Márcio André Lopes Cavalcante

Juiz Federal integrante do pleno do
TRE/AM no biênio 2020/2022

 

Robério Moreira Borges

Analista Judiciário do TRE/AM

 

A Emenda Constitucional nº 117/202,
promulgada em 05/04/2022, versou sobre os seguintes temas:

• manutenção de programas de promoção
e difusão da participação política das mulheres;

• cota de gênero e campanha eleitoral
(financiamento e tempo de propaganda);

• situação dos partidos que não
observaram a cota de gênero até a edição da emenda.

Vejamos cada um dos pontos.

 

1. MANUTENÇÃO
DE PROGRAMAS DE PROMOÇÃO E DIFUSÃO DA PARTICIPAÇÃO POLÍTICA DAS MULHERES

Partidos devem destinar pelo menos 5%
dos recursos do Fundo Partidário para participação das mulheres na política

Em 2009, foi editada a Lei nº 12.034,
que inseriu o inciso V no art. 44 da Lei nº 9.096/95 obrigando os partidos
políticos a destinar pelo menos 5% do total de recursos do Fundo Partidário em
programas de promoção e difusão da participação política das mulheres.

Segundo o Tribunal Superior Eleitoral,
“o incentivo à presença feminina na política constitui ação afirmativa
necessária, legítima e urgente que visa promover e integrar as mulheres na vida
político-partidária brasileira, dando-lhes oportunidades de se filiarem às
legendas e de se candidatarem, de modo a se garantir a plena observância ao
princípio da igualdade de gênero.” (CTA – Consulta nº 060407534 – BRASÍLIA – DF
– Acórdão de 19/04/2018 – Relator(a) Min. Jorge Mussi – Publicação: DJE –
Diário da justiça eletrônica, Tomo 185, Data 14/09/2018).

Importante destacar que essa obrigação legal é atualmente
regulamentada pelo art. 22, da Resolução TSE 23.604/2019:

Art. 22. Os órgãos partidários devem
destinar, no mínimo, 5% (cinco por cento) do total de recursos do Fundo
Partidário recebidos no exercício financeiro para criação ou manutenção de
programas de promoção e difusão da participação política das mulheres.

(…)

§ 3º O partido político que não
cumprir o disposto no caput deve transferir o saldo para conta bancária de que
trata o inciso IV do art. 6º, sendo vedada sua aplicação para finalidade
diversa, de modo que o saldo remanescente deve ser aplicado dentro do exercício
financeiro subsequente, sob pena de acréscimo de 12,5% (doze inteiros e cinco
décimos por cento) do valor previsto no caput, a ser aplicado na mesma
finalidade (art. 44, § 5º, da Lei nº 9.096/95).

§ 4º Na hipótese do § 3º, o partido
fica impedido de utilizar qualquer dos valores mencionados para finalidade
diversa.

§ 5º A aplicação de recursos a que se
refere este artigo, além da contabilização em rubrica própria do plano de
contas aprovado pelo TSE, deve estar comprovada mediante a apresentação de
documentos fiscais em que conste expressamente a finalidade da aplicação,
vedada a comprovação mediante o rateio de despesas ordinárias, tais como água,
luz, telefone, aluguel e similares.

(…)

 

E o que fez a Emenda Constitucional nº
117/2022?

Embora com uma redação mais sucinta, a
Emenda atribuiu status constitucional à previsão legal já existente que
obriga os partidos a destinar 5% dos recursos do Fundo Partidário para
programas de promoção e difusão da participação política das mulheres.

Vejamos o quadro comparativo:

Lei 9.096/95 (Lei dos Partidos
Políticos)

CF/88 com redação dada pela EC 117/2022

Art. 44. Os recursos oriundos do
Fundo Partidário serão aplicados:

V – na criação e manutenção de
programas de promoção e difusão da participação política das mulheres,
criados e executados pela Secretaria da Mulher ou, a critério da agremiação,
por instituto com personalidade jurídica própria presidido pela Secretária da
Mulher, em nível nacional, conforme percentual que será fixado pelo órgão
nacional de direção partidária, observado o mínimo de 5% (cinco por cento) do
total;

Art. 17 (…)

§ 7º Os partidos políticos devem
aplicar no mínimo 5% (cinco por cento) dos recursos do fundo partidário na
criação e na manutenção de programas de promoção e difusão da participação
política das mulheres, de acordo com os interesses intrapartidários.

(Incluído pela Emenda Constitucional
nº 117, de 2022)

 

O art. 44, V, da Lei nº 9.096/95
continua em vigor?

SIM. Nesse caso, o que a EC 117/2022
fez foi apenas constitucionalizar uma obrigação já existente na legislação
infraconstitucional.

Como decorrência disso, a partir da
entrada em vigor da EC 117/2022, a destinação obrigatória de 5% dos recursos do
Fundo Partidário para programas de incentivo à participação das mulheres não
pode mais ser suprimida pelo legislador infraconstitucional.

