Olá, amigos do Dizer o Direito, 

Foi publicada ontem (03/09/2021),
a Lei nº 14.200/2021, que alterou a Lei nº 9.279/96 (Lei de Propriedade
Industrial), para dispor sobre a licença compulsória de patentes ou de pedidos
de patente nos casos de declaração de emergência nacional ou internacional ou
de interesse público, ou de reconhecimento de estado de calamidade pública de
âmbito nacional. 

Vamos entender com calma o que
mudou. Para isso, é necessário contextualizar o tema.

 

INPI

O Instituto Nacional de
Propriedade Industrial (INPI) é uma autarquia federal, vinculada ao Ministério
da Economia, sendo responsável, no Brasil, pela concessão e garantia dos
direitos de propriedade intelectual para a indústria.

 

Patente

Patente é um título de
propriedade temporária concedido pelo INPI para a pessoa que inventou um novo
produto, um novo processo ou para quem fez aperfeiçoamentos destinados à
aplicação industrial.

A patente, concedida ao autor de uma invenção ou de um
modelo de utilidade, é o direito de, durante determinado tempo, só ele explorar
economicamente essa invenção ou modelo de utilidade. Veja o que diz o art. 6º
Lei nº 9.279/96:

Art. 6º Ao autor de invenção ou modelo
de utilidade será assegurado o direito de obter a patente que lhe garanta a
propriedade, nas condições estabelecidas nesta Lei.

 

Direitos

A patente confere os seguintes direitos ao seu titular:

Art. 42. A patente confere ao seu
titular o direito de impedir terceiro, sem o seu consentimento, de produzir,
usar, colocar à venda, vender ou importar com estes propósitos:

I – produto objeto de patente;

II – processo ou produto obtido
diretamente por processo patenteado.

§ 1º Ao titular da patente é assegurado
ainda o direito de impedir que terceiros contribuam para que outros pratiquem
os atos referidos neste artigo.

§ 2º Ocorrerá violação de direito da
patente de processo, a que se refere o inciso II, quando o possuidor ou
proprietário não comprovar, mediante determinação judicial específica, que o
seu produto foi obtido por processo de fabricação diverso daquele protegido
pela patente.

 

Depósito do pedido junto ao
INPI

O procedimento para obtenção da
patente tem início com o depósito do pedido no INPI, que deverá ser instruído
com uma série de documentos e informações.

Em regra, a patente deverá ser
requerida junto ao INPI pelo próprio autor, em nome próprio.

Poderá também ser requerida pelos
herdeiros ou sucessores do autor, pelo cessionário ou por aquele a quem a lei
ou o contrato de trabalho ou de prestação de serviços determinar que pertença a
titularidade (art. 6º, § 2º, da Lei nº 9.279/96).

 

Proteção conferida pela
patente retroage

É importante destacar que, expedida a carta-patente, surge
para o titular o direito de obter indenização pela exploração indevida do
objeto patenteado, inclusive em relação ao período entre a publicação do pedido
e a concessão da patente, como preceitua o art. 44 da Lei:

Art. 44. Ao titular da patente é
assegurado o direito de obter indenização pela exploração indevida de seu
objeto, inclusive em relação à exploração ocorrida entre a data da publicação
do pedido e a da concessão da patente.

 

Assim sendo, uma vez concedida a
patente, a proteção por ela conferida retroage a momento inicial do processo, o
que funciona como uma contenção (um desestímulo) aos concorrentes que cogitem
explorar indevidamente o objeto protegido durante a tramitação do pedido.

A proteção patentária, portanto,
não se inicia apenas com a decisão final de deferimento do pedido, sendo
interessante notar que a lei considera o requerente como presumivelmente
legitimado a obter a patente, salvo prova em contrário, conforme o art. 6º, §
1º, da LPI.

 

Prazo de vigência das
patentes

A vigência da patente observará os prazos fixos de 20 anos
para invenções e de 15 anos para modelos de utilidade, contados da data de depósito, conforme o caput do art. 40 da Lei:

Art. 40. A patente de invenção vigorará
pelo prazo de 20 (vinte) anos e a de modelo de utilidade pelo prazo 15 (quinze)
anos contados da data de depósito.

 

E depois que terminar o
prazo da patente?

Findo o prazo de vigência da patente, a proteção extingue-se
e seu objeto passa a ser considerado de domínio público, conforme o art. 78, I
e parágrafo único, da Lei:

Art. 78. A patente extingue-se:

I – pela expiração do prazo de
vigência;

(…)

Parágrafo único. Extinta a patente, o seu
objeto cai em domínio público.

 

Cessão da patente

A patente possui a natureza
jurídica de um bem móvel imaterial. Isso significa que essa patente pode ser
negociada.

