13.301/2016, que prevê diversas medidas de vigilância em saúde para combater o
mosquito transmissor da dengue, chikungunya e zika.
iminente perigo à saúde pública pela presença do mosquito transmissor do vírus
da dengue, do vírus chikungunya e do vírus da zika, a autoridade máxima do
Sistema Único de Saúde – SUS de âmbito federal, estadual, distrital e municipal
fica autorizada a determinar e executar as medidas necessárias ao controle das
doenças causadas pelos referidos vírus, nos termos da Lei nº 8.080, de 19 de
setembro de 1990, e demais normas aplicáveis, enquanto perdurar a Emergência em
Saúde Pública de Importância Nacional – ESPIN.
conversão da MP 712/2016, prevê, dentre outras, quatro medidas principais que podem
ser determinadas e executadas para a contenção das doenças transmitidas pelo
mosquito. Confira quais são essas medidas:
destinado a atividades de limpeza nos imóveis, com identificação e eliminação
de focos de mosquitos.
educativas e de orientação à população, em especial às mulheres em idade fértil
e gestantes, divulgadas em todos os meios de comunicação, incluindo programas
radiofônicos estatais.
públicos e particulares
antecipadamente comunicadas a todos os imóveis públicos e particulares, ainda
que com posse precária, para eliminação do mosquito e de seus criadouros.
públicos e particulares
públicos e particulares, no caso de situação de abandono, ausência ou recusa de
pessoa que possa permitir o acesso de agente público, regularmente designado e
identificado, quando se mostre essencial para a contenção das doenças.
autoriza o ingresso forçado de agentes públicos em imóveis públicos e
particulares para eliminar criadouros do mosquito Aedes aegyptie. Trata-se do ponto mais polêmico e relevante da Lei,
razão pela qual irei tecer abaixo alguns comentários a respeito do tema.
um grave problema de saúde pública decorrente da proliferação do Aedes aegyptie, mosquito transmissor do vírus
da dengue, do vírus chikungunya e do vírus da zika.
Muitas vezes esses reservatórios de água estão dentro das propriedades
privadas, como é o caso de pneus velhos que ficam guardados em quintais,
garrafas usadas de refrigerantes, pratinhos com água embaixo dos vasos de
planta etc.
portanto, em grande medida, da conscientização da população no sentido de que
deve eliminar de suas casas quaisquer reservatórios que sirvam para a
reprodução do Aedes.
governos federal, estadual e municipal têm enviado agentes de saúde e militares
para visitar a população em suas casas, oportunidade em que verificam se em
tais locais existem potenciais criadouros do mosquito.
no entanto, uma grande dificuldade: diversos imóveis visitados estão
aparentemente abandonados, mas com suas portas fechadas, o que impede o
ingresso das equipes de combate às endemias. Em outros casos, o imóvel está
habitado, mas os moradores não estão em casa no momento da visita. Há ainda a
desagradável situação em que o morador simplesmente se recusa a permitir a
entrada dos agentes de saúde.
autoridades podem fazer? Será possível que o servidor responsável pela visita ingresse
no imóvel mesmo sem autorização do morador?
delito de violação de domicílio
afirma que:
inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador,
salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou,
durante o dia, por determinação judicial;
tipifica o crime de invasão de domicílio:
permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou
tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências:
três meses, ou multa.
pessoas no imóvel que pudessem autorizar a visita no interior da casa, as
equipes de fiscalização viam-se forçadas a ir embora com receio de, ao entrarem
compulsoriamente no local, serem acusadas da prática do delito do art. 150 do
CP.
alguns Estados e Municípios (ex: SP) editaram leis permitindo o ingresso
forçado dos agentes de endemias. Em outros locais, os Municípios decretaram
situação de emergência e, por meio de decreto, autorizaram o direito de entrar
nos imóveis mesmo sem o consentimento do morador. Invocavam, para tanto, as
disposições da Lei Federal n.º 6.437/77 Tais medidas, contudo, ainda geravam
questionamentos quanto à sua constitucionalidade e receio dos agentes públicos.
questão, foi editada a Lei nº 13.301/2016 (fruto da conversão da MP 712/2016), que
autoriza expressamente o ingresso forçado dos agentes públicos nos imóveis a
fim de executarem medidas de combate ao mosquito Aedes aegyptie. Veja novamente o que texto da Lei:
iminente perigo à saúde pública pela presença do mosquito transmissor do vírus
da dengue, do vírus chikungunya e do vírus da zika, a autoridade máxima do
Sistema Único de Saúde – SUS de âmbito federal, estadual, distrital e municipal
fica autorizada a determinar e executar as medidas necessárias ao controle das
doenças causadas pelos referidos vírus, nos termos da Lei nº 8.080, de 19 de
setembro de 1990, e demais normas aplicáveis, enquanto perdurar a Emergência em
Saúde Pública de Importância Nacional – ESPIN.
determinadas e executadas para a contenção das doenças causadas pelos vírus de
que trata o caput, destacam-se:
públicos e particulares, no caso de situação de abandono, ausência ou recusa de
pessoa que possa permitir o acesso de agente público, regularmente designado e
identificado, quando se mostre essencial para a contenção das doenças.
