O I Congresso Sistema Brasileiro de Precedentes, promovido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), prosseguiu na manhã desta quinta-feira (15) com mais três painéis. Questões sobre ratio decidendi, suspensão de processos, modulação dos efeitos nos precedentes vinculantes e o papel dos plenários virtuais na formação de precedentes marcaram a manhã de debates no auditório externo da corte.

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O primeiro painel da manhã, sobre "A ratio decidendi, a distinção e a superação nos precedentes obrigatórios brasileiros", teve como presidente de mesa o ministro do STJ Reynaldo Soares da Fonseca, que iniciou o segundo dia do evento com homenagens ao ministro Paulo de Tarso Sanseverino, "nosso mentor na construção da cultura dos precedentes no âmbito do Tribunal da Cidadania e no âmbito do Judiciário brasileiro".

O ministro enfatizou a necessidade do trabalho de todo o sistema de Justiça voltado à aplicação dos precedentes, a fim de dar cumprimento ao princípio da igualdade, "mas ao mesmo tempo lembrando a necessidade da fundamentação, da razão de decidir e da superação de algum precedente em função da própria evolução social".

O ministro Sebastião Reis Junior lembrou em sua manifestação que, "quando se fala em sistema de precedentes, a gente sempre pensa no direito privado e público". Contudo, reforçou a importância do sistema de precedentes também na esfera penal, que, "atualmente, no STJ, talvez seja onde se faz mais necessário o respeito a essa questão de precedentes".

Sebastião Reis Junior disse ter "uma dificuldade enorme em compreender a resistência que existe hoje, em parte da magistratura, aos precedentes firmados pelos tribunais superiores", apontando a necessidade de mudança de mentalidade não apenas entre os magistrados, mas também no Ministério Público e na própria advocacia.

O professor Daniel Mitidiero, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, falou sobre como encontrar a ratio decidendi. Ele ressaltou que é fundamental para os tribunais superiores "levar em consideração os fatos relevantes de um caso. Não há como raciocinar com precedentes sem raciocinar sobre fatos. O que essas cortes superiores não podem fazer é revisar a valoração da prova, controlar a existência dos fatos, mas, naturalmente, precisam conhecer dos fatos para manejar a ratio decidendi dos casos", completou.

Suspensão deve ser excepcional e perdurar o tempo mínimo necessário

O segundo painel do dia, coordenado pelo ministro Marco Buzzi, debateu a suspensão de processos e a modulação de efeitos nos precedentes vinculantes. Primeira a falar, a ministra Nancy Andrighi destacou que, no mundo ideal, a suspensão é um importante instrumento de uniformização, na medida em que permite que juízes e desembargadores partam dos elementos decididos e fixados pelo STJ e pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para julgar em conformidade com esses entendimentos, propiciando, assim, a uniformidade dos julgamentos e a segurança jurídica.

No entanto, a ministra enfatizou que é preciso lembrar que a paralisação do trâmite de um processo representa uma crise de solução no âmbito do direito material, pois não há a entrega da tutela de mérito e do bem da vida esperado pelas partes.

Nesse sentido, ela afirmou que a suspensão deve ser excepcional e perdurar o tempo mínimo necessário. "A questão da suspensão dos processos para aguardar o julgamento vinculante deverá sempre ser permeada pela sensibilidade e pela atenção do julgador, sem abandonar a determinação legal, porém, sempre, aproximando o direito, levando-o rente aos fatos e rente à vida, e não pensando apenas no mundo ideal", declarou.

Quanto à modulação dos efeitos nos precedentes vinculantes, o professor Eduardo Arruda Alvim, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, destacou que ela deve resguardar a confiança que o jurisdicionado tem no Estado e no juiz, tendo em vista as mudanças jurisprudenciais que ocorrem em razão do reconhecimento de um equívoco pela corte ou da alteração na sua composição.

Segundo o professor, estabelecer um precedente sem modular não resolve o problema maior que é estabelecer segurança jurídica e uma pauta de conduta confiável para o jurisdicionado. "Assim, qualquer decisão que constitua pauta de conduta para o jurisdicionado é passível de ser modulada", comentou.

Com instrumentos adequados, plenário virtual permite deliberação mais racional

No último painel da manhã, sob a presidência do ministro Antonio Saldanha Palheiro, foi discutido o papel dos plenários virtuais das cortes superiores na formação dos precedentes obrigatórios.

O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva apontou que os plenários virtuais representam um grande avanço em relação aos julgamentos que eram realizados em lista. De acordo com o ministro, apesar de ainda existirem limitações, o plenário virtual proporciona uma janela temporal de uma semana, ao longo da qual é possível aos advogados apresentarem memoriais e destacarem pontos importantes – o que, na prática, melhorou a qualidade da deliberação.

O magistrado indicou que, com o plenário virtual, também é possível verificar a existência de precedentes, de situações análogas ou de distinções que permitam uma correção ou uniformização da jurisprudência. "O plenário virtual, com os instrumentos adequados, permite que se tenha uma deliberação um pouco mais racional, no sentido de verificar o que se decide e qual é o núcleo decisório", explicou.

A professora da Enfam Taís Schilling Ferraz apresentou uma breve história da criação do plenário virtual, desde quando ele surgiu no STF. Ela apontou que, com o tempo, o plenário virtual passou a ser usado para identificar a jurisprudência dominante, separar o que é matéria constitucional, examinar a repercussão geral e, finalmente, realizar o julgamento de mérito das causas.

Taís Schilling ressaltou que, apesar dos avanços e dos benefícios, o julgamento em plenário virtual, especialmente quando ele ingressa no debate de mérito, precisa ser feito com muito cuidado, uma vez que os impactos das decisões podem ir muito além do que se imagina.

"Nós temos percebido que um único precedente resolve muita coisa, mas se ele, eventualmente, for revertido em embargos de declaração, o risco de termos soluções distintas para casos iguais é muito grande", concluiu.

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