Compensação
Compensação ocorre quando o
credor também possui uma dívida a ser paga para o devedor, razão pela qual
deverá haver um encontro de contas entre os dois e as duas obrigações irão ser extintas
até onde se compensarem.
A compensação está prevista no 368 do CC:
Art. 368. Se duas pessoas forem ao
mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até
onde se compensarem.
A compensação pode ser total ou
parcial.
Ex1: João deve R$ 10 mil a Pedro
e Pedro deve R$ 10 mil a João. As duas obrigações serão extintas.
Ex2: João deve R$ 10 mil a Pedro
e Pedro deve R$ 7 mil a João. Haverá uma compensação parcial; a dívida de Pedro
para com João deixa de existir e João continuará devendo R$ 3 mil a Pedro.
Imagine a seguinte situação
hipotética:
João deve R$ 100 mil a Pedro.
Essa dívida surgiu em 2018.
Como não houve o pagamento, em
2022, Pedro ajuizou ação de cobrança contra ele.
Ao ser citado, João apresentou
contestação admitindo que existe a dívida. Alegou, contudo, que Pedro também
lhe deve R$ 80 mil. Essa dívida surgiu em 2014.
Diante disso, João pediu a
compensação das obrigações e que, ao final, só tenha que pagar R$ 20 mil.
Pedro se insurgiu contra isso
argumentando que:
1) não é possível arguir
compensação em contestação;
2) esses R$ 80 mil que João está cobrando
estão prescritos desde 2019. Como estamos em 2022, não é mais possível exigir a
quantia ainda que para fins de compensação.
Recapitulando o cenário:
• Em 2014, venceu um débito segundo
o qual Pedro deveria pagar R$ 80 mil a João. Não pagou.
• Em 2018, venceu um débito
segundo o qual João deveria pagar R$ 100 mil a Pedro. Não pagou.
• Em 2019, a pretensão de João
cobrar os R$ 80 mil prescreveu.
• Em 2022, Pedro ajuizou ação
contra João cobrando os R$ 100 mil.
O primeiro argumento de
Pedro está correto?
NÃO.
A compensação de dívida pode ser alegada em contestação.
A compensação é meio extintivo da obrigação, caracterizando-se
como defesa substancial de mérito ou espécie de contradireito do réu.
A compensação pode ser alegada em contestação como matéria de
defesa, independentemente pedido reconvencional, em obediência aos princípios
da celeridade e da economia processual.
STJ. 3ª Turma. REsp 1524730-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas
Cueva, julgado em 18/8/2015 (Info 567).
Vale ressaltar também que a
compensação pode ser alegada em embargos à execução (STJ. 3ª Turma. REsp
1.969.468-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 22/02/2022).
O segundo argumento de
Pedro está correto?
Também NÃO.
O Código Civil, ao tratar sobre a compensação, preconiza:
Art. 369. A compensação efetua-se
entre dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis.
A partir desse dispositivo,
podemos elencar alguns requisitos para que seja possível a compensação:
1) Reciprocidade das dívidas;
2) Liquidez das dívidas;
3) Certeza das dívidas;
4) Fungibilidade (homogeneidade)
das dívidas;
5) Exigibilidade das dívidas (o
CC fala em “vencidas”, mas a doutrina diz que se deve ler “exigíveis”).
As dívidas prescritas não
são compensáveis
Como vimos acima, para que as
dívidas sejam compensáveis, elas devem ser exigíveis.
Se uma dívida está prescrita,
isso significa que ela não é mais exigível.
Logo, se uma dívida está prescrita
ela não pode ser utilizada para fins de compensação.
Não se pode afirmar, no entanto,
que a obrigação prescrita não possa ser, em nenhuma hipótese, objeto de
compensação.
Deve-se analisar se a
dívida estava prescrita no momento em que houve a coexistência das dívidas
A prescrição somente obstará
(impedirá) a compensação se ela for anterior ao momento da coexistência das
dívidas. Se o prazo prescricional se completou posteriormente a esse fato, tal
circunstância não constitui empecilho à compensação dos débitos. Foi justamente
o exemplo dado acima. No momento em que surgiu a dívida de João para com Pedro (2018),
a dívida de Pedro para com João ainda existia. Logo, houve um período de
coexistência de dívidas exigíveis.
Reforçando a explicação:
• se a prescrição se completou
antes da coexistência das dívidas, a parte que se beneficia da prescrição pode
se negar a fazer a compensação alegando justamente que a prescrição extingue a
pretensão, e, portanto, falta o requisito da exigibilidade para que aquela se
efetue;
• por outro lado, se os dois
créditos coexistiram antes de ocorrer a prescrição, ocorreu a compensação, ipso
iure (por força de lei). A prescrição que venha completar-se posteriormente
a esse fato não mais atua sobre os débitos desaparecidos.
Em suma:
A prescrição somente obsta a compensação se for
anterior ao momento da coexistência das dívidas.
STJ. 3ª
Turma. REsp 1.969.468-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 22/02/2022 (Info
726).
Qual é a razão disso?
No direito civil, diz-se que a “compensação
opera por força de lei”. Isso significa que no momento em que coexistem as
dívidas a compensação ocorre de pleno direito, mesmo que não haja naquele
instante uma declaração judicial.
Por essa razão, se a compensação
é alegada em juízo, a sentença não é constitutiva (não é a sentença que faz a
compensação). A sentença será declaratória de algo que já aconteceu, tendo efeitos
ex tunc, retroagindo à data da coexistência dos créditos.