Aplicação analógica do art. 191 do CPC 1973 (art. 229 do CPC 2015) ao processo penal


Lei n.° 8.038/90

Se a ação penal for de
competência do STF, STJ, TRF ou TJ, ela deverá obedecer a um rito processual
próprio previsto na Lei n.°
8.038/90. Ex: se um Governador for acusado da prática de um crime, esta ação
penal tramitará originariamente no STJ e o procedimento será o da Lei n.° 8.038/90 (o CPP será aplicado
apenas subsidiariamente).

O procedimento da Lei n.°
8.038/90 é, resumidamente, o seguinte:

1. Oferecimento de denúncia (ou
queixa).

2. Notificação do acusado para
oferecer resposta preliminar no prazo de 15 dias (antes de receber a denúncia)
(art. 4º).

3. Se, com a resposta, o
acusado apresentar novos documentos, a parte contrária (MP ou querelante) será
intimada para se manifestar sobre esses documentos, no prazo de 5 dias.

4. O Tribunal irá se reunir e poderá (art.
6º):

a) receber a denúncia (ou
queixa);

b) rejeitar a denúncia (ou
queixa);

c) julgar
improcedente a acusação se a decisão não depender de outras provas (neste caso,
o acusado é, de fato, absolvido).

Importante: a decisão quanto ao
recebimento ou não da denúncia ocorre após
o denunciado apresentar resposta.

5. Se a denúncia (ou queixa)
for recebida, o Relator designa dia e hora para audiência.

Ao contrário do que ocorre no
procedimento do CPP, a Lei n.°
8.038/90 não prevê a existência de uma fase para absolvição sumária, tal qual
existente no art. 397 do CPP.

Feitas estas considerações,
vejamos o caso concreto:

O Procurador-Geral da República
ofereceu denúncia, no STF, contra o Presidente da Câmara dos Deputados e contra
outra pessoa (corréu) pela suposta prática dos crimes de corrupção passiva e lavagem
de dinheiro.

O próximo passo seria a notificação
dos denunciados para apresentarem resposta preliminar no prazo de 15 dias (art.
4º da Lei nº 8.038/90).

Ocorre que a defesa do Deputado
pediu ao STF que o prazo da resposta preliminar assim como todos os demais prazos
fossem contados em dobro, aplicando-se, ao processo penal, por analogia, o art.
191 do CPC 1973:

Art. 191. Quando os litisconsortes
tiverem diferentes procuradores, ser-lhes-ão contados em dobro os prazos para
contestar, para recorrer e, de modo geral, para falar nos autos.

O CPC 2015 também traz regra
semelhante, exigindo, contudo, que, além de serem procuradores (advogados)
diferentes, os causídicos também sejam de escritórios de advocacia diferentes.
Veja:
Art. 229. Os
litisconsortes que tiverem diferentes procuradores, de
escritórios de advocacia distintos
, terão prazos contados em dobro para todas as suas manifestações, em qualquer juízo ou
tribunal, independentemente de requerimento.
Segundo argumentou o Deputado, ele
está sendo acusado juntamente com mais uma outra pessoa (litisconsórcio passivo
no processo penal) e os dois réus estão sendo assistidos por escritórios de advocacia
diferentes. Logo, aplica-se perfeitamente o art. 191 do CPC 1973 (art. 229 do CPC
2015).

Essa
tese foi acatada pelo STF? É possível aplicar o art. 191 do CPC 1973 (art. 229
do CPC 2015) por analogia ao processo penal?

SIM. É cabível
a aplicação analógica do art. 191 do CPC 1973 (art. 229 do CPC 2015)
ao prazo previsto no art. 4º da Lei nº 8.038/1990 (“Apresentada a denúncia ou a
queixa ao Tribunal, far-se-á a notificação do acusado para oferecer resposta no
prazo de quinze dias”).
O Min. Luiz Fux
argumentou que, se no processo civil, em que se discutem direitos disponíveis, concede-se
prazo em dobro, com mais razão no processo penal, em que está em jogo a
liberdade do cidadão.
STF. Plenário.
Inq 3983/DF, rel. orig. Min. Teori Zavascki, red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux,
julgado em 3/9/2015 (Info 797).
Obs1: para alguns pode parecer
estranho, mas se em um processo criminal existem dois ou mais réus, tem-se, no
caso, um litisconsórcio passivo, considerando que o MP (ou o querelante) é o
autor da ação penal e os réus estão no polo passivo.

Obs2: o precedente acima foi envolvendo
a Lei nº 8.038/90, mas penso que nada impede que esse mesmo entendimento seja
aplicado aos procedimentos regidos pelo CPP.

É possível aplicar regras do CPC, por
analogia, ao processo penal?

SIM. A analogia é vedada no Direito
Penal, salvo se beneficiar o réu (analogia in
bonam partem
). No processo penal, não existe esta mesma vedação, tendo em
vista que as normas processuais não são incriminadoras. Veja a autorização
expressa prevista no CPP para a aplicação analógica:

Art. 3º A lei processual penal admitirá
interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios
gerais de direito.

Precedente no caso “Mensalão”

Vale ressaltar que o STF já havia
admitido que as partes (MP e defesa) tivessem prazo em dobro para recorrer
(embargos de declaração) no caso do “Mensalão”, utilizando como argumento justamente
o fato de que havia, no caso, um litisconsórcio passivo (vários réus), com
advogados diferentes, devendo, portanto, ser aplicada, por analogia, a regra
prevista no art. 191 do CPC (STF. Plenário. AP 470 Vigésimo Segundo AgR/MG,
rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o acórdão Min. Teori Zavascki,
17/4/2013).

Artigo Original em Dizer o Direito

Deixe um comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.