Breves comentários ao Decreto 9.412/2018, que atualizou os valores previstos no art. 23 da Lei de Licitações


MODALIDADES DE
LICITAÇÃO

A Lei nº 8.666/93 prevê “modalidades” de licitação. Isso
significa que, a depender do objeto ou serviço que se irá contratar e também a
depender do valor dessa contratação, a lei obriga que o administrador público
adote determinada modalidade de licitação.

A Lei nº 8.666/93, em seu art. 23, prevê cinco modalidades
de licitação:

I – concorrência;

II – tomada de preços;

III – convite;

IV – concurso;

V – leilão.

Obs: fora da Lei nº 8.666/93 existem ainda o pregão e a consulta.

Características de cada uma das modalidades:

Concorrência: é a modalidade de licitação mais complexa
e rigorosa da Lei nº 8.666/93, sendo utilizada para contratações que envolvem
grandes quantias. Envolve quaisquer interessados e exige uma publicidade maior.
Nesta espécie, os interessados deverão, já na fase inicial da habilitação
preliminar, comprovar que possuem os requisitos mínimos de qualificação
exigidos no edital para execução de seu objeto.

Tomada de preços: é considerada a modalidade intermediária.
Nesta espécie, a competição ocorre entre interessados devidamente cadastrados
ou que atenderem a todas as condições exigidas para cadastramento até o
terceiro dia anterior à data do recebimento das propostas, observada a
necessária qualificação.

Convite: é a modalidade de licitação destinada para
contratações de menor valor. Nesta espécie, é a administração que envia
cartas-convite para, pelo menos, 3 empresas do ramo, a fim de que apresentem
suas propostas.

Concurso: é a modalidade de licitação para escolher trabalho
técnico, científico ou artístico, mediante a instituição de prêmios ou
remuneração aos vencedores.

Leilão: é a modalidade de licitação utilizada quando
a Administração Pública quer vender:

a) bens móveis inservíveis para a administração (até R$ 650
mil);

b) produtos legalmente apreendidos ou penhorados;

c) bens imóveis, cuja aquisição haja derivado de
procedimentos judiciais ou de dação em pagamento.

Perceba que as três modalidades utilizadas para a contratação de
compras e serviços são a concorrência, a tomada de preços e o convite. A
pergunta que surge é a seguinte: qual é o critério que define a modalidade de
licitação que deverá ser utilizada?

O art. 23 da Lei nº 8.666/93 prevê que esse critério é baseado
no valor da contratação:

Art. 23. As modalidades de licitação a
que se referem os incisos I a III do artigo anterior serão determinadas em
função dos seguintes limites, tendo em vista o valor estimado da contratação:

I – para obras e serviços de
engenharia:

a) convite – até R$ 150.000,00 (cento
e cinquenta mil reais);

b) tomada de preços – até R$
1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais);

c) concorrência: acima de R$
1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais);

II – para compras e serviços não
referidos no inciso anterior:

a) convite – até R$ 80.000,00 (oitenta
mil reais);

b) tomada de preços – até R$
650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil reais);

c) concorrência – acima de R$
650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil reais).  

Esse art. 23 pode ser assim resumido:

Modalidade

Obras e serviços de engenharia

Compras e serviços que não sejam de engenharia

CONVITE

Até R$ 150 mil

Até R$ 80 mil

TOMADA DE PREÇOS

Até R$ 1 milhão e 500 mil

Até R$ 650 mil

CONCORRÊNCIA

Acima de R$ 1 milhão e 500 mil

Acima de R$ 650 mil

Qual era o “problema”?

Esses limites foram estipulados em 1998 pela Lei nº 9.648/98.

Já havia se passado 20 anos e os valores encontravam-se
desatualizados.

O poder de compra de R$ 8 mil em 1998 não é o mesmo de 2018
em virtude da inflação.

Assim, esses valores tornaram-se muito abaixo da realidade
do mercado e “engessaram” o administrador público.

