O que são danos sociais?

Danos sociais, segundo Antônio
Junqueira de Azevedo,

“são lesões à sociedade, no seu nível
de vida, tanto por rebaixamento de seu patrimônio moral – principalmente a
respeito da segurança – quanto por diminuição na qualidade de vida. Os danos
sociais são causa, pois, de indenização punitiva por dolo ou culpa grave,
especialmente, repetimos, se atos que reduzem as condições coletivas de
segurança, e de indenização dissuasória, se atos em geral da pessoa jurídica,
que trazem uma diminuição do índice de qualidade de vida da população.” (p.
376).

Danos sociais não se enquadram como
dano material, moral ou estético

O dano social é, portanto, uma nova
espécie de dano reparável, que não se confunde com os danos materiais, morais e
estéticos, e que decorre de comportamentos socialmente reprováveis, que
diminuem o nível social de tranquilidade.

De igual forma, dano social não é sinônimo
de dano moral coletivo.

Exemplos de danos sociais

Alguns exemplos dados por Junqueira de
Azevedo: o pedestre que joga papel no chão, o passageiro que atende ao celular
no avião, o pai que solta balão com seu filho. Tais condutas socialmente
reprováveis podem gerar danos como o entupimento de bueiros em dias de chuva,
problemas de comunicação do avião causando um acidente aéreo, o incêndio de
casas ou de florestas por conta da queda do balão etc.

Indenização por danos sociais tem
caráter punitivo

Diante da prática dessas condutas
socialmente reprováveis, o juiz deverá condenar o agente a pagar uma
indenização de caráter punitivo, dissuasório ou didático, a título de dano
social.

O valor da indenização é destinado à
coletividade (e não à “vítima” imediata)

Conforme explica
Flávio Tartuce, os danos sociais são difusos e a sua indenização deve ser
destinada não para a vítima, mas sim para um fundo de proteção ao consumidor,
ao meio ambiente etc., ou mesmo para uma instituição de caridade, a critério do
juiz (Manual de Direito do Consumidor.
São Paulo: Método, 2013, p. 58).

Instrumento de função social da
responsabilidade civil

Os danos sociais representam a aplicação
da função social da responsabilidade civil (PEREIRA, Ricardo Diego Nunes. Os novos danos: danos morais coletivos,
danos sociais e danos por perda de uma chance
. Disponível em: http://ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11307).

Ricardo Pereira cita alguns casos
práticos:

Um deles é a decisão do TRT-2ª Região
(processo 2007-2288), que condenou o Sindicato dos Metroviários de São Paulo e
a Cia do Metrô a pagarem 450 cestas básicas a entidades beneficentes por terem
realizado uma greve abusiva que causou prejuízo à coletividade.

Outro exemplo foi o caso de uma fraude ocorrida
em um sistema de loterias, no Rio Grande do Sul, chamado de “Toto Bola”. Ficou
constatado que a loteria seria fraudulenta, retirando do consumidor as chances
de vencer. Nesse episódio, o TJ/RS, no Recurso Cível 71001281054, DJ
18/07/2007, determinou indenização a título de dano social para o Fundo de
Proteção aos Consumidores. Veja a ementa do julgado:

(…) 1. Não há que se falar em perda
de uma chance, diante da remota possibilidade de ganho em um sistema de
loterias. Danos materiais consistentes apenas no valor das cartelas
comprovadamente adquiridas, sem reais chances de êxito.

2. Ausência de danos morais puros, que
se caracterizam pela presença da dor física ou sofrimento moral, situações de
angústia, forte estresse, grave desconforto, exposição à situação de vexame,
vulnerabilidade ou outra ofensa a direitos da personalidade.

3. Presença de fraude, porém, que não
pode passar em branco. Além de possíveis respostas na esfera do direito penal e
administrativo, o direito civil também pode contribuir para orientar os atores
sociais no sentido de evitar determinadas condutas, mediante a punição
econômica de quem age em desacordo com padrões mínimos exigidos pela ética das
relações sociais e econômicas. Trata-se da função punitiva e dissuasória que a
responsabilidade civil pode, excepcionalmente, assumir, ao lado de sua clássica
função reparatória/compensatória. “O Direito deve ser mais esperto do que o
torto”, frustrando as indevidas expectativas de lucro ilícito, à custa dos
consumidores de boa fé.

