Olá amigos do Dizer o Direito,

Foi publicada hoje uma importante
novidade legislativa.

Trata-se da Lei nº 13.985/2020, que
institui pensão especial destinada a crianças com Síndrome Congênita do Zika
Vírus, nascidas entre 2015 a 2019, beneficiárias do Benefício de Prestação
Continuada.

A Lei é fruto da aprovação da Medida
Provisória 894, de 4 de setembro de 2019.

Vamos entender em que consiste
essa pensão especial dividindo nosso estudo em três partes:

1) o que é o benefício de
prestação continuada?

2) o que previu o art. 18 da Lei
nº 13.301/2016?

3) como funciona a pensão
especial disciplinada pela MP 894/2019?

1) BENEFÍCIO
DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (BPC)

Benefício mensal de um salário
mínimo para pessoa com deficiência ou idoso

A CF/88 estabelece, em seu art. 203, V:

Art. 203. A assistência social será
prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade
social, e tem por objetivos:

(…)

V – a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria
manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

A fim de dar cumprimento a esse comando
constitucional, foi editada a Lei nº 8.742/93 que, em seus arts. 20 a 21-A,
disciplinou como seria pago esse benefício.

Nomenclatura

O art. 20 da Lei nº 8.742/93 denomina
esse direito de “Benefício de Prestação Continuada”. Ele também pode ser
chamado pelos seguintes sinônimos: “Amparo Assistencial”, “Benefício Assistencial” ou “LOAS”.

Em que consiste esse benefício:

Pagamento de um salário-mínimo por mês

• à pessoa com deficiência; ou

Desde que comprove não
possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua
família.

• ao idoso com 65 anos ou mais.

Para receber esse benefício, é necessário
que a pessoa contribua ou tenha contribuído para a seguridade social?

NÃO. Trata-se de um benefício de
assistência social que será prestado a quem dele necessitar, independentemente
de contribuição à seguridade social. A assistência social é caracterizada por
ser um sistema não-contributivo, ou seja, é prestada independentemente de
contribuição.

Quem administra e concede esse
benefício?

Apesar de o LOAS não ser um
benefício previdenciário, mas sim assistencial, ele é concedido e administrado
pelo INSS. Vale ressaltar, no entanto, que os recursos necessários ao seu
pagamento são fornecidos pela União (art. 29, parágrafo único, da Lei nº 8.742/93).

Assim, a competência para julgar ações
que discutam esse benefício é da Justiça Federal.

Renda que a lei considera como
sendo insuficiente para subsistência

Pela redação da Lei nº 8.742/93,
considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa
a família cuja renda mensal per capita seja igual ou inferior a 1/4 (um quarto)
do salário-mínimo.

Exceção: a Lei nº 13.982/2020
acrescentou o art. 20-A à Lei nº 8.742/93 prevendo a possibilidade de se
ampliar o máximo de renda mensal per capita para concessão do BPC. Em outras
palavras, esse novo artigo afirma que, durante o período de pandemia do
Covid-19, o INSS poderá conceder o BPC mesmo que fique demonstrado que a renda
mensal per capita é superior a 1/4 do salário-mínimo, desde que seja de até 1/2
salário-mínimo e se cumpram determinados requisitos. Veja o dispositivo
inserido:

Art. 20-A. Em razão do estado de
calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de
2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente
do coronavírus (Covid-19), o critério de aferição da renda familiar mensal per
capita previsto no inciso I do § 3º do art. 20 poderá ser ampliado para até 1/2
(meio) salário-mínimo.

(…)

Critério não é absoluto

Vale ressaltar, no entanto, que o
critério de 1/4, acima mencionado como regra geral, não é absoluto.

O Plenário do STF declarou,
incidentalmente, a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93
(sem pronúncia de nulidade) por considerar que o referido critério está
defasado para caracterizar a situação de miserabilidade. O STF afirmou que, para
aferir que o idoso ou deficiente não tem meios de se manter, o juiz está livre
para se valer de outros parâmetros, não estando vinculado ao critério da renda per capita inferior a 1/4 do
salário-mínimo previsto no § 3º do art. 20.

STF. Plenário. RE 567985/MT e RE
580963/PR, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, julgados em 17 e 18/4/2013
(Info 702).

