Em que momento se consuma o crime de extorsão?


Olá amigos do Dizer o Direito,

Para aqueles que não viajaram no feriado e estão estudando neste domingo, vamos tratar hoje sobre um tema de grande relevância prática e que é constantemente cobrado nas provas de concurso: qual é o momento consumativo do crime de extorsão.

No informativo 502 do STJ há um recente julgado do STJ versando sobre essa questão.

Antes de respondermos à pergunta, como é de costume, vamos fazer uma breve revisão sobre o crime de extorsão.

O Código Penal prevê o crime de extorsão nos
seguintes termos:

Art. 158. Constranger alguém,
mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para
outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar
fazer alguma coisa:
Pena – reclusão, de quatro a dez anos, e multa.


Em que consiste o crime:

O agente, usando de violência ou de
grave ameaça, obriga outra pessoa a ter determinado comportamento, com o
objetivo de obter uma vantagem econômica indevida.


A
vítima é coagida pelo autor do crime a fazer, tolerar que se faça ou deixar
fazer alguma coisa.


Ex: “A” exige que “B” assine um
cheque em branco em seu favor, senão contará a todos que “B” possui um caso
extraconjugal.


Ex2: Golpe do falso sequestro via
celular. “A” (de um presídio em SP) liga para “B” (em Brasília) e afirma que
sua filha foi sequestrada exigindo, por meio de ameaças, depósito de dinheiro em
determinada conta bancária. Obs: o juízo competente é o do local onde estava a
pessoa que recebeu os telefonemas (STF ACO 889/RJ).

Diferenças entre extorsão e roubo:

Extorsão

Roubo

O agente faz com que a vítima entregue a coisa (o verbo é constranger).

Na extorsão há a tradição da
coisa (traditio).

O agente subtrai a coisa
pretendida

(o verbo é subtrair).

No roubo há a subtração da coisa (concretatio).

A colaboração da vítima é
indispensável.

Se a vitima não quiser fazer,
não tem como o agente fazer sozinho.

A colaboração da vítima é
dispensável.

Se a vitima não quiser fazer,
existe como o agente fazer sozinho.

A vantagem buscada pelo agente
pode ser contemporânea ao constrangimento ou posterior a ele.

A vantagem buscada (coisa
alheia móvel) é para agora (imediata).

A vantagem econômica indevida
pode ser um bem móvel ou imóvel.

A vantagem econômica indevida
somente pode ser um bem móvel.

Para você guardar, no entanto, a
principal diferença entre os delitos está na necessidade ou não de que a vítima
colabore:

“No crime de roubo existe uma
total submissão da vítima à vontade do agente. A subtração, independentemente
da vontade do ofendido, ocorrerá, haja vista que o agente pode, mediante ato
próprio, apoderar-se do objeto desejado. Na extorsão, ao contrário, é evidente
a dependência de um ato da vítima para a configuração do delito.” (HC
182.477/DF, Min. Jorge Mussi, julgado em 07/08/2012).

É possível reconhecer continuidade delitiva entre roubo e extorsão?

NÃO. A jurisprudência do STF e do
STJ pacificou-se no sentido de que aos crimes de roubo e de extorsão não se
aplica
o instituto da continuidade delitiva, considerando que não são delitos
da mesma espécie
.

É possível reconhecer concurso material entre roubo e extorsão quando o
agente, por meio de mais de uma ação, pratica os núcleos dos verbos dos dois
tipos penais?

SIM, segundo entendimento do STF
e STJ.


Ex: o agente, ameaçando a vítima
com uma arma, subtrai seu carro e dinheiro que ela tinha na bolsa. Em seguida, leva
a vítima até um caixa eletrônico e exige, mediante grave ameaça, que ela diga a
senha de seu cartão, conseguindo, então, efetuar saques em sua conta corrente.
Haverá, nesse caso, concurso material entre roubo e extorsão.

De acordo com o STJ, vê-se
claramente a existência de duas ações praticadas pelo criminoso. A primeira
consistiu no ato de tomar para si os pertences encontrados em posse da vítima.
Logo em seguida, com desígnio distinto, obrigou-lhe a revelar a senha de sua
conta bancária e dirigir-se a um caixa eletrônico para sacar quantia em
dinheiro. Muito embora as ações tenham ocorrido em um curto espaço de tempo,
não se pode falar em ação única (HC 182.477/DF, Min. Jorge Mussi, julgado em
07/08/2012).

Principais pontos cobrados nas provas:

Elemento subjetivo: 
É o dolo, acrescido de um especial fim de agir (elemento
subjetivo específico).


Qual é o especial fim de agir?

O intuito de obter para si ou
para outrem indevida vantagem econômica.

Qual é o momento consumativo da extorsão?

Trata-se de crime FORMAL (também
chamado de consumação antecipada ou resultado cortado).

A extorsão se consuma no momento
em que a vítima, depois de sofrer a violência ou grave ameaça, realiza o
comportamento desejado pelo criminoso.