 

2. COTA DE
GÊNERO E AS CAMPANHAS ELEITORAIS (FINANCIAMENTO E TEMPO DE PROPAGANDA)

Em que consiste a cota de gênero?

A cota de gênero está prevista no art. 10, §3º, da Lei nº 9.504/97,
e consiste na obrigação de o partido reservar, pelo menos, 30% de candidaturas
para cada sexo. Vejamos:

Art. 10. Cada partido poderá registrar
candidatos para a Câmara dos Deputados, a Câmara Legislativa, as Assembleias
Legislativas e as Câmaras Municipais no total de até 100% (cem por cento) do
número de lugares a preencher mais 1 (um).

(…)

§ 3º Do número de vagas resultante das
regras previstas neste artigo, cada partido ou coligação preencherá o mínimo de
30% (trinta por cento) e o máximo de 70% (setenta por cento) para candidaturas
de cada sexo.

 

É possível que o partido faça o
registro de candidaturas apenas do sexo feminino?

NÃO. Segundo o dispositivo legal
supramencionado, deve haver, no mínimo, 30% de candidatos de cada
sexo
, masculino ou feminino.

Assim, não é possível o registro de
candidatos apenas do sexo masculino e o inverso também é verdadeiro, ou seja,
não é possível o registro de candidatos somente do sexo feminino.

 

E como é feito o financiamento dessas
campanhas eleitorais?

É proibido que pessoas jurídicas de
direito privado façam doações para partidos e candidatos, de forma que as
empresas não podem participar do financiamento de campanhas eleitorais.

Logo, o financiamento das campanhas atualmente
é feito de dois modos:

a) por doações de pessoas naturais;

b) com os recursos públicos que são
transferidos aos partidos pelo Fundo Partidário
e pelo Fundo Especial de Financiamento de Campanha
– FEFC
.

 

Principais
diferenças entre FEFC e Fundo Partidário

FEFC

FUNDO PARTIDÁRIO

Fundo Especial de Financiamento
de Campanha

Fundo Especial de Assistência
Financeira aos Partidos Políticos

Previsto nos arts. 16-C e 16-D da
Lei nº 9.504/97.

Previsto nos arts. 38 a 44-A da
Lei nº 9.096/95.

Constituído por dotações
orçamentárias da União em ano eleitoral, em valor ao menos equivalente:

I – ao definido pelo TSE, a
cada eleição, com base nos parâmetros definidos em lei;

II – ao percentual do montante
total dos recursos da reserva específica a programações decorrentes de
emendas de bancada estadual impositiva, que será encaminhado no projeto de
lei orçamentária anual.

Constituído por:

I – multas e penalidades
pecuniárias aplicadas nos termos do Código Eleitoral e leis conexas;

II – recursos financeiros que
lhe forem destinados por lei;

III – doações de pessoa física
ou jurídica, efetuadas por intermédio de depósitos bancários diretamente na
conta do Fundo Partidário;

IV – dotações orçamentárias da
União.

Destina-se a custear os gastos eleitorais
previstos no art. 26 da Lei nº 9.504/97.

Embora também possa ser
utilizado para campanhas eleitorais, tem por finalidade primordial assegurar
a manutenção dos partidos políticos, custeando as despesas previstas no art.
44 da Lei nº 9.096/95.

 

Como é feita a distribuição desses
recursos para os candidatos?

Cabe à direção do partido deliberar
sobre a forma de distribuição dos recursos do Fundo Partidário e do FEFC aos
seus candidatos, respeitados os parâmetros estabelecidos em resoluções editadas
pelo TSE.

 

Existe alguma regra específica para o
financiamento de candidaturas femininas?

SIM. Vamos entender com calma.

Em 2015, foi editada a Lei nº 13.165, que, em seu art. 9º,
exigiu que os partidos políticos destinem, no mínimo 5% e no máximo 15% do
total de recursos do Fundo Partidário para o financiamento das campanhas
eleitorais de candidatas (candidaturas de mulheres). Veja:

Art. 9º Nas três eleições que se
seguirem à publicação desta Lei, os partidos reservarão, em contas bancárias
específicas para este fim, no mínimo 5% (cinco por cento) e no máximo 15%
(quinze por cento) do montante do Fundo Partidário destinado ao financiamento
das campanhas eleitorais para aplicação nas campanhas de suas candidatas,
incluídos nesse valor os recursos a que se refere o inciso V do art. 44 da Lei
nº 9.096, de 19 de setembro de 1995.

 

A Procuradoria-Geral da República
ajuizou ADI contra este art. 9º da Lei nº 13.165/2015.

O argumento da PGR foi, em síntese, o
seguinte:

– o art. 10, §3º, da Lei nº 9.504/97
(que vimos acima), exige que, pelo menos 30% das candidaturas nas eleições
proporcionais, sejam do sexo feminino.

