Expropriação por cultivo de drogas pode ser afastada se o proprietário provar que não teve culpa


Art. 243 da CF/88

O art. 243 da CF/88 prevê o
seguinte:
Art. 243. As propriedades
rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas
ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma
da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de
habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de
outras sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no art.
5º.
Parágrafo único. Todo e
qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será
confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica, na forma da
lei.
Desapropriação confiscatória

A doutrina denomina este art. 243
de “desapropriação confiscatória” em virtude de não conferir ao
proprietário direito à indenização, como ocorre com as demais espécies de
desapropriação (CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2016, p. 1044).
Outros autores preferem falar em “confisco” (MORAES, Alexandre. Constituição do Brasil interpretada e
legislação constitucional
. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 2135).
Pressupostos

Existem dois motivos que geram
esse confisco:
a) o fato de no imóvel estarem
localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas; ou
b) o fato de no imóvel haver exploração
de trabalho escravo.
Extensão da expropriação

A expropriação irá recair sobre a
totalidade do imóvel, ainda que o cultivo ilegal ou a utilização de trabalho
escravo tenham ocorrido em apenas parte dele. Nesse sentido: STF. Plenário. RE
543974, Rel. Min. Eros Grau, julgado em 26/03/2009.
Procedimento

As regras e o procedimento para
essa expropriação estão disciplinados na Lei nº 8.257/91 e no Decreto nº
577/92. Trata-se de um rito muito célere no qual a Lei estipula poucos dias
para a realização de cada ato processual. Veja abaixo o resumo do procedimento:
1. Processo judicial. Para haver a desapropriação confiscatória, é
necessário processo judicial que tramita na Justiça Federal.
2. Petição inicial. A União deverá propor uma demanda chamada de
“ação expropriatória” contra o proprietário do imóvel (expropriado).
Vale ressaltar que apenas a União é competente para realizar a expropriação de
que trata o art. 243 da CF/88, não podendo ser feita pelos outros entes
federativos.
3. Citação. Recebida a inicial, o juiz determinará a citação do
expropriado, no prazo de 5 dias.

4. Perito. Ao ordenar a citação, o Juiz já nomeará um perito para
fazer a avaliação do imóvel. Este deverá entregar o laudo em 8 dias.

5. Audiência. O juiz determinará audiência de instrução e julgamento,
que deverá ser realizada no prazo máximo de 15 dias, a contar da data da
contestação.

6. Mandado de imissão na posse. O juiz poderá imitir, liminarmente, a
União na posse do imóvel expropriando, garantindo-se o contraditório pela
realização de audiência de justificação. Em outras palavras, o magistrado
poderá conceder tutela provisória de urgência determinando que o proprietário
saia do imóvel e este fique na posse da União. Vale ressaltar que o INCRA é
quem irá imitir-se em nome da União (art. 6º do Decreto nº 577/92).

7. Prova testemunhal. Na audiência de instrução e julgamento cada
parte poderá indicar até 5 testemunhas.
8. Oitiva do Ministério Público. A Lei nº 8.257/91 não prevê, mas o
Procurador da República deverá ser ouvido como fiscal da ordem jurídica, nos
termos do art. 178, I, do CPC/2015.
9. Sentença. Encerrada a instrução, o Juiz prolatará a sentença em
cinco dias.
10. Haverá expropriação mesmo que o imóvel esteja em garantia. A
expropriação prevalece sobre direitos reais de garantia, não se admitindo
embargos de terceiro fundados em dívida hipotecária, anticrética ou
pignoratícia.
11. Recurso. Da sentença, caberá apelação.
12. Trânsito em julgado. Transitada em julgado a sentença
expropriatória, o imóvel será incorporado ao patrimônio da União. Em seguida, a
gleba será destinada à reforma agrária e a programas de habitação popular.

O proprietário poderá evitar a
expropriação se provar que não teve culpa pelo fato de estarem cultivando
plantas psicotrópicas em seu imóvel?

SIM.
A
expropriação prevista no art. 243 da Constituição Federal pode ser afastada,
desde que o proprietário comprove que não incorreu em culpa, ainda que in vigilando ou in eligendo.

STF. Plenário. RE 635336/PE, Rel.
Min. Gilmar Mendes, julgado em 14/12/2016 (repercussão geral) (Info 851).
Não se exige que o proprietário
tenha participado

Para que haja a sanção do art.
243 não se exige a participação direta do proprietário no cultivo ilícito. Se o
proprietário não participou, mas agiu com culpa, deverá ser expropriado. Isso
porque a função social da propriedade gera para o proprietário o dever de zelar
pelo uso lícito do seu imóvel, ainda que não esteja na posse direta.
Mesmo tendo esse dever, poderá
provar que não teve como evitar

Esse dever de zelar pelo correto
uso da propriedade não é ilimitado, só podendo ser exigido do proprietário que
evite o ilícito quando estiver ao seu alcance.
Assim, o proprietário pode
afastar sua responsabilidade demonstrando que não incorreu em culpa. Ele pode
provar, por exemplo, que foi esbulhado ou até enganado pelo possuidor ou pelo
detentor.
Se agiu com culpa, aplica-se o
art. 243

Vale ressaltar, mais uma vez,
que, se o proprietário agiu com culpa, deverá ser expropriado.
Essa culpa pode ser in vigilando ou in eligendo:
• Culpa in vigilando é a falta de atenção com a conduta de outra pessoa.
Ocorre quando não há uma fiscalização efetiva.

• Culpa in eligendo consiste na má escolha daquele a quem se confia a
prática de um ato. Também chamada de “responsabilidade pela má eleição”.
Desse modo, se o proprietário
agiu com culpa in vigilando ou in eligendo, deverá incidir o art. 243
da CF/88.
E se houver mais de um
proprietário, o que fazer neste caso?

Se o imóvel pertencer a dois ou
mais proprietários (condomínio), haverá a expropriação mesmo que apenas um
deles tenha participação ou culpa. Restará apenas ao proprietário inocente
buscar reparação daquele que participou ou teve culpa.
Ônus da prova

Importante destacar que cabe ao proprietário
(e não à União) o ônus da prova. Em outras palavras, caberá ao proprietário
provar que não agiu com culpa.

Artigo Original em Dizer o Direito

Deixe um comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.