Comentários à Lei 13.301/2016, que prevê amparo assistencial e licença-maternidade estendida em caso de microcefalia decorrente do Aedes aegypti



Olá amigos do Dizer o Direito,
Foi publicada hoje a Lei nº
13.301/2016, que prevê diversas medidas de vigilância em saúde para combater o
mosquito transmissor da dengue, chikungunya e zika.
Um dos pontos mais polêmicos e
importantes desta Lei é que ela autoriza o ingresso forçado de agentes públicos
em imóveis públicos e particulares para eliminar criadouros do mosquito Aedes aegyptie. Tratei com detalhes
sobre esta tema em outro post, que recomendo a leitura.
Aqui, irei falar sobre dois
outros aspectos trazidos pela Lei nº 13.301/2016:
• Benefício de prestação
continuada a crianças que nasceram com microcefalia decorrentes de doenças
transmitidas pelo Aedes aegyptie;
• Licença-maternidade de 180 dias
para mães de crianças acometidas por sequelas neurológicas decorrentes de
doenças transmitidas pelo Aedes aegypti.
I – BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA
I.1 NOÇÕES GERAIS SOBRE O BPC
Benefício mensal de um salário
mínimo para pessoa com deficiência ou idoso
A CF/88 estabelece, em seu art. 203, V:
Art. 203. A assistência social será
prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade
social, e tem por objetivos:
(…)
V – a garantia de um salário mínimo de
benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso
que comprovem não possuir
meios
de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua
família, conforme dispuser a lei.
A fim de dar cumprimento a esse comando
constitucional, foi editada a Lei nº 8.742/93 que, em seus arts. 20 a 21-A,
disciplinou como seria pago esse benefício.
Nomenclatura
O art. 20 da Lei nº 8.742/93 denomina
esse direito de “Benefício de Prestação Continuada”.
Ele também pode ser
chamado pelos seguintes sinônimos: “Amparo Assistencial”, “Benefício Assistencial” ou “LOAS”.
Em que consiste esse benefício:
Pagamento de um salário-mínimo por
mês

à pessoa com deficiência; ou
Desde que comprove não
possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua
família.

ao idoso com 65 anos ou mais.
Para receber esse
benefício, é necessário que a pessoa contribua ou tenha contribuído para a
seguridade social?
NÃO. Trata-se de um benefício de
assistência social, que será prestado a quem dele necessitar, independentemente
de contribuição à seguridade social. A assistência social é caracterizada por
ser um sistema não-contributivo, ou seja, é prestada independentemente de
contribuição.
Quem administra e concede esse
benefício?
Apesar de o LOAS não ser um
benefício previdenciário, mas sim assistencial, ele é concedido e administrado
pelo INSS. Vale ressaltar, no entanto, que os recursos necessários ao seu
pagamento são fornecidos pela União (art. 29, parágrafo único, da Lei nº 8.742/93).
Assim, a competência para julgar ações
que discutam esse benefício é da Justiça Federal.
Inacumulável
A pessoa que recebe o amparo
assistencial não pode receber ao mesmo tempo outro benefício no âmbito da
seguridade social ou de outro regime, salvo assistência médica e pensão especial
de natureza indenizatória (art. 20, § 4º).
Renda que a lei considera como
sendo insuficiente para subsistência
A Lei nº 8.742/93 prevê, no seu art.
20, § 3º:
§ 3º Considera-se incapaz de prover a
manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per
capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.
Vale ressaltar, no entanto, que esse
critério não é absoluto. O Plenário do STF declarou, incidentalmente, a
inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93 (sem pronúncia de
nulidade) por considerar que o referido critério está defasado para caracterizar
a situação de miserabilidade. O STF afirmou que, para aferir que o idoso ou
deficiente não tem meios de se manter, o juiz está livre para se valer de
outros parâmetros, não estando vinculado ao critério da renda per capita inferior a 1/4 do
salário-mínimo previsto no § 3º do art. 20.
STF. Plenário. RE 567985/MT e RE
580963/PR, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, julgados em 17 e 18/4/2013
(Info 702).
