Dia Mundial da Juventude: desemprego é desafio para jovens e para a sociedade

Reportagem especial sobre a data aborda medidas para inclusão da nova geração no mercado de trabalho 

Perfis de jovens

Perfis de jovens

12/08/22 – “Disseram que eu precisava ter experiência profissional. Mas como vou ter, se não me dão uma chance?”, questiona a estudante Maryana Melo, de 18 anos.  Essa é uma dificuldade compartilhada por grande número de jovens na fase de transição da educação formal para o mercado de trabalho. E as transformações sociais, econômicas e tecnológicas, aceleradas com a pandemia da covid-19, podem estar agravando esses desafios, o que exige atenção de todos os atores envolvidos nas políticas para inserção de jovens no trabalho. 

Essa reportagem especial celebra o Dia Internacional da Juventude, comemorado anualmente em 12 de agosto. Criada em 1999 pela Organização das Nações Unidas (ONU), a data tem o objetivo de celebrar o papel dos jovens para gerar mudanças e debater os desafios enfrentados pela juventude mundial.

Desemprego

Entre os brasileiros de 14 a 17 anos que integram a força de trabalho (ou seja, que estão em busca de emprego), 36,4% estavam desempregados no primeiro trimestre deste ano. Na faixa etária de 18 a 24 anos, o índice era de 22,8%. Os números são bem superiores aos registrados há uma década: no mesmo período de 2012, a taxa de desocupação para a população de 14 a 17 anos era de 22,1%, e, na faixa etária de 18 a 24, era de 15,3%. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Pandemia e crise

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) tem alertado para o problema do desemprego entre jovens no mundo todo, especialmente a partir da pandemia. Entre os problemas advindos da crise de saúde para essa parcela da população estão a interrupção de programas educacionais e de formação e do vínculo com o mercado de trabalho, a perda de emprego e de renda e a perspectiva de mais dificuldades para, no futuro, encontrarem uma ocupação. 

A crise econômica agrava os desafios. Para boa parte da população jovem, buscar emprego se tornou uma necessidade, em razão da queda da renda das famílias. Em 2021, o rendimento mensal real domiciliar por pessoa foi de R$ 1.353, o menor valor da série histórica da PNAD Contínua, iniciada em 2012. 

Pior trajetória

“Com o mercado formal incapaz de absorver essa força de trabalho, cresce o risco de a nova geração de trabalhadores se sujeitar a empregos de pior qualidade – com remunerações mais baixas e sem proteção social”, alerta a ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Kátia Arruda, que, por sete anos, coordenou o Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem da Justiça do Trabalho. “Isso simboliza uma tendência de pior trajetória para esses jovens”, diz, lembrando que o problema penaliza, principalmente, quem é mais pobre.

Evasão escolar

Outra consequência negativa dessa realidade é que ela pode levar à interrupção dos estudos. No ano passado, a taxa de abandono escolar no ensino médio na rede pública mais que dobrou: 5,6% dos estudantes deixaram a escola, frente a 2,3% em 2020. E acessar o ensino superior se torna um objetivo cada vez mais distante. Para se ter uma ideia, os volumes de inscritos no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), porta de entrada para a faculdade, foram os dois piores da história em 2020 e 2021. 

Desigualdade

Sem educação formal e sem empregos que proporcionem o desenvolvimento profissional, fica ainda mais difícil acessar melhores empregos e melhores condições de vida no futuro. A OIT alerta que esse contexto pode trazer implicações sociais mais profundas, como aumento das desigualdades e da instabilidade decorrente do crescimento de conflitos sociais. “Temos uma geração grande de jovens nessa transição e estamos dando poucos incentivos para se qualificarem. Se perdermos esse timing, pode haver uma cicatriz, porque o efeito no mercado de trabalho é de longo prazo”, destaca o especialista em Mercado de Trabalho e Políticas de Emprego do escritório da OIT no Brasil, Aguinaldo Maciente. “O jovem que não se qualifica adequadamente, agora, para ser um trabalhador produtivo e com melhor remuneração terá impactos em toda a sua vida. E o setor produtivo também sentirá esses efeitos”. Na opinião dele, o tema requer atenção imediata no país. 

