Obs: este post foi atualizado com base em uma decisão mais recente do STJ. Confira aqui.
Olá amigos do Dizer o Direito,
Olá amigos do Dizer o Direito,
Hoje vamos tratar sobre um tema muito
interessante e que tem grandes repercussões práticas.
interessante e que tem grandes repercussões práticas.
Imagine
a seguinte situação adaptada:
a seguinte situação adaptada:
Em um processo cível, o juízo da
comarca “A” expediu uma carta precatória para que o juízo da comarca “B”
(pertencente a outro Estado da Federação) ouvisse uma testemunha que lá reside.
comarca “A” expediu uma carta precatória para que o juízo da comarca “B”
(pertencente a outro Estado da Federação) ouvisse uma testemunha que lá reside.
O juízo deprecado (juízo da comarca
“B”) ouviu a testemunha por meio de gravação audiovisual e devolveu a carta
precatória acompanhada de DVD contendo o depoimento.
“B”) ouviu a testemunha por meio de gravação audiovisual e devolveu a carta
precatória acompanhada de DVD contendo o depoimento.
O juízo deprecante (juízo da comarca
“A”), ao receber a carta, proferiu despacho determinando que esta retornasse ao
juízo deprecado com o objetivo de que lá (na comarca “B”) fosse feita a
degravação do depoimento prestado pela testemunha e, somente após isso, a carta
retornasse.
“A”), ao receber a carta, proferiu despacho determinando que esta retornasse ao
juízo deprecado com o objetivo de que lá (na comarca “B”) fosse feita a
degravação do depoimento prestado pela testemunha e, somente após isso, a carta
retornasse.
Em outras palavras, o juízo deprecante
afirmou que era uma obrigação do juízo deprecado transcrever, para o meio
físico (papel), o depoimento colhido por meio audiovisual.
afirmou que era uma obrigação do juízo deprecado transcrever, para o meio
físico (papel), o depoimento colhido por meio audiovisual.
O juízo deprecado não concordou.
Diante
desse impasse quanto ao cumprimento da carta precatória, o que poderá fazer o
juízo deprecado?
desse impasse quanto ao cumprimento da carta precatória, o que poderá fazer o
juízo deprecado?
Suscitar conflito negativo de
competência. Isso porque a obrigação de ter que degravar ou não os depoimentos
colhidos é uma discussão relativa à amplitude da competência do juízo deprecado
no cumprimento de cartas precatórias. Logo, trata-se do debate de quem seria
competente para tal ato.
competência. Isso porque a obrigação de ter que degravar ou não os depoimentos
colhidos é uma discussão relativa à amplitude da competência do juízo deprecado
no cumprimento de cartas precatórias. Logo, trata-se do debate de quem seria
competente para tal ato.
Quem
irá julgar esse conflito?
irá julgar esse conflito?
O Superior Tribunal de Justiça,
considerando que são juízes vinculados a tribunais diferentes (art. 105, I,
“d”, CF/88).
considerando que são juízes vinculados a tribunais diferentes (art. 105, I,
“d”, CF/88).
De quem é a responsabilidade pela degravação dos
depoimentos?
depoimentos?
Do juízo
DEPRECANTE. Foi o que decidiu a 1ª Seção do STJ no julgamento do CC 126.770-RS,
Rel. Min. Sérgio Kukina, em 8/5/2013.
DEPRECANTE. Foi o que decidiu a 1ª Seção do STJ no julgamento do CC 126.770-RS,
Rel. Min. Sérgio Kukina, em 8/5/2013.
Em verdade, não existe regra específica
na legislação processual civil determinando de quem seja a responsabilidade
pela degravação de depoimento colhido através de carta precatória.
na legislação processual civil determinando de quem seja a responsabilidade
pela degravação de depoimento colhido através de carta precatória.