– por outro lado, o art. 9º da Lei nº
13.165/2015, de forma menos protetiva, fala que as candidaturas femininas serão
financiadas com, no máximo 15% do Fundo Partidário;

– o limite máximo de 15% produz mais
desigualdade e menos pluralismo da definição das posições de gênero. “Se não há
limites máximos para financiamento de campanhas de homens, não se podem fixar
limites máximos para as mulheres”, afirma. Quanto ao limite mínimo, enfatiza
que o patamar de 5% dos recursos para as candidatas protege de forma deficiente
os direitos políticos das mulheres.

– na ação, a PGR defendeu que o
princípio da proporcionalidade só seria atendido se o percentual de recursos a
serem destinados para as candidaturas femininas fosse também de 30% dos
recursos do Fundo Partidário. Isso porque, neste caso, haveria uma equiparação
com o patamar mínimo de candidaturas femininas do art. 10, §3º, da Lei nº
9.504/97.

 

O STF concordou com os argumentos.

Se o partido adotar o piso de 5%
significa que, na prática, a agremiação partidária irá destinar às candidaturas
masculinas 95% dos recursos do Fundo Partidário.

Por outro lado, mesmo que o partido adote
o teto de 15%, nesta hipótese os recursos destinados às candidaturas masculinas
será de 85%.

Não existem justificativas para essa
diferenciação.

Os partidos políticos, mesmo gozando
de autonomia partidária, devem respeitar os direitos fundamentais a partir da
concepção da eficácia horizontal dos direitos fundamentais.

Assim, é preciso que, no âmbito dos
partidos políticos, sejam asseguradas medidas de igualdade material entre
homens e mulheres.

O fato de os recursos partidários
terem um caráter público reforça a obrigação de que sua distribuição não seja
discriminatória.

Diante disso, o STF afirmou que esses
limites do art. 9º da Lei nº 13.165/2015 são inconstitucionais. Conforme
decidiu a Corte, os recursos destinados à campanha eleitoral devem ser
distribuídos na exata proporção das candidaturas de ambos os sexos. Ex: se
houver 40% de mulheres candidatas, 40% dos recursos devem ser destinados a
elas.

Vale ressaltar, no entanto, que esse
percentual é de, no mínimo, 30%, considerando que o percentual de mulheres
candidatas em cada partido é de, no mínimo, 30%.

Assim, o STF decidiu:

Dar interpretação conforme a Constituição ao art. 9º da Lei nº
13.165/2015, de modo a equiparar o patamar legal mínimo de candidaturas
femininas (hoje o do art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97, isto é, ao menos 30% de
cidadãs), ao mínimo de recursos do Fundo Partidário a lhes serem destinados,
que deve ser interpretado como também de 30% do montante do Fundo alocado a
cada partido, para as eleições majoritárias e proporcionais, e fixar que,
havendo percentual mais elevado de candidaturas femininas, o mínimo de recursos
globais do partido destinados a campanhas lhe seja alocado na mesma proporção.

STF. Plenário. ADI 5617/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em
15/3/2018 (Info 894).

 

Outro ponto importante é que o STF
declarou a inconstitucionalidade da previsão de que a regra do art. 9º da Lei
nº 13.165/2015 iria durar apenas por três anos.

Explicando melhor.

A redação do art. 9º previa que a
regra de destinação de recursos partidários para as campanhas de mulheres iria
durar apenas por três eleições.

O STF decidiu que isso é
inconstitucional.

Como o STF afirmou que o percentual
mínimo de recursos para as campanhas de mulheres deve seguir a mesma regra do
art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97 (no mínimo, 30%), a Corte entendeu que não
deveria haver a fixação de um prazo determinado, já que essa regra de 30%
também não tem um período certo.

Assim, essa previsão mínima de 30% dos
recursos para as campanhas de mulheres deverá perdurar enquanto existir a regra
do art. 10, § 3º.

Desse modo, o STF decidiu:

Declarar a inconstitucionalidade da expressão “três”, contida no
art. 9º da Lei nº 13.165/2015.

STF. Plenário. ADI 5617/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em
15/3/2018 (Info 894).

 

A decisão do STF versou apenas sobre o
Fundo Partidário. E como ficou o FEFC?

Deverá seguir o mesmo raciocínio. A
distribuição do FEFC entre os candidatos também deve guardar proporcionalidade
com o número de candidaturas femininas.

Foi o que decidiu o TSE (sem grifos no
original):

(…) 9. Embora circunscrito o objeto da ADI 5617 à distribuição
dos recursos partidários que veio a ser fixada por meio da Lei nº 13.165/2015,
os fundamentos então esposados transcendem o decidido naquela hipótese,
considerada, em especial, a premissa de que “a igualdade entre homens e
mulheres exige não apenas que as mulheres tenham garantidas iguais
oportunidades, mas também que sejam elas empoderadas por um ambiente que lhes
permita alcançar a igualdade de resultados”. Aplicável, sem dúvida, a
mesma diretriz hermenêutica; “ubi eadem ratio ibi idem jus“,
vale dizer, onde houver o mesmo fundamento, haverá o mesmo direito. (…) 11. Se
a distribuição do Fundo Partidário deve resguardar a efetividade do disposto no
art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97, no sentido de viabilizar o percentual mínimo
de 30% de candidaturas por gênero, consoante decidiu a Suprema Corte ao
julgamento da ADI 5617, com maior razão a aplicação dos recursos do Fundo
Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) – cuja vocação é, exclusivamente,
o custeio das eleições – há de seguir a mesma diretriz
(CTA
0600252-18.2018.6.00.0000 – Consulta nº 060025218 – BRASÍLIA – DF – Acórdão de
22/05/2018 – Relator(a) Min. Rosa Weber – Publicação: DJE – Diário da justiça
eletrônica, Tomo 163, Data 15/08/2018).

