Análise do art. 1º-D da Lei 9.494/97


Olá queridos amigos do Dizer o Direito,

Como foi o feriado? Tomara que tenham
descansado bastante ou aproveitado o tempo para revisar os estudos atrasados.

Por aqui foi muito trabalho para tentar
deixar o site em dia 🙂

Hoje vamos tratar sobre um assunto difícil,
mas que é de fundamental importância para quem estuda para os concursos da
ADVOCACIA PÚBLICA.

Iremos analisar aqui o famigerado art. 1º-D
da Lei 9.494/97, que tem a seguinte redação:

Art.
1º-D. Não serão devidos honorários advocatícios pela Fazenda Pública nas
execuções não embargadas.  (Incluído pela
Medida provisória nº 2.180-35/2001)

Mas antes de chegarmos a esse artigo, vamos
fazer uma breve introdução.

REGIME
DE PRECATÓRIOS

Se a Fazenda Pública Federal, Estadual,
Distrital ou Municipal for condenada, por sentença judicial transitada em
julgado, a pagar determinada quantia a alguém, este pagamento será feito, em
regra, sob um regime especial chamado de “precatório” (art. 100 da CF/88).

Exceção ao regime de precatórios

O § 3º do art. 100 da CF prevê uma
exceção ao regime de precatórios. Estabelece este dispositivo que, se a
condenação imposta à Fazenda Pública for de “pequeno valor”, o pagamento será
realizado sem a necessidade de expedição de precatório.

Pequeno
valor

Quanto é “pequeno valor” para os fins
do § 3º do art. 100?

Este quantum poderá ser estabelecido
por cada ente federado (União, Estado, DF, Município) por meio de leis
específicas, conforme prevê o § 4º do art. 100:

§ 4º Para os fins do disposto no § 3º,
poderão ser fixados, por leis próprias, valores distintos às entidades de
direito público, segundo as diferentes capacidades econômicas, sendo o mínimo
igual ao valor do maior benefício do regime geral de previdência social.

União

Para as condenações envolvendo a União,
pequeno valor equivale a 60
salários mínimos
(art. 17, § 1º, da Lei n.° 10.259/2001).

E se o ente federado não editar a lei
prevendo o
quatum do “pequeno valor”?

Nesse caso, segundo o art. 87 do ADCT
da CF/88, para os entes que não editarem suas leis, serão adotados, como
“pequeno valor” os seguintes montantes:

I – 40 salários mínimos para Estados e
para o Distrito Federal;

II – 30 salários mínimos para
Municípios.

RPV

Nas hipóteses de “pequeno valor”, o
pagamento é feito por meio de requisição de pequeno valor (RPV), que se trata
de uma ordem expedida pela autoridade judicial à autoridade da Fazenda Pública
responsável para pagamento da quantia devida.

Impossibilidade de o credor receber
parte em RPV e o restante em precatório:

É vedado o fracionamento, repartição ou
quebra do valor da execução para que o credor receba parte do valor devido sem
precatório (como pequeno valor) e o restante por precatório (§ 8º do art. 100,
da CF). Ex: José tinha direito de receber da União 70 salários mínimos; não
pode receber 60 salários mínimos agora (sem precatório) e deixar para receber
os 10 salários mínimos restantes por meio de precatório.

Possibilidade de renunciar ao que
excede o “pequeno valor” para receber sem precatório

O credor poderá, no entanto, renunciar
ao valor que exceder o quantum de
pequeno valor para receber tudo sem precatório. Ex: João tinha direito de
receber da União 70 salários mínimos; decide renunciar a 10 salários mínimos e
receber todos os 60 salários mínimos sem precatório. Isso está previsto no
parágrafo único do art. 87 do ADCT da CF/88.

EXECUÇÃO
CONTRA A FAZENDA PÚBLICA (arts. 730 e 731 do CPC)

O procedimento no caso de execução
contra a Fazenda Pública pode ser assim resumido:

Citação da Fazenda Pública para
embargar

No caso de ser proposta execução contra
a Fazenda Pública, a legislação prevê que o Poder Público será citado para,
querendo, opor embargos à execução (embargos do devedor), no prazo de 30 dias (o art. 1º B da Lei 9.494/97 ampliou o prazo previsto no
art. 730, caput, do CPC).

Assim, a defesa típica da Fazenda
Pública, na execução contra ela proposta, são os embargos à execução.

Vale ressaltar que não se aplicam à
Fazenda Pública as regras do cumprimento de sentença (art. 475-I e ss.), não
havendo aplicação da multa de 10% de que trata o art. 475-J, por exemplo.

O que a Fazenda Pública poderá alegar
nos embargos à execução?

• Se a execução for fundada em título
judicial: as matérias do art. 741 do CPC.

• Se a execução for fundada em título
extrajudicial: as defesas previstas no art. 745 do CPC.

Se a Fazenda Pública apresentar
embargos

Recebidos os embargos, a execução fica
suspensa.

O magistrado determinará que o exequente/embargado
seja ouvido no prazo de 15 dias.

Em seguida, o juiz julgará
imediatamente o pedido (art. 330) ou designará audiência de conciliação,
instrução e julgamento, proferindo sentença no prazo de 10 dias.

Caso os embargos à execução sejam
julgados improcedentes, a execução continuará com a requisição de precatório e a Fazenda Pública será condenada a pagar honorários advocatícios ao
exequente/embargado
.

Se a Fazenda Pública NÃO apresentar
embargos

Nessa hipótese, o juiz deverá expedir o
precatório e encaminhá-lo ao Presidente do Tribunal.

Se a
Fazenda Pública não embargou a execução, ela, mesmo assim, será condenada a
pagar honorários advocatícios ao exequente?

