Durante três dias, cinco magistrados colombianos e mais de uma dezena de magistrados e acadêmicos brasileiros discutiram temas como caminhos para a paz, a violação dos direitos humanos e a importância do direito internacional no Seminário “Formas Inovadoras de Combate à Violência: a Experiência da Justiça Colombiana”, realizado pelo Superior Tribunal Militar (STM).
Os debates ocorreram em torno da experiência dos juízes colombianos na Jurisdição Especial para a Paz (JEP), uma justiça transitória criada em 2017, a partir da efetivação do Acordo de Paz assinado em setembro de 2016 entre o governo colombiano e as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).
No último painel de debate, nesta sexta-feira (13/06), os magistrados Gustavo Salazar e Camilo Suárez Aldana, ambos com atuação na JEP, enfatizaram o objetivo primeiro da Justiça restaurativa: buscar a paz por meio da garantia do direito das vítimas à verdade e a reparação dos delitos.
Os magistrados colombianos apontaram as inúmeras dificuldades enfrentadas pela Colômbia desde o fim da luta aramada travada pelas Farc, salientando que o atendimento jurídico às vítimas foi o mais bem-sucedido dos principais pontos previstos no Acordo de Paz, que incluem a reforma agrária, o desarmamento, o combate ao tráfico de drogas e a reinserção dos guerrilheiros na vida civil.
O monumental trabalho da JEP em mais de oito anos de existência contem números impressionantes. Alguns exemplos: foram identificadas mais de 35 mil vítimas de violência sexual; mais de 10 mil meninas e meninos foram recrutados pela luta armada; quase 30 mil vítimas de terrorismo; mais de 1,3 milhão de vítimas de povos e territórios étnicos, sendo esses crimes não anistiáveis. Em 54 anos de luta armada no país, cerca de 290 mil pessoas perderam a vida.
Mais de 14 mil pessoas foram julgadas pela Jurisdição Especial, tendo sido aplicadas a elas o princípio da restauração, com penas de prisão inferiores às adotadas na Justiça Ordinária – em vez de 25 a 60 anos de prisão, foram aplicadas penas de até oito anos, anistia e liberdade condicional, desde que obedecidas as seguintes exigências: assumir a verdade (do crime cometido), garantir a não repetição e participar de projeto restaurativo.
“Somos um país que viemos de 54 anos de conflito interno com graves crimes humanitários. A justiça restaurativa é uma justiça que repara e dignifica as vítimas, e que aplica a reparação aos julgados”, disse o magistrado Aldana.
“Tive oportunidade de visitar a JEP e sempre me encantou essa ideia de justiça que promove a paz e a conciliação, ao invés da simples punição e encarceramento. O acordo de Paz entre o Estado colombiano e as Farc é um grandioso exemplo para mundo”, afirmou a presidente do STM, ministra Maria Elizabeth, ao agradecer a presença dos participantes no Seminário, em especial aos magistrados colombianos.
Além dos magistrados da JEP, participaram dos debates desta sexta-feira o diretor da Faculdade Direito da Universidade de Brasília (UnB), Alexandre Bernardino, e o advogado Roberto Caldas, que acompanhou de perto o processo para a construção do Acordo de Paz na Colômbia, quando exerceu o cargo de presidente da Corte Interamericana dos Direitos Humanos, com sede na Costa Rica.