 

A cota de gênero também deve ser
observada na distribuição do tempo de propaganda eleitoral entre os candidatos?

SIM. O TSE, ao responder a mesma
consulta e com idênticas razões de decidir utilizadas pelo STF na ADI 5617, também
consignou que o partido, ao fazer a distribuição do tempo de propaganda
eleitoral entre seus candidatos, deveria observar essa mesma regra, reservando
percentual de tempo proporcional ao número de candidaturas femininas.

Vejamos (sem grifos):

12. No tocante ao tempo de propaganda eleitoral gratuita no
rádio e na televisão, consabido não haver disposição normativa expressa que
balize a sua distribuição em termos de percentual de gênero. A despeito disso, a
carência de regramento normativo que imponha a observância dos patamares
mínimos previstos no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97 à distribuição do tempo
de propaganda eleitoral no rádio e na televisão não obstaculiza interpretação
extraída a partir de preceitos constitucionais que viabilizem a sua
implementação
.

13. Consoante magistério de Inocêncio Mártires Coelho, com apoio
em Niklas Luhmann, Friedrich Müller e Castanheira Neves: “não existe norma
jurídica, senão norma jurídica interpretada, vale dizer, preceito formalmente
criado e materialmente concretizado por todos quantos integram as estruturas
básicas constituintes de qualquer sociedade pluralista. […] O teor literal de
uma disposição é apenas a ‘ponta do iceberg’; todo o resto, talvez o mais
importante, é constituído por fatores extralinguísticos, sociais e estatais,
que mesmo se o quiséssemos não poderíamos fixar nos textos jurídicos, no
sentido da garantia da sua pertinência.” (LUHMANN, Niklas. El derecho de
la sociedad. México: Herder/Universidad Iberoamericana, 2005, p. 425-6; MÜLLER,
Friedrich. Métodos de Trabalho do Direito Constitucional. Porto Alegre:
Síntese, 1999, p. 45; e NEVES, A. Castanheira. Metodologia Jurídica. Problemas
fundamentais. Coimbra: Universidade de Coimbra, 1993, p. 166-76.)

14. Aplica-se, no ponto, a mesma ratio decidendi
adotada pela Suprema Corte na ADI 5617, com prevalência ao direito à dignidade
da pessoa humana
(art. 1º, III, da CF) e à igualdade de gênero (art.
5º, caput, da CF) (CTA 0600252-18.2018.6.00.0000 – Consulta nº 060025218 –
BRASÍLIA – DF – Acórdão de 22/05/2018 – Relator(a) Min. Rosa Weber –
Publicação: DJE – Diário da justiça eletrônica, Tomo 163, Data 15/08/2018).

 

E o que fez a Emenda Constitucional nº
117/2022?

Incluiu o §8º ao art. 17, da Constituição Federal, que espelha
as mesmas regras já definidas pelo STF e pelo TSE para distribuição de recursos
públicos e tempo de propaganda para candidaturas femininas. Vejamos:

Art. 17 (…)

§ 8º O
montante do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e da parcela do fundo
partidário destinada a campanhas eleitorais, bem como o tempo de propaganda
gratuita no rádio e na televisão a ser distribuído pelos partidos às
respectivas candidatas, deverão ser de no mínimo 30% (trinta por cento),
proporcional ao número de candidatas, e a distribuição deverá ser realizada
conforme critérios definidos pelos respectivos órgãos de direção e pelas normas
estatutárias, considerados a autonomia e o interesse partidário. (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 117, de 2022)

 

Ainda de acordo com a redação do novo
dispositivo constitucional, é importante ressaltar que a obrigação do partido
estará cumprida com a destinação do percentual mínimo de recursos para
candidaturas femininas, não se exigindo que esse percentual seja dividido
igualitariamente entre as candidatas.

Assim, é possível que uma determinada candidata,
em relação a qual o partido entende que tem maiores chances, possa receber mais
recursos e tempo de propaganda que outra, desde que observados os critérios
definidos pelos respectivos órgãos de direção do partido e pelas normas
estatutárias.

 

O novo § 8º do art. 17 da CF/88, acima
transcrito, fala em “propaganda”. Qual é o tipo de propaganda a que se refere o
dispositivo?