Desse modo, como a declaração de
inconstitucionalidade foi sem pronúncia de nulidade, o critério definido pelo
art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 continua existindo no mundo jurídico, mas
devendo agora ser interpretado como um indicativo objetivo que não exclui a
possibilidade de o juiz verificar a hipossuficiência econômica do postulante do
benefício por outros meios de prova (STF. 1ª Turma. ARE 834476 AgR, Rel. Min.
Dias Toffoli, julgado em 03/03/2015).
É como o STJ também vem decidindo:
(…) O limite legal estabelecido no
art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 não é critério absoluto, de modo que a
necessidade/miserabilidade do postulante pode ser comprovada de outras
maneiras. (…) (STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 1341655/SP, Rel. Min. Castro
Meira, julgado em 06/08/2013)
(…) A jurisprudência do STJ
pacificou-se no sentido de que a limitação do valor da renda per capita
familiar não deve ser considerada a única forma de provar que a pessoa não
possui outros meios para prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua
família, pois é apenas um elemento objetivo para aferir a necessidade, ou seja,
presume-se absolutamente a miserabilidade quando demonstrada a renda per capita
inferior a 1/4 do salário-mínimo. Orientação reafirmada no julgamento do REsp
1.112.557/MG, sob o rito dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC). (STJ. 2ª
Turma. AgRg no AgRg no AREsp 617.901/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em
05/05/2015)
Desse modo, o que eu queria que
você entendesse é que, mesmo após a decisão do STF nos RE 567985/MT e RE 580963/PR, o art. 20,
§ 3º, da Lei nº 8.742/93 continua sendo um dos critérios para se aferir a
miserabilidade, sem prejuízo de outros. Assim, na prática, se a renda familiar
mensal per capita for superior a 1/4
do salário mínimo e não houver outras provas que atestem a miserabilidade, o
benefício assistencial será negado.
Novo § 11 do art. 20 da Lei nº 8.742/93
O legislador, de forma acertada,
encampou o entendimento jurisprudencial acima explicado e, por meio da Lei nº
13.146/2015, inseriu o § 11 ao art. 20 da Lei nº 8.742/93 prevendo o seguinte:
§ 11. Para concessão do benefício de
que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos
probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de
vulnerabilidade, conforme regulamento.
O que se entende por renda familiar
mensal
per
capita? Como isso é calculado?
Normalmente, um assistente social
vai até a residência da pessoa que está requerendo o benefício e faz
entrevistas com ela e os demais moradores da casa, indagando sobre as fontes de
renda de cada, verificando as condições estruturais do lar, os móveis e eletrodomésticos
existentes no local etc.
Após isso, é elaborado um laudo
social.
A renda familiar mensal per
capita é calculada da seguinte forma: soma-se todos os rendimentos dos membros
da família que moram na mesma casa que o requerente do benefício e depois
divide-se esse valor pelo número de familiares (incluindo o requerente). Ex.:
Carla (pessoa com deficiência) mora com seus pais (João e Maria) e mais um
irmão (Lucas). João e Maria trabalham e ganham um salário mínimo, cada. Cálculo
da renda mensal per capita: 2 salários mínimos divididos por 4 pessoas = 2:4.
Logo, a renda mensal per capita será igual a 1/2 do salário mínimo. Neste
exemplo, a renda familiar mensal per capita será maior do que o teto imposto
pelo art. 20,
§ 3º, da Lei nº 8.742/93. Mesmo assim, o juiz poderá conceder o benefício,
desde que existam outras provas que atestem a miserabilidade da requerente. Não
havendo, contudo, tal comprovação, o benefício será negado.
O que se entende por família?
Para os fins da renda familiar do LOAS,
a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na
ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos
e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto
(art. 20, § 1º).
I.2 BPC E A LEI 13.301/2016
Sabemos que um dos grandes e
tristes males causados pelo vírus da zika é que, se uma gestante for infectada,
existe o risco de que a criança, ao nascer, apresente problemas neurológicos,
dentre eles a chamada microcefalia. Pensando nisso, o que fez a Lei nº
13.301/2016?
