Lei 13.982/2020: alterações no Benefício de Prestação Continuada previsto na Lei nº 8.742/93


Olá, amigos do Dizer o Direito,
Foi publicada ontem (02/04/2020), a Lei nº 13.982/2020, que:

• promoveu alterações no benefício assistencial previsto na
Lei nº 8.742/93 (LOAS);

• criou um auxílio emergencial para trabalhadores autônomos.

Iremos analisar aqui as modificações promovidas na Lei nº
8.742/93 e, em outro post, a criação do auxílio emergencial.

Vamos dividir o estudo das modificações no LOAS em três
partes:

1) Mudança no critério de miserabilidade previsto no § 3º do
art. 20 da Lei nº 8.742/93;

2) Exclusão do benefício assistencial ou previdenciário de 1
salário-mínimo do cálculo da renda mensal per capita;

3) Ampliação do critério de miserabilidade no período de
pandemia do Covid-19.

1) MUDANÇA NO CRITÉRIO DE MISERABILIDADE PARA FINS DE BPC

Benefício mensal de um salário mínimo para pessoa com deficiência ou
idoso

A CF/88 estabelece, em seu art. 203, V:

Art. 203. A assistência social será
prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade
social, e tem por objetivos:

(…)

V – a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria
manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

A
fim de dar cumprimento a esse comando constitucional, foi editada a Lei nº
8.742/93 que, em seus arts. 20 a 21-A, disciplinou como seria pago esse
benefício.

Nomenclatura

O
art. 20 da Lei nº 8.742/93 denomina esse direito de “Benefício de Prestação
Continuada”. Ele também pode ser chamado pelos seguintes sinônimos: “Amparo
Assistencial”, “Benefício Assistencial” ou “LOAS”.

Em que consiste esse benefício:

Pagamento de um salário-mínimo por mês

• à pessoa com
deficiência; ou

Desde
que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la
provida por sua família.

• ao idoso com
65 anos ou mais.

Para
receber esse benefício, é necessário que a pessoa contribua ou tenha
contribuído para a seguridade social?

NÃO.
Trata-se de um benefício de assistência social, que será prestado a quem dele
necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social. A
assistência social é caracterizada por ser um sistema não-contributivo, ou
seja, é prestada independentemente de contribuição.

Quem
administra e concede esse benefício?

Apesar de o LOAS não ser um benefício previdenciário, mas sim
assistencial, ele é concedido e administrado pelo INSS. Vale ressaltar, no
entanto, que os recursos necessários ao seu pagamento são fornecidos pela União
(art. 29, parágrafo único, da Lei nº 8.742/93).

Assim,
a competência para julgar ações que discutam esse benefício é da Justiça
Federal.

Vimos
acima que a CF/88 afirma que só receberá o benefício as pessoas “que comprovem
não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua
família”. Existe algum critério na Lei para definir isso?

Antes da Lei nº 13.981/2020, a Lei nº
8.742/93 previa o seguinte:

Art. 20 (…)

§ 3º Considera-se incapaz de prover a
manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per
capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.

O STF, no entanto, ao analisar esse
dispositivo afirmou que ele não era absoluto:

Em 2013, o Plenário da Corte declarou a
inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 (sem pronúncia de
nulidade) por considerar que esse critério estava defasado para caracterizar a
situação de miserabilidade.

O STF afirmou que, para aferir que o
idoso ou deficiente não tem meios de se manter, o juiz está livre para se valer
de outros parâmetros, não estando vinculado ao critério da renda per capita inferior a 1/4 do
salário-mínimo previsto no § 3º do art. 20.

O Min. Gilmar Mendes afirmou que “a
economia brasileira mudou completamente nos últimos 20 anos. Desde a
promulgação da Constituição, foram realizadas significativas reformas
constitucionais e administrativas com repercussão no âmbito econômico e
financeiro. A inflação galopante foi controlada, o que tem permitido uma
significativa melhoria na distribuição de renda”. Tais modificações
proporcionaram que fossem modificados também os critérios para a concessão de
benefícios previdenciários e assistenciais que podem ser “mais generosos” que o
parâmetro de 1/4 do salário mínimo mencionado no § 3º do art. 20 acima
referido.

O Relator esclareceu que, atualmente,
os programas de assistência social no Brasil utilizam o valor de 1/2 salário
mínimo como referencial econômico para a concessão de benefícios. Ele ressaltou
que este é um indicador bastante razoável e que, portanto, o critério de 1/4 do
salário mínimo utilizado pela LOAS está completamente defasado e inadequado
para aferir a miserabilidade das famílias.

