Controle da atividade policial

O controle da atividade policial
é realizado de duas formas:
a) controle interno: feito por
meio das corregedorias de polícia;
b) controle externo: realizado
por intermédio do Ministério Público.
Controle externo da atividade
policial

Foi a Constituição Federal que
determinou que uma das funções institucionais do Ministério Público é a de
exercer o controle externo da atividade policial (art. 129, VII).
Quais são as finalidades do
controle externo realizado pelo MP?

O MP, no exercício do controle
externo, deverá fiscalizar, de forma geral, a atuação dos órgãos policiais,
podendo ser citados como exemplos:
• fiscalizar como tem sido o
trabalho policial na prevenção e investigação dos crimes;

• examinar se a polícia tem
respeitado os direitos e garantias constitucionais dos presos que estejam sob
sua responsabilidade;

• conferir se os órgãos policiais
estão dando devido cumprimento às determinações judiciais.
Ausência de subordinação

Vale ressaltar que o fato de o
Ministério Público realizar o controle externo da atividade policial não
significa que exista uma hierarquia entre os órgãos policiais e o Parquet.
A polícia não está subordinada
hierarquicamente ao Ministério Público. Este controle externo decorre do
sistema de freios e contrapesos que pode existir não apenas entre os poderes,
mas também entre órgãos. Nesse sentido: LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. Salvador:
Juspodivm, 2015, p. 189.
Disciplina legal

A LC 75/93 dedicou três artigos
para tratar sobre o controle externo da atividade policial. Chamo especial
atenção para o art. 9º, que é o mais importante deles:
Art. 3º O Ministério
Público da União exercerá o controle externo da atividade policial tendo em
vista:
a) o respeito aos
fundamentos do Estado Democrático de Direito, aos objetivos fundamentais da
República Federativa do Brasil, aos princípios informadores das relações
internacionais, bem como aos direitos assegurados na Constituição Federal e na
lei;
b) a preservação da ordem
pública, da incolumidade das pessoas e do patrimônio público;
c) a prevenção e a
correção de ilegalidade ou de abuso de poder;
d) a indisponibilidade da
persecução penal;
e) a competência dos
órgãos incumbidos da segurança pública.
Art. 9º O Ministério
Público da União exercerá o controle externo da atividade policial por meio de
medidas judiciais e extrajudiciais podendo:
I – ter livre ingresso em
estabelecimentos policiais ou prisionais;
II – ter acesso a quaisquer
documentos relativos à atividade-fim policial;
III – representar à
autoridade competente pela adoção de providências para sanar a omissão
indevida, ou para prevenir ou corrigir ilegalidade ou abuso de poder;
IV – requisitar à
autoridade competente para instauração de inquérito policial sobre a omissão ou
fato ilícito ocorrido no exercício da atividade policial;
V – promover a ação penal
por abuso de poder.
Art. 10. A prisão de
qualquer pessoa, por parte de autoridade federal ou do Distrito Federal e
Territórios, deverá ser comunicada imediatamente ao Ministério Público
competente, com indicação do lugar onde se encontra o preso e cópia dos
documentos comprobatórios da legalidade da prisão.
Apesar de esses artigos falarem
sobre o MPU, eles também são aplicados aos Ministérios Públicos estaduais, por
força do art. 80 da Lei nº 8.625/93.
Existem duas Resoluções do CNMP
que regulamentam o controle externo da atividade policial pelo Ministério
Público:
• Resolução nº 20/2007, que
regulamenta o art. 9º da LC 75/93 e o art. 80 da Lei 8.625/93, disciplinando,
no âmbito do Ministério Público, o controle externo da atividade policial.

• Resolução nº 129/2015, que
estabelece regras mínimas de atuação do Ministério Público no controle externo
da investigação de morte decorrente de intervenção policial.
Obs: caso você esteja nas fases
discursivas, prática ou oral do concurso do Ministério Público, recomenda-se a
leitura dessas duas resoluções.
Espécies de controle externo
exercido pelo MP sobre a atividade policial:

Controle difuso

Controle concentrado

Exercido
por todos os membros do Ministério Público com atribuição criminal, quando do
exame dos procedimentos que lhes forem atribuídos.

Exercido
por alguns membros do MP que tenham a atribuição específica de realizar o
controle externo da atividade policial, conforme disciplinado no âmbito de
cada Ministério Público.

Ex:
o membro do MP que atua na vara criminal, ao receber o inquérito policial,
deverá verificar se a autoridade policial cumpriu todas as exigências legais,
se os prazos foram cumpridos, se as diligências necessárias foram realizadas
etc. Essa atividade consiste em uma forma de controle externo difuso da
atividade policial.

Ex:
no MPE, existem promotorias especializadas no controle externo da atividade
policial (normalmente chamadas de PROCEAP). No âmbito do MPF, existe, em cada
Estado, um grupo de Procuradores da República designados pelo PGR para
exercer esta função (é o GCEAP).

Os
membros designados para essa função dedicam-se ao controle concentrado da
atividade policial e poderão tomar diversas iniciativas, como: a) realizar
visitas nas repartições policiais; b) fiscalizar a destinação de armas,
drogas e objetos apreendidos; c) fiscalizar os mandados de prisão; d) expedir
recomendações; e) instaurar inquéritos civis ou procedimentos de investigação
criminal para apurar condutas policiais.

