A situação concreta foi a
seguinte:

O Ministério Público Federal
ajuizou ação civil pública contra a Caixa Econômica Federal (empresa pública
federal) pedindo que ela seja proibida de terceirizar a sua atividade jurídica,
isto é, que seja proibida de contratar escritórios de advocacia para fazer a
sua defesa jurídica.

Para o MPF, a defesa jurídica da
Caixa Econômica deve ser feita exclusivamente por seu quadro próprio de
advogados, admitidos mediante concurso público.

A tese do MPF foi acolhida
pelo STJ?

NÃO.

Terceirização

Terceirização é um processo de
gestão empresarial, na qual um “terceiro” assume algumas atividades de uma
empresa, sem a necessidade de constituição de vínculo trabalhista entre a
empresa que terceiriza e

os empregados da empresa que
oferece mão-de-obra, como terceirizada. Em outras palavras, transferem-se para
terceiros certos serviços, que, originalmente, seriam executados dentro da
própria empresa contratante.

“Ocorre a terceirização quando
uma empresa, em vez de executar serviços diretamente com seus empregados,
contrata outra empresa para que esta os realize, com o seu pessoal sob a sua
responsabilidade. O empregado é contratado pela empresa intermediadora (empregadora),
mas presta serviços em outro local (empresa tomadora).” (CORREIA, Henrique. Direito do Trabalho para concursos de
analista do TRT, TST e MPU
. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 360).

Desse modo, terceirizar significa
transferir uma ou mais atividades da empresa para que sejam realizados por
outra empresa.

Em regra, a CEF é obrigada
a fazer concurso público para a contratação de seus empregados?

SIM. Existe uma súmula do TCU
sobre o tema:

Súmula 231-TCU: A exigência de
concurso público para admissão de pessoal se estende a toda a Administração
Indireta, nela compreendidas as Autarquias, as Fundações instituídas e mantidas
pelo Poder Público, as Sociedades de Economia Mista, as Empresas Públicas e,
ainda, as demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União,
mesmo que visem a objetivos estritamente econômicos, em regime de
competitividade com a iniciativa privada.

Vale ressaltar, contudo, que o
fato de a admissão de empregado, em seu quadro de pessoal, dever ser feita
mediante concurso público, não inviabiliza a contratação, pela CEF, de
terceirizados.

Finalidade da CEF

A CEF é uma empresa pública
criada para funcionar como instituição financeira. Sua atividade principal,
portanto, não é de natureza jurídica.

As atividades jurídicas
envolvendo a CEF, embora importantes para a consecução dos seus objetivos, não
são consideradas como sua atividade-fim. A atividade-fim da referida empresa é
a prestação de serviços bancários.

A CEF é uma instituição
financeira que visa o lucro. Assim, ainda que a contratação de seus empregados
deva ser feita mediante aprovação em concurso público, por força de norma
constitucional, não há como proibir a terceirização, especialmente em épocas
nas quais a CEF possui uma demanda bastante elevada, e comumente sazonal, de
serviços jurídicos.

Terceirização é necessária
para que a CEF possa manter sua competitividade em relação aos demais bancos

A CEF, como
empresa pública inserida no cenário econômico, sujeito à concorrência com
outros bancos, não pode ser impedida, mesmo observada a necessidade de admitir
empregados de seu quadro de pessoal mediante concurso público, de lançar mão,
em determinadas situações, dessa ferramenta gerencial, mesmo porque o art. 173,
§ 1º, II, da CF/88 afirma que a empresa pública que explore atividade econômica
sujeita-se ao regime próprio das empresas privadas:

Art. 173. Ressalvados os casos
previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo
Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança
nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

§ 1º A lei estabelecerá o estatuto
jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas
subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de
bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:

(…)

II – a sujeição ao regime jurídico
próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações
civis, comerciais, trabalhistas e tributários;

Dentro dos serviços jurídicos que
a CEF necessita, certamente haverá aqueles de alta complexidade e que se
vinculam a questões estratégicas da instituição, mas também haverá os
padronizados e de simples execução, segundo normas e orientações previamente
estabelecidas.

Assim, tanto a realização de
concurso público para provimento de emprego de advogado, quanto a terceirização,
mediante contratação de escritórios de advocacia, são alternativas legais à
CEF, e em conformidade com a moralidade administrativa. O que se exige é que
essa decisão seja tomada levando-se em consideração o princípio da economicidade,
especialmente considerando-se ser a CEF uma empresa pública, que, por
definição, visa o lucro e à qual devem ser garantidas condições de manter-se no
mercado

concorrencial em que se insere.

Limitar a atividade da advocacia,
dentro da Caixa Econômica Federal, somente permitindo que ela atue com
profissionais concursados é retirar a capacidade concorrencial da Caixa. 

Recentes novidades
legislativas

As conclusões acima foram
reforçadas por recentes novidades legislativas que permitiram a terceirização
inclusive de atividades-fim das empresas.

Lei nº 13.429/2017

Em março de 2017, foi editada a
Lei nº 13.429/2017, com o objetivo de regulamentar o trabalho temporário e a
terceirização.

“A Lei nº 13.429/2017 não
restringiu os serviços passíveis de terceirização apenas à atividade-meio da
empresa, o que levou à interpretação de que havia sido autorizada a
terceirização nas atividades-fim das empresas, inclusive pelos debates dos
parlamentares que antecederam a votação do projeto. Apesar da ampla
possibilidade de terceirização, a legislação era omissa quanto à possibilidade
de terceirização da atividade-fim e gerava insegurança jurídica, pois a
imprecisão da norma em admitir (ou não) a terceirização em atividade-fim levava
à discussão sobre sua permissão ou não no ordenamento jurídico.” (CORREIA,
Henrique. Direito do Trabalho para
concursos de analista do TRT, TST e MPU
. Salvador: Juspodivm, 2018, p.
360).

Lei nº 13.467/2017

Em julho de 2017, foi editada a
Lei nº 13.467/2017, a chamada Reforma Trabalhista, que também tratou sobre
alguns pontos da terceirização que ainda precisavam ser esclarecidos.

A Lei nº 13.467/2017 foi expressa
ao dizer que a terceirização abrange quaisquer atividades da empresa contratante,
inclusive sua atividade principal (atividade-fim).

Desse modo, não há mais qualquer
dúvida de que com essa Lei passou a ser permitida a terceirização de
atividades-fim da empresa, de forma que a Lei teve como objetivo superar o
entendimento jurisprudencial da Súmula 331 do TST.

Em suma:

A Caixa Econômica Federal, embora vinculada como
empresa pública ao Estado, executa uma atividade econômica em ambiente de
concorrência.

A terceirização pela Caixa Econômica Federal dos
serviços jurídicos não se revela ilegal, considerando que esses serviços não
estão relacionados com a atividade-fim da empresa.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.318.740-PR, Rel. Min.
Herman Benjamin, Rel. Acd.
Min.
Og Fernandes, julgado em 16/10/2018 (Info 659).

Artigo Original em Dizer o Direito

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