É cabível a liberdade provisória em caso de tráfico de drogas?


Proibição legal da liberdade provisória

A Lei de Drogas (Lei n.° 11.343/2006) proíbe
expressamente:

Art. 44. Os crimes previstos
nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37

desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça,
indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas
penas em restritivas de direitos.

Inconstitucionalidade desta proibição

Ocorre que o STF, no dia de ontem
(10/05/2012) decidiu que esta proibição é INCONSTITUCIONAL.

A decisão foi tomada no
julgamento do Habeas Corpus 104339.

Relator

O Relator do Habeas Corpus foi o
Min. Gilmar Mendes.

Argumentos

  • A regra prevista no art. 44 da
    Lei de Drogas é incompatível com inúmeros princípios constitucionais, como o
    princípio da presunção de inocência e do devido processo legal.
  • Ao afastar a concessão de
    liberdade provisória de forma genérica, a norma retira do juiz a oportunidade
    de, no caso concreto, analisar os pressupostos da necessidade ou não da prisão
    cautelar.
  • Este art. 44, ao proibir a
    liberdade provisória, representa uma antecipação de pena, o que é vedado pela
    CF.
  • A referida proibição estabelece
    um tipo de regime de prisão preventiva obrigatória, na medida em que torna a
    prisão a regra e a liberdade a exceção. A CF/88, ao contrário, prevê que a
    liberdade é a regra e a necessidade da prisão precisa ser devidamente
    fundamentada.
  • Cabe ao magistrado e, não ao
    legislador, verificar se se configuram ou não, em cada caso, hipóteses que
    justifiquem a prisão cautelar.
A Constituição Federal veda a concessão de fiança para o tráfico de
drogas

Art. 5º (…)

XLIII – a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis
de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins
, o terrorismo e os definidos como crimes
hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo
evitá-los, se omitirem;
Ao estabelecer que o tráfico de drogas é inafiançável (art. 5º, XLIII),
isso não significa que a CF proibiu também a concessão de liberdade provisória?

NÃO. De acordo com o Min. Dias
Toffoli, a impossibilidade de pagar fiança em determinado caso não impede a
concessão de liberdade provisória, pois são institutos diferentes.

Esta distinção está prevista,
inclusive, na própria CF, em seu art. 5º, LXVI (ninguém será levado à prisão ou
nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança).
Conforme se observa pela redação deste inciso LXVI, existe liberdade provisória
com fiança e liberdade provisória sem fiança.

O que a CF vedou para o tráfico
de drogas foi a fiança e não a liberdade provisória.

Assim, no caso de tráfico de
drogas:

  • É proibida a concessão de
    liberdade provisória com fiança.
  • É permitida, entretanto, a
    concessão de liberdade provisória sem fiança.
Conclusões

Desse modo, sendo
inconstitucional a proibição do art. 44, da Lei n.° 11.343/2006, o pedido de
liberdade provisória no caso de acusados por crimes relacionados à Lei de
Drogas deve ser analisado pelo juiz, da mesma forma como os demais delitos.

Pessoa presa por tráfico de
drogas formula pedido de liberdade provisória. O que o juiz deverá analisar?

  • Se estiverem presentes os requisitos
    do art. 312 do CPP, a prisão cautelar é devida e o pedido de liberdade
    provisória deve ser negado.
  • Se não estiverem presentes os
    requisitos do art. 312 do CPP, a prisão cautelar é inconstitucional e o juiz
    deve conceder a liberdade provisória.
O juiz não pode mais, como era
comum ser feito, não conhecer do pedido de liberdade provisória ou negá-lo com
a simples alegação de que havia proibição legal.
 
Como deve ser lido o art. 44 da Lei de Drogas com base na
jurisprudência do STF:

Art. 44.  Os crimes previstos nos arts. 33, caput e §
1o, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça,
indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em
restritivas de direitos
.
Quem votou pela inconstitucionalidade da proibição de liberdade
provisória

Min. Gilmar Mendes

Min. Dias Toffoli

Min. Rosa Weber

Min. Ricardo Lewandowski

Min. Cezar Peluso

Min. Celso de Mello

Min. Ayres Britto.

Quem votou pela constitucionalidade da proibição da liberdade
provisória

Min. Luiz Fux

Min. Marco Aurélio

Min. Joaquim Barbosa

Abstrativização do controle concreto

A decisão do STF reconhecendo a
inconstitucionalidade do artigo foi tomada em sede de controle difuso.

Controle concentrado

Controle difuso

Realizado pelo STF, de forma
abstrata, nas hipóteses em que lei ou ato normativo violar a CF/88.

Realizado por qualquer juiz ou
Tribunal, em um caso concreto.

Efeitos (regra geral):

Ex tunc

Erga omnes

Vinculante

Efeitos (regra geral):

Ex tunc

Inter partes

Não vinculante

Desse modo, em regra, a
declaração de inconstitucionalidade no controle difuso produz efeitos inter partes e não vinculante.

Contudo, em razão da importância
desta decisão, é muito provável que se reacenda a discussão quanto à “teoria da
abstrativização do controle difuso”.

Em uma explicação bem simples, esta
teoria preconiza que se o Plenário do STF decidir a constitucionalidade ou
inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo, ainda que em controle
difuso, essa decisão terá os mesmos efeitos do controle concentrado, ou seja,
efeitos erga omnes e vinculante.

No STF, um adepto conhecido desta
teoria é o Min. Gilmar Mendes.

Caso esta teoria prevaleça, se um
juiz criminal de Itabuna (BA), por exemplo, continuar decidindo que não cabe
liberdade provisória por tráfico de drogas, afirmando que o art. 44 da Lei n.° 11.343/2006 é
constitucional, seria possível que o réu formulasse uma reclamação diretamente
ao STF considerando que a autoridade de sua decisão estaria sendo desrespeitada.

Para evitar tais discussões, o
ideal seria que o Supremo editasse uma Súmula Vinculante tratando sobre o tema.

Artigo Original em Dizer o Direito

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