O titular de uma patente pode ceder a sua propriedade para outra
pessoa. É como se ele “vendesse” a patente para um terceiro. Isso está previsto
no art. 58 da Lei nº 9.276/98:

Art. 58. O pedido de patente ou a
patente, ambos de conteúdo indivisível, poderão ser cedidos, total ou
parcialmente.

 

Essa cessão será anotada no INPI
(art. 59 da LPI).

 

Licenciamento da patente

Uma outra forma de negociação da
patente consiste no licenciamento.

A principal diferença para a
cessão é que no licenciamento o titular não cede a propriedade da patente. No
licenciamento, é como se o titular “alugasse” a patente para que uma outra
pessoa a explorasse.

A licença da patente pode ser:

a) voluntária;

b) compulsória.

 

Assim, essa autorização para que
alguém explore a patente nem sempre é voluntária, podendo o titular se obrigado
a fazer isso.

 

Licença voluntária

Ocorre quando o titular celebra
um contrato permitindo que uma outra pessoa (chamada de “licenciado”) explore a
patente. Como contraprestação, esse licenciado pagará ao titular uma
contraprestação chamada de royalty.

Veja o que diz a LPI:

Art. 61. O titular de patente ou o
depositante poderá celebrar contrato de licença para exploração.

Parágrafo único. O licenciado poderá
ser investido pelo titular de todos os poderes para agir em defesa da patente.

 

O contrato de licença deverá ser
averbado no INPI para que produza efeitos em relação a terceiros (art. 62).

 

Licença compulsória

Ocorre quando o titular da
patente é obrigado a conceder a licença, mesmo que não tivesse intenção de
fazê-lo.

Por que existe a licença
compulsória? Por que o titular pode ser obrigado a autorizar que outras pessoas
utilizem a patente?

As hipóteses de licença compulsória são tratadas em quatro artigos da
LPI:

 

Art. 68: trata-se de uma forma de punição do
titular da patente que está agindo de forma abusiva;

Art. 68. O titular ficará sujeito a
ter a patente licenciada compulsoriamente se exercer os direitos dela
decorrentes de forma abusiva, ou por meio dela praticar abuso de poder
econômico, comprovado nos termos da lei, por decisão administrativa ou
judicial.

§ 1º Ensejam, igualmente, licença
compulsória:

I – a não exploração do objeto da
patente no território brasileiro por falta de fabricação ou fabricação
incompleta do produto, ou, ainda, a falta de uso integral do processo
patenteado, ressalvados os casos de inviabilidade econômica, quando será
admitida a importação; ou

II – a comercialização que não
satisfizer às necessidades do mercado.

(…)

 

Art. 70: motivada por razões de ordem técnica;

Art. 70. A licença compulsória será
ainda concedida quando, cumulativamente, se verificarem as seguintes hipóteses:

I – ficar caracterizada situação de
dependência de uma patente em relação a outra;

II – o objeto da patente dependente
constituir substancial progresso técnico em relação à patente anterior; e

III – o titular não realizar acordo
com o titular da patente dependente para exploração da patente anterior.

 

Art. 71: em razão de emergência ou inspirada
por motivos de interesse público. Aqui houve alteração promovida pela Lei nº
14.200/2021.

LEI Nº 9.279/96
(LEI DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL)

Antes da Lei
14.200/2021

Depois da Lei
14.200/2021

Art. 71. Nos casos de
emergência nacional ou interesse público, declarados em ato do Poder
Executivo Federal, desde que o titular da patente ou seu licenciado não
atenda a essa necessidade, poderá ser concedida, de ofício, licença
compulsória, temporária e não exclusiva, para a exploração da patente, sem
prejuízo dos direitos do respectivo titular. (Regulamento)

Art. 71. Nos casos de
emergência nacional ou internacional ou de interesse público declarados em lei ou em ato do Poder Executivo
federal, ou de
reconhecimento de estado de calamidade pública de âmbito nacional pelo
Congresso Nacional
, poderá ser concedida licença compulsória, de
ofício, temporária e não exclusiva, para a exploração da patente ou do pedido
de patente, sem prejuízo dos direitos do respectivo titular, desde que seu titular ou seu
licenciado não atenda a essa necessidade
. (Redação dada pela Lei nº
14.200/2021)

 

Publicação de lista com as patentes
e pedidos de patente que podem auxiliar

O Poder Executivo federal
publicará lista de patentes ou de pedidos de patente, não aplicável o prazo de
sigilo previsto no art. 30 da LPI, potencialmente úteis ao enfrentamento das
situações previstas no caput do art. 71, no prazo de até 30 (trinta) dias após
a data de publicação da declaração de emergência ou de interesse público, ou do
reconhecimento de estado de calamidade pública, excluídos as patentes e os
pedidos de patente que forem objetos de acordos de transferência da tecnologia
de produção ou de licenciamento voluntário capazes de assegurar o atendimento
da demanda interna, nos termos previstos em regulamento (novo § 2º do art. 71).

