O que é detração penal?
A detração penal ocorre
quando
– o juiz desconta
– da pena ou da medida de
segurança aplicada ao réu
– o tempo que ele ficou preso
antes do trânsito em julgado
– ou o tempo em que ficou
internado em hospital de custódia (medida de segurança).
Exemplo:
Eduardo foi preso em flagrante
por roubo com emprego de arma em 02/01/2011.
Foi, então, denunciado pelo art.
157, § 2º, I, do CP, tendo respondido o processo preso cautelarmente.
Em 01/08/2011 foi sentenciado a 5
anos de reclusão, tendo ocorrido o trânsito em julgado.
Percebe-se, portanto, que Eduardo
ficou preso provisoriamente (antes do trânsito em julgado) durante 7 meses.
Este período de prisão provisória
(7 meses) deverá ser descontado, pelo magistrado, da pena imposta a Eduardo (5
anos).
Assim, restará a Eduardo cumprir
ainda 4 anos e 5 meses de reclusão.
O ato do juiz de descontar este
período é chamado, pela lei, de detração.
A detração está prevista no art. 42 do Código
Penal:
Art. 42. Computam-se, na pena
privativa de liberdade e na medida de segurança, o tempo de prisão
provisória, no Brasil ou no estrangeiro, o de prisão administrativa e
o de internação em qualquer dos estabelecimentos referidos no artigo
anterior.
Veja como o tema já foi cobrado em prova:
þ
(Cartórios TJCE 2018) O abatimento na
pena privativa de liberdade e na medida de segurança, do tempo de prisão
provisória, no Brasil ou no estrangeiro, o de prisão administrativa e o de
internação em hospital de custódia, ou outro estabelecimento adequado é chamado
de detração. (certo)
þ
(Agente_Penitenciário 2018 FCC) A detração consiste no cômputo do tempo de
prisão preventiva na pena privativa de liberdade. (certo)
“Por prisão provisória, devem ser entendidas todas as formas
de prisão cautelar admitidas processualmente: prisão em flagrante, preventiva
etc.” ▪Paulo Queiroz, Curso de direito penal. v. 1.
Imagine agora a seguinte situação
hipotética:
João foi condenado a uma pena de
5 anos de reclusão.
Vale ressaltar que, durante o processo, João não ficou preso
preventivamente. No entanto, o juiz determinou que ele deveria se submeter à medida
cautelar de recolhimento domiciliar noturno, aos finais de semana e dias não
úteis, cumulada com fiscalização eletrônica, nos termos do art. 319, V e IX, do
CPP:
Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão:
(…)
V – recolhimento domiciliar no período
noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e
trabalho fixos;
(…)
IX – monitoração eletrônica.
Assim, durante 1 ano, João
cumpriu essa medida cautelar diversa da prisão.
Diante disso, indaga-se:
esse 1 ano poderá ser descontado da pena imposta com base na detração?
SIM.
É possível considerar o tempo submetido à medida
cautelar de recolhimento noturno, aos finais de semana e dias não úteis,
supervisionados por monitoramento eletrônico, como tempo de pena efetivamente
cumprido, para detração da pena.
STJ. 3ª
Seção. HC 455.097/PR, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 14/04/2021 (Info 693).
Deve-se interpretar a legislação
que regula a detração de forma que favoreça o sentenciado. Isso harmoniza-se
com o Princípio da Humanidade, que impõe ao juízo da Execução Penal a especial
percepção da pessoa presa como sujeito de direitos.
Se fosse proibida a detração nesse
caso, estaríamos diante de excesso de execução. Isso porque a medida cautelar imposta com base
no art. 319, V e IX, do CPP representou uma limitação objetiva à liberdade do
réu, ainda que menos grave que a prisão.
A medida cautelar do art. 319, V
e IX, impede o acautelado de sair de casa após o anoitecer e em dias não úteis
e, dessa forma, assemelha-se ao cumprimento de pena em regime prisional
semiaberto.
