STF começa julgamento de dispositivo que prorroga patentes de medicamentos

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar, nesta quarta-feira (28), a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5529, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra dispositivo da Lei de Patentes (Lei 9.279/1996) que estabelece que o prazo de vigência da patente não será inferior a 10 anos para invenção e a sete anos para modelo de utilidade. Após as manifestações das partes e de interessados admitidos no processo, o julgamento foi suspenso e será retomado nesta quinta-feira (29) com o voto do relator, ministro Dias Toffoli.

Prolongamento

Na ação, a PGR argumenta que o parágrafo único do artigo 40 da norma, ao invés de promover condução célere e eficiente dos processos administrativos, admite e, de certa forma, estimula o prolongamento exacerbado do exame de pedido de patente. O ministro Toffoli, em recente decisão liminar, suspendeu a aplicação da prorrogação de prazo às patentes, mesmo que pendentes, de produtos farmacêuticos e materiais de saúde, que só poderão vigorar por 15 anos (modelo de utilidade) e 20 anos (invenção). Porém, a suspensão é válida apenas para as requeridas após a concessão da liminar.

Direito da sociedade

O procurador-geral da República, Augusto Aras, no julgamento, sustentou que a possibilidade de a patente vigorar por prazo indeterminado viola o artigo 5º, inciso XXIX, da Constituição Federal, segundo o qual a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização. Segundo ele, a Constituição não define o tempo de exclusividade, mas impõe que seja estabelecido tempo certo, definido e previsível, sob pena de prejudicar a inovação tecnológica e o desenvolvimento socioeconômico, em flagrante prejuízo ao mercado nacional.

Ao se manifestar pela quebra imediata de patentes de produtos farmacêuticos e materiais de saúde, especialmente os eficazes no enfrentamento da pandemia, Aras afirmou que o direito à razoável duração do processo é da própria sociedade.

Efeito prejudicial

Segundo o advogado-geral da União, André Mendonça, não há, na norma, violação a postulados constitucionais. Ao contrário, na sua avaliação, a revogação do dispositivo causaria insegurança jurídica, caso seja adotada com efeitos retroativos, e afetaria de forma prejudicial diversos setores tecnológicos, como os de telecomunicações, mecânica, micro e pequenas empresas, empreendedores individuais e universidades.

Insegurança

Entre os interessados que defenderam a improcedência da ação, a representante da Associação das Empresas de Biotecnologia na Agricultura e Agroindústria, Liliane Roriz de Almeida, afirmou que declarar a regra inconstitucional é importar insegurança jurídica para os sistemas de patentes. No mesmo sentido, a Associação Brasileira de Propriedade Intelectual (ABPI), representada por Luiz Henrique do Amaral, afirmou que a inconstitucionalidade afetaria a economia brasileira, pois atingiria a indústria e o desenvolvimento do país.

Para o advogado da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), Gustavo Morais, não há desabastecimento de nenhum medicamento contra a Covid-19 em razão do artigo questionado. Ele destacou ainda que, caso seja declarada a inconstitucionalidade da norma, deve-se manter em vigor as patentes já concedidas.

Victor Santos Rufino, da Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef), destacou que existe um universo de patentes e um microssistema estável que funciona muito bem no país. Em sua opinião, não há justificativa para dizer que a lei é inconstitucional.

Em nome da Associação Brasileira dos Agentes da Propriedade Industrial, o advogado Marcelo Martins afirmou que não é razoável esperar até 11 anos para a conclusão de um processo administrativo que envolve tecnologia de ponta. A seu ver, a ação deve ser julgada totalmente improcedente.

A Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs, representada pelo advogado Otto Licks, também defendeu a improcedência da ação. Segundo ele, o tempo de vigência da patente permite o investimento em novas fábricas, produtos e serviços e é levado em consideração pelo BNDES para conceder empréstimos.

Para o representante da Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras (Anpei), Luiz Augusto Lopes Paulino, o período que antecede a concessão da patente é mera expectativa de direito e que as empresas já carregam o “pesado fardo da inovação”.

Pela Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), Regis Percy Arslanian observou que o pedido da PGR diz respeito a 72 medicamentos, e nenhum deles é direcionado à Covid-19, apesar dos argumentos envolvendo a pandemia. Também destacou que a procedência da ação seria uma medida traumática para inovação no país, pois mais de 10.500 pedidos de patente que pertencem a outros segmentos industriais de tecnologia seriam concedidos sem prazo ou com prazo mínimo.

Em nome da Associação Interamericana de Propriedade Intelectual (Asipi), Gabriel Francisco Leonardos afirmou que a extensão dos prazos de patente, nos casos de demora do exame, é uma obrigação assumida pelo Brasil em acordo internacional, e seu descumprimento pode causar sanções no âmbito da OMC.

Para Eduardo Telles Pires Hallak, representante da Croplife Brasil, a discussão é muito importante para o setor do agronegócio, que poderá ter quase 2 mil patentes e outros 500 pedidos afetados.

Inconstitucionalidade

No polo contrário, o advogado Allan Rossi, em nome da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids, defendeu a inconstitucionalidade da norma, em nome de um “sistema mais justo, equitativo e transparente”.

A Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina, Biotecnologia e suas Especialidades (Abifina), representada pelo advogado Pedro Barbosa, sustentou que as patentes, no Brasil, têm a data postergada de forma natural, e uma das consequências disso é não se saber quando o concorrente poderá ingressar no mercado. Ele pediu, também, a inconstitucionalidade integral do dispositivo questionado.

Em nome do Instituto Brasileiro de Propriedade Intelectual (IBPI), o advogado Felipe Santa Cruz afirmou que a extensão do prazo de patentes é indevida e causa impacto ao Sistema Único de Saúde (SUS), que tem 20% de suas despesas com a compra de medicamentos.

Em nome do Grupo FarmaBrasil e da Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos (PróGenéricos), Marcus Vinícius Furtado Coelho ressaltou que afastar a extensão patentária com prazo incerto é um dever constitucional, além de uma exigência ética e inafastável, principalmente no período de pandemia.

Representada pelo defensor público federal Gustavo Zortea da Silva, a Defensoria Pública da União (DPU) defendeu o livre acesso à saúde, ressaltando que a alta artificial de preços de medicamentos decorre da restrição indevida de competição.

 

 

SP, CM, EC/CR//CF

Leia mais:

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Fonte STF

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