Obs: os controles difuso e
concentrado não se excluem e são exercidos concomitantemente.
Feitas estas considerações,
imagine a seguinte situação hipotética:

O Procurador da República
integrante do Grupo de Controle Externo da Atividade Policial do Rio de Janeiro
(GCEAP/RJ) instaurou inquérito civil para apurar a regularidade e eficiência do
serviço de inteligência da Superintendência de Polícia Federal no Estado.
Como providência, requisitou ao
Superintendente que enviasse cópia de todos os relatórios de inteligência policial
produzidos pela Diretoria de Inteligência daquela Superintendência no último
ano.
O pedido foi fundamentado no art.
9º, II, da LC 75/93 e no art. 5º, II, da Resolução 20/2007-CNMP:
Art. 9º O Ministério
Público da União exercerá o controle externo da atividade policial por meio de
medidas judiciais e extrajudiciais podendo:
II – ter acesso a
quaisquer documentos relativos à atividade-fim policial;
Art. 5º Aos órgãos do
Ministério Público, no exercício das funções de controle externo da atividade
policial, caberá:
II – ter acesso a
quaisquer documentos, informatizados ou não, relativos à atividade-fim policial
civil e militar, incluindo as de polícia técnica desempenhadas por outros
órgãos, em especial:
A Polícia Federal se recusou a
remeter os documentos alegando que o Ministério Público estava extrapolando
suas atribuições constitucionais, considerando que a produção dos relatórios de
inteligência não está sujeita ao controle externo do MPF.
A questão chegou até o STJ. O
pedido formulado pelo MPF, no presente caso, deverá ser atendido?

NÃO. O controle externo da
atividade policial exercido pelo Ministério Público Federal não lhe garante o
acesso irrestrito a todos os relatórios de inteligência produzidos pela
Diretoria de Inteligência do Departamento de Polícia Federal, mas somente aos
de natureza persecutório-penal.
Lei nº 9.883/99

A Lei nº 9.883/99 instituiu o
Sistema Brasileiro de Inteligência (SISBIN), que tem por objetivo planejar e executar
as atividades de inteligência do País com a finalidade de fornecer subsídios ao
Presidente da República nos assuntos de interesse nacional.
A Lei foi regulamentada pelo
Decreto nº 4.376/2002, que previu que a Diretoria de Inteligência Policial do Departamento
de Polícia Federal integra o SISBIN.
Desse modo, a Diretoria de
Inteligência Policial do Departamento de Polícia Federal, dentre outras
atribuições, executa atividades de inteligência com a finalidade de subsidiar o
Presidente da República nos assuntos de interesse nacional.
Assim, os relatórios de
inteligência (chamados de RELINT) nem sempre têm por objetivo servir de
subsídio para a deflagração de inquéritos policiais. Algumas vezes eles servem
apenas para municiar o SISBIN e auxiliar o Presidente da República na tomada de
decisões.
MP deve ter acesso aos RELINTs
relacionados com as atividades de investigação criminal

Se você reparar novamente na
redação do art. 9º, II, da LC 75/93, verá que o legislador afirma que o MP
poderá ter “acesso a quaisquer documentos relativos à atividade-fim policial”.
Dessa forma, o controle externo
da atividade policial exercido pelo Parquet deve circunscrever-se à atividade
de polícia judiciária. Logo, somente cabe ao órgão ministerial acesso aos
relatórios de inteligência emitidos pela Polícia Federal de natureza
persecutório-penal, ou seja, que guardem relação com a atividade de
investigação criminal (atividade-fim policial).
Acesso irrestrito a todos os
relatórios de inteligência não é cabível

Desse modo, o pleito do MP de ter
acesso a “todos os relatórios de inteligência” produzidos pelo
Departamento de Polícia Federal no Rio de Janeiro, de modo irrestrito e
incluindo aqueles não destinados a aparelhar procedimentos investigatórios criminais,
extrapola o poder fiscalizador atribuído à Instituição.
E as atividades de inteligência
realizadas pelo SISBIN ficarão sem nenhuma fiscalização?

NÃO. O controle e a fiscalização
externos da atividade de inteligência do SISBIN serão exercidos pelo Poder
Legislativo, ou seja, pelo Congresso Nacional (art. 6º da Lei nº 9.883/99).
Resumindo:

O
controle externo da atividade policial exercido pelo Ministério Público Federal
não lhe garante o acesso irrestrito a todos os relatórios de inteligência
produzidos pela Diretoria de Inteligência do Departamento de Polícia Federal,
mas somente aos de natureza persecutório-penal.

O
controle externo da atividade policial exercido pelo Parquet deve
circunscrever-se à atividade de polícia judiciária, conforme a dicção do art.
9º da LC n. 75/93, cabendo-lhe, por essa razão, o acesso aos relatórios de
inteligência policial de natureza persecutório-penal, ou seja, relacionados com
a atividade de investigação criminal.

O
poder fiscalizador atribuído ao Ministério Público não lhe confere o acesso
irrestrito a “todos os relatórios de inteligência” produzidos pelo
Departamento de Polícia Federal, incluindo aqueles não destinados a aparelhar
procedimentos investigatórios criminais formalizados.

STJ. 1ª Turma. REsp 1.439.193-RJ,
Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 14/6/2016 (Info 587).

Artigo Original em Dizer o Direito

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