STF. Plenário. RE 567985/MT e RE
580963/PR, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, julgados em 17 e 18/4/2013
(Info 702).

Esse
foi também o entendimento do STJ:

(…) A Terceira Seção do STJ, ao
apreciar o REsp 1.112.557/MG, submetido à sistemática do art. 543-C do
CPC/1973, firmou a compreensão de que o critério objetivo de renda per capita
mensal inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo – previsto no art. 20, §
3°, da Lei 8.742/93 – não é o único parâmetro para aferir hipossuficiência,
podendo tal condição ser constatada por outros meios de prova.

STJ. 2ª Turma. REsp 1797465/SP, Rel. Min.
Herman Benjamin, julgado em 21/03/2019.

O legislador, de forma acertada,
encampou o entendimento jurisprudencial acima explicado e, por meio da Lei nº
13.146/2015, inseriu o § 11 ao art. 20 da Lei nº 8.742/93 prevendo o seguinte:

Art. 20 (…)

§ 11. Para concessão do benefício de
que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos
probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de
vulnerabilidade, conforme regulamento.

O
que fez a Lei nº 13.981/2020 (publicada em 24/03/2020)?

Atualizou o § 3º do art. 20, aumentando
a renda mensal per capita de 1/4 para 1/2 do salário mínimo:

LEI
Nº 8.742/93

Antes
da Lei 13.981/2020

Depois
da Lei 13.981/2020

Art. 20 (…)

§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa
com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior
a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.

Art. 20 (…)

§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa
com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior
a 1/2 (meio)
salário-mínimo
.

Vale
ressaltar que o projeto que deu origem à Lei nº 13.981/2020 havia sido vetado
pelo Presidente da República, mas o veto foi derrubado e a Lei foi promulgada
pelo Congresso Nacional, entrando em vigor no dia 24/03/2020 (data de sua
publicação).

Ocorre
que a confusão não acabou aí.

No
dia 02/04/2020 foi publicada a Lei nº 13.982/2020, que alterou novamente o § 3º
do art. 20 da Lei nº 8.742/93.

Vamos
entender.

O
que previa o projeto aprovado que deu origem à Lei nº 13.982/2020?

§
3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou
idosa a família cuja renda mensal per capita seja:

I
– igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, até 31 de dezembro de
2020;

II
– igual ou inferior a 1/2 (meio) salário-mínimo, a partir de 1º de janeiro de
2021.

Ocorre
que esse inciso II foi vetado pelo Presidente da República.

Vejamos a evolução histórica:

LEI
8.742/93

Critério objetivo de miserabilidade
para fins de recebimento do BPC

Redação
original

da Lei
8.742/93

Redação
dada pela  

Lei
12.470/2011

Redação
dada pela

Lei 13.981/2020

Redação
dada pela

Lei 13.982/2020

Não
previa

Renda mensal per capita inferior a 1/4 (um
quarto) do SM

Renda
mensal per capita inferior a 1/2 (meio) SM

Regra: renda
mensal per capita

igual ou
inferior a 1/4 (um quarto) do SM até 31/12/2020

Exceção:
pode ampliar para 1/2 do SM no período de calamidade do Covid-19

Essa
é a redação atual do § 3º do art. 20 da Lei nº 13.982/2020:

Art. 20. (…)

§ 3º Considera-se incapaz de prover a
manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per
capita seja:

I – igual ou inferior a 1/4 (um quarto)
do salário-mínimo, até 31 de dezembro de 2020;

II – (VETADO).

Obs:
a exceção está prevista no art. 20-A, que veremos mais abaixo.

Vale
ressaltar que é muito provável que esse veto seja novamente rejeitado pelo
Congresso Nacional e, possivelmente, o inciso II entrará em vigor prevendo o
critério de 1/2 para o ano de 2021. No entanto, atualmente, temos o quadro
acima.

O
que se entende por renda familiar mensal
per
capita? Como isso é calculado?

Normalmente, um assistente social vai até a residência da
pessoa que está requerendo o benefício e faz entrevistas com ela e os demais
moradores da casa, indagando sobre as fontes de renda de cada, verificando as
condições estruturais do lar, os móveis e eletrodomésticos existentes no local
etc.