Consumação
= constrangimento + realização do comportamento pela vítima

Atenção: o fato da vítima ter
realizado o comportamento exigido pelo agente não significa que este tenha
obtido a vantagem indevida. Ex: “A” exige que “B” assine um cheque em branco em
seu favor, senão contará a todos que “B” possui um caso extraconjugal. “B” cede
à chantagem e assina o cheque. Ocorre que, depois, arrepende-se e susta o
cheque. Nesse caso, houve consumação do delito mesmo sem ter o agente
conseguido sacar o dinheiro.

Para fins de consumação não
importa se o agente consegue ou não obter a vantagem indevida. Esta obtenção da
vantagem constitui mero exaurimento, que só interessa para a fixação da pena.

Súmula 96-STJ: O crime de
extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida.

Caso julgado pelo STJ no informativo 502 (com nomes fictícios):

João exigiu que Maria, sua
ex-mulher, entregasse a quantia de 300 reais e, ainda, que retirasse os
boletins de ocorrência contra ele registrados, deixando-o ver os filhos nos
finais de semana. O agente prometeu matar Maria caso ela não fizesse o que ele
ordenou.

A vítima não se submeteu à
exigência, deixando de realizar a conduta que João procurava lhe impor, tendo
então buscado auxílio policial.

O Ministério Público alegou que o
delito estava consumado e a defesa que se tratou de mera tentativa.

O que decidiu o STJ?

Houve apenas tentativa de
extorsão. Não se consuma o crime de extorsão quando, apesar de ameaçada, a
vítima não se submete à vontade do criminoso.

Sexta Turma. REsp 1.094.888-SP,
Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 21/8/2012.

Resumindo as etapas do crime:

Se o agente constrange a
vítima, mas ela não faz o que foi exigido.

Tentativa

Se o agente constrange a vítima
e ela faz o que foi exigido, mas não se consegue a vantagem econômica.

Consumado

Se o agente constrange a
vítima, ela faz o que foi exigido e se consegue a vantagem econômica.

Consumado

(a obtenção da vantagem é mero exaurimento do delito)

Como vimos, essa distinção se o
crime é formal ou material não tem importância meramente acadêmica, sendo muito
relevante na prática. Veja dois outros aspectos que são diretamente
influenciados pelo fato da extorsão ser crime formal:

Prescrição

Flagrante

Se a extorsão fosse crime
material, a prescrição somente começaria a correr na data da obtenção da
vantagem indevida.

No entanto, como a extorsão é
crime formal, o prazo de prescrição tem início no dia em que o agente
constrangeu a vítima, não importando a data do recebimento da vantagem.

Se a extorsão fosse crime
material, o agente poderia ser preso no momento em que estivesse recebendo a
vantagem.

No entanto, como a extorsão é
crime formal, a prisão em flagrante deverá levar em consideração o momento em
que houve o agente constrangeu a vítima, para saber se há situação de
flagrância, nos termos do art. 302 do CPP. Se o constrangimento for feito em um momento e a obtenção da vantagem em outro, o que importa para o flagrante é o instante do constrangimento.

Assim, se o agente constrangeu
a vítima a dar o seu cartão bancário e senha em um dia e somente foi sacar a quantia
três dias depois, nesse momento do saque não haverá mais flagrante.



Vejam como esse assunto é bastante exigido nas provas:

1. (Promotor MP/SP – 2010) O elemento subjetivo do delito de
extorsão é o dolo, sendo prescindível o fim especial de agir. (     )

2. (Procurador da República – 2005) A jurisprudência do STF
e do STJ desautoriza dizer que o crime de extorsão não se consuma sem a
obtenção da vantagem indevida. (     )

3. (Promotor MP/RR – 2012) Para a consumação do crime de extorsão,
incluído entre os delitos patrimoniais, é imprescindível a obtenção, pelo
agente, de indevida vantagem econômica para si ou para outrem. (     )

4. (Juiz TJ/PA – 2012) Configura-se mera tentativa de
extorsão o fato de o ameaçado vencer o temor inspirado e deixar de atender à
imposição do agente, solicitando, confiantemente, a intervenção policial.
(     )

5. (Juiz TJ/CE – 2012) A jurisprudência dos tribunais
superiores pacificou-se no sentido de que aos crimes de roubo e de extorsão
aplica-se o instituto da continuidade delitiva, pois, a despeito de não serem
delitos da mesma espécie, estão intimamente ligados por nexo funcional. (     )

6. (Delegado/PB – CESPE – 2009) Se o agente, após subtrair
os pertencentes da vítima com grave ameaça, obriga-a a entregar o cartão do
banco e a fornecer a respectiva senha, há concurso formal entre os crimes de
extorsão e roubo, pois são crimes da mesma espécie, isto é, contra o
patrimônio. (     )

7. (Promotor/CE – 2009) É admissível o arrependimento posterior
no crime de extorsão. (     )

8. (Promotor/RS – 2008) De acordo com a orientação
jurisprudencial dominante, o crime de extorsão:

a) só pode ter como objeto coisa alheia móvel.

b) não admite tentativa.

c) consuma-se independentemente da obtenção da vantagem
indevida.

d) pode visar a obtenção de vantagem devida.

e) pode não ter fim econômico.

Gabarito:

1. E

2. C

3. E

4. C

5. E

6. E

7. E

8. Letra C

Artigo Original em Dizer o Direito

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