Ministro Celso de Mello vota para que depoimento de Jair Bolsonaro seja presencial

Ministro Celso de Mello vota para que depoimento de Jair Bolsonaro seja presencial


Em sua última sessão jurisdicional como integrante do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Celso de Mello votou pela rejeição do recurso do presidente da República, Jair Bolsonaro, contra a determinação de que preste depoimento presencial nos autos do Inquérito (Inq) 4831, no qual é investigado por suposta tentativa de interferência política na Polícia Federal. De acordo com o decano, o benefício especial de depoimento por escrito aos chefes dos três Poderes da República, previsto no artigo 221, caput e parágrafo 1º, do Código de Processo Penal (CPP), aplica-se somente aos casos em que figurem como testemunhas ou vítimas, e não como investigados ou réus. Integrante da Corte desde 15/11/1989, Celso pediu aposentadoria voluntária e encerra sua trajetória como ministro no próximo dia 13.

O pedido de reconsideração, interposto contra decisão do próprio relator, estava em julgamento no Plenário Virtual, mas foi retirado para ser julgado presencialmente.

Princípio da oralidade

Na sessão desta quinta-feira (8), o relator afirmou que sua decisão se ajusta à legislação processual penal vigente e a vários julgados do Supremo sobre a aplicabilidade do artigo 221 do CPP apenas quando as autoridades públicas nele descritas ostentarem a condição de testemunhas. Assegura-se, assim, segundo ele, tanto o comparecimento pessoal quanto a necessária interação presencial entre o réu e o seu juiz natural ou a autoridade responsável pelo interrogatório, conferindo-se, assim, efetividade ao princípio da oralidade.

Prerrogativas

O ministro ressaltou que as prerrogativas atribuídas ao presidente da República, quando submetido a investigação criminal, são, unicamente, as concedidas na Constituição e nas leis do Estado, como, por exemplo, a garantia de imunidade temporária, o foro perante o Supremo, ou a presunção de inocência e ao devido processo legal, de caráter genérico, extensíveis a qualquer cidadão. “Entre estas, quando figurar como investigado, não se encontra a prerrogativa de responder ao interrogatório – que se rege, ordinariamente, pelo princípio da oralidade”, observou.

Para o decano, apesar de sua posição hegemônica na estrutura político-institucional do Poder Executivo, o presidente da República, como qualquer outro cidadão, não dispõe de benefícios anulatórios do direito comum, além das mencionadas prerrogativas, quando figurar como pessoa sob investigação criminal. “Ninguém, nem mesmo o chefe do Poder Executivo da União, está acima da autoridade da Constituição e das leis da República”, afirmou.

Igualdade

Celso de Mello frisou que a própria ideia de República exprime o dogma fundamental do primado da igualdade de todos perante as leis, “no sentido de repelir privilégios e não tolerar discriminações”, impedindo que se estabeleçam tratamentos seletivos em favor de determinadas pessoas e obstando que se imponham restrições gravosas em detrimento de outras, em razão de diversos fatores, dentre eles, a posição estamental.

Devido processo legal

O relator observou, entretanto, que as garantias asseguradas a todos os investigados ou réus contra a autoincriminação, o direito ao silêncio e ao não comparecimento ao ato interrogatório e todas as etapas do devido processo legal não conferem ao chefe do Poder Executivo da União o privilégio de eleger, ele próprio, a forma pela qual quer e pretende seja efetivada sua inquirição policial.

Com esses fundamentos, para o ministro Celso de Mello, a inquirição do presidente Jair Bolsonaro deverá observar o procedimento normal de interrogatório (CPP, artigo 6º, inciso V, c/c o art. 185 e seguintes), que é a forma presencial.

Tratamento isonômico

O decano enfatizou, por fim, que deve ser garantido, no caso em análise, tratamento isonômico a todos os investigados que ostentam a mesma condição jurídica. Ele lembrou que o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sérgio Moro, também investigado, já prestou depoimento presencialmente. Assim, em seu voto, Celso de Mello assegura a Moro, por meio de seus advogados, o direito de participar do interrogatório do presidente da República e de formular reperguntas (parágrafo único do artigo 229 do CPP).

Leia a íntegra do voto do ministro Celso de Mello.

SP/CR//CF

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