A juíza Inês Marchalek Zarpelon, da 1ª Vara Criminal de Curitiba, mencionou a raça de um réu em uma sentença em que condena sete pessoas por organização criminosa.
Segundo o documento, assinado no dia 19 de junho, o grupo fazia assaltos e roubava aparelhos celulares nas Praças Carlos Gomes, Rui Barbosa e Tiradentes, no centro de Curitiba.
Em nota, nesta quarta-feira (12), a juíza pediu \”sinceras desculpas\” e afirmou que a frase foi retirada de contexto.
\”Seguramente integrante do grupo criminoso, em razão da sua raça, agia de forma extremamente discreta os delitos e o seu comportamento, juntamente com os demais, causavam o desassossego e a desesperança da população, pelo que deve ser valorada negativamente (sic)\”, disse a magistrada.
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A decisão em primeira instância da magistrada condenou Natan Vieira da Paz, de 42 anos, a 14 anos e dois meses de prisão por organização criminosa e por roubos no centro da cidade.
O trecho que menciona a raça de Natan aparece três vezes no documento no momento em que a magistrada aplica a dosimetria da pena.
Apenas pelo crime de organização criminosa, o homem foi condenado a três anos e sete meses de prisão e, segundo o texto, a pena foi elevada por causa da \”conduta social\” do réu.
No mesmo documento, a juíza escreveu que Natan é réu primário e que \”nada se sabe\” da sua \”conduta social\”.
Além dele, outras seis pessoas foram condenadas pelos mesmos crimes pela juíza.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou, nesta quarta-feira, que a Corregedoria Geral da Justiça do Paraná investigue o caso da juíza. Segundo o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJ-PR), a Corregedoria instaurou um procedimento administrativo.
Defesa diz que vai recorrer
A advogada Thayse Pozzobon, que defende Natan, afirmou que vai recorrer da decisão.
\”A raça dele não pode, de maneira alguma, ser relacionada com os fatos que ele supostamente praticou\”, afirmou a advogada.
No texto da sentença em que cita os dados pessoais e a identificação dos réus, o apelido de Natan é descrito como \”Neguinho\”.
\”Essa referência dele aparece mais de uma vez na sentença. Não é um erro de digitação, por exemplo. Isso revela o olhar parcial da juíza, e um magistrado tem o dever da imparcialidade\”, afirmou.
De acordo com a advogada, a juíza usou a justificativa racial para aumentar a pena do réu. \”Ela aumentou em sete meses a pena dele em razão dessa circunstância\”, afirmou.
Natan recorre da decisão em liberdade.
A advogada informou que o caso foi comunicado à Comissão de Igualdade Racial e Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil no Paraná (OAB-PR).
Apuração sobre crime de racismo
O presidente da OAB-PR, Cássio Telles, afirmou que vai pedir ao Ministério Público do Paraná (MP-PR) uma apuração sobre o caso para verificar se houve crime de racismo por parte da magistrada.
De acordo com Telles, o trecho da sentença da magistrada tem uma \”carga discriminatória\”.
\”Não há o menor fundamento legal nessa avaliação que a magistrada fez, utilizando raça e cor para aplicar uma pena maior ou menor ou mesmo condenar alguém por isso. É um retrocesso de centenas de anos na história da humanidade, para um período que noa queremos viver novamente\”, afirmou.
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Fonte: G1