A Lei nº 13.301/2016 previu que a
criança vítima de microcefalia decorrente de doenças transmitidas pelo Aedes aegypti possui direito de receber,
pelo prazo de 3 anos, o benefício de prestação continuada (BPC) que estudamos
acima. Veja a redação legal:
Art.
18. Fará jus ao benefício de prestação continuada temporário, a que se refere o
art. 20 da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, pelo prazo máximo de três
anos, na condição de pessoa com deficiência, a criança vítima de microcefalia
em decorrência de sequelas neurológicas decorrentes de doenças transmitidas
pelo Aedes aegypti.
(…)
§
2º O benefício será concedido após a cessação do gozo do salário-maternidade
originado pelo nascimento da criança vítima de microcefalia.
Presunção de deficiência
O BPC a que se refere o art. 20
da Lei nº 8.742/93 pode ser concedido para dois grupos de pessoas:
a) pessoas com deficiência; ou
b) idosos maiores de 65 anos.
O conceito de pessoa com
deficiência está previsto no art. 20, § 2º da Lei nº 8.742/93:
Art. 20 (…)
§ 2º Para efeito de
concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em
igualdade de condições com as demais pessoas.
Os médicos estimam que cerca de
90% dos bebês com microcefalia apresentarão atraso significativo no desenvolvimento
neurológico, psíquico e/ou motor. Desse modo, a criança com microcefalia, na
esmagadora maioria dos casos, pode ser enquadrada no conceito de pessoa com
deficiência.
O art. 18 da Lei nº 13.301/2016,
no entanto, optou por facilitar a situação e fixar uma presunção legal
(absoluta, iure et de iure): a
criança com microcefalia é pessoa com deficiência para fins de recebimento de
BPC.
Assim, ao requerer o benefício,
bastará ser provada a microcefalia e, como consequência, a criança já será
considerada pessoa com deficiência.
Não há como comprovar que a
microcefalia é decorrente do Aedes aegypti
O art. 18 exige que a criança
tenha sido “vítima de microcefalia em decorrência de sequelas neurológicas
decorrentes de doenças transmitidas pelo Aedes aegypti.”
Trata-se de previsão infundada e
praticamente inexequível.
Nem mesmo a medicina conseguiu
estabelecer, com precisão, a exata relação entre o vírus zika e a microcefalia.
Sabe-se que existe a relação, mas não como ela ocorre com detalhes. É possível
até mesmo que uma mulher seja infectada pelo vírus antes de estar grávida e
transmiti-lo ao feto algum tempo depois. É uma suposição. A única certeza é que
não há certezas ainda sobre este tema.
Desse modo, mostra-se completamente
inoportuno associar o pagamento do benefício ao fato de a vítima da
microcefalia ter adquirido a enfermidade em decorrência de doenças transmitidas
pelo Aedes aegypti.
É importante relembrar que os
sintomas da zika são parecidos com o de uma gripe ou outra virose e é
extremamente comum que a pessoa infectada não faça exames para confirmar se a
moléstia que a acometeu era realmente zika ou não. Na esmagadora maioria dos municípios
brasileiros, este exame nem é facilmente encontrado nos postos de saúde, de
forma que a gestante não terá condições de comprovar que a microcefalia de seu
filho foi decorrente de uma doença transmitida pelo Aedes aegypti.
Por isso, sustento que, para a concessão
do benefício, não se exige que a mãe requerente (ou qualquer outro responsável)
comprove que a microcefalia da criança é decorrente de sequelas neurológicas de
doenças transmitidas pelo Aedes aegypti. Esta parte do dispositivo deve ser
tida como não-escrita, considerando que nem mesmo a medicina dispõe de
instrumentos para fazer essa correlação, tratando-se, portanto, de exigência
inexequível.
Necessário comprovar a
miserabilidade
O benefício de prestação
continuada (art. 20 da Lei nº 8.742/3) pago à pessoa com deficiência exige a
configuração de dois requisitos: deficiência + miserabilidade. Veja novamente a
redação legal:
Art. 20. O benefício de
prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos
ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria
manutenção nem de tê-la provida por sua família
.
O art. 18 da Lei nº 13.301/2016
faz remissão ao art. 20 da Lei nº 8.742/93. Isso significa que, mesmo no caso
de bebês com microcefalia decorrentes do Aedes
aegypti
, eles só poderão receber o benefício caso fique comprovado que a
sua família não tem condições econômicas de prover o seu sustento.
