Os filhos de um trabalhador vitimado por acidente de trabalho garantiram, na justiça, o direito de receber reparação por danos morais reflexos pela morte do pai. Também chamado de dano em ricochete, ele ocorre quando a lesão atinge uma pessoa, mas quem sente os efeitos é outra, geralmente alguém que tem estreita relação familiar ou social com a vítima.
Empregado de uma propriedade rural no município de Cocalinho, na divisa entre Mato Grosso e Goiás, o trabalhador faleceu poucas horas após ser atingido na cabeça por um mourão de madeira que se quebrou quando ele fazia uma cerca do pasto na fazenda.
Julgado inicialmente na Vara do Trabalho de Água Boa (MT), os pedidos de indenizações foram negados. A sentença concluiu que o acidente ocorreu por culpa exclusiva do trabalhador, que teria agido com imprudência.
EPIs
Os três filhos mais velhos recorreram ao Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (MT) argumentando que o pai não tinha experiência na atividade que desempenhava no momento do acidente e que cumpria ordens sem que tivesse recebido equipamentos de proteção individual (EPIs) ou treinamento.
Por maioria, a Primeira Turma do Tribunal modificou a sentença ao reconhecer que o empregador também contribuiu para o acidente e, desta forma, a sua responsabilidade em arcar com o pagamento de indenizações pelos danos à família. A reparação por parte da fazenda foi fixada, no entanto, em 50% do dano, tendo em vista o reconhecimento da culpa recíproca entre os envolvidos no caso.
Danos reflexos
Ao dar início à análise do pedido apresentado ao TRT, a relatora do recurso, juíza convocada Rosana Caldas, apontou se tratar de uma típica ação de indenização por danos reflexos que, no judiciário trabalhista, envolve, em regra, morte decorrente de acidente de trabalho e os efeitos da ausência da vítima entre aqueles com os quais ela mantinha vínculos afetivos.
No caso, lembrou ser presumível o sofrimento e o abalo de ordem moral dos filhos pela ausência permanente do pai, independentemente de residirem na mesma cidade ou de serem dependentes financeiros.
Quanto à indenização por danos morais, a relatora salientou ser impossível a qualquer pessoa afirmar saber exatamente qual a medida do sofrimento pelo qual passa uma mãe, um pai ou os filhos pela morte inesperada e prematura de um ente querido, “mas ninguém ignora que também passaria por sofrimento semelhante caso se encontrasse em idêntica situação.”
Nesse sentido, e na ausência de um sistema objetivo para aquilatar o preço da dor moral, deve-se levar em conta critérios como a posição social da vítima, a situação econômica do ofensor, a culpa pelo ocorrido, dentre outros.
A quantificação da indenização, lembrou a relatora, tem o intuito de compensar os dissabores causados pelo dano moral, e não restituir, o que é impossível no caso de falecimento. Ela ressaltou, ainda, que nesse arbitramento o magistrado deve buscar a solução que melhor traduza o sentimento de justiça no ofendido e na sociedade, observando o princípio da razoabilidade e proporcionalidade. “Deve-se, pois, buscar uma solução humanista que ao mesmo tempo não destoe da lógica jurídica.”
Com base nesses parâmetros, fixou em R$ 120 mil o valor da reparação moral. Entretanto, a quantia efetivamente a ser paga pela fazenda deve ser reduzida em 50%, tendo em vista a culpa concorrente da vítima no acidente, resultando em uma indenização de R$ 60 mil, a ser dividida em partes iguais entre os três filhos que ajuizaram a ação.
Dependência econômica
A Turma indeferiu, no entanto, o pagamento de pensão pedida pelos dois filhos que, na data do falecimento, em dezembro de 2016, tinham 17 e 19 anos de idade. Ao pedir a reparação por danos materiais, eles alegaram que dependiam economicamente do pai.
Apesar da condição de dependência poder ser presumida para filhos, especialmente até 21 anos de idade, essa presunção é relativa e deve ser comprovada quando não mais residem com os pais, constituíram sua própria família ou se sustentam pelo exercício de alguma atividade econômica.
No caso, ambos já não moravam mais com o pai: a filha vivia em uma união estável em outro município e o filho residia em localidade distinta. Além disso, eles não comprovaram a dependência econômica em relação ao trabalhador falecido.
Fonte: TRT da 23ª Região (MT)