Multa por abandono do processo
pelo defensor

O caput do art. 265 do CPP prevê a possibilidade de o juiz
aplicar multa ao defensor (advogado ou Defensor Público) que “abandonar o
processo”:

Art. 265. O defensor não poderá
abandonar o processo senão por motivo imperioso, comunicado previamente o juiz,
sob pena de multa de 10 (dez) a 100 (cem) salários mínimos, sem prejuízo das
demais sanções cabíveis.

 

Segundo a Min. Cármen Lúcia, “o
comportamento exigido pelo art. 265 do Código de Processo Penal para a não
aplicação da multa nele prevista é que o advogado comunique ao juízo antes de
deixar a defesa do réu ou informe a impossibilidade de prática dos atos
processuais que lhe cabem.” (ADI 4398)

O art. 265 do CPP é complementado pelo art. 5º, § 3º da Lei nº
8.906/94 (Estatuto da OAB), de forma que o advogado fica ainda obrigado a
continuar prestando assistência jurídica ao seu cliente durante 10 dias após
avisar que está renunciando ao mandato, salvo se, antes disso, o próprio cliente
já constituir um novo profissional para representá-lo:

Art. 265 (…)

§ 3º O advogado que renunciar ao
mandato continuará, durante os dez dias seguintes à notificação da renúncia, a
representar o mandante, salvo se for substituído antes do término desse prazo.

 

Infração disciplinar

O abandono do processo pode
configurar infração disciplinar, nos termos do art. 34, XI, do Estatuto da OAB:

Art. 34. Constitui infração disciplinar:

(…)

XI – abandonar a causa sem justo motivo
ou antes de decorridos dez dias da comunicação da renúncia;

 

O defensor precisa expor ao
juiz o motivo pelo qual está abandonando o processo?

SIM. No entanto, não é necessário
entrar em detalhes.

Ex: o advogado pode afirmar que
está deixando o caso por divergências com o réu em relação às estratégias de
defesa. Neste caso, não é preciso que o advogado detalhe quais são essas
divergências.

 

O juiz pode discordar do
motivo exposto?

NÃO. Não existe essa previsão
legal, não devendo o magistrado analisar se o motivo aventado pode, ou não, ser
considerado como “imperioso”.

 

O advogado que deixa de
comunicar previamente o juiz está sujeito a quais consequências?

Ao pagamento de multa, fixada
pelo juiz, em valor que varia de 10 a 100 salários-mínimos.

Vale ressaltar que, além disso, o
advogado pode estar sujeito à eventual punição disciplinar, caso a situação se
enquadre no art. 34, XI, do Estatuto da OAB. Essa sanção disciplinar, contudo,
é aplicada pelo Tribunal de Ética da OAB (e não pelo Poder Judiciário).

 

Imagine que quem abandonou
o processo sem prévia comunicação foi um Defensor Público. Neste caso, a multa
do art. 265 do CPP deverá ser aplicada contra o Defensor Público ou contra a
Defensoria Pública (instituição)?

Contra a Defensoria Pública.

O Defensor Público atua
institucionalmente, não sendo razoável responsabilizá-lo pessoalmente se atuou
em sua condição de agente presentante do órgão da Defensoria Pública.

Assim, as sanções aplicadas aos
seus membros, nesse contexto, devem ser suportadas pela instituição, sem
prejuízo de eventual ação regressiva, acaso verificado excesso nos parâmetros
ordinários de atuação profissional, com abuso do direito de defesa:

A multa por abandono do plenário do júri por defensor público,
com base no art. 265 do CPP, deve ser suportada pela Defensoria Pública, sem
prejuízo de eventual ação regressiva.

STJ. 5ª Turma.
RMS 54.183-SP, Rel. 
Min. Ribeiro Dantas, Rel. Acd. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, julgado em 13/08/2019 (Info 658).

 

O fato de o juiz aplicar a
multa prevista no art. 265 do CPP contra o advogado ou Defensor Público viola a
autonomia da OAB e da Defensoria Pública, que têm a competência legal de impor
sanções contra infrações disciplinares de seus membros?

NÃO.

A punição do advogado, nos termos do art. 265 do CPP, não entra
em conflito com sanções aplicáveis pelos órgãos a que estão vinculados os
causídicos, uma vez que estas têm caráter administrativo, e a multa do Código
de Processo Penal tem caráter processual.

As instâncias judicial-penal e administrativa são independentes.

Além disso, o próprio texto da norma ressalva a possibilidade de
aplicação de outras sanções. 

O reconhecimento de que os advogados, membros do Ministério
Público e da Defensoria Pública exercem funções essenciais à Justiça não lhes
outorga imunidade absoluta.

STJ. 5ª Turma.
RMS 54.183-SP, Rel. 
Min. Ribeiro Dantas, Rel. Acd. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, julgado em 13/08/2019 (Info 658).

 

A OAB ajuizou ADI contra a
multa do caput do art. 265 do CPP alegando, entre outros argumentos, que ela violaria
o livre exercício da advocacia (art. 133 da CF/88), além de não oferecer ao
profissional a possibilidade de contraditório e ampla defesa. Essa tese foi
acolhida pelo STF? Essa multa é inconstitucional?

NÃO.

 

Previsão está de acordo com
os princípios da razoabilidade e proporcionalidade

A previsão de multa, de dez a cem
salários mínimos, para o advogado que abandona injustificadamente o processo
afigura-se compatível com os princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade.

A multa não se mostra inadequada
nem desnecessária. Ao contrário, mostra-se razoável como meio prévio para
evitar o comportamento prejudicial à administração da justiça e ao direito de
defesa do réu, tendo em vista a imprescindibilidade da atuação do profissional
da advocacia para o regular andamento do processo penal.

Embora elevado o valor da sanção
estabelecida no art. 265 do CPP, não se mostra desproporcional ou desarrazoada,
tendo em vista as graves consequências da conduta que se busca evitar.

Ademais, os parâmetros
quantitativos previstos no dispositivo legal permitem ao magistrado fixar a
pena com observância à gravidade da conduta do advogado e à sua capacidade
econômica.

 

Não há ofensa ao
contraditório e à ampla defesa

A multa do art. 265 do CPP não
ofende o contraditório, a ampla defesa, o devido processo legal ou a presunção
de não culpabilidade.

Não há necessidade de instauração
de processo autônomo e de manifestação prévia do defensor, no entanto, é possível
que ele se justifique.

O profissional que receber a
multa poderá se insurgir no próprio processo em que aplicada a sanção, por
pedido de reconsideração. Outra alternativa é a impetração de mandado de segurança
contra a decisão pela qual imposta a multa quando não caracterizada a situação
legal descrita.

 

Em suma:

É constitucional a multa imposta ao defensor por
abandono do processo, prevista no art. 265 do CPP.

STF. Plenário. ADI 4398, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em
05/08/2020 (Info 993). 

Artigo Original em Dizer o Direito

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