Pessimismo

Chama a atenção, ainda, que os jovens brasileiros estão pouco otimistas. A pesquisa The Changing Childhood Project, realizada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e divulgada em 2021, perguntou a diferentes gerações suas opiniões sobre o mundo. O levantamento foi realizado em 21 países. Ao serem questionados sobre se o mundo está se tornando um lugar melhor para cada nova geração, somente 31% de adolescentes e jovens brasileiros disseram que sim, o segundo percentual mais baixo (atrás apenas do Mali, país da África Ocidental). 

Mas os brasileiros estão entre os que mais citam a educação como principal fator para o sucesso (59%, ante 36% da média dos demais países). O segundo fator mais mencionado foi trabalho árduo (para 27% dos jovens). 

Encurtando distâncias

Para a ministra Kátia Arruda, a situação exige uma ação da sociedade e uma política pública eficaz. “A Lei da Aprendizagem”, defende, “é uma dessas políticas, que já mostrou resultados importantes e que não pode ser diminuída”. 

A Lei 10.097/2000, chamada Lei da Aprendizagem, foi criada para regulamentar essa modalidade de contratação e, dessa forma, encurtar a distância entre a educação formal e o mercado de trabalho. Seus dispositivos objetivam a criação de vagas para estudantes com mais de 14 anos e estabelece uma série de regras para que adolescentes e jovens tenham acesso a  emprego digno, com a minimização do impacto sobre a vida escolar ou acadêmica. A legislação foi alterada, em maio de 2022, pela Medida Provisória (MP) 1.116, ainda em apreciação pelo Congresso Nacional. 

“Essa é uma das políticas públicas mais importantes da atualidade para a inserção de jovens no mercado de trabalho”, defende a ministra do TST. “Ela exige que jovens continuem tendo acesso à educação formal e possibilita que aprendam conceitos e práticas do mercado de trabalho e que sejam qualificados até serem inseridos como adultos no mercado de trabalho”.  

O texto determina que empresas de médio e grande porte contratem de 5% a 15% de aprendizes em relação ao quadro de empregados cujas funções demandem formação profissional. Mas organizações de quaisquer portes podem contar com aprendizes em seus quadros.  

Primeiros passos

Foi por causa da Lei da Aprendizagem que Maryana, a jovem que está na abertura desta reportagem, conseguiu uma oportunidade no mercado de trabalho. Depois de distribuir seu currículo em diferentes estabelecimentos, ela se candidatou a uma vaga de jovem aprendiz e passou a atuar, em maio deste ano, no Tribunal Superior do Trabalho. A jornada de quatro horas diárias permite que ela dedique tempo aos estudos de inglês e para o Enem; a remuneração que recebe tem, como destino, seus animais de estimação, a compra de remédios para a família e uma poupança pessoal. 

Aos 16 anos, Gustavo Abreu também conseguiu o primeiro emprego por meio da Lei da Aprendizagem. Ele é outro jovem aprendiz do TST e, assim, consegue auxiliar a mãe nas despesas de casa sem prejudicar as aulas do segundo ano do ensino médio. “Acho essa oportunidade muito boa, aprendo demais com a possibilidade de mexer com processos e entender mais desse mundo”, diz. 

Ambos veem o cotidiano no TST como um primeiro passo para a carreira que almejam – ao menos para os primeiros anos de suas vidas profissionais. Ela, que trabalha na Coordenadoria de Legislação de Pessoal, quer cursar Psicologia. Ele, por enquanto, não pensa no ensino superior, mas almeja prestar concurso público para se tornar servidor no Poder Judiciário.  