Regra
geral: NÃO

O art.
1º-D da Lei n.° 9.494/97
afirma que “não serão devidos honorários
advocatícios pela Fazenda Pública nas execuções não embargadas
.”

EXCEÇÃO:

A Fazenda Pública será condenada a pagar honorários ao
exequente, mesmo que não apresente embargos à execução, caso a dívida cobrada
seja enquadrada como de pequeno valor (§ 3º do art. 100 da
CF).

Resumindo:

• o art. 1º-D da Lei 9.494/97 é válido apenas para as
execuções contra a Fazenda Pública envolvendo a sistemática de precatórios
(art. 100, caput);

• o art. 1º-D da Lei 9.494/97 NÃO se aplica no caso
execuções contra a Fazenda Pública cobrando dívidas de pequeno valor (§ 3º do
art. 100 da CF/88), nas quais o precatório é dispensado.

Foi o que decidiu o STF:

(…) Fazenda Pública: execução não
embargada: honorários de advogado: constitucionalidade declarada pelo Supremo
Tribunal, com interpretação conforme ao art. 1º-D da L. 9.494/97, na redação
que lhe foi dada pela MPr 2.180-35/2001, de modo a reduzir-lhe a aplicação à
hipótese de execução por quantia certa contra a Fazenda Pública (C. Pr. Civil,
art. 730), excluídos os casos de pagamento de obrigações definidos em lei como
de pequeno valor (CF/88, art. 100, § 3º).

STF. Plenário. RE 420816, Rel. p/
Acórdão Min. Sepúlveda Pertence, julgado em 29/09/2004.

EXEQUENTE
QUE INICIA COBRANDO DÍVIDA SOB A SISTEMÁTICA DO PRECATÓRIO, MAS DEPOIS RENUNCIA
AO EXCEDENTE PARA RECEBER EM RPV

Imagine agora a seguinte situação:

Maria propôs uma execução contra a
União cobrando uma dívida equivalente a 80 salários-mínimos (execução segundo a
sistemática dos precatórios).

A União foi citada para apresentar
embargos, tendo, contudo, decidido não embargar.

Não tendo sido embargada, não caberia,
como vimos, a condenação em honorários (art. 1º-D).

Ocorre que, em momento posterior, a
parte exequente mudou de ideia e decidiu renunciar ao excedente do limite para
pagamento de RPV e passou a pleitear a fixação da verba sucumbencial.

Em outras palavras, Maria resolveu
renunciar aos 20 salários-mínimos e quis mudar a execução para cobrança de
dívida de pequeno valor (sem precatório).

A exequente poderia ter feito isso?

SIM. Conforme analisado acima, o credor
poderá renunciar ao valor que exceder o quantum de pequeno valor para receber
tudo sem precatório. Isso está previsto no parágrafo único do art. 87 do ADCT
da CF:

Parágrafo único.
Se o valor da execução ultrapassar o estabelecido neste artigo, o pagamento
far-se-á, sempre, por meio de precatório, sendo facultada à parte exequente a
renúncia ao crédito do valor excedente, para que possa optar pelo pagamento do
saldo sem o precatório, da forma prevista no § 3º do art. 100.

Nesse caso, em que a execução contra a
Fazenda Pública iniciou-se sob a sistemática do precatório e, posteriormente, o
exequente mudou de ideia e renunciou ao excedente pedindo a dívida como sendo
de pequeno valor, haverá a aplicação do art. 1º-D?

SIM. Segundo o STF e o STJ, caso o
exequente, após a propositura da execução, tenha renunciado ao valor excedente e
pleiteado apenas o teto da “dívida de pequeno valor”, neste caso a Fazenda
Pública não será condenada a pagar honorários advocatícios, aplicando-se o art.
1º-D.

Confira recente julgado do STF nesse
sentido:

(…) No presente caso, a renúncia ao
valor excedente àquele previsto no artigo 87 do ADCT para a expedição da
requisição de pequeno valor ocorreu com o ajuizamento da execução.

5. O Poder Público não deu causa ao
ajuizamento da execução, não podendo, por conseguinte, ser condenado ao
pagamento de honorários advocatícios. (…)

STF. 1ª Turma. RE 679164 AgR, Rel. Min.
Luiz Fux, julgado em 11/12/2012.

O STJ pacificou o tema em recurso
repetitivo:

(…) A renúncia ao valor excedente ao
previsto no art. 87 do ADCT, manifestada após a propositura da demanda
executiva, não autoriza o arbitramento dos honorários, porquanto, à luz do
princípio da causalidade, a Fazenda Pública não provocou a instauração da Execução,
uma vez que se revelava inicialmente impositiva a observância do art. 730 CPC,
segundo a sistemática do pagamento de precatórios. Como não foram opostos
Embargos à Execução, tem, portanto, plena aplicação o art. 1°-D da Lei
9.494/1997. (…)

STJ. 1ª Seção. REsp 1406296/RS, Rel. Min.
Herman Benjamin, julgado em 26/02/2014.

Quadro-resumo:

EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA

Fazenda não embargou. Será condenada em honorários?

Cobrando dívida superior ao previsto
no art. 87 do ADCT (sistemática do precatório).

NÃO

Cobrando dívida inferior ao previsto
no art. 87 do ADCT (pequeno valor – dispensa de precatório).

SIM

O exequente iniciou a execução
cobrando dívida superior ao previsto no art. 87 do ADCT, mas depois renunciou
ao excedente para receber em RPV.

NÃO

É isso aí pessoal. Tema difícil,
repleto de detalhes, mas muito importante para Advocacia Pública.

Bons estudos!

Artigo Original em Dizer o Direito

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