Imagine a seguinte situação
hipotética:

João ajuizou ação de cobrança
contra a Fazenda Pública.
Foi prolatada sentença condenando
o Poder Público a pagar R$ 300 mil.
Essa sentença transitou em
julgado em 04/04/2016.
Em 10/04/2016, o credor pediu ao
juiz, nos termos do art. 534 do CPC, o cumprimento de sentença, apresentando o
cálculo da dívida atualizada.
Segundo
entende o STF, a partir do momento em que forem apresentados os cálculos,
começa a incidir juros da mora contra a Fazenda Pública:
Incidem
os juros da mora no período compreendido entre a data da realização dos
cálculos e a da requisição de pequeno valor (RPV) ou do precatório.

STF.
Plenário. RE 579431/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 19/4/2017
(repercussão geral) (Info 861).

O que acontece a agora?

A Fazenda Pública poderá impugnar
ou não o cumprimento de sentença.
Suponhamos que o Poder Público
não impugnou. Neste caso, deverá ser expedido, por intermédio do Presidente do
Tribunal, precatório em favor do exequente. Confira o que diz o art. 535, § 3º
do CPC:
§ 3º Não impugnada a execução ou
rejeitadas as arguições da executada:
I – expedir-se-á, por intermédio do
presidente do tribunal competente, precatório em favor do exequente,
observando-se o disposto na Constituição Federal;
II – por ordem do juiz, dirigida à
autoridade na pessoa de quem o ente público foi citado para o processo, o
pagamento de obrigação de pequeno valor será realizado no prazo de 2 (dois)
meses contado da entrega da requisição, mediante depósito na agência de banco
oficial mais próxima da residência do exequente.
Neste caso, o juízo da execução
elabora o precatório e o encaminha ao Presidente do Tribunal. Este, por sua
vez, irá expedir o precatório, ou seja, repassá-lo ao ente devedor para que
seja incluído no orçamento.
Ex: se a execução era contra a
União, o juiz federal responsável pela execução irá elaborar o precatório e
encaminhá-lo ao Presidente do TRF; este irá expedir o precatório determinando
que a União inclua no orçamento para pagamento.
Suponhamos que, em nosso exemplo,
a Fazenda Pública concordou com os cálculos do credor. Diante disso, o juiz
encaminhou ao Presidente do Tribunal que expediu, em 30/05/2016, o precatório
em favor de João.
Assim, deverá haver a incidência dos
juros da mora referente ao período de 10/04/2016 (data da realização dos cálculos)
e a data do precatório.
Existe um prazo para que o ente
pague o precatório?

SIM. Os pagamentos requisitados
até 01/07 de cada ano deverão ser pagos até o final do exercício do ano
seguinte. Isso está previsto no § 5º do art. 100 da CF/88:
§ 5º É obrigatória a inclusão, no
orçamento das entidades de direito público, de verba necessária ao pagamento de
seus débitos, oriundos de sentenças transitadas em julgado, constantes de
precatórios judiciários apresentados até 1º de julho, fazendo-se o pagamento
até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados
monetariamente.
Em nosso exemplo: o precatório
foi apresentado pelo Presidente do Tribunal em 30/05/2016; logo, ele deverá ser
pago pelo Poder Público até o dia 31/12/2017 (último dia do ano seguinte).
Abrindo um parêntese: se o
precatório tiver valor muito alto (valor superior a 15% do montante dos demais precatórios
apresentados até o dia 01/07 do respectivo ano), então, neste caso, deverá ser
pago 15% do valor deste precatório até o dia 31/12 do ano seguinte e o restante
em parcelas iguais nos 5 anos subsequentes, acrescidas de juros de mora e
correção monetária. A CF/88 permite também que o credor faça um acordo com o
Poder Público (§ 20 do art. 100 da CF/88, incluído pela EC 94/2016).
Período de suspensão dos juros
moratórios

Entre o dia 01/07 de um ano até o
dia 31/12 do ano seguinte (em nosso exemplo: de 01/07/2016 até 31/12/2017), não
haverá incidência de juros de mora porque o STF entende que esse foi o prazo normal
que a CF/88 deu para o Poder Público pagar seus precatórios, não havendo razão
para que a Fazenda Pública tenha que pagar juros referentes a esse interregno.
Existe, inclusive, uma súmula
vinculante sobre o tema:
SV 17-STF: Durante o período previsto
no parágrafo (obs: atual § 5º) do artigo 100 da Constituição, não
incidem juros de mora sobre os precatórios que nele sejam pagos.
Obs: neste período, não há
incidência de juros moratórios, mas deverá ser paga correção monetária,
conforme prevê a parte final do § 5º do art. 100.
E se passar o dia 31/12 e o ente
devedor não efetuar o pagamento do precatório, neste caso, voltará a incidir
juros de mora? Em nosso exemplo, se passar o dia 31/12/2017, começa novamente a
incidir juros moratórios?

