Denúncia espontânea

A denúncia espontânea é um
instituto previsto no CTN por meio do qual o devedor, antes que o Fisco
instaure contra ele qualquer procedimento administrativo ou medida de
fiscalização, confessa para a Fazenda que praticou uma infração tributária e
paga os tributos em atraso e os juros de mora. Como “recompensa”, ele
ficará dispensado de pagar a multa.
A denúncia espontânea é também
chamada de “confissão espontânea” ou “autodenúncia”,
estando prevista no art. 138 do CTN:
Art. 138. A
responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada,
se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do
depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o
montante do tributo dependa de apuração.
Parágrafo único. Não se
considera espontânea a denúncia apresentada após o início de qualquer
procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a
infração.
Exclui tanto as multas punitivas
(de ofício) como as moratórias

A denúncia espontânea exclui
tanto as multas punitivas, como também as moratórias.
Razões que justificam a
existência do instituto

• Justificativa ética/axiológica:
valorizar o comportamento considerado moral e adequado de o infrator, de forma
espontânea, adiantar-se à Administração Tributária, denunciar-se e pagar o
tributo devido;

• Justificativa econômica:
trata-se de uma forma de reduzir os custos para a Administração Tributária, que
não precisará instaurar processo de fiscalização.
“O instituto da denúncia
espontânea, mais que um benefício direcionado ao contribuinte, que dele se
favorece ao ter excluída a responsabilidade pela multa, está direcionado à
Administração Tributária, que deve ser preservada de incorrer nos custos
administrativos relativos à fiscalização, constituição, administração e
cobrança do crédito. Para sua ocorrência, deve haver uma relação de troca entre
o custo de conformidade (custo suportado pelo contribuinte para se adequar ao
comportamento exigido pelo Fisco) e o custo administrativo (custo no qual
incorre a máquina estatal para as atividades acima elencadas) balanceado pela
regra prevista no art. 138 do CTN.” (Min. Mauro Campbell Marques, EREsp
1131090/RJ)
É como se fosse o seguinte: a
multa cobrada pelo Fisco serve para punir o infrator e também para cobrir os
custos decorrentes do fato de a Administração Tributária ter tido que instaurar
um procedimento para apurar o ocorrido. Se este procedimento não foi necessário
porque o contribuinte confessou e pagou antes da sua instauração, a multa não
será devida porque não houve este custo por parte do Fisco.
Por conta disso, o STJ, apoiado
nas lições de Christiano Mendes Wolney Valennte (Denúncia espontânea: uma análise econômica da jurisprudência do STJ.
Revista Fórum de Direito Tributário: RFDT, Belo Horizonte, v. 13, n. 74,
p.81-100, mar. 2015) entende que somente deve ser admitida a denúncia
espontânea quando o Fisco é preservado dos custos administrativos de lançamento.
Daí ter surgido a Súmula 360, que será analisada mais abaixo, tendo em vista
que, nesse caso, já se parte do pressuposto de que não haverá custo administrativo
porque o tributo já se encontra em condições de cobrança, haja vista ter sido
constituído pelo contribuinte via declaração.
Requisitos

Para que a denúncia espontânea
seja eficaz e afaste a incidência da multa, é necessário o preenchimento de três
requisitos cumulativos:
a) “denúncia” (confissão)
da infração;
b) pagamento integral do tributo
devido com os respectivos juros moratórios;
c) espontaneidade (confissão e
pagamento devem ocorrer antes do início de qualquer procedimento fiscalizatório
por parte do Fisco relacionado com aquela determinada infração).
Na denúncia espontânea o
pagamento deve ser feito à vista; não vale parcelar

Para ter direito ao benefício da
denúncia espontânea, o devedor deverá efetuar o pagamento integral de uma só
vez. Se o contribuinte parcelar o pagamento, isso não configura denúncia
espontânea e ele não estará isento da multa. Essa previsão encontra-se
insculpida no § 1º do art. 155 do CTN:
Art. 155-A. O parcelamento
será concedido na forma e condição estabelecidas em lei específica.
§ 1º Salvo disposição de
lei em contrário, o parcelamento do crédito tributário não exclui a
incidência de juros e multas
.
Termo final para que haja a
denúncia espontânea

Como visto acima, um dos
requisitos para que haja denúncia espontânea está no fato de que o devedor
deverá confessar e pagar o débito ANTES que o Fisco instaure contra ele “qualquer
procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a
infração”. Tem que confessar antes de ser “descoberto”. Se for
depois, não adiantará nada.
Segundo a doutrina (SABBAG, p.
668), o documento que demonstra que o Fisco instaurou procedimento
administrativo para apurar a infração é o “Termo de Início de Fiscalização”,
previsto no art. 196 do CTN:
Art. 196. A autoridade
administrativa que proceder ou presidir a quaisquer diligências de fiscalização
lavrará os termos necessários para que se documente o início do procedimento,
na forma da legislação aplicável, que fixará prazo máximo para a conclusão
daquelas.
Parágrafo único. Os termos
a que se refere este artigo serão lavrados, sempre que possível, em um dos
livros fiscais exibidos; quando lavrados em separado deles se entregará, à
pessoa sujeita à fiscalização, cópia autenticada pela autoridade a que se
refere este artigo.
Se a confissão foi feita antes da
assinatura do termo, haverá denúncia espontânea; se depois, não.
Imagine
que determinado contribuinte praticou duas infrações tributárias: “X”
(quanto ao imposto de renda de 2010) e “Y” (relacionada com IOF de
2010). Se a Receita Federal instaurar um procedimento para apurar a infração
“X”, o contribuinte continuará tendo direito à denúncia espontânea
quanto à infração “Y”.