Diante dessa lacuna, para decidir o
conflito, o Min. Relator valeu-se da Resolução 105/2010 do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ), que disciplinou, no âmbito do processo penal, sobre a “documentação
dos depoimentos por meio de sistema audiovisual e realização de interrogatório
e inquirição de testemunha por videoconferência”.
conflito, o Min. Relator valeu-se da Resolução 105/2010 do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ), que disciplinou, no âmbito do processo penal, sobre a “documentação
dos depoimentos por meio de sistema audiovisual e realização de interrogatório
e inquirição de testemunha por videoconferência”.
Apesar de se tratar de uma
regulamentação específica para o processo penal, o Ministro entendeu que
poderia ser também aplicada, por analogia, ao processo civil.
regulamentação específica para o processo penal, o Ministro entendeu que
poderia ser também aplicada, por analogia, ao processo civil.
Segundo a Resolução 105/2010-CNJ, “caracteriza
ofensa à independência funcional do juiz de primeiro grau a determinação, por
magistrado integrante do Tribunal, da transcrição de depoimentos tomadas pelo
sistema audiovisual”.
ofensa à independência funcional do juiz de primeiro grau a determinação, por
magistrado integrante do Tribunal, da transcrição de depoimentos tomadas pelo
sistema audiovisual”.
Em outros termos, o CNJ afirmou que o
Tribunal não poderá determinar que o juízo de 1º grau faça a transcrição dos
depoimentos prestados pelo sistema audiovisual.
Tribunal não poderá determinar que o juízo de 1º grau faça a transcrição dos
depoimentos prestados pelo sistema audiovisual.
Veja uma decisão do CNJ que espelha
esse entendimento:
esse entendimento:
(…) Caracteriza ofensa à
independência funcional do juiz de primeiro grau a determinação, por magistrado
de segundo grau, da transcrição de depoimentos tomados pelo sistema
audiovisual, seja em processos em grau de recurso, seja em processos de
competência originária do Tribunal.
independência funcional do juiz de primeiro grau a determinação, por magistrado
de segundo grau, da transcrição de depoimentos tomados pelo sistema
audiovisual, seja em processos em grau de recurso, seja em processos de
competência originária do Tribunal.
2. A transcrição da gravação da
audiência configura faculdade, e não dever do magistrado. Se o desembargador
defere o pedido de transcrição requerido pelo MP, deve disponibilizar sua
própria equipe técnica para o desempenho da tarefa, e não obrigar o magistrado
de 1º grau a fazê-lo. (…)
audiência configura faculdade, e não dever do magistrado. Se o desembargador
defere o pedido de transcrição requerido pelo MP, deve disponibilizar sua
própria equipe técnica para o desempenho da tarefa, e não obrigar o magistrado
de 1º grau a fazê-lo. (…)
(CNJ – PP – Pedido de Providências –
Conselheiro – 0001602-36.2012.2.00.0000 – Rel. NEY JOSÉ DE FREITAS – 149ª
Sessão – j. 19/6/2012)
Conselheiro – 0001602-36.2012.2.00.0000 – Rel. NEY JOSÉ DE FREITAS – 149ª
Sessão – j. 19/6/2012)
Ora, se nem mesmo o Tribunal tem o
poder de obrigar que o juiz faça a transcrição dos depoimentos colhidos por
meio audiovisual, com maior razão não poderá um juiz de igual estatura
hierárquica (juízo deprecante) ordenar que o juízo deprecado proceda à
degravação.
poder de obrigar que o juiz faça a transcrição dos depoimentos colhidos por
meio audiovisual, com maior razão não poderá um juiz de igual estatura
hierárquica (juízo deprecante) ordenar que o juízo deprecado proceda à
degravação.
Em regra, “os depoimentos documentados por meio audiovisual não precisam de
transcrição” (art. 2º da Resolução 105/2010). Isso porque exigir que haja
sempre a degravação provocará o fim das vantagens do sistema audiovisual, tendo
em conta que, segundo estudos realizados pelo CNJ, “para cada minuto de gravação leva-se, no mínimo, 10 (dez) minutos para
a sua degravação” (texto da Resolução).
transcrição” (art. 2º da Resolução 105/2010). Isso porque exigir que haja
sempre a degravação provocará o fim das vantagens do sistema audiovisual, tendo
em conta que, segundo estudos realizados pelo CNJ, “para cada minuto de gravação leva-se, no mínimo, 10 (dez) minutos para
a sua degravação” (texto da Resolução).