Em outras palavras, o amparo
assistencial previsto no art. 18 da Lei nº 13.301/2016 deve ser analisado em
conjunto com os demais requisitos do art. 20 da Lei nº 8.742/93 e, portanto, só
é destinado às crianças vítimas de microcefalia que sejam economicamente “miseráveis”,
conforme os critérios adotados pela Lei e pela jurisprudência. Sendo
repetitivo: não basta ser vítima de microcefalia decorrente de doenças
transmitidas pelo Aedes aegypti para
ter direito ao BPC.
Veto ao § 1º do art. 18
Como reforço à conclusão acima
exposta (exigência da comprovação da miserabilidade), devemos mencionar o veto
aposto ao § 1º do art. 18 da Lei nº 13.301/2016, que estabelecia o seguinte:
“§ 1º Para efeito da primeira
concessão do benefício, presume-se a condição de miserabilidade do grupo
familiar.”
O Presidente da República vetou
este parágrafo sob o argumento de que:
“O dispositivo apresenta
incompatibilidade com as regras atuais do Benefício de Prestação Continuada
(BPC), estabelecidas na Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS (Lei nº 8.742,
de 1993) e já em plena aplicabilidade. O comando constitucional do benefício o
vincula à condição de miserabilidade comprovada, não sendo razoável sua
presunção. Além disso, as regras atuais não impedem o alcance do objetivo da
norma sob sanção, na medida em que já permitem o acesso das crianças com
microcefalia, em situação de vulnerabilidade, ao BPC.”
Dessa forma, o veto aposto e suas
razões corroboram o fato de que é indispensável a comprovação da miserabilidade
do grupo familiar.
Prazo máximo de 3 anos
Pela redação do art. 18 da Lei nº
13.301/2016, o prazo máximo para recebimento do benefício seria de 3 anos.
Para fins de concurso, guardem
este prazo porque poderá ser perguntado nas provas. No entanto, na prática, a
tendência é que as pessoas com microcefalia recebam o benefício por muito mais
tempo que isso. Explico.
A criança com microcefalia, na grande
maioria dos casos, pode ser enquadrada no conceito de pessoa com deficiência
previsto no art. 20, § 2º da Lei nº 8.742/93.
Desse modo, mesmo sem o art. 18
da Lei nº 13.301/2016, a criança com microcefalia já teria, em tese, direito ao
benefício assistencial, desde que preenchesse também o requisito da
“miserabilidade”. E teria este direito com base no art. 20 da Lei nº
8.742/93 que, por sua vez, não prevê prazo máximo para recebimento do benefício
de prestação continuada. Logo, mesmo após acabar o prazo de 3 anos trazido pelo
art. 18 da Lei nº 13.301/2016, a criança com microcefalia poderá continuar
recebendo o benefício, com base no art. 20 da Lei nº 8.742/93, desde que demonstre
que se enquadra no conceito de pessoa com deficiência e que a situação
econômica de sua família não tenha melhorado.
Legislação simbólica
O leitor mais atento já deve ter
percebido que o art. 18 da Lei nº 13.301/2016 não traz novidade significativa. Isso
porque um bebê com microcefalia amolda-se, a meu sentir, no conceito de pessoa
com deficiência previsto no § 2º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 e já teria
direito ao benefício.
Conclui-se que o art. 18 da Lei
nº 13.301/2016 é mais um exemplo de legislação simbólica, que tem como objetivo
chamar atenção para esta situação tão triste e dar demonstrações públicas de
que o Governo tem tomado medidas para minimizar o sofrimento dessas famílias.
II – LICENÇA-MATERNIDADE
Licença-maternidade
A CF/88 garante às mulheres que
tiverem filho uma licença remunerada para que possam durante um tempo se
dedicar exclusivamente à criança. Isso é chamado de licença-maternidade (ou
licença à gestante) e está previsto no art. 7º, XVIII, da CF/88:
Art. 7º São direitos dos
trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua
condição social:
(…)
XVIII – licença à
gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte
dias;
Qual é o prazo da
licença-maternidade?
