Olá amigos do Dizer o Direito,
estamos preparando o Informativo 505 do STJ. No entanto, enquanto ele não é publicado,
gostaríamos de comentar um tema muito difícil e interessante que certamente
será cobrado em breve numa prova discursiva de concurso da magistratura.
estamos preparando o Informativo 505 do STJ. No entanto, enquanto ele não é publicado,
gostaríamos de comentar um tema muito difícil e interessante que certamente
será cobrado em breve numa prova discursiva de concurso da magistratura.
A pergunta é a seguinte:
Na fase de liquidação da sentença, se o juiz entender que as provas
produzidas não foram suficientes para definir o quantum debeatur, o que ele deverá fazer?
produzidas não foram suficientes para definir o quantum debeatur, o que ele deverá fazer?
Antes de responder a pergunta, vamos
rememorar o tema:
rememorar o tema:
Liquidação
da sentença
da sentença
Um dos requisitos da sentença é que ela
seja líquida.
seja líquida.
Para o CPC, sentença líquida é aquela
que define o quantum debeatur, ou
seja, é aquela que fixa o valor da obrigação devida.
que define o quantum debeatur, ou
seja, é aquela que fixa o valor da obrigação devida.
Pode acontecer, no entanto, de a
sentença prolatada ser ilíquida, isto é, não fixar o valor certo que o réu foi
condenado a pagar.
sentença prolatada ser ilíquida, isto é, não fixar o valor certo que o réu foi
condenado a pagar.
Neste caso, deverá ser realizada a
liquidação da sentença, conforme prevê o CPC:
liquidação da sentença, conforme prevê o CPC:
Art. 475-A. Quando a sentença não
determinar o valor devido, procede-se à sua liquidação.
Desse modo, a liquidação da sentença é a
etapa do processo que ocorre após a fase de conhecimento e que se destina a descobrir
o valor da obrigação (quantum debeatur)
quando não foi possível fixar essa quantia diretamente na sentença.
etapa do processo que ocorre após a fase de conhecimento e que se destina a descobrir
o valor da obrigação (quantum debeatur)
quando não foi possível fixar essa quantia diretamente na sentença.
Objetivo
da liquidação
da liquidação
A finalidade da liquidação é descobrir
o quantum debeatur e, assim, poder permitir
o cumprimento da sentença (execução).
o quantum debeatur e, assim, poder permitir
o cumprimento da sentença (execução).
É
possível que, na liquidação, não se consiga obter provas do quanto é devido ao
credor?
possível que, na liquidação, não se consiga obter provas do quanto é devido ao
credor?
SIM. É possível que seja iniciada a
fase de liquidação da sentença, sejam buscadas provas para se conseguir definir
o quantum debeatur e, mesmo assim, o
juiz entenda que não foram produzidos elementos suficientes para fixar o valor
devido.
fase de liquidação da sentença, sejam buscadas provas para se conseguir definir
o quantum debeatur e, mesmo assim, o
juiz entenda que não foram produzidos elementos suficientes para fixar o valor
devido.
Exemplo
(julgado pelo STJ, com algumas adaptações):
(julgado pelo STJ, com algumas adaptações):
Certo programa de TV divulgou,
indevidamente, imagens de uma menor em situação vexatória, fato ocorrido em
1991. A menor, devidamente, assistida por seus pais, ajuizou ação de indenização
por danos morais e materiais contra a emissora, demanda que foi julgada
procedente.
indevidamente, imagens de uma menor em situação vexatória, fato ocorrido em
1991. A menor, devidamente, assistida por seus pais, ajuizou ação de indenização
por danos morais e materiais contra a emissora, demanda que foi julgada
procedente.
Na sentença, o juiz fixou um valor certo
para os danos morais (100 salários-mínimos).
para os danos morais (100 salários-mínimos).
Quanto aos danos materiais, o juiz condenou
a emissora a pagar o valor correspondente ao minuto cobrado pela emissora por
anúncios publicitários multiplicado pela quantidade de minutos que a menor ficou
exposta.
a emissora a pagar o valor correspondente ao minuto cobrado pela emissora por
anúncios publicitários multiplicado pela quantidade de minutos que a menor ficou
exposta.
Perceba que o valor dos danos morais é
líquido, mas a quantia referente aos danos materiais é ilíquida já que não será
possível executar imediatamente essa quantia. Para saber qual é essa soma, será
necessário, primeiro, definir qual era o valor do minuto de publicidade na época
dos fatos e quanto tempo a menor foi exposta (incluindo não apenas o programa
em si, mas também as chamadas divulgadas antes que o programa fosse ao ar).
líquido, mas a quantia referente aos danos materiais é ilíquida já que não será
possível executar imediatamente essa quantia. Para saber qual é essa soma, será
necessário, primeiro, definir qual era o valor do minuto de publicidade na época
dos fatos e quanto tempo a menor foi exposta (incluindo não apenas o programa
em si, mas também as chamadas divulgadas antes que o programa fosse ao ar).
Foi iniciada a liquidação da sentença e,
durante essa fase, tentou-se obter a cópia da grade de programação para saber quantas
chamadas foram divulgadas do programa e em quantos minutos a garota aparecia. Tentou-se
também chegar a um valor exato do quanto era cobrado por minuto pela emissora
em cada um dos horários.
durante essa fase, tentou-se obter a cópia da grade de programação para saber quantas
chamadas foram divulgadas do programa e em quantos minutos a garota aparecia. Tentou-se
também chegar a um valor exato do quanto era cobrado por minuto pela emissora
em cada um dos horários.