SIM. Isso porque terá se esgotado
o prazo dado pela Constituição para que o ente devedor pague o precatório.
Logo, o ente encontra-se em mora. Assim, por exemplo, se o precatório foi
inscrito até o dia 01/07/2016, este precatório deverá ser pago até o dia
31/12/2017. Se o pagamento for realizado neste período, não haverá incidência
de juros de mora porque não houve inadimplemento por parte da Fazenda Pública.
No entanto, se passar o dia 31/12/2017 sem pagamento, haverá a incidência de
juros moratórios que serão computados a partir de 01/01/2018 até a data em que
ocorrer a quitação do precatório.
Confira as palavras do Min. Edson
Fachin:
“A não incidência de juros
de mora nesse período ocorre justamente porque nele não existe mora, em
decorrência de norma constitucional, e isso se mantém independentemente de
quando ocorrer o pagamento do precatório.
No caso de o pagamento ocorrer
após o prazo estabelecido pela Constituição, haverá a incidência de juros de
mora, mas só no período em que houver mora, ou seja, depois do prazo estabelecido
para o pagamento.” (Voto na Rcl 15906 AgR, Rel.  Min. Edson Fachin, Primeira Turma, julgado em
18/08/2015)
Obs: como estes juros moratórios
não estavam previstos no precatório, considerando que se presumia que ele seria
pago na data fixada pela CF/88 (até o dia 31/12), para que o credor receba o
valor dos juros será necessária a expedição de um precatório complementar. Depois
que o precatório está expedido, não se pode acrescentar novos valores a ele.
Voltando ao nosso exemplo:

         
Sentença transitada em julgado: 04/04/2016.
         
Início dos juros moratórios: 10/04/2016 (data da
realização dos cálculos).
         
Dia em que o precatório foi apresentado para
pagamento: 30/05/2016.
         
Suspensão dos juros moratórios: 01/07/2016 (SV
17-STF).
         
Prazo máximo para a Fazenda Pública pagar:
31/12/2017 (§ 5º do art. 100 da CF/88).
         
Se a Fazenda não pagar até o prazo máximo
(31/12/2017): voltam a correr os juros moratórios.
Repare, portanto, que o
entendimento do STF definido no RE 579431/RS não invalida a SV 17 porque o que
foi decidido neste recurso é um período anterior ao de que trata a súmula.
Observação final complementar
O que foi explicado acima é
suficiente para fins de concurso. Irei, contudo, agora fazer uma observação
complementar a respeito da súmula vinculante 17.
A SV 17 foi editada em 29/10/2009
e continua sendo atualmente aplicada pelo STF. Nesse sentido: RE 577465
AgR-ED-ED-EDv-AgR, Rel. Min. Rosa Weber, Tribunal Pleno, julgado em 23/09/2016.
Contudo, tem crescido entre os
Ministros a ideia de que esta súmula foi superada pelo § 12 do art. 100 da
CF/88, acrescentado pela EC 62, de 10/12/2009, ou seja, posteriormente à edição
do enunciado. Para muitos Ministros, o § 12 determina a incidência de juros
moratórios independentemente do período. Confira a redação do dispositivo:
§ 12. A partir da promulgação desta
Emenda Constitucional, a atualização de valores de
requisitórios, após sua expedição, até o efetivo pagamento
,
independentemente de sua natureza, será feita pelo índice oficial de
remuneração básica da caderneta de poupança, e, para fins de
compensação da mora, incidirão juros simples
no mesmo percentual de
juros incidentes sobre a caderneta de poupança, ficando excluída a incidência
de juros compensatórios. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009).

Em provas de concurso, a SV 17
continua válida, devendo ser assinalada como correta. Somente se manifeste
sobre esta crítica ao enunciado caso você seja expressamente indagado acerca
disso, como no caso de uma prova oral, por exemplo.

Artigo Original em Dizer o Direito

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