1ª Turma começa a discutir recurso contra decisão do júri que absolve réu contra provas dos autos
Em sessão realizada na terça-feira (3), a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar recurso em que se o Ministério Público pode recorrer de julgamento em que o Tribunal do Júri absolve o réu, mesmo após admitir a existência de materialidade e de indícios de autoria ou participação no delito. A matéria é objeto do Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 170559, que teve análise suspensa por pedido de vista do ministro Luiz Fux.
Homicídio
O recurso foi interposto em favor de um comerciante submetido a júri popular por crime de homicídio qualificado, acusado de ter mandado matar um juiz de Mato Grosso do Sul (MS). O crime ocorreu no Paraguai em setembro de 1999, e o corpo foi encontrado parcialmente queimado com dois tiros na cabeça.
A executora do homicídio recebeu a pena de 12 anos de reclusão, em condenação definitiva. Já o acusado de ser o mandante do crime foi absolvido pela maioria dos votos do Conselho de Sentença do Tribunal do Júri Federal de Mato Grosso (MT), que, no entanto, respondeu de forma positiva ao terceiro quesito formulado, relativo à absolvição.
Apelação
O Ministério Público Federal (MPF) recorreu da decisão, alegando que esse quesito deveria ter sido considerado prejudicado pelo juiz presidente do júri porque, nos dois quesitos anteriores, o conselho de sentença haviam reconhecido a autoria e a materialidade (comprovação que o crime ocorreu) do delito e, por isso, não poderia absolver o acusado.
Ao prover a apelação do MPF, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) determinou a anulação da sentença e a realização de novo julgamento. A defesa não obteve êxito em habeas corpus impetrado no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e, por essa razão, interpôs o recurso ao Supremo. No dia 1º/8, o relator do RHC, ministro Marco Aurélio, concedeu liminar para suspender o trâmite do processo-crime até o julgamento do mérito do recurso.
Absolvição
No julgamento do mérito, o relator votou no sentido de endossar a decisão do Conselho de Sentença. Segundo o ministro Marco Aurélio, o Código de Processo Penal (artigo 483, parágrafo 2º) prevê que, após a resposta positiva de mais de três jurados sobre os quesitos referentes à materialidade e à autoria do crime, será formulado o quesito genérico de absolvição (se o acusado deve ser absolvido).
Para o relator, não se trata de contradição, pois o Júri respondeu sim à pergunta contida no próprio CPP: “O jurado absolve o acusado?”. Ele observou que o Conselho de Sentença não é um órgão técnico e tem liberdade de decisão. Ainda de acordo com o ministro Marco Aurélio, o CPP também estabelece que o julgamento prosseguirá apenas se os jurados decidirem pela condenação do acusado e que a resposta pela absolvição impede a continuidade do julgamento.
Soberania do júri
Ao abrir divergência para negar provimento ao recurso, o ministro Alexandre de Moraes observou que o Supremo ainda não tem jurisprudência sobre o tema e lembrou que há a possibilidade de recurso para que se realize novo julgamento pelo júri quando uma das partes entender que a decisão foi contrária às provas, como ocorreu no caso. “Reconhecendo-se essa possibilidade do julgamento contrário à prova dos autos, devolva-se para que o Júri novamente delibere”, afirmou. “A palavra final sobre o mérito da acusação absolvendo ou condenando é do Júri. Se novamente o Júri entender dessa maneira, não cabe esse recurso novamente”.
Para o ministro, qualquer alteração jurisprudencial estaria indo de encontro ao sistema acusatório, à paridade de armas entre acusação e defesa e ao próprio entendimento do Supremo de que os jurados não são portadores de poder absoluto, ‘ao menos no primeiro julgamento”.
O ministro Luís Roberto Barroso acompanhou a divergência. Segundo ele, há inúmeros precedentes do Supremo no sentido de que a soberania do Tribunal do Júri não impede a apelação pela acusação e pela defesa. Ele entendeu que uma nova redação do quesito relativo à absolvição, depois de reconhecida a autoria e a materialidade, se aplica hipóteses como legítima defesa e desclassificação do crime.
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