Ocorre que, quando foi proferida a
sentença, a emissora não tinha mais essas informações, nem mesmo as gravações
da época. Isso se mostrou justificável pelo fato de que a ação somente foi julgada
20 anos após o programa ter ido ao ar, e como não se determinou, em nenhum
momento, que a TV guardasse essas gravações, o STJ considerou que não houve irregularidade
no procedimento adotado pela empresa de reaproveitar o material gravando outros
programas por cima.
sentença, a emissora não tinha mais essas informações, nem mesmo as gravações
da época. Isso se mostrou justificável pelo fato de que a ação somente foi julgada
20 anos após o programa ter ido ao ar, e como não se determinou, em nenhum
momento, que a TV guardasse essas gravações, o STJ considerou que não houve irregularidade
no procedimento adotado pela empresa de reaproveitar o material gravando outros
programas por cima.
O certo é que não havia meios de conseguir
provar a quantidade de minutos e o valor do minuto. Em outros termos, não havia
meios de provar o quantum debeatur.
provar a quantidade de minutos e o valor do minuto. Em outros termos, não havia
meios de provar o quantum debeatur.
O
que o juiz deve fazer caso isso ocorra?
que o juiz deve fazer caso isso ocorra?
A 3ª Turma do STJ decidiu que, neste
caso, o juiz deve declarar o non liquet.
Em suma, o juiz declara que não irá decidir o mérito da liquidação. Non liquet significa isso: o juiz deixa
de decidir a controvérsia posta à sua apreciação.
caso, o juiz deve declarar o non liquet.
Em suma, o juiz declara que não irá decidir o mérito da liquidação. Non liquet significa isso: o juiz deixa
de decidir a controvérsia posta à sua apreciação.
Como o juiz deixa de decidir em virtude
da ausência de elementos de prova necessários para resolver a controvérsia,
significa dizer que ele profere uma decisão terminativa (e não de mérito).
da ausência de elementos de prova necessários para resolver a controvérsia,
significa dizer que ele profere uma decisão terminativa (e não de mérito).
A decisão terminativa não produz coisa
julgada material (o processo é extinto sem resolução do mérito). Na prática,
isso significa que a liquidação pode ser reproposta desde que o autor consiga
reunir novas provas que consigam demonstrar o quantum debeatur.
julgada material (o processo é extinto sem resolução do mérito). Na prática,
isso significa que a liquidação pode ser reproposta desde que o autor consiga
reunir novas provas que consigam demonstrar o quantum debeatur.
Essa
decisão do juiz reconhecendo o non liquet
encontra previsão no CPC atual?
decisão do juiz reconhecendo o non liquet
encontra previsão no CPC atual?
NÃO. Situações como essa não contam com
previsão expressa no CPC de 1973 (atual). No CPC/39 (anterior), existia essa possibilidade
em seu art. 915, que permitia a declaração de non liquet, com extinção da liquidação sem resolução de mérito e
eventual repetição do procedimento, no futuro, caso se tornasse possível
apresentar a prova necessária para a condenação.
previsão expressa no CPC de 1973 (atual). No CPC/39 (anterior), existia essa possibilidade
em seu art. 915, que permitia a declaração de non liquet, com extinção da liquidação sem resolução de mérito e
eventual repetição do procedimento, no futuro, caso se tornasse possível
apresentar a prova necessária para a condenação.
Segundo decidiu o STJ, apesar dessa
regra não ter sido repetida no CPC atual, ela poderá ser aplicada ainda hoje.
regra não ter sido repetida no CPC atual, ela poderá ser aplicada ainda hoje.
Assim,
sendo impossível apurar, na
liquidação, o quantum debeatur em
virtude da ausência de provas, o processo deve ser extinto sem resolução do
mérito, facultando-se ao autor reiniciar a liquidação no futuro, caso reúna,
com novos elementos, provas suficientes para definir esse valor.
sendo impossível apurar, na
liquidação, o quantum debeatur em
virtude da ausência de provas, o processo deve ser extinto sem resolução do
mérito, facultando-se ao autor reiniciar a liquidação no futuro, caso reúna,
com novos elementos, provas suficientes para definir esse valor.
Em sede doutrinária,
há certa divergência sobre esse assunto, mas o julgado do STJ está de acordo
com a posição de Cândido Rangel Dinamarco (Instituições de Direito Processual
Civil).
há certa divergência sobre esse assunto, mas o julgado do STJ está de acordo
com a posição de Cândido Rangel Dinamarco (Instituições de Direito Processual
Civil).
Uma última pergunta:
No caso concreto, o juiz, diante da ausência das gravações
e do valor do horário publicitário da emissora, poderia ele fazer uma
estimativa de tais informações?
e do valor do horário publicitário da emissora, poderia ele fazer uma
estimativa de tais informações?
NÃO. Segundo
decidiu o STJ, não é possível ao juízo promover a liquidação da sentença
valendo-se, de maneira arbitrária, de meras estimativas, na hipótese em que a
sentença fixa a obrigatoriedade de indenização do dano, mas as partes sem culpa
estão impossibilitadas de demonstrar a sua extensão.
decidiu o STJ, não é possível ao juízo promover a liquidação da sentença
valendo-se, de maneira arbitrária, de meras estimativas, na hipótese em que a
sentença fixa a obrigatoriedade de indenização do dano, mas as partes sem culpa
estão impossibilitadas de demonstrar a sua extensão.
Processo mencionado: STJ. Terceira
Turma. REsp 1.280.949-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 25/9/2012.
Turma. REsp 1.280.949-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 25/9/2012.