Após isso, é elaborado um laudo social.

A renda familiar mensal per capita é calculada da seguinte
forma: soma-se todos os rendimentos dos membros da família que moram na mesma
casa que o requerente do benefício e depois divide-se esse valor pelo número de
familiares (incluindo o requerente). Ex.: Carla (pessoa com deficiência) mora
com seus pais (João e Maria) e mais um irmão (Lucas). João e Maria trabalham e
ganham um salário mínimo, cada. Cálculo da renda mensal per capita: 2 salários
mínimos divididos por 4 pessoas = 2:4. Logo, a renda mensal per capita será
igual a 1/2 do salário mínimo.

O
que se entende por família?

Para
os fins da renda familiar do LOAS, a família é composta pelo requerente, o
cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o
padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores
tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art. 20, § 1º).

2) EXCLUIU DO CÁLCULO DA RENDA MENSAL PER CAPITA, O
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL OU PREVIDENCIÁRIO NO VALOR DE 1 SALÁRIO-MÍNIMO RECEBIDO
POR FAMILIAR

Como
vimos acima, o amparo assistencial é um benefício pago aos idosos com mais de
65 anos ou às pessoas com deficiência. Foi dito também que esse benefício está
previsto no art. 20 da Lei nº 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social –
Loas).

Ocorre
que o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003), norma editada 10 anos depois,
também resolveu tratar sobre o assunto e trouxe a seguinte regra:

Art. 34. Aos idosos, a partir de 65
(sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência,
nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um)
salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social – Loas.

Até
aí, tudo bem, sem novidades. No entanto, preste bastante atenção ao que diz o
parágrafo único deste art. 34 do Estatuto do Idoso:

Parágrafo único. O benefício já
concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado
para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas.

O
que disse o parágrafo único: se o idoso pedir o amparo assistencial e for
constatado que alguém de sua família já recebe esse benefício, essa quantia
deverá ser excluída da renda familiar per capita.

Ex:
Maria (65 anos) requereu o amparo assistencial; a assistente social foi até a
sua casa e percebeu que lá vivem as seguintes pessoas:

1)
Maria (a requerente): que não tem renda;

2)
João (cônjuge): que possui 70 anos e recebe BPC idoso;

3)
Pedro (filho): recebe 1 salário-mínimo;

4)
Ricardo (filho): sem renda.

5)
Vitor (filho): sem renda.

Logo,
a renda familiar per capita é de 1 salário-mínimo dividido por 5
pessoas, ou seja, a renda familiar per capita é de 1/5 do salário mínimo. Essa
renda de 1/5 do salário-mínimo atente o critério previsto no art. 20, § 3º, da
Lei nº 8.742/93.

Vale
ressaltar que o valor recebido por João não entra no cálculo da renda familiar per
capita
por força do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso.

Repare
que, se entrasse, a renda per capita familiar seria superior a 1/4 do salário-mínimo.


Se não houvesse o art. 34, parágrafo único: a renda mensal per capita seria 2/5
do salário-mínimo (superior ao critério de 1/4);


Como existe o art. 34, parágrafo único:  a
renda mensal per capita é de 1/5 do salário-mínimo (inferior ao critério de 1/4).

Conclui-se,
portanto, que regra do parágrafo único do art. 34 da Lei nº 10.741/2003 ajuda
bastante o idoso que pede o benefício.

Para
a jurisprudência, o parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso podia ser
aplicado, por analogia, à pessoa com deficiência que pede o amparo
assistencial? Se uma pessoa com deficiência possui em sua família alguém que já
recebe o LOAS, é possível excluir esse valor do cálculo da renda mensal per
capita, assim como é feito com o idoso?

SIM.
Esse era o entendimento tanto do STF como do STJ. Veja como o STF decidiu:

(…) 4. A inconstitucionalidade por
omissão parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. O Estatuto do
Idoso dispõe, no art. 34, parágrafo único, que o benefício assistencial já concedido
a qualquer membro da família não será computado para fins do cálculo da renda
familiar per capita a que se refere a LOAS. Não exclusão dos benefícios
assistenciais recebidos por deficientes e de previdenciários, no valor de até
um salário mínimo, percebido por idosos. Inexistência de justificativa
plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos
idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos
idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário
mínimo. Omissão parcial inconstitucional. 5. Declaração de
inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 34, parágrafo
único, da Lei 10.741/2003. (…)

STF. Plenário. RE 580963, Rel. Min. Gilmar
Mendes, julgado em 18/04/2013.