A propaganda política é gênero que abrange duas espécies:

PROPAGANDA POLÍTICA

PROPAGANDA PARTIDÁRIA

PROPAGANDA ELEITORAL

A propaganda partidária se presta à
difusão dos princípios ideológicos, atividades e programas dos partidos
políticos. Sua finalidade é a de angariar eleitores e cidadãos que simpatizem
com os ideais do partido.

 

Nessa modalidade, é vedada a
divulgação de propaganda de candidatos a cargos eletivos (Art. 50-B, §4º, II,
LPP)

A propaganda eleitoral é aquela que
se realiza antes de certame eleitoral e objetiva, basicamente, a obtenção de votos,
tornando-se instrumento de convencimento do eleitor, que pode, por seu
intermédio, ampliar seu conhecimento sobre as convicções de cada candidato ou
partido, fazendo a escolha que mais lhe convier.

É regulada pela Lei nº 9.096/95.

É regida pela Lei nº 9.504/97.

Veiculada fora do período eleitoral
(Art. 50-B, §3º, LPP)

Veiculada a partir de 15 de agosto
do ano da eleição (Art. 36, LE)

 

Feita essa distinção, vamos agora ler
novamente o dispositivo inserido pela EC 117/2022:

§ 8º O montante do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e
da parcela do fundo partidário destinada a campanhas eleitorais, bem como o tempo
de propaganda gratuita no rádio e na televisão a ser distribuído pelos partidos
às respectivas candidatas
, deverão ser de no mínimo 30% (trinta por
cento), proporcional ao número de candidatas, e a distribuição deverá ser
realizada conforme critérios definidos pelos respectivos órgãos de direção e
pelas normas estatutárias, considerados a autonomia e o interesse partidário.

 

Observe que o dispositivo faz menção a
tempo de propaganda “a ser distribuído pelos partidos às respectivas
candidatas”
, o que nos leva à conclusão de que se trata de propaganda
eleitoral
, tendo em vista que a propaganda partidária, além de ocorrer
fora do período eleitoral, não permite a divulgação de candidatos.

 

E como fica a propaganda partidária? O
partido estaria desobrigado de promover a participação política das mulheres?

NÃO. Como dito, a propaganda
partidária não veicula propaganda de candidatos, mas a difusão das ideias,
princípios, atividades e programas partidários, com o objetivo de atrair
simpatizantes.

Dentre essas finalidades, uma delas é
justamente a promoção e a difusão da participação política das mulheres, dos
jovens e dos negros, conforme prevê o art. 50-B, da Lei dos Partidos Políticos:

Art. 50-B. O partido político com estatuto registrado no
Tribunal Superior Eleitoral poderá divulgar propaganda partidária gratuita
mediante transmissão no rádio e na televisão, por meio exclusivo de inserções,
para:

(…)

V – promover e difundir a participação política das mulheres,
dos jovens e dos negros.

 

A Resolução TSE nº 23.679/2022, que
regulamenta a propaganda partidária, prevê, inclusive, destinação mínima de tempo
de propaganda para essa finalidade, em percentual idêntico ao mencionado pela
Emenda Constitucional:

Resolução TSE 23.679/2022

Art. 3º (…)

§ 1º Do tempo total a que, nos termos do art. 2º desta
Resolução, o partido político fizer jus, no mínimo 30% (trinta por cento)
deverão ser destinados à promoção e à difusão da participação política das
mulheres.

 

Assim, embora não seja contemplada
pela Emenda Constitucional, remanesce a obrigação do partido de destinar 30% do
tempo de propaganda partidária para promoção e difusão da participação política
das mulheres, com fundamento nos dispositivos legais supracitados.

 

 

3. SITUAÇÃO
DOS PARTIDOS QUE NÃO OBSERVARAM A COTA DE GÊNERO ATÉ A EDIÇÃO DA EC 117/2022

Como visto até aqui, os dispositivos
constitucionais introduzidos pela Emenda Constitucional nº 117/2022 apenas
positivaram o entendimento já consolidado do Supremo Tribunal Federal e do
Tribunal Superior Eleitoral sobre a matéria, não se vislumbrando, em princípio,
qualquer mudança naquilo que já deveria estar acontecendo na prática. Desse
modo, os partidos políticos já deveriam estar cumprindo tais regras nos últimos
anos.

Ocorre que a verdade é que muitas
agremiações deixaram de destinar o percentual mínimo de recursos para as candidaturas
femininas e para os programas de difusão e incentivo das mulheres na política.

Em consequência disso, tais partidos
começaram a ser punidos pela Justiça Eleitoral com sanções como a desaprovação
de contas, aplicação de multa, devolução de recursos ao Tesouro Nacional, suspensão
de repasse de cotas do Fundo Partidário, entre outras penalidades.

 

O que fez a Emenda Constitucional
quanto a este aspecto?

A EC 117/2022 criou duas regras
com o objetivo de regularizar a situação dos partidos inadimplentes.

Vamos analisar cada uma delas, mas
antes é necessário rememorar que um dos mecanismos utilizados pela justiça
eleitoral para fiscalizar os partidos políticos é a prestação de contas.

