Em seminário, presidente e ministros do STJ destacam impacto das decisões da corte no mercado de seguros
O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Humberto Martins, e outros sete ministros da corte participaram, nesta segunda-feira (29), do 4º Seminário Jurídico de Seguros, evento virtual promovido pelo Instituto Justiça & Cidadania e pela Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg).
“A importância do setor de seguro fica prontamente clara quando colocada em números, quando se vê a percentagem do setor na formação do PIB dos países desenvolvidos e em desenvolvimento: o setor de seguro garante o funcionamento da economia, construído sempre com a presença do setor financeiro-bancário e com a presença do Estado”, comentou Humberto Martins durante a abertura do evento.
Ele elogiou a iniciativa do coordenador científico do encontro, o ministro Luis Felipe Salomão, pela realização dos debates. Durante o dia, ministros e especialistas apresentaram painéis sobre temas jurídicos relacionados ao setor de seguros, como dever de informação do estipulante no seguro de vida, os desafios dos Núcleos de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NatJus) e a definição judicial de índices para correção de indenização securitária.
“O seguro acompanha a vida de milhões de brasileiros no que lhes é mais essencial: o seguro de vida, o seguro-saúde, o seguro à complementação da aposentadoria”, declarou Martins ao reforçar a relevância do tema discutido.
Atuação para garantir equilíbrio contratual
O presidente do STJ afirmou que o tribunal cumpre o seu papel ao dirimir as questões que moldam as relações entre seguradoras e segurados, buscando o equilíbrio, a tutela da boa-fé e a higidez contratual.
“A existência do contrato de seguro gera bem-estar, no sentido de atenuar aflições, colocando nossa situação subjetiva mais com ênfase no risco do que na incerteza, antecipando a resposta possível às imprevisibilidades, beneficiando todo um continente de cidadãos”, concluiu o ministro.
O presidente da CNseg, Márcio Coriolano, lembrou que o setor de seguros já representa 6,5% do PIB nacional, e as discussões jurídicas sobre as relações de seguro são cada vez mais relevantes para o direito.
Dever de informar nos seguros coletivos
Presidido pelo ministro Raul Araújo, o primeiro painel abordou o tema “Dever de informação do estipulante no seguro de vida”. Ele destacou que essa questão foi recentemente analisada pelas turmas de direito privado do STJ, que concluíram pela responsabilidade do estipulante, nos contratos coletivos de seguro, do dever de prestar as informações sobre a apólice aos segurados.
Na avaliação do ministro, contudo, a responsabilidade principal deve ficar com o segurador, em atendimento ao disposto no artigo 4° do Código de Defesa do Consumidor (CDC), uma vez que é a empresa que oferta o produto.
O diretor jurídico da Zurich e presidente da Comissão de Assuntos Jurídicos da CNseg, Washington Luís Bezerra da Silva, explicou a diferença entre a apólice coletiva tradicional e a aberta. Segundo ele, nas apólices coletivas abertas – que não têm nenhum vínculo anterior entre os segurados e o estipulante –, os contratos são tratados como se fossem individuais. Nas coletivas tradicionais, afirmou, geralmente há um vínculo antecedente, uma relação anterior entre o estipulante e os segurados, que os representa.
O palestrante explicou que, nesse caso, as informações recebidas pela seguradora são sobre a massa das pessoas que serão seguradas, não havendo a individualização de cada um. “Não seria razoável que, no coletivo tradicional, a informação antecedente fosse dada pela seguradora, sendo que o momento da oferta é dado pelo estipulante”, afirmou.
Diretor da CNseg e presidente do Conselho da Mag Seguros, Nilton Molina ponderou que, mesmo que no ato da contratação a seguradora dê ao estipulante material promocional e legal suficiente para que ele faça uma ampla discussão e divulgação para os seus empregados, isso não basta. “Para qualquer segurado, o seguro é intangível, abstrato, ele não quer discutir esse assunto. Portanto, a responsabilidade de informá-lo tem que ser cotidiana, e, para isso, tem que ser exercida pelo departamento de recursos humanos, por meio de todos os meios de comunicação disponíveis, de forma renovada constantemente”, opinou.
Novo entendimento sobre a responsabilidade de informar
Em sua fala, o ministro Luis Felipe Salomão ponderou que a Segunda Seção do STJ, especializada em direito privado, funciona quase como uma agência reguladora de toda a atividade civil e econômica do país, uma vez que a corte superior dá a última palavra na interpretação do direito infraconstitucional. No Brasil, explicou, a formação do contrato de seguro obedece a algumas especificidades – como o dever de informar, que está diretamente relacionado ao conceito da máxima boa-fé, o qual deve reger a relação entre o segurado e o segurador.
Para o ministro, identificar a quem compete o dever de informar é fundamental no caso de ocorrência de alguma falha nessa comunicação, de modo a definir a quem cabe eventual indenização.
De acordo com Salomão, a Segunda Seção possuía um direcionamento inicial, em decorrência de um julgado de 2015, de que competia à seguradora esclarecer previamente ao segurado e ao estipulante sobre as cláusulas do seguro. Esse entendimento, destacou, foi modificado em 2020 pela Terceira Turma: o colegiado estabeleceu que, no contrato de seguro coletivo, cabe ao estipulante o dever de fornecer ao segurado ampla e prévia informação dos contornos contratuais. Essa alteração, lembrou, também foi adotada pela Quarta Turma neste ano e deverá ser consolidada pela Segunda Seção em julgamento repetitivo.
Programação extensa
A quarta edição do Seminário Jurídico de Seguros contou, ainda, com outros três painéis. Presidido pelo ministro Marco Buzzi, o painel 2 tratou do tema “NatJus – Instrumentos de apoio técnico às decisões judiciais”. Participaram das discussões o juiz federal Valter Shuenquener, secretário-geral do Conselho Nacional de Justiça (CNJ); Arnaldo Hossepian Júnior, subprocurador-geral de Justiça de Relações Institucionais e membro do Comitê do Fórum da Saúde do CNJ; e a vice-presidente de Saúde e Odonto da Sul América Seguros, Raquel Giglio.
O painel 3, cujo tema era “Critérios de correção das dívidas civis”, contou com a presidência do ministro Villas Bôas Cueva e palestra do ministro João Otávio de Noronha. Também participaram dos debates o presidente da Zurich Brasil, Edson Luis Franco, e o economista e professor da Fundação Getulio Vargas Armando Castelar.
Por fim, o painel de encerramento tratou do tema “Exercício irregular da atividade seguradora – Mercado marginal dos seguros”. A presidência foi do ministro Gurgel de Faria e as palestras, do ministro Og Fernandes; do presidente da Porto Seguro, Roberto Santos; e do procurador-geral da Susep, Jezihel Pena Lima.