Nesse período de pandemia
decorrente do novo coronavírus, foram impostas várias restrições, dentre elas o
chamado “isolamento social”.

Infelizmente, por razões
sociológicas que ainda precisam ser estudadas, verificou-se que esse
confinamento social gerou um aumento no número de casos de violência doméstica
e familiar contra as mulheres, crianças, adolescentes, idosos e pessoas com deficiência.

Pensando nisso, foi editada a Lei
nº 14.022/2020, que prevê medidas para enfrentamento da violência doméstica e
familiar contra essas pessoas durante a pandemia da Covid-19.

Veja abaixo um resumo das mudanças
efetuadas.

1) Serviços de atendimento
a essas pessoas são considerados essenciais

O art. 3º da Lei nº 13.979/2020
prevê, em seus incisos, nove medidas para enfrentamento do coronavírus. Ex: isolamento,
quarentena, restrição excepcional e temporária da locomoção interestadual ou
intermunicipal, requisição de bens e serviços, entre outros.

O § 8º do art. 3º faz, contudo,
uma ressalva e afirma que essas medidas previstas nos incisos, quando adotadas,
deverão resguardar o exercício e o funcionamento de serviços públicos e
atividades essenciais.

Os serviços públicos e atividades
essenciais foram listados pelo Decreto nº 10.282/2020.

A Lei nº 14.022/2020 acrescenta
um novo parágrafo ao art. 3º da Lei nº 13.979/2020 afirmando que são essenciais
os serviços e atividades voltados ao atendimento de:

• mulheres em situação de
violência doméstica e familiar;

• crianças e adolescentes vítimas
de crimes previstos no ECA ou no CP;

• pessoas idosas vítimas de
crimes previstos no Estatuto do Idoso ou no CP;


pessoas com deficiência vítimas de crimes previstos no Estatuto da Pessoa com
Deficiência ou no CP.

Veja o dispositivo inserido:

Art. 3º (…)

§ 7º-C Os serviços públicos e
atividades essenciais, cujo funcionamento deverá ser resguardado quando
adotadas as medidas previstas neste artigo, incluem os relacionados ao
atendimento a mulheres em situação de violência doméstica e familiar, nos
termos da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, a crianças, a adolescentes, a
pessoas idosas e a pessoas com deficiência vítimas de crimes tipificados na Lei
nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), na Lei
nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), na Lei nº 13.146, de 6
de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), e no Decreto-Lei nº
2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal).


os prazos processuais, a apreciação de matérias, o atendimento às partes e a
concessão de medidas protetivas devem continuar normalmente;


o registro de ocorrências relacionadas com essas infrações penais poderá ser feito
por telefone ou meio eletrônico.

  

Art.
5º-A Enquanto perdurar o estado de emergência de saúde internacional decorrente
do coronavírus responsável pelo surto de 2019:

I
– os prazos processuais, a apreciação de matérias, o atendimento às partes e a
concessão de medidas protetivas que tenham relação com atos de violência
doméstica e familiar cometidos contra mulheres, crianças, adolescentes, pessoas
idosas e pessoas com deficiência serão mantidos, sem suspensão;

II
– o registro da ocorrência de violência doméstica e familiar contra a mulher e
de crimes cometidos contra criança, adolescente, pessoa idosa ou pessoa com
deficiência poderá ser realizado por meio eletrônico ou por meio de número de
telefone de emergência designado para tal fim pelos órgãos de segurança
pública;

Parágrafo
único. Os processos de que trata o inciso I do caput deste artigo serão
considerados de natureza urgente.

2) Poder público deverá
adotar medidas para garantir o atendimento presencial

A Lei nº 14.022/2020 prevê que o poder
público deverá adotar as medidas necessárias para que, mesmo durante a
pandemia, seja mantido o atendimento presencial de mulheres, idosos, crianças
ou adolescentes em situação de violência.

Se for necessário, poderá haver a
adaptação dos procedimentos estabelecidos na Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006)
às circunstâncias emergenciais do período de pandemia.

A adaptação dos procedimentos deverá
assegurar a continuidade do funcionamento habitual dos órgãos do poder público
descritos na Lei nº 11.340/2006, no âmbito de sua competência, com o objetivo
de garantir a manutenção dos mecanismos de prevenção e repressão à violência
doméstica e familiar contra a mulher e à violência contra idosos, crianças ou
adolescentes.

Se, por razões de segurança
sanitária, não for possível manter o atendimento presencial a todas as demandas
relacionadas à violência doméstica e familiar contra a mulher e à violência
contra idosos, crianças ou adolescentes, o poder público deverá,
obrigatoriamente, garantir o atendimento presencial para situações que possam
envolver, efetiva ou potencialmente, os ilícitos previstos:

I – no Código Penal, na
modalidade consumada ou tentada:

a) feminicídio (art. 121, § 2º, VI);

b) lesão corporal de natureza
grave (art. 129, § 1º);

c) lesão corporal dolosa de
natureza gravíssima (art. 129, § 2º);

d) lesão corporal seguida de
morte (art. 129, § 3º);

e) ameaça praticada com uso de
arma de fogo (art. 147);

f) estupro (art. 213);

g) estupro de vulnerável (art.
217-A);

h) corrupção de menores (art. 218);

i) satisfação de lascívia
mediante presença de criança ou adolescente (art. 218-A);

II – na Lei nº 11.340/2006 (Lei
Maria da Penha): o crime de descumprimento de medidas protetivas de urgência (art.
24-A);

III – no ECA;

IV – no Estatuto do Idoso.