Diante desse cenário, o que fez o Governo Federal?

O Presidente da República editou um decreto atualizando os
valores do art. 23 da Lei nº 8.666/93.

Trata-se do Decreto nº 9.412/2018. Veja o que diz o art. 1º
do Decreto:

Art. 1º Os valores estabelecidos nos
incisos I e II do caput do art. 23 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993,
ficam atualizados nos seguintes termos:

I – para obras e serviços de
engenharia:

a) na modalidade convite – até R$
330.000,00 (trezentos e trinta mil reais);

b) na modalidade tomada de preços –
até R$ 3.300.000,00 (três milhões e trezentos mil reais); e

c) na modalidade concorrência – acima
de R$ 3.300.000,00 (três milhões e trezentos mil reais); e

II – para compras e serviços não
incluídos no inciso I:

a) na modalidade convite – até R$
176.000,00 (cento e setenta e seis mil reais);

b) na modalidade tomada de preços –
até R$ 1.430.000,00 (um milhão, quatrocentos e trinta mil reais); e

c) na modalidade concorrência – acima
de R$ 1.430.000,00 (um milhão, quatrocentos e trinta mil reais).

ATUALIZAÇÃO DO DECRETO 9.412/2018

Modalidade

Obras e serviços de engenharia

Compras e serviços que não sejam de engenharia

CONVITE

Antes: até 150 mil

Agora: até 330 mil

Antes: até 80 mil

Agora: até 176 mil

TOMADA DE PREÇOS

Antes: até 1 milhão e 500 mil

Agora: até 3 milhões e 300 mil

Antes: até 650 mil

Agora: até 1 milhão e 430 mil

CONCORRÊNCIA

Antes: acima de 1 milhão e 500 mil

Agora: acima de 3 milhões e 300 mil

Antes: acima de 650 mil

Agora: acima de 1 milhão e 430 mil

Quais são as duas principais consequências?

1) Aumentam as situações nas quais o administrador público
estará autorizado a utilizar a modalidades de CONVITE e TOMADA DE PREÇOS.

Assim, com a atualização do valor, houve uma ampliação dos
casos nos quais a administração pública poderá realizar modalidades menos
complexas de licitação.

Ex: em maio de 2018, se a Administração Pública fosse construir
a sede de um órgão público e esta obra de engenharia fosse orçada em R$ 3
milhões, ela deveria fazer a licitação sob a modalidade concorrência (com
critérios mais rígidos). Se essa mesma construção for feita em agosto de 2018,
a Administração Pública poderá realizar uma tomada de preços.

2) Aumenta o limite de valor (“teto”) que o administrador
público tem para contratar diretamente, sem licitação.

Vamos entender com calma essa segunda consequência nos
tópicos abaixo.

OBRIGATORIEDADE DE LICITAÇÃO

Regra:
obrigatoriedade de licitação

Como
regra, a CF/88 impõe que a Administração Pública somente pode contratar obras,
serviços, compras e alienações se realizar uma licitação prévia para escolher o
contratante (art. 37, XXI).

Exceção: contratação direta
nos casos especificados na legislação

O
inciso XXI do art. 37 da CF/88 afirma que a lei poderá especificar casos em que
os contratos administrativos poderão ser celebrados sem esta prévia licitação.
A isso, a doutrina denomina “contratação direta”.

Resumindo:

A
regra na Administração Pública é a contratação precedida de licitação. Contudo,
a legislação poderá prever casos excepcionais em que será possível a
contratação direta, sem licitação.

CONTRATAÇÃO DIRETA

A
Lei de Licitações (Lei nº 8.666/93) prevê três grupos de situações em que a
contratação ocorrerá sem licitação prévia. Trata-se das chamadas licitações
dispensadas, dispensáveis e inexigíveis. Vejamos o quadro comparativo abaixo:

Dispensada

Dispensável

Inexigível

Art. 17

Art. 24

Art. 25

Rol taxativo

Rol taxativo

Rol exemplificativo

A lei determina a não realização da licitação, obrigando a contratação
direta.