2º) previu três hipóteses em que será permitido o ingresso forçado do agente
público no imóvel:
de localização de pessoa que possa permitir o acesso ao imóvel na hipótese de
duas visitas devidamente comunicadas, em dias e períodos alternados, dentro do
intervalo de dez dias;
impedimento de acesso do agente público ao imóvel.
ABANDONO (“imóvel abandonado”).
situação de abandono, para os fins da Lei, é aquele no qual está flagrantemente
demonstrada a ausência prolongada de sua utilização. Ocorre quando está muito
claro que o local há muito tempo não é habitado por ninguém. Isso pode ser constatado
pelas características físicas do imóvel (exs: janelas quebradas, telhas
faltando), por sinais de inexistência de conservação (ex: mato que cresceu dentro
da propriedade), pelo relato de moradores da área ou por outros indícios que evidenciem
a sua não utilização.
possa permitir o acesso do agente público (“AUSÊNCIA DO MORADOR”).
caracterizada esta hipótese, a Lei exige que o agente público tenha visitado
duas vezes o imóvel, em dias e períodos alternados, dentro do intervalo de dez
dias, e mesmo assim não encontre ninguém no local que possa autorizar sua
entrada.
que quando o agente público realizar a tentativa de encontrar o morador, deverá
deixar no local uma notificação a fim de que ele saiba que uma equipe de
combate ao mosquito esteve lá e que irá retornar no outro dia.
negar ou impedir o acesso do agente público ao imóvel (“RECUSA DO MORADOR”).
ao local e encontra o morador na casa, explica a situação e o motivo da visita,
mas ele não autoriza a entrada.
público agora está autorizado, com fundamento na Lei nº 13.301/2016, a ingressar
compulsoriamente no imóvel.
forçado previsto na MP 712/2016 pode ocorrer não apenas nos casos de imóveis
privados, mas também em imóveis públicos.
necessidade de ingresso forçado, o agente público competente deverá emitir um
relatório circunstanciado no local explicando o motivo que autorizou a entrada
(situação de abando ou ausência do morador) e demais circunstâncias envolvidas (art.
3º).
encontrado o imóvel;
adotadas para o controle do vetor e da eliminação de criadouros do mosquito
transmissor do vírus da dengue, do vírus chikungunya e do vírus da zika. Ex:
limpeza em vasos de plantas que havia no local, cobertura de pneus velhos que
estavam acumulando água etc;
observadas pelo responsável (ex: não deixar mais pneus descobertos, limpar
constantemente o quintal etc); e
restabelecer a segurança do imóvel.
o agente público competente poderá requerer auxílio à autoridade policial ou à
Guarda Municipal (art. 3º, § 1º).
realizado buscando-se a preservação da integridade do imóvel e das condições de
segurança em que foi encontrado (art. 2º).
casa do morador, mesmo sem seu consentimento, respeitando os termos da Lei nº
13.301/2016, esta sua conduta será lícita e ele não responderá pelo crime de
violação de domicílio (art. 150 do CP). Para a doutrina tradicional, o
fundamento legal que exclui o crime seria o estrito cumprimento de dever legal
(art. 23 do CP) e para a doutrina mais moderna, seria a teoria da imputação
objetiva (o agente não criou risco proibido).
outras doenças
especificamente sobre mosquito transmissor do vírus da dengue, do vírus
chikungunya e do vírus da zika. No entanto, ela prevê que a autorização para
que os agentes públicos ingressem nos imóveis sem consentimento do morador (art.
1º, § 1º, IV) poderá ser utilizada também para o combate de outras
enfermidades. Veja:
no inciso IV do § 1º do art. 1º aplica-se sempre que se verificar a existência
de outras doenças com potencial de proliferação ou de disseminação ou agravos
que representem grave risco ou ameaça à saúde pública, condicionada à
declaração de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional – ESPIN.
sanitária
à legislação sanitária federal.