3) Realização prioritária
do exame de corpo de delito

Mesmo durante a vigência da Lei
nº 13.979/2020, ou mesmo durante o estado de emergência de caráter humanitário
e sanitário em território nacional, deverá ser garantida a realização
prioritária do exame de corpo de delito quando se tratar de crime que envolva:

I – violência doméstica e
familiar contra a mulher;

II – violência contra criança,
adolescente, idoso ou pessoa com deficiência.

Nos casos de crimes de natureza
sexual, se houver a adoção de medidas pelo poder público que restrinjam a
circulação de pessoas, os órgãos de segurança deverão estabelecer equipes
móveis para realização do exame de corpo de delito no local em que se encontrar
a vítima.

4) Disponibilização de canais
de comunicação

Os órgãos de segurança pública
deverão disponibilizar canais de comunicação que garantam interação simultânea,
inclusive com possibilidade de compartilhamento de documentos, desde que
gratuitos e passíveis de utilização em dispositivos eletrônicos, como celulares
e computadores, para atendimento virtual de situações que envolvam violência
contra a mulher, o idoso, a criança ou o adolescente, facultado aos órgãos
integrantes do Sistema de Justiça – Poder Judiciário, Ministério Público e
Defensoria Pública, e aos demais órgãos do Poder Executivo, a adoção dessa
medida.

Vale ressaltar que a
disponibilização de canais de atendimento virtuais não exclui a obrigação do
poder público de manter o atendimento presencial de mulheres em situação de
violência doméstica e familiar e de casos de suspeita ou confirmação de
violência praticada contra idosos, crianças ou adolescentes.

Nos
casos de violência doméstica e familiar, a ofendida poderá solicitar quaisquer
medidas protetivas de urgência à autoridade competente por meio dos
dispositivos de comunicação de atendimento on-line.

5) Concessão das medidas
protetivas de urgência de forma eletrônica

A Lei prevê que, se as
circunstâncias do fato justificarem, a autoridade competente poderá conceder
qualquer uma das medidas protetivas de urgência previstas Lei Maria da Penha,
de forma eletrônica.

A autoridade poderá considerar
provas coletadas eletronicamente ou por audiovisual, em momento anterior à
lavratura do boletim de ocorrência e a colheita de provas que exija a presença
física da ofendida.

É possível ainda que o Poder
Judiciário faça a intimação da ofendida e do ofensor da decisão judicial por
meio eletrônico.

Após a concessão da medida de
urgência de forma eletrônica, a autoridade competente, independentemente da
autorização da ofendida, deverá:

I – se for autoridade judicial,
comunicar à unidade de polícia judiciária competente para que proceda à
abertura de investigação criminal para apuração dos fatos;

II – se for delegado de polícia,
comunicar imediatamente ao Ministério Público e ao Poder Judiciário da medida
concedida e instaurar imediatamente inquérito policial, determinando todas as
diligências cabíveis para a averiguação dos fatos;

III – se for policial, comunicar
imediatamente ao Ministério Público, ao Poder Judiciário e à unidade de polícia
judiciária competente da medida concedida, realizar o registro de boletim de
ocorrência e encaminhar os autos imediatamente à autoridade policial competente
para a adoção das medidas cabíveis.

6) Prorrogação automática
das medidas protetivas

As medidas protetivas deferidas
em favor da mulher serão automaticamente prorrogadas e vigorarão durante a
vigência da Lei nº 13.979/2020, ou durante a declaração de estado de emergência.

O juiz competente providenciará a
intimação do ofensor, que poderá ser realizada por meios eletrônicos,
cientificando-o da prorrogação da medida protetiva.

Obviamente, essas medidas poderão
ser revistas ou cessadas pelo Poder Judiciário caso se entenda necessário.

7) Denúncia recebidas deverão
ser repassadas para os órgãos competentes

As denúncias de violência
recebidas na esfera federal pela Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180 e
pelo serviço de proteção de crianças e adolescentes com foco em violência
sexual – Disque 100 devem ser repassadas, com as informações de urgência, para
os órgãos competentes.

O prazo máximo para o envio dessas
informações é de 48 horas, salvo impedimento técnico.

8) Autoridade de segurança
pública deverá assegurar atendimento ágil

Em todos os casos, a autoridade
de segurança pública deve assegurar o atendimento ágil a todas as demandas
apresentadas e que signifiquem risco de vida e a integridade da mulher, do
idoso, da criança e do adolescente, com atuação focada na proteção integral.

9) Realização de campanhas
informativas

O poder público promoverá
campanha informativa sobre prevenção à violência e acesso a mecanismos de
denúncia durante a vigência da Lei nº 13.979/2020, ou durante a vigência do
estado de emergência decorrente da Covid-19.

Vigência

A Lei nº 14.022/2020 entrou em
vigor na data de sua publicação (08/07/2020).

Artigo Original em Dizer o Direito

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