O
STJ foi mais claro na fixação da tese:

Aplica-se o parágrafo único do art. 34
do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003), por analogia, a pedido de benefício
assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício
previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado
no cálculo da renda per capita prevista no art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993.

STJ. 1ª Seção. REsp 1.355.052-SP, Rel.
Min. Benedito Gonçalves, julgado em 25/2/2015 (recurso repetitivo) (Info 572).

Como
vimos, esse benefício possui fundamento constitucional (art. 203, V, da CF/88)
e a CF/88 não fez distinção de tratamento entre o idoso e o deficiente,
tratando-os igualmente. Assim, conclui-se que há uma inaceitável lacuna
normativa a desproteger os deficientes vulneráveis, lacuna essa que deve ser
suprida com fundamento nos arts. 4º e 5º da LINDB e no parágrafo único do art.
34 do Estatuto do Idoso.

Desse
modo, à luz dos princípios da isonomia e da dignidade humana, faz-se necessário
aplicar a analogia a fim de que o parágrafo único do art. 34 do Estatuto do
Idoso integre também o sistema de proteção à pessoa com deficiência, para
assegurar que o benefício previdenciário, no valor de um salário mínimo,
recebido por idoso que faça parte do núcleo familiar não componha a renda per
capita prevista no § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93.

O
que fez a Lei nº 13.982/2020?

Positivou
o entendimento jurisprudencial acima explicado. Assim, a Lei nº 13.982/2020 acrescentou
o § 14 ao art. 20 da Lei nº 8.742/93 prevendo a mesma regra do parágrafo único
do art. 34 tanto para o idoso como para a pessoa com deficiência. Veja o
dispositivo inserido:

Art.
20 (…)

§
14. O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor
de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco)
anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de
concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com
deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste
artigo.

Vale
ressaltar que o § 14 foi ainda mais generoso que o parágrafo único do art. 34
porque disse que o benefício previdenciário no valor de 1 salário-mínimo
(ex: uma aposentadoria no valor de 1 salário-mínimo) também é excluído do
cálculo da renda mensal per capita. Compare:

Estatuto
do Idoso

Lei
8.742/93 (com a redação

dada
pela Lei 13.982/2020)

Art.
34 (…)

Parágrafo
único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do
caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita
a que se refere a Loas.

Art.
20 (…)

§
14. O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um)
salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade
ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do
benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da
mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste artigo.

Assim,
no exemplo dado acima, se João (cônjuge de Maria) recebesse uma aposentadoria
no valor de 1 salário-mínimo, isso também estaria excluído do cálculo da renda
mensal per capita.

Para reforçar a possibilidade – já aceita
pela jurisprudência – de que duas ou mais pessoa da mesma família podem receber
o benefício, a Lei nº 13.982/2020 inseriu o § 15 com a seguinte redação:

Art.
20 (…)

§
15. O benefício de prestação continuada será devido a mais de um membro da
mesma família enquanto atendidos os requisitos exigidos nesta Lei.

3) AMPLIAÇÃO DO CRITÉRIO DE MISERABILIDADE NO PERÍODO DE
PANDEMIA DO COVID-19

A
Lei nº 13.982/2020 acrescenta ainda um novo artigo à Lei nº 8.742/93 prevendo a
possibilidade de se ampliar o máximo de renda mensal per capita para
concessão do BPC. Em outras palavras, esse novo artigo afirma que, durante o período
de pandemia do Covid-19, o INSS poderá conceder o BPC mesmo que fique
demonstrado que a renda mensal per capita é superior a 1/4 do salário-mínimo,
desde que seja de até 1/2 salário-mínimo e se cumpram determinados requisitos.
Veja o dispositivo inserido:

Art.
20-A. Em razão do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto
Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de
importância internacional decorrente do coronavírus (Covid-19), o critério de
aferição da renda familiar mensal per capita previsto no inciso I do § 3º do
art. 20 poderá ser ampliado para até 1/2 (meio) salário-mínimo.

Vale
explicar mais uma vez: renda mensal per capita de até 1/2 salário-mínimo é maior
do que renda mensal per capita de até 1/4 do salário-mínimo. Isso significa que,
para o requerente, o art. 20-A é mais benéfico porque mesmo tendo uma renda um
pouco maior, ainda se enquadra no critério legal para que seja concedido
administrativamente o benefício.