Lei nº 13.301/2016 a fim de prever multa aos moradores e proprietários de
imóveis que não cumprirem as determinações para eliminação dos criadouros do Aedes aegyptie.
encontrados focos do mosquito no imóvel, as autoridades deverão alertar o
morador/proprietário sobre este fato e determinar a ele que siga algumas
recomendações para eliminar esses criadouros (ex: cobrir os pneus que estão
expostos pegando chuva, acondicionar adequadamente garrafas em quintal etc). Caso
haja uma nova fiscalização e se verifique que as recomendações não foram
cumpridas, o morador/proprietário poderá ser multado por infração à legislação
sanitária federal. Isso agora está previsto no art. 10, XLII, da Lei nº
6.437/77:
sanitárias:
manutenção de focos de vetores no imóvel por descumprimento de recomendação das
autoridades sanitárias:
por cento) dos valores previstos no inciso I do § 1o do art. 2o, aplicada em
dobro em caso de nova reincidência.
nº 13.301/2016)
o ser vivo com capacidade para transmitir parasitas, bactérias ou vírus a outro
ser ou organismo. Assim, segundo esta concepção, o Aedes aegypti é um vetor.
13.301/2016
pode ser travada diz respeito à constitucionalidade ou não do ingresso forçado
previsto no inciso IV do § 1º do art. 1º da Lei nº 13.301/2016. Isso porque a
CF/88 prevê, em seu art. 5º, XI, as hipóteses em que poderá haver a violação do
domicílio e não elenca, dentre elas, o ingresso forçado para fins de combate a
epidemias ou pandemias.
inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do
morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar
socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;
dispositivo, só se pode entrar na casa de alguém, sem o consentimento do
morador, nas seguintes hipóteses:
Durante o DIA
|
Durante a NOITE
|
• Em caso de flagrante delito;
• Em caso de desastre;
• Para prestar socorro;
• Para cumprir determinação
judicial (ex: busca e apreensão; cumprimento de prisão preventiva). |
• Em caso de flagrante delito;
• Em caso de desastre;
• Para prestar socorro.
|
dúvida: a previsão do inciso IV do § 1º do art. 1º da Lei nº 13.301/2016 é
inconstitucional por violar o art. 5º, XI, da CF/88?
do agente público para fiscalizar possíveis locais dentro da residência da
pessoa onde o mosquito Aedes aegyptie possa
vir a colocar ovos não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas no inciso
XI, não podendo ser classificada como situação de “desastre” ou para
“prestar socorro”, expressões muito intensas e que não se confundem
com mero exercício de poder de polícia preventivo.
IV do § 1º do art. 1º da Lei nº 13.301/2016 não encontra autorização no art.
5º, XI, da CF/88.
previsão do ingresso forçado, na forma como delineada pela Lei nº 13.301/2016,
não se revela inconstitucional, devendo ser realizado no caso uma ponderação
dos interesses envolvidos.
consiste em direito fundamental inerente à pessoa humana. Ocorre que não se
trata de um direito absoluto. Assim, pode ser restringido, desde que observado
o princípio da proporcionalidade.
aparente entre dois valores protegidos pelo Direito: de um lado, a liberdade
individual dos moradores; e de outro, a vida e a saúde desses mesmos indivíduos
e de toda a coletividade, que devem ser protegidas pelo Estado.
ponderação dos interesses envolvidos: ou restringe-se a liberdade individual,
ou então haverá um grave e real risco à saúde de toda a sociedade (incluindo os
proprietários e/ou moradores do imóvel). Não há dúvidas de que, no presente
contexto, deverá preponderar a proteção à vida e à saúde, havendo uma restrição
à liberdade individual.
imposta pela Lei nº 13.301/2016 à inviolabilidade de domicílio é pontual,
específica, temporária e mínima.
em três situações excepcionais (imóvel abandonado, morador não encontrado ou
recusa do morador). Além disso, o ingresso compulsório tem apenas uma
finalidade: encontrar possíveis focos de criadouro do mosquito, eliminando-os. Ressalte-se,
ainda, que não haverá qualquer prejuízo ao morador, já que os agentes públicos
não irão adentrar na casa para produzir provas contra ele (não se trata de
investigação criminal) nem para retirar de lá seus bens (não é uma medida de
busca e apreensão ou de penhora). Logo, não há violação ao devido processo
legal (art. 5º, LIV, da CF/88).
necessário buscar autorização judicial todas as vezes em que o imóvel estiver
fechado o trabalho de fiscalização restaria inviabilizado, além de
sobrecarregar o Poder Judiciário. Segundo dados oficiais, desde que a campanha
de combate ao mosquito se iniciou, com os primeiros casos de Zika Vírus, as
equipes de saúde já encontraram cerca 2,7 milhões de domicílios fechados no
momento das visitas. Seria inimaginável ter que exigir uma ação judicial para
cada uma dessas casas.
Lei nº 13.301/2016 é adequada, necessária e proporcional, sendo a solução que melhor
atende a proteção da saúde pública, que é um dever constitucional do Estado
(art. 196), havendo uma mínima intervenção na inviolabilidade do domicílio.
Defensor Público, Promotor de Justiça e Procurador do Estado.