Desse modo, como a declaração de
inconstitucionalidade foi sem pronúncia de nulidade, o critério definido pelo
art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 continua existindo no mundo jurídico, mas
devendo agora ser interpretado como um indicativo objetivo que não exclui a
possibilidade de o juiz verificar a hipossuficiência econômica do postulante do
benefício por outros meios de prova (STF. 1ª Turma. ARE 834476 AgR, Rel. Min.
Dias Toffoli, julgado em 03/03/2015).

É como o STJ também vem decidindo:

(…) O limite legal estabelecido no
art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 não é critério absoluto, de modo que a
necessidade/miserabilidade do postulante pode ser comprovada de outras
maneiras. (…)

STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 1341655/SP,
Rel. Min. Castro Meira, julgado em 06/08/2013.

(…) A jurisprudência do STJ
pacificou-se no sentido de que a limitação do valor da renda per capita
familiar não deve ser considerada a única forma de provar que a pessoa não
possui outros meios para prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua
família, pois é apenas um elemento objetivo para aferir a necessidade, ou seja,
presume-se absolutamente a miserabilidade quando demonstrada a renda per capita
inferior a 1/4 do salário-mínimo. Orientação reafirmada no julgamento do REsp
1.112.557/MG, sob o rito dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC).

STJ. 2ª Turma. AgRg no AgRg no AREsp
617.901/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 05/05/2015.

§ 11 do art. 20 da Lei nº 8.742/93

O legislador, de forma acertada,
encampou o entendimento jurisprudencial acima explicado e, por meio da Lei nº
13.146/2015, inseriu o § 11 ao art. 20 da Lei nº 8.742/93 prevendo o seguinte:

Art. 20 (…)

§ 11. Para concessão do benefício de
que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos
probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de
vulnerabilidade, conforme regulamento.

O que se entende por renda familiar
mensal
per
capita? Como isso é calculado?

Normalmente, um assistente social
vai até a residência da pessoa que está requerendo o benefício e faz
entrevistas com ela e os demais moradores da casa, indagando sobre as fontes de
renda de cada um, verificando as condições estruturais do lar, os móveis e
eletrodomésticos existentes no local etc.

Após isso, é elaborado um laudo
social.

A renda familiar mensal per
capita é calculada da seguinte forma: soma-se todos os rendimentos dos membros
da família que moram na mesma casa que o requerente do benefício e depois
divide-se esse valor pelo número de familiares (incluindo o requerente). Ex.:
Carla (pessoa com deficiência) mora com seus pais (João e Maria) e mais um
irmão (Lucas). João e Maria trabalham e ganham um salário mínimo, cada. Cálculo
da renda mensal per capita: 2 salários mínimos divididos por 4 pessoas = 2:4.
Logo, a renda mensal per capita será igual a 1/2 do salário mínimo. Neste
exemplo, a renda familiar mensal per capita será maior do que o teto imposto
pelo art. 20,
§ 3º, da Lei nº 8.742/93. Mesmo assim, o juiz poderá conceder o benefício,
desde que existam outras provas que atestem a miserabilidade da requerente. Não
havendo, contudo, tal comprovação, o benefício será negado.

O que se entende por família?

Para os fins da renda familiar do LOAS,
a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na
ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos
e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto
(art. 20, § 1º).

2) BPC E A
LEI 13.301/2016

Sabemos que um dos grandes e
tristes males causados pelo vírus da zika é que, se uma gestante for infectada,
existe o risco de que a criança, ao nascer, apresente problemas neurológicos,
dentre eles a chamada microcefalia. Pensando nisso, o que fez a Lei nº
13.301/2016?

A Lei nº 13.301/2016 previu que a
criança vítima de microcefalia decorrente de doenças transmitidas pelo Aedes aegypti possuiria direito de
receber, pelo prazo de
3 anos
, o benefício de prestação continuada (BPC) que estudamos acima.

Veja qual era a redação do art.
18 da Lei nº 13.301/2016:

Art. 18. Fará jus ao benefício de
prestação continuada temporário, a que se refere o art. 20 da Lei nº 8.742, de
7 de dezembro de 1993, pelo prazo máximo de três anos, na condição de pessoa
com deficiência, a criança vítima de microcefalia em decorrência de sequelas neurológicas
decorrentes de doenças transmitidas pelo Aedes
aegypti
.

(…)

§ 2º O benefício será concedido
após a cessação do gozo do salário-maternidade originado pelo nascimento da
criança vítima de microcefalia.

Assim, o art. 18 da Lei nº
13.301/2016 previu um benefício temporário para as crianças vítimas de
microcefalia em decorrência de sequelas neurológicas decorrentes de doenças
transmitidas pelo Aedes aegypti.