Regulamento
irá definir como será feita essa ampliação, considerando-se alguns fatores

Art. 20-A (…)

§ 1º A ampliação de que trata o caput
ocorrerá na forma de escalas graduais, definidas em regulamento, de acordo com
os seguintes fatores, combinados entre si ou isoladamente:

I – o grau da deficiência;

II – a dependência de terceiros para o
desempenho de atividades básicas da vida diária;

III – as circunstâncias pessoais e
ambientais e os fatores socioeconômicos e familiares que podem reduzir a
funcionalidade e a plena participação social da pessoa com deficiência
candidata ou do idoso;

IV – o comprometimento do orçamento do
núcleo familiar de que trata o § 3º do art. 20 exclusivamente com gastos com
tratamentos de saúde, médicos, fraldas, alimentos especiais e medicamentos do
idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados gratuitamente pelo
Sistema Único de Saúde (SUS), ou com serviços não prestados pelo Serviço Único
de Assistência Social (Suas), desde que comprovadamente necessários à
preservação da saúde e da vida.

§ 2º O grau da deficiência e o nível de
perda de autonomia, representado pela dependência de terceiros para o
desempenho de atividades básicas da vida diária, de que tratam,
respectivamente, os incisos I e II do § 1º deste artigo, serão aferidos, para a
pessoa com deficiência, por meio de índices e instrumentos de avaliação
funcional a serem desenvolvidos e adaptados para a realidade brasileira,
observados os termos dos §§ 1º e 2º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 6 de julho
de 2015.

§ 3º As circunstâncias pessoais e
ambientais e os fatores socioeconômicos de que trata o inciso III do § 1º deste
artigo levarão em consideração, observado o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 2º
da Lei nº 13.146, de 2015, entre outros aspectos:

I – o grau de instrução e o nível
educacional e cultural do candidato ao benefício;

II – a acessibilidade e a adequação do
local de residência à limitação funcional, as condições de moradia e
habitabilidade, o saneamento básico e o entorno familiar e domiciliar;

III – a existência e a disponibilidade
de transporte público e de serviços públicos de saúde e de assistência social
no local de residência do candidato ao benefício;

IV – a dependência do candidato ao
benefício em relação ao uso de tecnologias assistivas; e

V – o número de pessoas que convivem
com o candidato ao benefício e a coabitação com outro idoso ou pessoa com
deficiência dependente de terceiros para o desempenho de atividades básicas da
vida diária.

§ 4º O valor referente ao
comprometimento do orçamento do núcleo familiar com gastos com tratamentos de
saúde, médicos, fraldas, alimentos especiais e medicamentos do idoso ou da
pessoa com deficiência, de que trata o inciso IV do § 1º deste artigo, será
definido pelo Instituto Nacional do Seguro Social, a partir de valores médios
dos gastos realizados pelas famílias exclusivamente com essas finalidades,
conforme critérios definidos em regulamento, facultada ao interessado a
possibilidade de comprovação, nos termos do referido regulamento, de que os
gastos efetivos ultrapassam os valores médios.

Considerações
finais

Os
parágrafos do art. 20-A preveem critérios complexos, pouco objetivos e de
difícil aferição. Isso tudo para regular uma pequena relativização do requisito
da miserabilidade (de 1/4 para 1/2 do salário-mínimo) e apenas por um período
de tempo.

Não
me parece que tenha sido uma boa alteração.

Melhor
seria ter deixado o critério geral de 1/2 do salário-mínimo já previsto pela Lei
nº 13.981/2020 não apenas durante o período de calamidade pública, mas, principalmente,
depois, quando as camadas mais pobres da sociedade sofrerão imensamente com os
impactos da recessão econômica que assolará o país.

Vale
ressaltar, por fim, que esse critério de 1/4 ou de 1/2 vincula, quando muito,
apenas o INSS na concessão administrativa do benefício. Isso porque, segundo decidiu
o STF, o Poder Judiciário, quando analisa a possibilidade ou não de concessão
judicial do BPC está livre para se valer de outros parâmetros, não estando
vinculado ao critério da renda per capita inferior a 1/4 (ou 1/2) do
salário-mínimo previsto na Lei (STF. Plenário. RE 567985/MT e RE 580963/PR,
red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, julgados em 17 e 18/4/2013).

Márcio André Lopes
Cavalcante

Juiz Federal

Artigo Original em Dizer o Direito

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