O Superior Tribunal Militar (STM) aumentou a pena de um sargento do Exército, condenado na primeira instância da Justiça Militar da União por desvio de munições e granadas e venda a um traficante da cidade de Campinas (SP).
O Tribunal também aumentou a pena de um civil, reconhecidamente traficante no estado de São Paulo, preso com 350 cartuchos de metralhadora .50, usada como munição antitanque e antiaérea, desviada da Companhia de Comando da 11ª Brigada de Infantaria Leve (Bda Inf L).
O sargento réu no processo também extraviou 48 granadas, de treinamentos para tropas do Haiti e guardadas no paiol daquela unidade militar. Na primeira instância, um major e dois tenentes do Exército também foram condenados, na forma culposa, por “desaparecimento, consunção ou extravio”, por não terem controlado a munição, desviada pelo sargento, conforme os crimes previsto nos artigos 265 e 266 do Código Penal Militar.
O caso somente foi descoberto em 2010, após uma operação da Polícia Civil de São Paulo, que identificou uma grande quantidade de material bélico pertencente ao Exército na comunidade de Jardim Florence 1, na posse de um traficante e chefe de uma organização criminosa local.
Segundo as investigações de um Inquérito Policial Militar (IPM), aberto pelo Exército para apurar o caso, desde 2009 a munição estava armazenada no paiol da Companhia e correspondia às sobras de treinamentos da tropa que participaria do Batalhão Brasileiro em missão de paz do Brasil no Haiti.
Após as investigações, concluiu-se que o material bélico encontrado com o traficante pertencia à Companhia de Comando da 11ª Brigada de Infantaria Leve e que havia sido vendido pelo sargento responsável pelo controle de munições para um dos comandantes do tráfico daquele bairro. O sargento também teria dado fim a 48 granadas.
Após denúncia do Ministério Público Militar, foi instaurada Ação Penal Militar junto à primeira instância da Justiça Militar União, em São Paulo, onde foram denunciados o civil traficante; o sargento que vendeu a munição; um major, Comandante da Companhia de Comando à época, dois tenentes temporários do Exército, responsáveis direto pelo paiol e pelas munições.
Em julho de 2018, o Conselho Especial de Justiça da 1ª Auditoria de São Paulo decidiu condenar o civil que comprou a munição a três anos de reclusão, pelo crime de receptação (artigo 254 do Código Penal Militar).
Já o sargento responsável pelo paiol, foi condenado a dois anos de reclusão pelo desaparecimento e extravio do material (artigo 265 do Código Penal Militar). O major e os dois tenentes foram condenados na forma culposa. O primeiro a dois anos de suspensão do exercício do posto e os dois oficiais subalternos a um ano de detenção, cada um deles.
A defesa de todos os acusados e ainda o Ministério Público Militar recorreram da decisão junto ao Superior Tribunal Militar (STM), em Brasília. O MPM por achar muito brandas as penas aplicadas ao sargento e ao traficante. E a defesa dos acusados pedia absolvição, por falta de provas.
Majoração das penas
Antes de finalizar o processo criminal, o sargento e os dois tenentes, por serem temporários, não tiveram o contrato renovado com o Exército e passaram à condição de civil.
No STM, ao analisar os recursos, em sede de apelação, o ministro relator Odilson Sapaio Benzi decidiu por acatar o pedido do Ministério Público Militar e aumentar as penas aplicadas ao sargento e ao réu civil traficante.
O relator afirmou que, após analisar o conjunto probatório, foi possível concluir que o então sargento era o principal agente controlador de toda a munição armazenada no quartel e explicou que sua condição privilegiada possibilitou o desaparecimento de grande quantidade de itens bélicos.
Segundo o ministro Benzi, no entanto, não havia como atribuir todo o “descontrole” e toda a “negligência”, que resultaram no crime apenas ao sargento, uma vez que o problema não aconteceu “da noite para o dia”. “Pelo contrário, era uma situação que, segundo o conjunto de provas contidas no feito, vinha de alguns anos e, pelo que se observou, tudo leva a crer que outros militares daquele quartel igualmente contribuíram, direta ou indiretamente, para o extravio do material bélico em questão”, concluiu.
O ministro decidiu acolher parcialmente o pedido do MPM para aumentar a pena em mais seis meses.
“Como bem ressaltou o MPM, a sentença levou em consideração a extensão do dano, mas não considerou a gravidade do fato praticado pelo réu, pois, de fato, o destino final desses artefatos de grosso calibre e de alto poder destrutivo retirados do interior do quartel em que o então sargento servia era, sem dúvida alguma, o crime organizado e as quadrilhas especializadas nos mais variados tipos de roubos. Aumentando, consideravelmente, por um lado, o poderio bélico desses marginais e fragilizando, mais ainda, por outro, a população, que fica cada vez mais intimidada, acuada e refém desse tipo de criminosos”, declarou.
Quanto ao réu civil, o ministro decidiu acolher o pedido do Ministério Público para fixar a pena em 4 anos. A majoração foi justificada pela gravidade dessa modalidade de delito, que envolve o aliciamento de militares e ex-militares para o submundo do crime.
O magistrado citou também a sentença do Conselho de Justiça: “É notório o fato de que o destino dessa espécie de munição .50 sejam as organizações criminosas especializadas em roubo (…) no transporte de valores. Não é incomum nos noticiários televisivos depararmos com imagens aterrorizantes de criminosos fortemente armados destruindo a blindagem de carros-forte, com o uso de tiros .50, verdadeiro arsenal de guerra.”
O plenário do STM decidiu seguir o voto do relator e aumentou a pena do ex-sargento para dois anos e seis meses e a do civil para 4 anos de reclusão.
Apelação 7000811-18.2018.7.00.0000
Assista à íntegra do julgamento, que foi transmitido ao vivo pela internet