Os partidos políticos devem apresentar
à Justiça Eleitoral dois tipos de prestação de contas: a prestação de contas
partidária
(anual) e a prestação de contas eleitorais.

As principais diferenças entre elas são as seguintes:

PRESTAÇÃO
DE CONTAS PARTIDÁRIAS

PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS

Prestação de contas que o partido
deve apresentar anualmente até o dia 30 de junho, contendo todas as receitas
e despesas do exercício anterior.

Prestação de contas que deve ser
entregue ao final do pleito pelos partidos que participaram do pleito, ainda
que não tenham lançado candidatos.

Previsão legal: art. 32 da Lei nº 9.096/95.

Previsão legal: art. 34, V, da Lei nº
9.096/95.

Analisa toda a movimentação
financeira do partido durante o exercício.

Restringe-se à análise das receitas
e despesas durante a campanha eleitoral.

 

Pois bem. Agora vamos analisar os
arts. 2º e 3º da EC 117/2022, que buscam regularizar a situação dos partidos
inadimplentes.

 

Partidos que não aplicaram percentual
mínimo para programa de incentivo à participação das mulheres na política (art.
2º da EC 117/2022)

Vimos, no início dessa longa
explicação, que o inciso V do art. 44 da Lei nº 9.096/95 prevê a obrigação dos partidos
políticos de destinarem pelo menos 5% do total de recursos do Fundo Partidário
em programas de promoção e difusão da participação política das mulheres.

Essa obrigação, por se tratar de dever
inerente ao funcionamento do partido, sem relação com a campanha eleitoral, é
aferida pela Justiça Eleitoral na prestação de contas partidárias (anual).

Até a edição da EC 117/2022, essa
irregularidade poderia gerar:

• a desaprovação das contas
partidárias; e

• a determinação de restituição do
valor correspondente à irregularidade acrescido de multa de até 20% (art. 37 da
Lei nº 9.096/95).

 

Segundo previu o art. 2º da EC
117/2022, os partidos inadimplentes até a data da edição da Emenda
Constitucional (05/04/2022) poderão utilizar os recursos correspondentes nas
eleições subsequentes, sem que a irregularidade possa ensejar penalidade na
prestação contas.

A nova regra, no entanto, vale somente
para prestações de contas que ainda não tenham sido definitivamente julgadas.

Veja a redação do art. 2º da EC 117/2022:

Art. 2º Aos
partidos políticos que não tenham utilizado os recursos destinados aos
programas de promoção e difusão da participação política das mulheres ou cujos
valores destinados a essa finalidade não tenham sido reconhecidos pela Justiça
Eleitoral é assegurada a utilização desses valores nas eleições subsequentes,
vedada a condenação pela Justiça Eleitoral nos processos de prestação de contas
de exercícios financeiros anteriores que ainda não tenham transitado em julgado
até a data de promulgação desta Emenda Constitucional.

 

Mas se a destinação de recursos do
Fundo Partidário para programas de incentivo à participação das mulheres está
relacionada com as despesas anuais do partido, por qual razão o artigo autoriza
a utilização dos recursos “nas eleições subsequentes”?

De fato, pela redação literal do
dispositivo, é possível afirmar que o legislador criou para o partido
inadimplente a opção de destinar para campanhas eleitorais femininas futuras os
recursos não utilizados para promoção de programas de incentivos de
participação da mulher na política.

No entanto, é importante ressaltar que
o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 5617, declarou
inconstitucionais, por arrastamento, dois dispositivos legais introduzidos pela
Lei nº 13.165/2015 que permitiam a utilização desses recursos em campanhas
eleitorais.

Esses dispositivos declarados inconstitucionais
continham a seguinte redação:

Lei nº 9.096/95

Art. 44 (…)

§ 5º-A.  A critério das agremiações partidárias, os
recursos a que se refere o inciso V poderão ser acumulados em diferentes
exercícios financeiros, mantidos em contas bancárias específicas, para
utilização futura em campanhas eleitorais de candidatas do partido.

§ 7º A critério
da secretaria da mulher ou, inexistindo a secretaria, a critério da fundação de
pesquisa e de doutrinação e educação política, os recursos a que se refere o
inciso V do caput poderão ser acumulados em diferentes exercícios financeiros,
mantidos em contas bancárias específicas, para utilização futura em campanhas
eleitorais de candidatas do partido, não se aplicando, neste caso, o disposto
no § 5º.

(Declarados
inconstitucionais pela ADI 5617)

 

Assim, seguindo essa orientação do
Supremo Tribunal Federal, pensamos que o trecho “utilização desses valores nas eleições
subsequentes” pode vir a ser interpretado como sendo “utilização desses valores
nos exercícios financeiros subsequentes”.

De qualquer forma, devemos aguardar
para saber qual será a orientação da doutrina e da jurisprudência sobre o tema.