Se o juiz não se acostuma ou não gosta
de analisar os depoimentos em meio audiovisual, ele tem o direito de fazer a
degravação, no entanto, isso tem que ocorrer por conta própria, não podendo
obrigar o juízo deprecado a fazê-lo. Essa é a ideia constante do parágrafo
único do art. 2º da Resolução 105/2010 do CNJ:
de analisar os depoimentos em meio audiovisual, ele tem o direito de fazer a
degravação, no entanto, isso tem que ocorrer por conta própria, não podendo
obrigar o juízo deprecado a fazê-lo. Essa é a ideia constante do parágrafo
único do art. 2º da Resolução 105/2010 do CNJ:
Parágrafo único. O magistrado, quando
for de sua preferência pessoal, poderá determinar que os servidores que estão
afetos a seu gabinete ou secretaria procedam à degravação, observando, nesse
caso, as recomendações médicas quanto à prestação desse serviço.
for de sua preferência pessoal, poderá determinar que os servidores que estão
afetos a seu gabinete ou secretaria procedam à degravação, observando, nesse
caso, as recomendações médicas quanto à prestação desse serviço.
Finaliza o Min. Sérgio Kukina
afirmando:
afirmando:
“Mais não
é preciso dizer, restando claro que, se o juízo deprecante assim o desejar,
deverá ele mesmo tomar a iniciativa de, em seu próprio reduto de trabalho,
implementar as providências necessárias à indigitada degravação, sem que se
onere o juízo deprecado com essa adicional e desgastante tarefa.”
é preciso dizer, restando claro que, se o juízo deprecante assim o desejar,
deverá ele mesmo tomar a iniciativa de, em seu próprio reduto de trabalho,
implementar as providências necessárias à indigitada degravação, sem que se
onere o juízo deprecado com essa adicional e desgastante tarefa.”
Apenas para complementar a informação,
vale ressaltar que, no âmbito do processo penal, existe uma previsão específica
no § 2º do art. 405 do CPP dispensando expressamente a transcrição caso o
depoimento tenha sido colhido meio audiovisual. Confira:
vale ressaltar que, no âmbito do processo penal, existe uma previsão específica
no § 2º do art. 405 do CPP dispensando expressamente a transcrição caso o
depoimento tenha sido colhido meio audiovisual. Confira:
§ 1º Sempre que possível, o registro
dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas será feito
pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica
similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das
informações. (Incluído pela Lei nº 11.719/2008).
dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas será feito
pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica
similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das
informações. (Incluído pela Lei nº 11.719/2008).
§ 2º No
caso de registro por meio audiovisual, será encaminhado às partes cópia do
registro original, sem necessidade de transcrição. (Incluído pela Lei nº 11.719/2008).
caso de registro por meio audiovisual, será encaminhado às partes cópia do
registro original, sem necessidade de transcrição. (Incluído pela Lei nº 11.719/2008).
Assim, com maior razão, no caso
do processo penal, se o juízo deprecado tiver colhido o depoimento por meio
audiovisual, ele não tem o dever de degravar o conteúdo, podendo simplesmente
devolver a carta acompanhada do CD ou DVD com a filmagem.
do processo penal, se o juízo deprecado tiver colhido o depoimento por meio
audiovisual, ele não tem o dever de degravar o conteúdo, podendo simplesmente
devolver a carta acompanhada do CD ou DVD com a filmagem.
De igual modo, as partes (MP ou
defesa) não podem exigir do juízo que faça a transcrição considerando que o
registro audiovisual é plenamente válido por si só, dispensada a degravação.
defesa) não podem exigir do juízo que faça a transcrição considerando que o
registro audiovisual é plenamente válido por si só, dispensada a degravação.