O cumprimento de pena em regime
semiaberto gera direito à detração, razão pela qual a presente situação também
deve garantir o mesmo direito.
Aplica-se aqui o brocardo latino Ubi
eadem ratio, ibi eadem legis dispositio, que significa, em uma tradução
literal: onde existe a mesma razão fundamental, aplica-se a mesma regra
jurídica.
O STJ, nos casos em que há a
configuração dos requisitos do art. 312 do CPP, admite que a condenação em
regime semiaberto produza efeitos antes do trânsito em julgado da sentença
(prisão preventiva compatibilizada com o regime carcerário do título
prisional). Nessa perspectiva, mostra-se incoerente impedir que a medida
cautelar que pressuponha a saída do paciente de casa apenas para laborar, e
durante o dia, seja descontada da reprimenda.
O STJ concluiu, portanto, que as
hipóteses previstas no art. 42 do Código Penal (prisão provisória, prisão
administrativa e internação) não representam um rol taxativo.
Desse modo, o período de
recolhimento domiciliar, aplicado simultaneamente a monitoração eletrônica,
para fiscalização de seu cumprimento, deve ser objeto de detração penal.
O cálculo da detração
deverá considerar a quantidade de horas efetivas de recolhimento domiciliar
O recolhimento noturno,
diferentemente da prisão preventiva, tem restrições pontuais ao direito de
liberdade. Por essa razão, o STJ afirmou que o cálculo da detração considerará
a soma da quantidade de horas efetivas de recolhimento domiciliar com monitoração
eletrônica, as quais serão convertidas em dias para o desconto da pena.
Assim, o tempo a ser aferido para
fins de detração é somente aquele em que o acautelado se encontra
obrigatoriamente recolhido em casa, não sendo computado o período em que lhe é
permitido sair.
No mesmo sentido:
Qualquer prisão processual deve ser detraída da pena final
imposta, não importa o local de seu cumprimento – cadeia, domicílio ou hospital
-, devendo, portanto, a decisão ser mantida por seus próprios fundamentos.
Assim, mesmo o tempo em que o indivíduo ficou em prisão
domiciliar também deve ser detraído do tempo total de pena.
STJ. 6ª Turma. AgRg no AgRg nos EDcl no HC 442.538/PR, Rel. Min.
Nefi Cordeiro, julgado em 05/03/2020.
O cumprimento de prisão domiciliar, por comprometer o status
libertatis da pessoa humana, deve ser reconhecido como pena efetivamente
cumprida para fins de detração da pena, em homenagem ao princípio da
proporcionalidade e em apreço ao princípio do non bis in idem.
STJ. 5ª Turma.
HC 459.377/RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em
04/09/2018.
DOD Plus –
outros julgados sobre detração
A detração penal não se
aplica à pena de prestação pecuniária
Não é possível a aplicação da detração, na pena privativa de liberdade,
do valor recolhido a título de prestação pecuniária. Isso porque, a prestação
pecuniária tem caráter penal e indenizatório, com consequências jurídicas
distintas da prestação de serviços à comunidade (em que se admite a detração).
STJ. 5ª Turma. REsp 1853916/PR, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado
em04/08/2020.
STJ. 6ª Turma. AgRg no HC 401.049/SC, Rel. Min. Ribeiro Dantas,
julgado em 13/12/2018.
É possível que haja a
detração em processos criminais distintos?
1) Se a prisão cautelar foi ANTERIOR ao crime pelo qual a pessoa
foi condenada: NÃO
2) Se a prisão cautelar foi POSTERIOR ao crime pelo qual a
pessoa foi condenada: SIM
É cabível a aplicação do benefício da detração penal, previsto
no art. 42 do CP, em processos distintos, desde que o delito pelo qual o
sentenciado cumpre pena tenha sido cometido antes da segregação cautelar,
evitando a criação de um crédito de pena.
STJ. 5ª Turma.
HC 178894-RS, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 13/11/2012.