Lei 14.126/2021: classifica a visão monocular como deficiência sensorial, do tipo visual


Olá, amigos do Dizer o Direito,

Foi publicada hoje (23/03/2021) a
Lei nº 14.126/2021, que classifica a visão monocular como deficiência
sensorial, do tipo visual.

Vamos entender um pouco mais
sobre o assunto.

 

Conceito jurídico de pessoa
com deficiência

O conceito de pessoa com
deficiência pode ser encontrado no art. 2º da Lei nº 13.146/2015 (Estatuto da
Pessoa com Deficiência):

Art. 2º Considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em
igualdade de condições com as demais pessoas.

 

Convenção de Nova York

Em verdade, a Lei nº 13.146/2015
adotou o conceito de pessoa com deficiência previsto no art. 1º da Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Convenção de Nova
York), assinada em 30/03/2007, aprovada no Congresso Nacional pelo Decreto
Legislativo 186/2008 e promulgada pelo Decreto n. 6.949/2009.

Vale ressaltar que a Convenção de
Nova York possui status de emenda
constitucional em nosso país, considerando que se trata de convenção
internacional sobre direitos humanos que foi aprovada, em cada Casa do
Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos
membros, conforme previsto no § 3º do art. 5º da CF/88.

Desse modo, a Lei nº 13.146/2015
utiliza um conceito de deficiência previsto em norma constitucional (bloco de
constitucionalidade).

 

Visão monocular

Visão monocular é a cegueira de
um dos olhos.

Segundo o critério técnico da Organização
Mundial de Saúde (OMS), a visão monocular ocorre quando o indivíduo possui 20%
ou menos de eficiência visual em um olho.

As dificuldades para uma pessoa
com visão monocular vão além do fato de não enxergar com um dos olhos. A pessoa
com visão monocular sofre uma “perda da noção de profundidade (visão em 3D) e
uma piora na acuidade visual binocular, bem como diminuição significativa (em
torno de 25%) do campo visual periférico. (…) A visão monocular provoca
determinadas limitações nas atividades diárias da pessoa afetada. Isso ocorre,
principalmente, pela dificuldade de localização espacial.” (https://www.hospitalholhos.com.br/noticia/visao-monocular-enxergar-bem-com-apenas-um-dos-olhos-e-considerado-deficiencia-visual/)

 

O indivíduo que possui
visão monocular é considerado pessoa com deficiência?

Mesmo antes da Lei nº 14.126/2021,
prevalecia, na doutrina e jurisprudência, que sim.

O exemplo típico é o caso dos concursos
públicos.

O art. 37, VIII, da CF/88
determina que um percentual das vagas dos concursos públicos deve ser destinado
aos candidatos com deficiência.

Segundo a jurisprudência do STJ e do STF, o indivíduo que apresenta visão
monocular é considerado pessoa com deficiência para fins de concurso público.
Nesse sentido:

Súmula 377-STJ: O portador de visão monocular tem direito de concorrer,
em concurso público, às vagas reservadas aos deficientes.

 

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal assentou o entendimento de
que o candidato com visão monocular é deficiente físico (sic).

STF. 1ª Turma. ARE 760015
AgR, Rel.
Roberto Barroso, julgado em
24/06/2014.

 

Vale ressaltar que esse entendimento é diametralmente oposto no caso de
pessoa com surdez unilateral:

Súmula 552-STJ: O portador de surdez unilateral não se qualifica como
pessoa com deficiência para o fim de disputar as vagas reservadas em concursos
públicos.

 

Essa distinção acima existe por causa do Decreto nº 3.298/99, que regulamentou
a Lei nº 7.853/89, (lei da política nacional para a integração da pessoa com deficiência).

· Para que seja considerada deficiência auditiva, o Decreto nº 3.298/99 exige
que a surdez seja bilateral (art. 4º, II).

· Por outro lado, ao definir deficiência visual (art. 4º, III), o Decreto
não exige que a cegueira seja nos dois olhos.

 

Em outras palavras, o art. 4º do Decreto nº 3.298/99 proíbe que a pessoa
com surdez unilateral seja considerada deficiente auditiva, mas permite que a
pessoa com visão monocular seja enquadrada como deficiente visual. Dessa forma,
a diferença de tratamento foi fixada pelo Decreto com base, supostamente, em
critérios técnicos.

 

O que fez a Lei nº 14.126/2021?

Para que não
houvesse mais qualquer questionamento, afirmou expressamente que a visão
monocular é considerada deficiência:

Art. 1º Fica a visão monocular classificada como
deficiência sensorial, do tipo visual, para todos os efeitos legais.

Parágrafo único. O previsto no § 2º do art. 2º da Lei
nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência),
aplica-se à visão monocular, conforme o disposto no caput deste artigo.

 

Estatuto da Pessoa com
Deficiência:

Art. 2º (…)

§ 2º O Poder Executivo criará
instrumentos para avaliação da deficiência.

 

Duas principais implicações
práticas da Lei nº 14.126/2021:

Vimos acima que, para fins de
vaga em concurso público, o entendimento já era pacífico no sentido de que o
indivíduo com visão monocular poderia ser enquadrado como pessoa com deficiência.

A Lei nº 14.126/2021 terá maior
impacto sob dois aspectos jurídicos: aposentadoria e amparo assistencial.

Assim, a pessoa com visão
monocular, desde que cumpridos os demais requisitos, terá direito:

1) à aposentadoria com base no
art. 201, § 1º, I, da CF/88 e LC 142/2013;

2) ao amparo assistencial (BPC) de
que trata o art. 20 da Lei nº 8.742/93.

 

Vigência

A Lei nº 14.126/2021 entrou em
vigor na data de sua publicação (23/03/2021).

 

 Márcio André Lopes Cavalcante

Artigo Original em Dizer o Direito

Deixe um comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.