Clubes de futebol e Justiça buscam soluções para execução de dívidas trabalhistas

Descobrir o esquema tático do adversário, o afastamento de algum titular ou o árbitro da partida são problemas enfrentados por um time quando entra em campo. Entretanto, uma preocupação que pode comprometer uma temporada inteira de trabalho tem origem fora dos gramados. Estamos falando do endividamento dos clubes de futebol resultante de condenações em ações trabalhistas movidas por jogadores e por empregados.

A fim de equacionar o problema, a Justiça do Trabalho vem buscando mecanismos que possam facilitar o cumprimento das obrigações devidas. Esse é um dos campos de atuação da Comissão Nacional de Efetividade da Execução Trabalhista. Instituída em 2011 no âmbito do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), a comissão tem como objetivo planejar ações para dar maior efetividade a essa fase processual e tornar o resultado concreto para a parte vencedora da ação.

Para o ministro Cláudio Brandão, gestor nacional da comissão, o problema referente ao endividamento dos clubes é bastante complexo. “Não é que o futebol mereça algum tratamento especial em face da lei”, ressalta. “Mas, muitas vezes, os clubes têm passivos elevados”. Essa circunstância, para o ministro, atrapalha a execução.

Outra dificuldade enfrentada é a tentativa de indicação de bens para o pagamento das dívidas. O ministro explica que o patrimônio dos clubes em geral se limita a um estádio e um centro de treinamento. “Em razão da vinculação afetiva por parte dos torcedores, às vezes a penhora desses bens causa impacto numa comunidade bastante grande”, destaca.

Regime centralizado de execução

Preocupada com os grandes devedores, a Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho (CGJT), com o auxílio da Comissão de Efetividade da Execução, editou o Provimento 1/2018. A medida uniformiza os procedimentos de reunião de execuções na Justiça do Trabalho.

Segundo o ministro Cláudio Brandão, a execução centralizada, para os clubes de futebol, equivale a uma recuperação judicial. “De um lado reúnem-se todos os credores, e de outro levanta-se o passivo do clube”, explica. “Num terceiro momento, viabiliza-se uma forma para resolver a pendência que o clube possui”.

Entretanto, ele adverte que, para a obtenção de resultados satisfatórios, é necessário transparência. “Quem procura a central de execução tem que abrir as suas contas e colocar suas receitas à disposição do juiz, para que ele possa viabilizar um projeto de liquidação do passivo no prazo que for ajustado”, observa.

Ao centralizar a execução de suas dívidas, o clube se compromete também a não aumentar o passivo com o inadimplemento de obrigações relativas à Previdência Social e ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), por exemplo. Entre os exemplos bem-sucedidos da iniciativa, o ministro cita as negociações com o Cube de Regatas Flamengo, do Rio de Janeiro (RJ), e com o Guarani Futebol Clube, de Campinas (SP), que conseguiram zerar todo o seu passivo.

Penhora de bilheteria

É comum lermos notícias sobre a penhora da renda da bilheteria de jogos para a quitação de dívidas com jogadores e empregados. “O oficial de justiça vai à bilheteria e separa da cota que cabe ao clube executado o valor destinado à execução da dívida trabalhista”, observa o ministro. Esses valores são então colocados à disposição do juízo da execução, que definirá sua destinação.

Segundo Cláudio Brandão, o clube, como qualquer pessoa física ou jurídica que tenha contra si uma condenação, tem a obrigação de quitar a dívida. “Se o clube tem patrimônio, esse pode ser constrito para efeito de alienação posterior e quitação da dívida”.

Fair play financeiro

O fair play financeiro (FFP, na sigla em inglês) foi criado e aprovado na Europa em 2010 visando melhorar a saúde financeira e promover uma gestão mais responsável dos clubes europeus de futebol. A proposta entrou efetivamente em funcionamento em 2011 para as competições da Union of European Football Associations (UEFA). Desde então, os times, para se qualificarem a disputar uma das muitas competições da liga europeia, devem comprovar a quitação de dívidas fiscais, previdenciárias, com os próprios jogadores e também em relação a outros clubes, como no caso de empréstimos de atletas.

No Brasil, a ideia básica do FFP já é discutida por dirigentes dos grandes clubes de futebol, mas ainda carece de regulamentação. O primeiro passo em relação à negociação das dívidas fiscais foi dado em 2015 com a criação do Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro (Profut), do governo federal.

Pelas regras do Profut, os clubes se comprometem, na adesão, a não atrasar os salários e as parcelas relativas ao direito de imagem, a regularizar as ações trabalhistas e a utilizar no máximo 80% da receita bruta com o futebol profissional. Em contrapartida, o governo permite o refinanciamento das dívidas num prazo de 20 anos (240 parcelas)

Para o ministro Cláudio Brandão, as normas criadas com o objetivo de sanar as finanças dos clubes de futebol, impondo-lhes uma gestão mais responsável, são bem-vindas. “A medida é muito bem recebida por todos, desde os torcedores até os juízes que tratam das questões relacionadas às obrigações trabalhistas não satisfeitas pelos clubes”, avalia.

O ministro considera que tais regras, se postas em prática, podem, a médio e a longo prazo, estabelecer para o futebol uma realidade mais consentânea com uma vida financeira saudável. “O que importa, efetivamente, não é a regra, mas o seu efetivo cumprimento”, conclui.

(DA/CF)



Com informações do Tribunal Superior do Trabalho

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