4. Considerando, porém, que os danos
verificados são mais sociais do que propriamente individuais, não é razoável
que haja uma apropriação particular de tais valores, evitando-se a disfunção
alhures denominada de overcompensantion.
Nesse caso, cabível a destinação do numerário para o Fundo de Defesa de
Direitos Difusos, criado pela Lei 7.347/85, e aplicável também aos danos
coletivos de consumo, nos termos do art. 100, parágrafo único, do CDC.
Tratando-se de dano social ocorrido no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, a
condenação deverá reverter para o fundo gaúcho de defesa do consumidor. (…)

(TJRS – Recurso Cível 71001281054 –
Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais – Rel. Des. Ricardo Torres
Hermann – j. 12.07.2007).

V Jornada de Direito Civil

Na V Jornada de Direito Civil do
CJF/STJ foi aprovado um enunciado reconhecendo a existência dos danos sociais:

Enunciado
455: A expressão “dano” no art. 944 abrange não só os danos individuais,
materiais ou imateriais, mas também os danos sociais, difusos, coletivos e
individuais homogêneos a serem reclamados pelos legitimados para propor ações
coletivas.

Em uma ação individual por danos morais,
o juiz ou Tribunal pode, de ofício, condenar o autor do ilícito a indenizar a coletividade
por danos sociais?

NÃO. Veja esse exemplo prático:

João passou várias horas na fila do
banco para ser atendido.

Inconformado,
ingressou, no Juizado Especial, com ação pedindo unicamente indenização por
danos morais.

O juiz julgou procedente, determinando
que o réu pagasse 3 mil reais a João pelos danos morais sofridos. Além disso, de
ofício, condenou o banco a pagar 15 mil reais a título de danos sociais, valor
a ser revertido em favor de uma instituição de caridade.

O banco interpôs recurso inominado (art.
41 da Lei n.°
9.099/95) alegando que a decisão violou o princípio da adstrição/congruência, considerando
que o condenou ao pagamento de algo que não foi pedido.

A Turma Recursal, contudo, manteve a
sentença.

A instituição financeira ajuizou
reclamação no STJ contra a decisão da Turma Recursal.

O que o STJ decidiu? A decisão da Turma
Recursal foi acertada?

NÃO. O
STJ entendeu que a decisão da Turma Recursal era nula por ser “extra petita”.

Para que
haja condenação por dano social, é indispensável que haja pedido expresso,
sob pena de violar os princípios da demanda, da inércia e, fundamentalmente, da
adstrição/congruência, o qual exige a correlação entre o pedido e o provimento
judicial a ser exarado pelo Poder Judiciário.

No caso concreto,
em uma ação individual houve condenação do réu ao pagamento de indenização por
danos sociais em favor de terceiro estranho à lide, sem que houvesse pedido
nesse sentido ou sem que essa questão fosse levada a juízo por qualquer das
partes.

Nessa medida,
a decisão condenatória extrapolou os limites objetivos e subjetivos da demanda,
uma vez que conferiu provimento jurisdicional diverso daquele requerido na
petição inicial, beneficiando terceiro alheio à relação jurídica processual
posta em juízo.

STJ. 2ª
Seção. Rcl 12.062-GO, Rel. Ministro Raul Araújo, julgado em 12/11/2014 (recurso
repetitivo) (Info 552).

E se o
autor tivesse pedido a condenação por danos sociais, seria possível seu
deferimento?

NÃO. Mesmo
que houvesse pedido de condenação em danos sociais na demanda em exame, o
pleito não poderia ter sido julgado procedente, pois esbarraria na ausência de legitimidade
para postulá-lo. Isso porque, na visão do STJ, a condenação por
danos sociais somente pode ocorrer em demandas coletivas
 e, portanto, apenas os legitimados para a propositura de ações coletivas poderiam
pleitear danos sociais.

Em suma, não
é possível discutir danos sociais em ação individual.

Observação final

Interessante destacar que esse foi o
primeiro caso oriundo de uma reclamação do Juizado Especial que foi submetido à
sistemática de recurso repetitivo (art. 543-C do CPC).

Obras consultadas:

AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Por uma
nova categoria de dano na responsabilidade civil: o dano social. In: FILOMENO,
José Geraldo Brito; WAGNER JR., Luiz Guilherme bda Costa; GONÇALVES, Renato
Afonso (coord.). O Código Civil e sua
interdisciplinariedade
. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.

TARTUCE, Flávio; NEVES, Daniel Amorim
Assumpção. Manual de Direito do
Consumidor
. 2ª ed., São Paulo: Método, 2013.

Artigo Original em Dizer o Direito

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