 

Partidos que não destinaram percentual
mínimo de recursos públicos para candidaturas femininas (art. 3º da EC
117/2022)

Vimos ao longo da explicação que, no
mínimo, 30% do FEFC e da parcela do fundo partidário destinado a campanhas
eleitorais deverão ser destinados a candidaturas femininas.

Essa obrigação, por estar ligada ao
financiamento de campanhas, é fiscalizada pela Justiça Eleitoral na prestação
de prestação de contas eleitorais.

O descumprimento dessa obrigação poderia
gerar para o partido:

• a desaprovação das contas
eleitorais;

• a perda do direito ao recebimento de
cotas do Fundo Partidário do ano seguinte (art. 25 da Lei nº 9.504/97); e

• a restituição dos recursos ao
Tesouro Nacional.

 

O art. 3º da EC 117/2022 prevê que os
partidos que eventualmente descumpriram essa regra nas eleições ocorridas até a
promulgação da Emenda Constitucional (05/04/2022) não mais poderão ser punidos
pela Justiça Eleitoral em razão dessa irregularidade:

Art. 3º Não
serão aplicadas sanções de qualquer natureza, inclusive de devolução de
valores, multa ou suspensão do fundo partidário, aos partidos que não
preencheram a cota mínima de recursos ou que não destinaram os valores mínimos
em razão de sexo e raça em eleições ocorridas antes da promulgação desta Emenda
Constitucional.

 

Dizendo de uma forma mais simples,
pode-se afirmar que a EC 117/2022 anistiou os partidos que descumpriram o dever
de destinar percentual mínimo de recursos para candidaturas femininas.

Vale registrar, por fim, que esse novo
dispositivo constitucional guarda semelhança com os arts. 55-A a 55-C, da nº Lei
9.096/95, inseridos pela Lei nº 13.831/2019.

Esses dispositivos isentaram de
sanções os partidos que descumpriram a obrigação de aplicar percentual mínimo
de recursos do fundo partidário em programas de incentivo à participação das mulheres
nos exercícios anteriores à 2019.

 

Partidos que não destinaram percentual
mínimo de recursos públicos para candidatos negros (Art. 3º da EC 117/2022)

Apesar de a Emenda Constitucional
versar apenas sobre candidaturas femininas, o art. 3º também isentou de
penalidades os partidos que não destinaram percentual mínimo de recursos
reservados para a cota étnico-racial.

 

Onde está prevista essa cota?

Não há previsão específica de cota
étnico-racial na Lei nº 9.504/97 (Lei das Eleições).

Em razão dessa omissão, foi submetida
ao TSE a Consulta nº 0600306-47.2019.6.04.0000, que questionava a possibilidade
de se instituir, por interpretação jurisprudencial, reserva de 30% de
candidaturas de cada partido para pessoas negras e a destinação de recursos e
tempo de propaganda em igual percentual.

 

Na ocasião, o TSE firmou, entre
outras, as seguintes premissas:

• cabe prioritariamente ao Congresso
Nacional estabelecer política de ação afirmativa;

• ao Poder Judiciário é dada a missão
de assegurar direitos fundamentais de grupos historicamente vulneráveis;

• a implementação da cota de gênero
gera uma redução na quantidade de recursos públicos disponíveis e, dado o
racismo estrutural existente e à marginalização histórica, as candidaturas
negras tendem a ser mais afetadas.

 

Fundado nessas premissas, o TSE, por
maioria, respondeu a Consulta nos seguintes termos:

1) Não é adequado o estabelecimento, pelo
TSE, de política de reserva de candidaturas para pessoas negras no patamar de
30%;

2) Os recursos públicos do Fundo
Partidário e do FEFC e o tempo de rádio e TV destinados às candidaturas de
mulheres, pela aplicação das decisões judiciais do STF na ADI nº 5617/DF e do
TSE na Consulta nº 0600252-18/DF, devem ser repartidos entre mulheres negras e
brancas na exata proporção das candidaturas apresentadas pelas agremiações;

3) Os recursos públicos do Fundo
Partidário e do FEFC e o tempo de rádio e TV devem ser destinados ao custeio
das candidaturas de homens negros na exata proporção das candidaturas apresentadas
pelas agremiações.

 

Desse modo, o que o TSE fez foi
determinar que, dentro de cada gênero (candidaturas masculinas e femininas), os
recursos e tempo de TV fossem distribuídos proporcionalmente entre os
candidatos(as) negros e brancos.

O TSE, por maioria, também definiu que
esse entendimento seria aplicado somente a partir das Eleições 2022,
tendo em vista que prevaleceu, à época, entendimento de que a implementação
dessas regras já no Pleito 2020 poderia importar em violação ao princípio da
anuidade eleitoral, uma vez que o julgamento havia sido concluído em 25 de
agosto de 2020.

Não concordando com a postergação dos
efeitos dessa decisão para 2022, O Partido Socialismo e Liberdade – PSOL ingressou
com uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 738/DF), por
meio do qual postulou pela aplicação dessas regras já para o Pleito 2020.