A lei autoriza a não realização da licitação. Mesmo sendo dispensável,
a Administração pode decidir realizar a licitação (discricionariedade).

Como a licitação é uma
disputa, é indispensável que haja pluralidade de objetos e pluralidade de
ofertantes para que ela possa ocorrer. Assim, a lei prevê alguns casos em que
a inexigibilidade se verifica porque há impossibilidade jurídica de
competição.

Ex.: quando a Administração
Pública possui uma dívida com o particular e, em vez de pagá-la em espécie,
transfere a ele um bem público desafetado, como forma de quitação do débito.
A isso chamamos de dação em pagamento (art. 17, I, “a”).

Ex.: compras de pequeno valor
(inciso II).

Ex.: contratação de artista
consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública para fazer o show do aniversário da cidade.

LICITAÇÃO DISPENSÁVEL

O art. 24 da Lei nº 8.666/93 prevê um rol de situações nas
quais seria possível realizar uma licitação, mas a lei desobriga (dispensa) o
administrador de fazer o procedimento licitatório.

Licitação dispensável pelo pequeno valor

Duas hipóteses bem conhecidas de licitação dispensável estão
nos incisos I e II do art. 24 da Lei nº 8.666/93. Veja:

Art. 24.  É dispensável a licitação:

I – para obras e serviços de
engenharia de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea
“a”, do inciso I do artigo anterior, desde que não se refiram a
parcelas de uma mesma obra ou serviço ou ainda para obras e serviços da mesma
natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e
concomitantemente;

II – para outros serviços e compras de
valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea “a”, do
inciso II do artigo anterior e para alienações, nos casos previstos nesta Lei,
desde que não se refiram a parcelas de um mesmo serviço, compra ou alienação de
maior vulto que possa ser realizada de uma só vez;

A redação dos incisos é um pouco confusa, mas o que ele quer
dizer é o seguinte:

• Inciso I: o administrador público pode optar por realizar
a contratação direta (ou seja, sem licitação), no caso de obras ou serviços de
engenharia se o valor não for maior do que 10% do limite previsto no art. 23, I,
“a”.

• Inciso II: o administrador público pode optar por realizar
a contratação direta (ou seja, sem licitação), no caso de compras e serviços
(que não sejam de engenharia) cujo valor não seja maior do que 10% do limite
previsto no art. 23, II, “a”.

E quais são os limites previstos no art. 23, I, “a” e II, “a”?

Inciso I

O inciso I, alínea “a” do art. 23 prevê R$ 150 mil:

Art. 23. As modalidades de licitação a
que se referem os incisos I a III do artigo anterior serão determinadas em
função dos seguintes limites, tendo em vista o valor estimado da contratação:

I – para obras e serviços de
engenharia:

a) convite – até R$ 150.000,00 (cento
e cinquenta mil reais);

Logo, 10% desse valor representava R$ 15 mil.

Inciso II

O inciso II, alínea “a” do art. 23 (obras e serviços que não
sejam de engenharia) prevê R$ 80 mil:

Art. 23. As modalidades de licitação a
que se referem os incisos I a III do artigo anterior serão determinadas em
função dos seguintes limites, tendo em vista o valor estimado da contratação:

II – para compras e serviços não
referidos no inciso anterior:

a) convite – até R$ 80.000,00 (oitenta
mil reais);

Logo, 10% desse valor representava R$ 8 mil.

Conjugando o art. 24, I e II com o art. 23, I, “a” e II, “a”, o cenário
que se TINHA era o seguinte:

CONTRATAÇÃO DIRETA PELO PEQUENO VALOR

Não era necessário fazer licitação no caso de…

Obras
ou serviços de engenharia:

se
o valor não fosse maior do que R$ 15 mil.

