Após voto de relator e revisor, ministra pede vista no “Caso Guadalupe”

A ministra do Superior Tribunal Militar (STM), Maria Elizabeth Rocha, pediu vista em relação à Apelação que aprecia o “Caso Guadalupe” – Ação Penal nº 7000147-45.2022.7.00.0000/RJ.

Antes do pedido de vista, dois ministros votaram para manter a condenação em um dos homicídios, mas reduziu as penas aplicadas.

O relator da ação, ministro Carlos Augusto Amaral, decidiu absolver os acusados do crime de homicídio contra o músico Evaldo Rosa dos Santos, com base no art. 439, alínea “e”, do CPPM (Código de Processo Penal Militar), isto é, por inexistir prova suficiente para a condenação.

O ministro relator considerou a possibilidade de ocorrência de um crime impossível, em face da impropriedade do objeto, da possibilidade de a vítima já estar morta em razão do primeiro fato – momento da troca de tiro com os meliantes.

Como não havia certeza absoluta dessa circunstância, foi invocada a dúvida a favor dos acusados.

Em relação ao crime contra o catador de latinhas Luciano Macedo, o magistrado votou para mudar a sentença de homicídio doloso para homicídio culposo (quando não há intenção de matar) e reduzir o tempo de prisão para cerca de três anos em regime aberto, com a invocação da legítima defesa putativa.

“A legitima defesa putativa se perfaz na conduta de um agente em situação fática, quando imagina, acredita, prever erroneamente uma realidade adversa da que irá acontecer. Ele tem uma visão fantasiosa do que poderá ocorrer e se antecipa a fim de proteger de injusta agressão ou iminente perigo um bem jurídico”, diz a doutrina sobre este instituto previsto no artigo 36 do Código Penal Militar.

Assista à íntegra do julgamento

O ministro revisor do processo, José Coelho Ferreira, acompanhou o voto do relator. 

No julgamento, o procurador-geral Antônio Pereira Duarte, que atuou como acusação, afirmou que “não havia assalto em andamento” para os militares agirem daquela maneira e que, ao recorrer da condenação, os militares reiteram a tese de que supunham estar sob ameaça.

Já o assistente da acusação, o advogado André Perecmanis, que representa as famílias das vítimas, afirmou que a defesa dos militares alegar que eles estavam sob estresse não é razoável. “Se as Forças Armadas trocarem tiros na parte da manhã, ninguém sai às ruas porque tudo pode acontecer. Se houver um assalto e alguém estiver com um carro igual ou parecido com o dos assaltantes, será uma fatalidade ser metralhado com 82 tiros de fuzil. E a população gritava, os vídeos mostram: ‘É trabalhador’. E nem assim esses militares mostraram empatia”.

Em defesa oral, o advogado Rodrigo Roca, que defende os militares, disse que a ação dos réus foi um “erro plenamente justificado pelas circunstâncias”.

“Os militares se depararam com uma situação praticamente impossível de acontecer. Eles foram defender o cidadão de bem. Eles agiram em legítima defesa por entenderem que estavam em confronto em uma área de conflito. Eles teriam sido informados sobre um assalto na região e entrado em confronto com bandidos, que fugiram. Na perseguição, teriam confundido o carro do músico, que já teria uma marca de bala, com o dos criminosos. O local era de conflito, o local estava em pleno conflito e eles haviam deixado, aliás, estavam o dia inteiro no combate. Há um pano de fundo que precisa ser considerado. É o que as Forças Armadas esperam de seus militares”.

A defesa também informou que os militares estavam em missão, fardados e cumprindo ordens. “No Código Penal Militar, é isento de pena quem atua supondo uma situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Se é preciso um pretexto jurídico para desvendar essa ação humana, é este”, acrescentou Roca, que pediu a absolvição dos réus, a alteração por homicídio culposo ou a redução da pena dos militares.

Relembre o Caso

Os militares do Exército respondem na Justiça Militar da União (JMU) pelas mortes do músico Evaldo Rosa dos Santos e do catador de latinhas Luciano Macedo, por homicídio doloso. O julgamento de primeiro grau ocorreu em outubro de 2021, com a condenação de oito réus.

Na ocasião, os militares também foram condenados por tentativa de homicídio contra Sergio Gonçalves de Araújo, sogro de Evaldo. A pena maior foi imposta ao tenente que exercia a função de comandante do grupo de combate: 31 anos e 6 meses de reclusão.

Os demais militares foram condenados a 28 anos de reclusão e também excluídos dos quadros do Exército, por não serem oficiais e terem penas superiores a dois anos. Todos os réus puderam recorrer do julgamento em liberdade.

As mortes ocorreram durante uma ação de patrulhamento do Exército na área da Vila Militar em Guadalupe, na Zona Norte do Rio de Janeiro, em abril de 2019. Os militares foram denunciados por homicídio qualificado de Evaldo e Luciano e por tentativa de homicídio qualificado de Sérgio (sogro de Evaldo).

Os outros quatro militares que faziam parte do grupo foram absolvidos por falta de provas de que participaram efetivamente da ação. Um vídeo, exames residuográficos, um relatório de ensaio e pareceres técnicos estão em consonância com a informação de que estes não efetuaram disparos. O julgamento de primeira instância foi realizado pelos votos dos integrantes de um Conselho, designado Conselho Especial de Justiça, composto por cinco membros: uma Juíza Federal da Justiça Militar, que atuou como presidente do conselho, e quatro oficiais do Exército, que atuaram como juízes militares.

O STM, última instância da Justiça Militar da União (JMU), é composto por quinze ministros, sendo dez oficiais-generais do último posto das Forças Armadas e cinco  ministros civis, numa composição mista chamada de escabinato. Dos militares, quatro são generais de exército, três almirantes de esquadra e três tenentes brigadeiros do ar.

Os civis são três oriundos da OAB, um do Ministério Público Militar e outro oriundo da carreira de juiz federal da Justiça Militar da União. 

O escabinato tem como função precípua permitir aliar a experiência dos comandantes que atingiram o ápice das carreiras, acumulando mais de quarenta anos de vida na caserna, com o conhecimento jurídico dos magistrados civis.

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Com Informações so Superior Tribunal Militar

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