A ADPF foi distribuída para o Ministro
Ricardo Lewandowski, que concedeu liminar posteriormente ratificada pelo
Plenário.

Nesse julgamento, a Corte reafirmou entendimento
de que a ofensa ao princípio da anuidade eleitoral somente ocorre em quatro
situações, a saber:

(1) Rompimento da igualdade de
participação dos partidos políticos ou candidatos no processo eleitoral;

(2) deformação que afete a normalidade
das eleições;

(3) introdução de elemento perturbador
do pleito; ou;

(4) mudança motivada por propósito
casuístico.

 

Naquele caso concreto, o Supremo
Tribunal Federal decidiu que as regras implementadas pelo TSE a respeito da
destinação de recursos e tempo de propaganda para negros não importam em
qualquer alteração “nas normas relativas ao processo eleitoral, concebido em
sua acepção estrita, porquanto não modificou a disciplina das convenções
partidárias, nem os coeficientes eleitorais e nem tampouco a extensão do
sufrágio universal
”. Ainda segundo o STF, o TSE apenas “introduziu um
aperfeiçoamento nas regras relativas à propaganda, ao financiamento das
campanhas e à prestação de contas, todas de caráter eminentemente
procedimental, com o elevado propósito de ampliar a participação de cidadãos
negros no embate democrático pela conquista de cargos políticos
”.

 

Vejamos:

I – Políticas públicas tendentes a incentivar a apresentação de
candidaturas de pessoas negras aos cargos eletivos nas disputas eleitorais que
se travam em nosso País, já a partir deste ano, prestam homenagem aos valores
constitucionais da cidadania e da dignidade humana, bem como à exortação,
abrigada no preâmbulo do texto magno, de construirmos, todos, uma sociedade
fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social, livre de
quaisquer formas de discriminação.

II – O princípio da igualdade (art. 5º, caput, da CF),
considerado em sua dimensão material, pressupõe a adoção, pelo Estado, seja de políticas
universalistas, que abrangem um número indeterminado de indivíduos, mediante
ações de natureza estrutural, seja de políticas afirmativas, as quais atingem
grupos sociais determinados, de maneira pontual, atribuindo-lhes certas vantagens,
por um tempo definido, com vistas a permitir que superem desigualdades
decorrentes de situações históricas particulares (ADPF 186/DF, de minha
relatoria). Precedentes.

III – O entendimento do Supremo Tribunal Federal é no sentido de
que só ocorre ofensa ao princípio da anterioridade nas hipóteses de: (i)
rompimento da igualdade de participação dos partidos políticos ou candidatos no
processo eleitoral; (ii) deformação que afete a normalidade das eleições; (iii)
introdução de elemento perturbador do pleito; ou (iv) mudança motivada por
propósito casuístico (ADI 3.741/DF, de minha relatoria). Precedentes.

IV – No caso dos autos, é possível constatar que o TSE não
promoveu qualquer inovação nas normas relativas ao processo eleitoral,
concebido em sua acepção estrita, porquanto não modificou a disciplina das
convenções partidárias, nem os coeficientes eleitorais e nem tampouco a
extensão do sufrágio universal. Apenas introduziu um aperfeiçoamento nas regras
relativas à propaganda, ao financiamento das campanhas e à prestação de contas,
todas com caráter eminentemente procedimental, com o elevado propósito de
ampliar a participação de cidadãos negros no embate democrático pela conquista
de cargos políticos.

STF. Plenário. ADPF 738/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado
em 05/10/2020.

 

Em decorrência dessa decisão, os
partidos foram obrigados a observar a proporcionalidade na distribuição de
recursos e tempo de TV entre candidatos negros e brancos já no Pleito 2020.

 

Essa obrigação, por estar ligada ao financiamento
de campanhas, é fiscalizada pela Justiça Eleitoral na prestação de prestação de
contas eleitorais e seu descumprimento poderia gerar para o partido:

• a desaprovação das contas
eleitorais;

• a perda do direito ao recebimento de
cotas do Fundo Partidário do ano seguinte (art. 25 da Lei nº 9.504/97); e

• a restituição dos recursos ao
Tesouro Nacional.

 

O art. 3º da EC 117/2022 prevê que os
partidos que eventualmente descumpriram essa regra nas eleições ocorridas até a
promulgação da Emenda Constitucional (05/04/2022) não mais poderão ser punidos
pela Justiça Eleitoral em razão dessa irregularidade:

Art. 3º Não
serão aplicadas sanções de qualquer natureza, inclusive de devolução de
valores, multa ou suspensão do fundo partidário, aos partidos que não
preencheram a cota mínima de recursos ou que não destinaram os valores mínimos
em razão de sexo e raça em eleições ocorridas antes da promulgação desta Emenda
Constitucional.

 

O mesmo comentário relativo ao tópico
anterior pode ser aqui replicado, ou seja, que a EC 117/2022 anistiou os
partidos que descumpriram o dever de destinar percentual mínimo de recursos
para candidatos(as) negros.

 

Artigo Original em Dizer o Direito

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