Compras
e serviços diferentes de engenharia:

se
o valor não fosse maior que R$ 8 mil.

Fundamento:
art. 24, I c/c art. 23, I, “a”

Fundamento:
art. 24, II c/c art. 23, II, “a”

O que aconteceu?

Como vimos, os valores previstos no art. 23 foram ampliados
pelo Decreto nº 9.412/2018.

Como o art. 24, I e II faz remissão (referência) ao art. 23,
os limites do art. 24, I e II foram também, por via de consequência, ampliados.

Vamos relembrar:

ATUALIZAÇÃO DO DECRETO 9.412/2018

Modalidade

Obras e serviços de engenharia

Compras e serviços que não sejam de engenharia

CONVITE

Antes: até 150 mil

Agora: até 330 mil

Antes: até 80 mil

Agora: até 176 mil

TOMADA DE PREÇOS

Antes: até 1 milhão e 500 mil

Agora: até 3 milhões e 300 mil

Antes: até 650 mil

Agora: até 1 milhão e 430 mil

CONCORRÊNCIA

Antes: acima de 1 milhão e 500 mil

Agora: acima de 3 milhões e 300 mil

Antes: acima de 650 mil

Agora: acima de 1 milhão e 430 mil

Diante disso, com essa mudança nos valores do art. 23, veja como ficou
o reflexo na contratação direta dos incisos I e II do art. 24:

CONTRATAÇÃO
DIRETA PELO PEQUENO VALOR (ART. 24, I e II)

(Com a atualização do Decreto 9.412/2018)

Pode haver contratação direta (sem licitação) nos
seguintes casos:

Obras
ou serviços de engenharia:

Antes: para haver a contratação direta, o valor deveria
ser até R$ 15 mil.

Agora: o valor da obra ou do serviço deve ser de
até R$ 33 mil.

Compras
e serviços diferentes de engenharia:

Antes: o valor da compra ou do serviço deveria ser
de até R$ 8 mil.

Agora: para contratar sem licitação, o valor da
compra ou do serviço deve ser de até R$ 17.600,00 (17 mil e 600 reais).

Alguns de vocês devem estar se perguntando: mas como é possível que um
Decreto “altere” os valores que estão previstos em uma lei? Como o Decreto nº
9.412/2018 pode ter atualizado os valores trazidos pelo art. 23 da Lei nº
8.666/93?

Por mais estranho que pareça, a autorização para isso está
no art. 120 da Lei nº 8.666/93:

Art. 120.  Os valores fixados por esta Lei poderão ser
anualmente revistos pelo Poder Executivo Federal, que os fará publicar no
Diário Oficial da União, observando como limite superior a variação geral dos
preços do mercado, no período.

Como a produção de uma lei é bem mais demorada que a de um decreto,
a intenção do legislador foi a de dinamizar esse processo, permitindo uma
atualização rápida. Vale ressaltar, no entanto, a ressalva feita ao final no
sentido de que essa atualização deve respeitar “a variação geral dos preços do
mercado, no período”. Em outras palavras, não se trata de um aumento real, mas
sim de uma mera recomposição da variação dos preços no período.

Esse Decreto nº 9.412/2018 produz também efeitos no âmbito das
Administrações Públicas estadual, distrital e municipal? Em outras palavras, ele
vale também para Estados, DF e Municípios?

SIM. As normas gerais da Lei nº 8.666/93 são aplicáveis no
âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
O Decreto nº 9.412/2018 foi editado com base na autorização conferida pelo art.
120 da Lei nº 8.666/93, que outorga ao “Poder Executivo Federal” a atribuição
de atualizar os valores fixados na Lei de Licitações. Logo, o Decreto editado
produz efeitos para todos os entes.

Vacatio legis

O Decreto nº 9.412/2018 possui vacatio legis de 30 dias e entra
em vigor em 19/07/2018.

Artigo Original em Dizer o Direito

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