O prazo da licença-maternidade,
em regra, é de 120 dias, nos termos do art. 7º, XVIII, da CF/88.
Vale ressaltar, no entanto, que,
em 2008, o Governo, com o objetivo de ampliar o prazo da licença-maternidade,
editou a Lei nº 11.770/2008 por meio de um programa chamado “Empresa
Cidadã”.
Este programa prevê que a pessoa
jurídica que possua uma empregada que tenha um filho(a) poderá conceder a ela
uma licença-maternidade não de 120, mas sim de 180 dias. Em outras palavras, a
CF/88 fala que o prazo mínimo é de 120 dias, mas a empresa pode conceder 180
dias.
As empresas não são obrigadas a
dar os 180 dias e a forma que o Governo idealizou de incentivar que elas
forneçam esses 60 dias a mais foi por meio de incentivos fiscais.
O art. 5º da Lei nº 11.770/2008
previu que a pessoa jurídica que aderir ao programa “empresa cidadã”
poderá deduzir do imposto de renda o total da remuneração integral da empregada
pago nos dias de prorrogação de sua licença-maternidade. Em outras palavras, a
empresa poderá descontar do imposto de renda o valor pago pelos 60 dias a mais
concedidos.
O ponto negativo da Lei nº
11.770/2008 é que este incentivo foi muito tímido, já que a dedução do imposto
de renda só vale para empregadores que sejam pessoas jurídicas tributadas com
base no lucro real (o que exclui a grande maioria das empresas do benefício,
fazendo com que elas não tenham qualquer incentivo para conceder a licença
prorrogada). Em virtude disso, a adesão ao programa é baixíssima.
No âmbito do serviço público, os
órgãos e entidades concedem a licença-maternidade estendida, ou seja, de 180
dias para as servidoras públicas que tenham filhos.
A regra, portanto, é que o prazo
de licença-maternidade seja de 120 dias. O que fez a Lei nº 13.301/2016?
Determinou que, em caso de
empregada que der à luz a criança com microcefalia, a sua licença-maternidade
será de 180 dias. Veja:
Art. 18 (…)
§ 3º A licença-maternidade
prevista no art. 392 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo
Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, será de cento e oitenta dias no
caso das mães de crianças acometidas por sequelas neurológicas decorrentes de
doenças transmitidas pelo Aedes aegypti, assegurado, nesse período, o recebimento
de salário-maternidade previsto no art. 71 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de
1991.
A razão de ser da previsão está
no fato de que uma criança recém-nascida com microcefalia exige maiores
cuidados da mãe, sendo, por isso, justificado um prazo maior de afastamento do
trabalho a fim de que ela possa acompanhá-la de forma mais imediata nos
primeiros dias de sua vida.
Esse prazo dilatado aplica-se às
servidoras públicas?
As servidoras públicas da União e
da quase totalidade dos Estados e Municípios já gozam de licença-maternidade de
180 dias por força da autorização conferida pelo art. 2º da Lei nº 11.770/2008.
No entanto, se ainda houver algum Estado ou Município que não tenha
implementado a medida, penso que seja possível estendê-la às servidoras
públicas, por analogia e, em face do princípio da isonomia, não havendo
justificativa para tratamento diferenciado.
Irrazoabilidade da previsão
restrita aos casos de microcefalia decorrente de doenças transmitidas pelo
Aedes aegypti
O § 3º traz uma previsão socialmente
relevante, mas possui uma visão estreita sobre as políticas voltadas à pessoa
com deficiência.
Não há motivo para que o prazo
dilatado da licença-maternidade fique restrito às mães de crianças com microcefalia
decorrente de doenças transmitidas pelo Aedes
aegypti
. Não há justificativa de negar esse direito para mães de crianças
com microcefalia decorrente de outras causas. Assim como não há razoabilidade
para se excluir desta previsão mães de crianças que nasceram com síndrome de
down e outras deficiências tão severas quanto à microcefalia.
Márcio André Lopes Cavalcante
Professor. Juiz Federal. Foi
Defensor Público, Promotor de Justiça e Procurador do Estado.

Artigo Original em Dizer o Direito

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