença. Quando acabou o prazo de 90
dias de suspensão do processo, a parte que foi prejudicada com a sentença
ingressou com apelação. O Tribunal, no entanto, considerou que o recurso era
intempestivo sob o argumento de que o recurso deveria ter sido interposto mesmo
o processo estando suspenso.
processo estava suspenso, o juiz proferiu a sentença. Quando acabou o prazo de 90
dias de suspensão do processo, a parte que foi prejudicada com a sentença
ingressou com apelação. O Tribunal, no entanto, considerou que o recurso era
intempestivo sob o argumento de que o recurso deveria ter sido interposto mesmo
o processo estando suspenso.
A questão chegou até o STJ. O que decidiu a Corte?
Segundo o Relator, Min. Herman
Benjamin, o entendimento do TJ foi equivocado.
Benjamin, o entendimento do TJ foi equivocado.
Antes mesmo de publicada a sentença
contra a qual foi interposta a apelação, o juízo de 1° grau já havia homologado
requerimento de suspensão do processo pelo prazo de 90 dias.
contra a qual foi interposta a apelação, o juízo de 1° grau já havia homologado
requerimento de suspensão do processo pelo prazo de 90 dias.
Em havendo suspensão do processo, o
art. 266 do CPC veda a prática de qualquer ato processual, com a ressalva dos
urgentes a fim de evitar dano irreparável.
art. 266 do CPC veda a prática de qualquer ato processual, com a ressalva dos
urgentes a fim de evitar dano irreparável.
A lei processual não permite, desse
modo, que seja publicada decisão durante a suspensão do feito, não se podendo
cogitar, por conseguinte, do início da contagem do prazo recursal enquanto
paralisada a marca do processo.
modo, que seja publicada decisão durante a suspensão do feito, não se podendo
cogitar, por conseguinte, do início da contagem do prazo recursal enquanto
paralisada a marca do processo.
Ao homologar a convenção pela suspensão
do processo, o Poder Judiciário criou nos jurisdicionados a legítima
expectativa de que o processo só voltaria a tramitar após o prazo
convencionado. Por óbvio, não se pode admitir que, logo em seguida, seja
praticado ato processual de ofício – publicação de decisão – e, ademais,
considerá-lo como termo inicial do prazo recursal.
do processo, o Poder Judiciário criou nos jurisdicionados a legítima
expectativa de que o processo só voltaria a tramitar após o prazo
convencionado. Por óbvio, não se pode admitir que, logo em seguida, seja
praticado ato processual de ofício – publicação de decisão – e, ademais,
considerá-lo como termo inicial do prazo recursal.
Desse modo, para o STJ, a conduta de publicar
a decisão no período de suspensão do processo e de contar o início do prazo
recursal caracterizou a prática de ato contraditório por parte do magistrado.
Assim agindo, o Poder Judiciário feriu a máxima nemo potest venire contra factum proprium, que é aplicável no
âmbito processual (Segunda Turma. REsp 1.306.463-RS, Rel. Min. Herman Benjamin,
julgado em 4/9/2012).
a decisão no período de suspensão do processo e de contar o início do prazo
recursal caracterizou a prática de ato contraditório por parte do magistrado.
Assim agindo, o Poder Judiciário feriu a máxima nemo potest venire contra factum proprium, que é aplicável no
âmbito processual (Segunda Turma. REsp 1.306.463-RS, Rel. Min. Herman Benjamin,
julgado em 4/9/2012).
Como
esse tema foi cobrado recentemente nas provas de concurso:
esse tema foi cobrado recentemente nas provas de concurso:
1. (Promotor/RR – CESPE – 2012)
Determinada pessoa pode exercer um direito contrariando um comportamento
anterior próprio, sem necessidade de observância dos elementos constitutivos da
boa-fé objetiva. ( )
Determinada pessoa pode exercer um direito contrariando um comportamento
anterior próprio, sem necessidade de observância dos elementos constitutivos da
boa-fé objetiva. ( )
2. (PFN – ESAF – 2012) A proibição do
venire contra factum proprium, corolário do princípio da boa-fé, impede que
sejam adotadas posturas contraditórias no processo e constitui lastro para a
teorização da preclusão lógica no processo civil. ( )
venire contra factum proprium, corolário do princípio da boa-fé, impede que
sejam adotadas posturas contraditórias no processo e constitui lastro para a
teorização da preclusão lógica no processo civil. ( )
3. (Juiz Federal/TRF2 – CESPE – 2009 –
adaptada) A boa-fé objetiva recomenda a verificação da vontade aparente das
partes. ( )
adaptada) A boa-fé objetiva recomenda a verificação da vontade aparente das
partes. ( )
4. (Juiz Federal/TRF2 – CESPE – 2009)
Por se tratar de regra de conduta, a boa-fé objetiva da parte é analisada
externamente. ( )
Por se tratar de regra de conduta, a boa-fé objetiva da parte é analisada
externamente. ( )
5. (Juiz Federal/TRF3 – CESPE – 2011) A
consideração pelo juiz da possibilidade de existência de propósito protelatório
do réu indica análise da situação conforme o princípio da boa fé processual, sob
o ângulo objetivo. ( )
consideração pelo juiz da possibilidade de existência de propósito protelatório
do réu indica análise da situação conforme o princípio da boa fé processual, sob
o ângulo objetivo. ( )
6. (Juiz Federal/TRF3 – CESPE – 2011) A
configuração do abuso de direito exige o elemento subjetivo. ( )
configuração do abuso de direito exige o elemento subjetivo. ( )
7. (Juiz Federal/TRF3 – CESPE – 2011)
De acordo com o STJ, a teoria dos atos próprios não se aplica ao poder público.
( )
De acordo com o STJ, a teoria dos atos próprios não se aplica ao poder público.
( )
Gabarito
1. E
|
2. C
|
3. C
|
4. C
|
5. C
|
6. E
|
7. E
|