Obrigações acessórias

Segundo o art. 113 do CTN, a
obrigação tributária pode ser: a) principal;
b) acessória.
A obrigação tributária principal
representa o ato de pagar o tributo ou a multa. Trata-se de uma obrigação de
dar dinheiro. Ex: pagamento do IPTU.
A obrigação tributária acessória
representa os deveres burocráticos que devem ser observados pelo contribuinte.
São também chamados de “deveres instrumentais do contribuinte”. Trata-se de uma
obrigação de fazer ou não fazer. Ex: obrigação das empresas de manterem a
escrituração de suas receitas e despesas em livros próprios.
Normalmente, a legislação prevê
que o contribuinte que deixar de cumprir a obrigação tributária acessória terá
que pagar uma multa. Ex: quem deixar de apresentar determinada declaração para
o Fisco terá que pagar uma multa.
O benefício concedido pela
“denúncia espontânea” (art. 138 do CTN) não vale para o caso de
confissão de descumprimento de obrigações acessórias. Assim, se o contribuinte
tinha até o dia XX para apresentar a declaração e não o fez, ele terá que pagar
a multa mesmo que vá até o Fisco e “confesse” que atrasou a
declaração, apresentando a destempo.
Denúncia espontânea e tributo
sujeito a lançamento por homologação

No lançamento por homologação, a
lei determina que é o próprio contribuinte quem, sem prévio exame da autoridade
administrativa, deverá calcular e declarar o quanto deve, antecipando o
pagamento do imposto. Depois que ele fizer isso, o Fisco irá conferir se o
valor pago foi correto e, caso tenha sido, fará a homologação deste pagamento.
Esta espécie de homologação encontra-se prevista no art. 150 do CTN.
O que acontece se o contribuinte fizer a
declaração do débito, mas não pagar nada?
No caso dos tributos sujeitos a
lançamento por homologação, “a declaração do débito feita sem o respectivo
pagamento tem o condão de constituir o crédito tributário e todos os seus
consectários, sem a necessidade de procedimento administrativo para a cobrança
da multa moratória.” (STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 1251419/RJ, Rel. Min.
Humberto Martins, julgado em 01/09/2011).

Em outras palavras, se o contribuinte
fez a declaração de débito, mas não pagou nada, o crédito tributário já estará
constituído e o Fisco poderá cobrar o valor que foi declarado. Isso porque a declaração
configura confissão da dívida demonstrando que o sujeito passivo tem ciência de
seu dever de pagamento e das consequências decorrentes de sua inadimplência.
Assim, não é mais necessário que a Administração Tributária faça lançamento.
Ela já poderá inscrever em dívida ativa e ajuizar a execução fiscal.

Imagine que, em um imposto sujeito a
lançamento por homologação, o contribuinte tinha até o dia 02/02 para fazer a
declaração e pagar o tributo. No dia 02/02, o contribuinte fez a declaração,
mas não pagou o imposto. Suponha, então, que um mês depois ele se
“arrependa” de não ter pago e resolva ir até o Fisco confessar que
não recolheu o imposto e pagar o que deve. Neste caso, este contribuinte terá
direito à isenção da multa com base na “denúncia espontânea” (art.
138 do CTN)?

NÃO. Trata-se de entendimento
sumulado do STJ:
Súmula 360-STJ: O
benefício da denúncia espontânea não se aplica aos tributos sujeitos a
lançamento por homologação regularmente declarados, mas pagos a destempo.
O STJ entende dessa forma porque o
benefício da denúncia espontânea tem como um dos objetivos
“facilitar” o trabalho de fiscalização e arrecadação do Fisco,
reduzindo os custos da Fazenda. Se o contribuinte fez a declaração de débito, mas não pagou nada,
o crédito tributário já estará constituído (já houve confissão de dívida).
Logo, a nova confissão posterior do contribuinte não irá ajudar em nada o Fisco.
Por essa razão, o contribuinte não terá direito aos benefícios da denúncia
espontânea.

Feitas as devidas considerações,
imagine a seguinte situação adaptada:

A empresa deixou de pagar determinado
imposto federal.
Um mês depois, antes que a
Receita Federal instaurasse qualquer procedimento contra a empresa, ela ajuizou
ação declaratória na qual confessou que não pagou o imposto, alegando que ele é
inconstitucional. A fim de suspender a exigibilidade do crédito tributário, a contribuinte
efetuou o depósito em juízo do montante integral do valor que o Fisco entende
devido (art. 151, II, do CTN).
A ação foi julgada improcedente,
tendo transitado em julgado.
Diante disso, a empresa pediu que
este depósito integral fosse considerado como “denúncia espontânea”,
isentando-a do pagamento da multa.
A tese invocada pela empresa foi
aceita pelo STJ? É possível o reconhecimento da denúncia espontânea caso o
contribuinte faça, em juízo, o depósito integral da dívida para fins de
questioná-la judicialmente?

NÃO.
O
depósito judicial integral do débito tributário e dos respectivos juros de
mora, mesmo antes de qualquer procedimento do Fisco tendente à sua exigência,
não configura denúncia espontânea (art. 138 do CTN).

O
depósito judicial integral não trouxe qualquer vantagem ou redução de custos
para a Administração Tributária. Não houve a chamada “relação de troca
entre custo de conformidade e custo administrativo” a atrair
caracterização da denúncia espontânea (art. 138 do CTN).

STJ. 1ª Seção. EREsp 1.131.090-RJ,
Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 28/10/2015 (Info 576).

Artigo Original em Dizer o Direito

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