As vantagens e desvantagens do uso de algoritmos e das redes sociais no Brasil e no mundo, bem como o uso da inteligência artificial no direito processual foram os temas abordados na manhã desta terça-feira (20), no segundo dia do Fórum Internacional Justiça e Inovação (Fiji), realizado na sede do Tribunal Superior do Trabalho (TST), em Brasília.

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, foi enfático em sua palestra ao afirmar que um grande problema a ser enfrentado hoje é a total ausência de transparência, de critérios, de regulamentação, de respeito e de responsabilidade de quem utiliza e gere esses algoritmos.

Ele afirmou que se criou uma ideia de que não integra o mundo real esse mundo digital do qual fazem parte as big techs (grandes empresas de tecnologia) e defende a necessidade urgente de regulação para o setor. “Uma regulação minimalista, sem que se retire a liberdade das pessoas de se manifestarem dentro da lei”, afirmou.

Alexandre de Moraes ressaltou que as big techs não querem debater sobre autorregulação, pois lucram com a falta de limites por serem as maiores empresas de publicidade e mídia do mundo, embora ainda juridicamente definidas como empresas de tecnologia.

O ministro Alexandre afirmou que para elas é possível barrar conteúdos ilícitos como discursos de ódio, apologia ao nazismo e discursos contra a democracia – como já fazem com crimes cibernéticos como pedofilia, pornografia infantil e violação de direitos autorais – mas não o fazem.

Para Alexandre de Moraes “não é possível que continuemos a fechar os olhos e achar que isso é normal” e enfatizou que se nada for feito em termos de regulação, as redes sociais se transformarão “no esgoto da humanidade”. Segundo ele, não é possível que essas novas tecnologias, “sem transparência, sem critérios, sem respeito aos demais direitos fundamentais continuem sendo utilizadas”.

Tecnologia de vigilância

Com moderação da procuradora da Advocacia-Geral da União Manuelita Hermes Rosa Oliveira Filha, o painel contou ainda com a participação da professora norte-americana e especialista em análise e ciência de dados da Universidade de Virgínia, Renée Cummings. Ela falou sobre as vantagens e desvantagens do uso da inteligência artificial para policiamento e investigações criminais e o risco que representa deixar questões delicadas somente a cargo de algoritmos.

Explicou que a tecnologia é favorável na solução de diversos tipos de crimes, como os financeiros, cibernéticos, de corrupção, tráfico humano e outros. Mas alertou que essa tecnologia não deve ser usada em tomada de decisões de alto risco, pois, “os dados criam acesso para certos grupos, mas restringem acesso para outros grupos”. Segundo Renée Cummings, isso pode levar o sistema a cometer erros, como o corrido em Detroit, com a prisão de um homem negro acusado injustamente de um crime com base em tecnologia de reconhecimento facial.

Direito processual e era digital

Sergio Cruz Arenhart, procurador regional da República, professor da Universidade Federal do Paraná e autor de diversas obras na área do Direito Processual, falou sobre o impacto das novas tecnologias no direito processual, bem como sobre a guarda e exteriorização da informação obtida por meio de processo. A informação, afirmou, é uma maneira de comunicação entre os jurisdicionados e a jurisdição.

Segundo ele, cerca de 15% da população não tem acesso a atos processuais por via eletrônica, seja porque não tem acesso, interesse ou domínio, o que configura um desafio para o Judiciário. Ao mesmo tempo, afirmou, a cultura está cada vez mais alinhada com a perspectiva digital e tecnológica. “Nossas relações jurídicas são pautadas por essa nova visão”, afirmou. O professor acrescentou que, no futuro, é possível que as máquinas que auxiliam juízes na elaboração de decisões judiciais sejam vistas como “sujeitos de relações processuais”.

Novas tecnologias

O advogado e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Dierle Nunes discorreu sobre o direito processual na era do avanço das novas tecnologias. Segundo ele, vivemos um momento de virada tecnológica na área, que deve mesclar teoria e prática com o objetivo de gestar uma justiça centrada no ser humano. Dierle afirmou que hoje é possível desenvolver um direito processual e um sistema de justiça construído a partir do cidadão (da litigância e dos litigantes) e orientado por dados.

Dessa forma, frisou, será possível ter uma visão mais clara do sistema de justiça e das necessidades dos cidadãos. Ele acrescentou que a saúde do sistema da justiça civil depende da saúde do seu ecossistema de dados. A partir daí, ressaltou, será possível extrair conhecimento para saber questões fundamentais, como o tipo de litígio e litigante que se tem, bem como os dilemas e gargalos judiciais.

Colaboração

No Seminário “IA para e pelo Judiciário: uma proposta de trabalho colaborativo entre tribunais”, o juiz auxiliar da Presidência do CNJ João Thiago Guerra destacou a necessidade de o Judiciário revisitar periodicamente os princípios que norteiam o uso de inteligência artificial e suas especificidades.

“É uma tecnologia de apoio, que busca não substituir pessoas. A inteligência humana precisa permanentemente estar no controle”, salientou. Guerra citou a Resolução 332/2020, do CNJ, que prevê os padrões éticos, de transparência, de governança e de auditabilidade para o uso de IA no Judiciário.

Troca de experiências

Já Silvia Maria Wanderley Moraes, analista de inteligência artificial do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), discorreu sobre o projeto ColaboraJUS, que tem o objetivo de promover um ecossistema em ciência de dados e IA no Judiciário para desenvolvimento de soluções inteligentes e inovadoras. Segundo ela, a ideia é incentivar a integração, a troca de experiências e de conhecimento por meio da formação de equipes multidisciplinares nos tribunais e no CNJ.

AR, RR, RP//GR, GG 

Com informações do STF

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