O Superior Tribunal Militar (STM) confirmou as condenações de duas mulheres acusadas de causar prejuízos de quase três milhões de reais aos cofres públicos, após fraude junto ao sistema de pensões da Marinha do Brasil.

O caso tramitou na 3ª Auditoria do Rio de Janeiro, que condenou uma das rés a cinco anos e quatro meses de reclusão e a outra a dois anos de reclusão pelo crime de estelionato. 

Um Inquérito Policial Militar (IPM) da Marinha apurou que uma então pensionista morreu em 18 de agosto de 2000. Mas, mesmo após a morte da pensionista, a Administração Militar continuou a realizar os depósitos dos seus proventos até dezembro de 2017. Os prejuízos aos cofres públicos ao longo de quase duas décadas foram de R$ 2,8 milhões em valores atualizados.

Segundo a denúncia do Ministério Público Militar (MPM), uma terceira pessoa se passou pela ex-pensionista morta durante diversas ‘provas de vida’. De acordo com a promotoria, a Marinha foi mantida em erro devido às condutas perpetradas por uma das filhas da pensionista, que também era a procuradora da idosa, e uma sobrinha-neta da ex-pensionista. “A primeira ré organizou a fraude instruindo e acompanhando uma terceira mulher, que por diversas vezes se passou pela ex-pensionista durante as visitas para as provas de vida realizadas ao longo dos anos”. O MPM arguiu que a filha da pensionista, aproveitando-se da condição de procuradora e de posse de seu cartão bancário e senha, confessou ter realizado sucessivas movimentações na conta-corrente, dentre elas inúmeros saques.

A segunda acusada confessou ter atuado como ‘testemunha’ nas fraudes durante as visitas de prova de vida. O IPM não foi capaz de identificar outras pessoas que poderiam ter se passado pela ex-pensionista morta ou confirmar, por conta da existência de diversos homônimos, a informação prestada pela primeira denunciada quanto ao suposto falecimento da fraudadora (terceira pessoa).

A investigação não detectou a participação de militares ou servidores civis nas condutas criminosas. O MPM também informou que foi solicitada a reverão aos cofres públicos do valor indevidamente depositado, mas a Caixa Econômica Federal informou não haver saldo na conta da ex-pensionista para a quitação.

Recurso no STM

Após a condenação na primeira instância da JMU, os advogados impetraram o recurso de apelação junto ao STM, arguindo a inocência de ambas as rés.

Aos apreciar a apelação, o ministro Lúcio Mário de Barros Góes afirmou que a autoria, materialidade e dolo foram categoricamente comprovados, em especial por provas como: certidão de óbito da pensionista; planilha de recadastramentos no período de 2006 a 2017; ofício da Caixa Econômica Federal informando a impossibilidade de reversão dos valores; termo de recadastramento domiciliar, de 27/1/2017, tendo como testemunhas as duas rés; solicitação de recadastramento domiciliar, de 13/1/2017, assinado por uma das acusadas; laudo de avaliação do prejuízo e demonstrativo de débito; além da prova oral produzida em Juízo.

O relator também usou o próprio depoimento da filha da pensionista, que declarou que se encontrava com depressão e que a acusação era verdadeira. O ministro ressaltou que a mulher admitiu ter recebido indevidamente os valores depositados pela Marinha desde o óbito de sua mãe e que tinha consciência da ilicitude que praticou. 

“A jurisprudência desta Corte tem se forjado no sentido de que a movimentação da conta de pensionista sabidamente falecida, como se aquela estivesse viva, cumulado com a não comunicação do seu falecimento à Administração Militar, configurando o silêncio “conveniente e malicioso”, já são elementos bastantes para caracterizar o artifício fraudulento, hábil a manter a Administração Militar em erro. Aliás, o simples fato de realizar sucessivos saques na conta de uma pessoa falecida, por si só, já aponta para o chamado \’animus fraudandi\’, em situações desse jaez”, fundamentou o magistrado.

Para a segunda acusada, a sobrinha-neta, a Defensoria Pública da União levantou a tese sob as alegações de que a ré não obteve vantagem ilícita, não causou prejuízo à Administração Militar, o dolo não estaria comprovado e que não tinha cometido qualquer crime. Mas a tese não foi aceita pelo relator. 

“Os autos comprovam que, por duas vezes, ela atuou como testemunha no fraudulento procedimento de prova de vida da falecida, a pedido da mentora do engodo, sua prima. A instrução processual não deixa dúvidas de que a segunda vez em que a apelante atuou como testemunha corresponde ao último procedimento de recadastramento realizado pela Marinha do Brasil, relacionado à prova de vida da ex-pensionista.”

O ministro-relator decidiu manter a condenação e aumentou a pena da sobrinha-neta para três anos, dois meses e doze dias de reclusão, negando o benefício do sursis e estabelecido o regime inicial aberto para o cumprimento da pena.

Os demais ministros da Corte seguiram o voto do relator por unanimidade.

APELAÇÃO Nº 7000809-77.2020.7.00.0000

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