Doação inoficiosa


 

Doação

Considera-se doação o contrato em que
uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens
para o de outra (art. 538 do CC).

 

Restrições à liberalidade de doar

Em regra, a pessoa sendo proprietária da coisa, pode doá-la
para quem quiser. A lei impõe, contudo, algumas restrições ao exercício desse
direito. Veja:

RESTRIÇÕES
À LIBERALIDADE DE DOAR

Doação…

Características

1) feita por pessoa casada

O cônjuge que for casado, para doar,
precisa da autorização do outro, exceto:

a) no regime da separação absoluta;

b) na doação remuneratória;

c) nas doações propter nuptiaes de bens feitos aos filhos quando casarem ou
estabelecerem economia separada.

2) feita por incapaz

O absolutamente incapaz não pode
realizar doações. Se o fizer, é nula.

3) universal

Doação universal é aquela que engloba
a totalidade de bens do devedor. É proibida.

Art. 548. É nula a doação de todos os
bens sem reserva de parte, ou renda suficiente para a subsistência do doador.

4) inoficiosa

Doação inoficiosa é a que invade a
legítima dos herdeiros necessários.

A pessoa que tenha herdeiros necessários
só pode doar até o limite máximo da metade de seu patrimônio, considerando
que a outra metade é a chamada “legítima” (art. 1.846 do CC) e pertence aos
herdeiros necessários.

5) colacionável

A pessoa pode doar para seus
ascendentes, descendentes ou cônjuges. No entanto, isso será considerado
“adiantamento da legítima”, ou seja, um adiantamento do que o donatário iria
receber como herdeiro no momento em que o doador morresse.

6) fraudulenta

É aquela realizada pelo devedor
insolvente ou que, com a doação, torna-se insolvente. Vale ressaltar que
devedor insolvente é aquele cujo patrimônio passivo (dívidas) é maior que o
ativo (bens).

A doação, nesses casos, somente é
válida se foi realizada com o consentimento de todos os credores.

Se feita sem tal consentimento,
configura fraude contra os credores, sendo, portanto, anulável.

7) do cônjuge adúltero a seu cúmplice

Art. 550. A doação do cônjuge
adúltero ao seu cúmplice pode ser anulada pelo outro cônjuge, ou por seus
herdeiros necessários, até dois anos depois de dissolvida a sociedade
conjugal.

8) do pródigo

O pródigo pode realizar doações,
desde que assistido pelo curador:

Art. 1.782. A interdição do pródigo
só o privará de, sem curador, emprestar, transigir, dar quitação, alienar,
hipotecar, demandar ou ser demandado, e praticar, em geral, os atos que não
sejam de mera administração.

 

Doação
inoficiosa

Como vimos acima, a pessoa que tenha
herdeiros necessários só pode doar até o limite máximo da metade de seu
patrimônio, considerando que a outra metade é a chamada “legítima” (art. 1.846
do CC) e pertence aos herdeiros necessários.

Se o doador não tiver herdeiros
necessários, poderá doar livremente, contanto que não seja doação universal.

Veja como o tema já foi cobrado em prova:

(FCC – Defensor Público – DPE – BA/2021) Vilma doou R$
200.000,00 a José, que se apresentava como líder religioso e dizia a Vilma que
tal doação lhe garantiria melhoras na sua vida profissional e pessoal. O
numerário era fruto de poupança de uma vida inteira de Vilma, que é viúva e tem
um filho, já maior e capaz. Meses depois, Vilma procura atendimento na
Defensoria Pública mostrando arrependimento em relação à doação. Nesse caso,

A) a revogação da doação se justifica pela inexecução do
encargo estabelecido no contrato verbal de doação.

B) é válida a doação verbal, ainda que sobrem bens móveis,
independentemente do valor, se for seguida da tradição.

C) é nula a doação dos bens que não garantam o mínimo de
subsistência ao doador, estando sujeita ao prazo prescricional geral de dez
anos.

D) a doação realizada por Vilma pode ser considerada doação
inoficiosa, porque, no momento da liberalidade, excedeu o limite disponível em
relação à legítima.

E) a doação somente poderá ser anulada se alegado vício de
consentimento, prescrevendo a ação em quatro anos.

Gabarito: letra D

 

Quem
são os herdeiros necessários?

