Os juízes brasileiros não gostam muito de seguir jurisprudência e nem são apegados a precedentes. De acordo com pesquisa sobre o perfil da magistratura divulgada nesta segunda-feira (11/2) pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a maioria dos juízes, de primeira e de segunda instância, acha que o sistema de precedentes prejudica sua independência profissional.
De acordo com a pesquisa, 52% dos juízes de primeiro grau entendem que não devem se pautar por jurisprudência. Até mesmo os ministros, responsáveis por criar os precedentes e súmulas, são ressabiados com o sistema: 55% dos 20 entrevistados pela pesquisa concordam que o magistrado deveria poder decidir sem se pautar necessariamente pelo sistema de súmulas e precedentes vinculantes.
Ao mesmo tempo, no entanto, a maioria esmagadora dos juízes concorda que o sistema de precedentes garante maior velocidade e segurança jurídica à atividade jurisdicional e, portanto, maior racionalização do Judiciário. A pesquisa “Quem somos: a magistratura que queremos” ouviu cerca de 4 mil magistrados.
É um dado alarmante, aponta o constitucionalista Lenio Streck. O Código de Processo Civil de 2015 acabou com o que o jurista chama de \”livre convencimento\”.
Os artigos 926 e 927 do CPC enumeram o que os juízes e tribunais devem observar quando forem tomar decisões, minimizando a influência de interpretações pessoais.
Para Lenio, \”a pesquisa desnuda um problema grave, que já era do conhecimento da comunidade jurídica, isto é, não há simpatia de parcela considerável da magistratura, nos diversos graus, por um sistema jurídico que funcione por, e com, coerência e integridade\”.
\”E aí reside o nó: exatamente por isso é que o sistema é fragmentado e há tantos recursos. Isso gera jurisprudência defensiva. É um círculo vicioso. Se as decisões não são coerentes umas com outras e não obedecem uma integridade vertical, parece óbvio que aumenta a insegurança jurídica\”, analisa o professor.
\”O que a pesquisa não perguntou é, por exemplo, as razões pelas quais nem os próprios tribunais superiores seguem a sua própria jurisprudência. Temos, pois, um duplo problema: os juízes de piso e tribunais de segundo grau não obedecem – ou, como diz a pesquisa, não concordam que devam obedecer – a jurisprudência (precedentes, sumulas etc) que vem de cima. E os tribunais de cima não seguem a si mesmos. Interessante é que, desde 2015, existe o novo CPC que obriga a que todos os magistrados (incluídos Ministros) que julguem de acordo com o artigo 926 do CPC, que diz que a jurisprudência deve ser estável, íntegra e coerente, além do artigo 10 que diz que nenhuma decisão deve ser feita de surpresa. Isso sem considerar o artigo 489, parágrafo 1º do CPC.\”
Ativismo judicial
Os juízes responderam também perguntas sobre ativismo judicial e fundamentação das decisões. Em relação à possibilidade do Judiciário exercer um papel criativo na produção de normas acerca de temas sensíveis para a sociedade sobre os quais não se constitui uma maioria parlamentar, o posicionamento muda conforme o grau do judiciário.
Em primeiro grau, a maioria discorda. Já em segundo grau, há uma maioria favorável (55,8%). Nos tribunais superiores, a quantidade de ministros que concordam com esse papel do Judiciário aumenta ainda mais (66,6%).
Já em relação à possibilidade do Judiciário interpretar criativamente as leis para atender a anseios da sociedade sobre temas sem definição parlamentar, a maioria dos magistrados concorda que é possível.
90% dos entrevistados concordaram ainda que é legítimo ao magistrado se basear em princípios constitucionais para compelir os demais poderes a assegurar a efetividade de direitos, em especial quanto à saúde, educação e segurança.
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(Por: Tadeu Rover / Fonte: Conjur)