O motorista que entrega mercadorias pode ficar responsável por cobrar o pagamento dos clientes, sem que fique caracterizado, a priori, acúmulo de funções. A conclusão é da Quinta Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC), que julgou ação trabalhista proposta por um motorista de Itajaí (SC) contra uma transportadora de cervejas da cidade.
Segundo o empregado, a cobrança dos pagamentos não estava prevista em seu contrato e, além de aumentar sua carga de trabalho, também o colocava em situação de risco, sem o treinamento e a proteção necessários. Ele também destacou que, por exercer a cobrança, tinha de arcar com eventuais diferenças de caixa.
A empresa alegou que o serviço foi prestado desde o início do contrato e apontou que o valor transportado em dinheiro era o mesmo da carga transportada — de R$ 5 mil a R$ 10 mil. Ainda segundo a transportadora, o caminhão usado pelo trabalhador possuía cofre do tipo “boca-de-lobo”, que só pode ser aberto na sede da empresa.
Tarefa complementar
Ao julgar o processo em primeira instância, o juiz da 1ª Vara do Trabalho de Itajaí Daniel Lisbôa interpretou que as tarefas desempenhadas pelo empregado eram inerentes à condição de motorista. Segundo o magistrado, o acúmulo de funções acontece apenas quando o empregado desempenha atribuições estranhas à função.
“Todo contrato de trabalho contém cláusulas não expressas, concernentes ao dever de colaboração das partes entre si”, ponderou o magistrado, acrescentando que as tarefas solicitadas pela empresa eram compatíveis com a condição pessoal do motorista. “Tais misteres sempre estiveram ínsitas ao objeto de seu contrato. Por esse mesmo motivo, não se pode pensar em abuso quantitativo nas atribuições”, concluiu.
A defesa do trabalhador recorreu e a ação foi novamente julgada pela Quinta Câmara do TRT. O colegiado manteve o julgamento de primeira instância e considerou que o acúmulo de funções só deve ser reconhecido quando o empregado acumula tarefas que não guardam relação com a função principal, tal como prevê a Súmula nº 51 do TRT.
Em seu voto, a desembargadora-relatora Lourdes Leiria (atual presidente do TRT) destacou que a tarefa complementar não possuía maior grau de complexidade e tampouco exigia habilidade específica, não podendo ser caracterizada a acumulação de funções.
“A realização de tarefas pertinentes à função de cobrador identifica-se com a função principal do autor, motorista. Logo, o desempenho dessas atividades não configura acúmulo incompatível de atribuições”, concluiu, observando ainda que havia “equilíbrio entre as atividades desempenhadas e a remuneração correspondente”.
As partes podem recorrer da decisão.
Fonte: TRT da 12ª Região (SC)