No TST, hoje, atuam 16 jovens aprendizes. Dados mais recentes do Boletim da Aprendizagem, do Ministério da Economia, indicam que, em 2021, havia 458.976 aprendizes com vínculo ativo no Brasil. 

Soluções conjuntas

Contudo, uma lei, sozinha, não é capaz de reduzir o desemprego na faixa etária dos 14 aos 29 anos nem garantir que as novas gerações tenham apoio para iniciar a construção de suas trajetórias profissionais. A aprendizagem requer o envolvimento e o diálogo entre setor público – em todas as esferas -, empregadores, entidades patronais e instituições de ensino, para construção conjunta de soluções que facilitem o acesso e favoreçam a permanência de adolescentes e jovens na educação e no emprego. 

Segundo Aguinaldo Maciente, especialista da OIT, é preciso debater também formas de reduzir a discrepância entre o conteúdo ensinado e as competências que o setor produtivo requer, hoje, dos trabalhadores. Além disso, salienta que jovens aprendizes tendem a ser aproveitados pelas organizações em pequenas funções administrativas, o que pouco contribui para seu desenvolvimento pessoal e para a capacidade produtiva da empresa. Por isso, defende que os papéis desempenhados pela nova geração devem oportunizar vivências que, de fato, a capacitem para o mercado de trabalho.     
 
Assim, o tema não é importante somente para novas e novos trabalhadores. Maciente destaca que, para as empresas, fomentar a aprendizagem representa a oportunidade de formar e reter talentos, além de contribuir para formar trabalhadores que as empresas querem contratar. Dados de 2019 mostram que, dos 320.260 egressos da aprendizagem desligados por término de contrato, 160.762 foram admitidos até 18 meses após o desligamento. Os números são do Boletim da Aprendizagem do Ministério da Economia.  
 
Ao final, o impacto se dá sobre toda a sociedade: a qualificação e a empregabilidade da população mais jovem é crucial para o desenvolvimento, o crescimento econômico e a estabilidade do país. 

Semana da Aprendizagem

Entre 22 e 26 de agosto, a Justiça do Trabalho em todo o Brasil realiza a Semana da Aprendizagem, uma iniciativa do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem. Durante esses dias, os Tribunais Regionais do Trabalho do país promoverão palestras, exposições e audiências públicas sobre o tema, com a participação de órgãos integrantes da rede de proteção da criança e do adolescente, de organizações governamentais e da sociedade civil. O objetivo é fomentar medidas que estimulem a inserção de jovens no mercado de trabalho de forma regular, na condição de aprendizes. 

O que a Lei da Aprendizagem prevê 

Quem pode ser aprendiz: pessoas entre 14 e 24 anos incompletos, que tenham concluído ou que estejam cursando o ensino fundamental ou médio. Para pessoas com deficiência, não há limite de idade. Para atividades vedadas a menores de 21 anos, podem ser contratadas pessoas com até 29 anos como aprendizes.

Direitos: a modalidade garante aos jovens direitos trabalhistas como férias e 13º salário, segurança na formação escolar e qualificação profissional. A jornada é de até seis horas diárias. 

Para as empresas: além de prepararem novos talentos, de acordo com suas demandas e sua cultura organizacional, as empresas pagam alíquota menor de contribuição ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), correspondente a 2% da remuneração – enquanto para o trabalhador convencional é 8%.

Prazo do contrato: para jovens com 15 anos incompletos, o limite do contrato é de quatro anos; para pessoas com deficiência, não há prazo máximo; para os demais casos, a contratação deve ter prazo determinado de até três anos. 
 
Validade do contrato de aprendizagem: para que o contrato permaneça válido, o jovem deve permanecer matriculado e frequentando a educação formal (caso ainda não tenha concluído o ensino médio). Também é necessária a inscrição em programa de aprendizagem profissional.

(NP/CF)


Fonte: TST – Tribunal Superior do Trabalho

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