 

Entidades especializadas serão
consultadas para a elaboração dessa lista

Entes públicos, instituições de
ensino e pesquisa e outras entidades representativas da sociedade e do setor
produtivo deverão ser consultados no processo de elaboração da lista de
patentes ou de pedidos de patente que poderão ser objeto de licença compulsória
(novo § 3º do art. 71).

Qualquer instituição pública ou
privada poderá apresentar pedido para inclusão de patente ou de pedido de
patente na lista (novo § 4º do art. 71).

 

Informações que deverão
constar na lista

A lista conterá informações e
dados suficientes para permitir a análise individualizada acerca da utilidade
de cada patente e pedido de patente e contemplará, pelo menos:

I – o número individualizado das
patentes ou dos pedidos de patente que poderão ser objeto de licença
compulsória;

II – a identificação dos
respectivos titulares;

III – a especificação dos
objetivos para os quais será autorizado cada licenciamento compulsório.

(novo § 5º do art. 71)

 

Avaliação individualizada das
patentes

A partir da lista publicada, o
Poder Executivo realizará, no prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável por igual
período, a avaliação individualizada das invenções e modelos de utilidade
listados e somente concederá a licença compulsória, de forma não exclusiva,
para produtores que possuam capacidade técnica e econômica comprovada para a
produção do objeto da patente ou do pedido de patente, desde que conclua pela
sua utilidade no enfrentamento da situação que a fundamenta (novo § 6º do art.
71).

 

Exclusão da lista

Patentes ou pedidos de patente
que ainda não tiverem sido objeto de licença compulsória poderão ser excluídos
da lista referida no § 2º deste artigo nos casos em que a autoridade competente
definida pelo Poder Executivo considerar que seus titulares assumiram
compromissos objetivos capazes de assegurar o atendimento da demanda interna em
condições de volume, de preço e de prazo compatíveis com as necessidades de
emergência nacional ou internacional, de interesse público ou de estado de
calamidade pública de âmbito nacional por meio de uma ou mais das seguintes
alternativas:

I – exploração direta da patente
ou do pedido de patente no País;

II – licenciamento voluntário da
patente ou do pedido de patente; ou

III – contratos transparentes de
venda de produto associado à patente ou ao pedido de patente.

(novo § 7º do art. 71)

 

Critérios para o arbitramento
da remuneração do titular

No arbitramento da remuneração do
titular da patente ou do pedido de patente, serão consideradas as
circunstâncias de cada caso, observados, obrigatoriamente, o valor econômico da
licença concedida, a duração da licença e as estimativas de investimentos
necessários para sua exploração, bem como os custos de produção e o preço de
venda no mercado nacional do produto a ela associado (novo § 12 do art. 71).

A remuneração do titular da
patente ou do pedido de patente objeto de licença compulsória será fixada em
1,5% (um inteiro e cinco décimos por cento) sobre o preço líquido de venda do
produto a ela associado até que seu valor venha a ser efetivamente estabelecido
(novo § 13 do art. 71)

A remuneração do titular do
pedido de patente objeto de licença compulsória somente será devida caso a
patente venha a ser concedida, e o pagamento, correspondente a todo o período
da licença, deverá ser efetivado somente após a concessão da patente (novo § 14
do art. 71)

A autoridade competente dará
prioridade à análise dos pedidos de patente que forem objeto de licença
compulsória (novo § 15 do art. 71)

 

Produtos somente podem ser
comercializados após a autorização da vigilância sanitária

Os produtos que estiverem
sujeitos ao regime de vigilância sanitária deverão observar todos os requisitos
previstos na legislação sanitária e somente poderão ser comercializados após a
concessão de autorização, de forma definitiva ou para uso em caráter
emergencial, pela autoridade sanitária federal (novo § 16 do art. 71)

 

Art. 71-A: de produtos
farmacêuticos destinados à exportação por razões humanitárias.

Trata-se de importante inovação incluída pela Lei nº
14.200/2021:

Art. 71-A. Poderá ser concedida, por
razões humanitárias e nos termos de tratado internacional do qual a República
Federativa do Brasil seja parte, licença compulsória de patentes de produtos
destinados à exportação a países com insuficiente ou nenhuma capacidade de
fabricação no setor farmacêutico para atendimento de sua população. (Incluído
pela Lei nº 14.200/2021)

 

Vigência

A Lei nº 14.200/2021 entrou em vigor
na data de sua publicação (03/09/2021).

 

Artigo Original em Dizer o Direito

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