PENSÃO MENSAL
DA LEI 13.985/2020 (MP 894/2019)

O que fez a Lei nº 13.985/2020 (decorrente
da MP 894/2019)?

Instituiu uma pensão especial…

– mensal, vitalícia e
intransferível

– a ser paga para as crianças com
Síndrome Congênita do Zika Vírus,

– nascidas entre 01/01/2015 a 31/12/2019,

– e que já sejam beneficiárias do
Benefício de Prestação Continuada.

E o benefício do art. 18 da Lei nº
13.301/2016?

Foi revogado. Assim, o benefício
do art. 18 da Lei nº 13.301/2016 foi, na prática, “substituído” pela pensão
especial trazida pela Lei nº 13.985/2020. O beneficiário não receberá os dois.
Quando passar a receber a pensão especial, o BPC cessará.

Essa substituição é vantajosa
para os beneficiários?

Sim, por duas razões:

1) o BPC do art. 18 da Lei nº
13.301/2016 era temporário (3 anos, no máximo); já a pensão especial da Lei nº
13.985/2020 é vitalícia.

2) o beneficiário só tinha
direito de continuar recebendo o BPC do art. 18 da Lei nº 13.301/2016 se ficasse
demonstrado que a família da criança com microcefalia não possuía meios de
prover a sua manutenção (a família da criança tinha que se enquadrar no conceito
jurídico de economicamente “miserável”); a pensão mensal não faz essa
exigência. Assim, por exemplo, mesmo que os pais da criança consigam um bom
emprego ou uma outra fonte de renda, ela continuará tendo direito à pensão
mensal.

Características da pensão
especial

Essa pensão especial é…

• mensal;

• vitalícia (deverá ser paga até
a pessoa com Síndrome Congênita do Zika Vírus falecer);

• intransferível (depois que ela
falecer, a pensão não se transfere para os herdeiros do beneficiário).

Valor

A pensão especial tem o valor de
um salário mínimo.

Inacumulável

A pensão especial não poderá ser
acumulada:

• com indenizações pagas pela
União em razão de decisão judicial sobre os mesmos fatos; ou

• com o Benefício de Prestação
Continuada.

Desistência da ação

O reconhecimento da pensão
especial ficará condicionado à desistência de ação judicial que tenha por
objeto pedido idêntico sobre o qual versa o processo administrativo.

Termo inicial

A pensão especial será devida a
partir do dia posterior à cessação do Benefício de Prestação Continuada ou das
indenizações pagas pela União em razão de decisão judicial sobre os mesmos
fatos, que não poderão ser acumulados com a pensão.

Não dá direito a abono ou pensão
por morte

A pensão especial não gerará
direito a:

abono (quando se fala em
abono, no Direito Previdenciário, é como se fosse o “13º salário”; assim, em
dezembro, não se recebe duas vezes esse valor da pensão; só se recebe o valor
normal mensal) ou

pensão por morte (isso
porque é um benefício intransferível; assim, quando a vítima da microcefalia
morre, a pensão especial cessa e não se transfere aos seus herdeiros).

Quem administra e concede esse
benefício?

Essa pensão especial não é um
benefício previdenciário, mas sim assistencial. Apesar disso, ele é concedido e
administrado pelo INSS.

Assim, o requerimento da pensão
especial será realizado no INSS.

De igual forma, a competência para
julgar ações que discutam esse benefício é, em regra, da Justiça Federal (art.
109, I, da CF/88).

Exame médico

A Lei prevê que deverá ser realizado
exame pericial por perito médico federal para constatar a relação entre a
síndrome congênita adquirida e a contaminação pelo vírus da zika.

Origem dos recursos para
pagamento das pensões

As despesas necessárias para o
pagamento das pensões correrão à conta da programação orçamentária
“Indenizações e Pensões Especiais de Responsabilidade da União”.

Benefícios para as mães das
crianças

No caso de mães de crianças
nascidas até 31 de dezembro de 2019 acometidas por sequelas neurológicas decorrentes da
Síndrome Congênita do Zika Vírus, será observado o seguinte:

I – a licença-maternidade de que
trata o art. 392 da CLT será de 180 dias;

II – o salário-maternidade de que
trata o art. 71 da Lei nº 8.213/91, será devido por 180 dias.

Revogação do art. 18 da Lei nº
13.301/2016

A Lei nº 13.985/2020 revogou o
art. 18 da Lei nº 13.301/2016.

Artigo Original em Dizer o Direito

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