Os descendentes, os ascendentes e cônjuge
(art. 1.845).

Obs: considerando a decisão do STF no
Tema 809, há autores que sustentam que a(o) companheira(o) deveria também ser
considerada como integrante do rol de herdeiros necessários:

No sistema constitucional vigente, é inconstitucional a
diferenciação de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser
aplicado, em ambos os casos, o regime estabelecido no art. 1.829 do Código
Civil.

STF. Plenário. RE 646721/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac.
Min. Roberto Barroso e RE 878694/MG, Rel. Min. Roberto Barroso, julgados em
10/5/2017 (Repercussão Geral – Tema 809) (Info 864).

 

A
doação inoficiosa é nula ou anulável?

O art. 549 do CC afirma que é nula:

Art. 549. Nula é também a doação
quanto à parte que exceder à de que o doador, no momento da liberalidade,
poderia dispor em testamento.

 

Ação
cabível para se obter a anulação:

Ação anulatória de doação inoficiosa
(ação de redução).

Obs: em alguns outros julgados, o STJ
fala em “ação de nulidade de doação inoficiosa”.

 

Quem
pode propor:

Apenas os herdeiros necessários do doador.

 

Prazo:

10 anos (art. 205 do CC).

O STJ entende que, diante da
inexistência de prazo específico, a ação de nulidade de doação inoficiosa se
submete a prazo vintenário, se regida pelo CC/1916, ou decenal, se regida pelo
CC/2002;

 

Quando
se inicia esse prazo?

Regra: conta-se a partir do registro do ato
jurídico que se pretende anular.

Exceção: essa
prazo pode ser iniciado antes se ficar comprovado que, em momento anterior ao
registro, o suposto prejudicado já teve ciência inequívoca do ato.

 

Assim, vamos imaginar que:

– a escritura pública de doação de
um bem imóvel foi lavrada em 04/04/2004.

– essa doação, contudo, somente
foi registrada no registro de imóveis em 05/05/2005.

– em regra, o prazo prescricional
para se anular essa doação inoficiosa se iniciou em 05/05/2005, salvo se ficar
demonstrado que, antes dessa data, a pessoa prejudicada com a doação já teve
ciência inequívoca do ato.

 

Caso concreto julgado pelo
STJ:

Rui e Sandra são irmãos.

Em 09/09/2005, foi lavrada
escritura pública na qual os pais doaram para Sandra um bem imóvel muito
valioso.

Vale ressaltar que essa doação
foi inoficiosa, pois atingiu a parte indisponível do patrimônio dos doadores,
ferindo o direito de Rui à legítima.

Rui, mesmo não sendo doador nem
donatário, participou da assinatura da escritura pública na qualidade de “interveniente-anuente”.

Em 18/05/2009, essa doação
foi registrada no cartório de registro de imóveis.

A mãe de Rui e Sandra faleceu em
2014 e o pai morreu em 2017.

Em 22/08/2018, Rui ajuizou
ação pedindo a nulidade dessa doação por ser inoficiosa.

Sandra arguiu a prescrição da
pretensão considerando que o prazo de 10 anos teria se iniciado em 09/09/2005
(data da lavratura da escritura pública).

Rui se defendeu alegando que o
termo inicial da prescrição foi 18/05/2009, quando ocorreu o registro do ato
jurídico que se pretende anular.

A 3ª Turma do STJ concordou com os argumentos de Sandra.
Confira o que disse a Min. Nancy Andrighi:

“17) Dito de
outra maneira, em se tratando de ação de nulidade de doação inoficiosa, o prazo
prescricional é contado a partir do registro do ato jurídico que se pretende
anular, salvo se houver anterior ciência inequívoca do suposto prejudicado,
hipótese em que essa será a data de deflagração do prazo prescricional.

18) Em suma,
dado que o recorrente RUI participou, na qualidade de interveniente-anuente, da
lavratura de escritura pública de doação do imóvel objeto da alegada doação
inoficiosa em 09/09/2005, esse é o termo inicial do prazo prescricional, ainda
que o registro desse ato na matrícula do imóvel apenas tenha ocorrido em
18/05/2009, razão pela qual o prazo decenal para impugná-la escoou em
09/09/2015 e a presente ação, somente ajuizada em 22/08/2018, está
irremediavelmente prescrita.”

Artigo Original em Dizer o Direito

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