A voz delicada e o cuidado com as palavras dão o tom da conversa sobre um assunto que é frequentemente evitado: o suicídio. Porém, a fala da psicóloga Karina Okajima Fukumitsu vai além da preocupação clínica com pessoas ou familiares que viveram esse drama de perto. Ela nos leva a uma reflexão sobre como estamos cuidando das coisas simples da vida, dos nossos sentimentos e daqueles que amamos.
Fukumitsu falou para uma plateia formada por servidores e magistrados da Justiça Militar da União, sobre o tema \”Suicídio: prevenção e posvenção\”. A abertura do encontro contou com as palavras do presidente do Tribunal, ministro José Coêlho Ferreira, que falou sobre a importância de trazer o tema para promover conhecimento e sensibilização diante de dados que revelam a quantidade de suicídios que ocorrem no Brasil.
Além da palestra, a psicóloga também realizou um curso de capacitação de dois dias com profissionais do STM que, pelas suas funções, possam vir a lidar com situações nas quais sejam exigidos conhecimentos mais específicos. A iniciativa de trazer a psicóloga foi da Coordenadoria de Serviços de Saúde, que formará um grupo para lidar com temáticas relativas ao suicídio.
Valorização da vida
Os pés descalços são um sinal de quem aprendeu com a doença que o simples ato de acordar todas as manhãs, respirar e poder tocar o chão com os pés já são um milagre. Ela mesma afirma que ganhou um saldo extra da vida, após atravessar uma doença autoimune e hoje estar sem nenhuma sequela. É por isso que hoje a pós-doutora da USP tira as sandálias dos pés no seu consultório, na sala de aula e nos locais onde dá palestra: são lugares sagrados.
O tema do suicídio para Karina tem a ver com uma história pessoal e tornou-se sua linha de atuação profissional na saúde pública, ao decidir tratar não só a prevenção, mas também a “posvenção”, ou seja, o cuidado prestado aos familiares das vítimas de suicídio.
Um dos temas mais recorrentes na fala da especialista foi a dificuldade que todos têm de lidar com emoções como raiva, solidão, desesperança e culpa. São os chamados “sentimentos inóspitos”, que são inevitáveis e precisam ser acolhidos e compreendidos. Caso esses sentimentos não sejam observados e trabalhados, eles irão contribuir com o que a psicóloga chama de “sofrimento existencial” e podem evoluir para o fenômeno do suicídio.
Por essa razão Fukumitsu dá a primeira e mais importante orientação para quem deseja ajudar uma pessoa que deseja tirar a própria vida: “não dê conselhos”. Com isso ela alerta que acolher o sofrimento do outro e entrar no seu mundo é uma atitude mais eficaz do que tentar convencer alguém a não cometer o suicídio. “É dizer para a pessoa: estou aqui com você. E também: o que você gostaria que morresse na sua vida?”
Assim, a psicóloga ensinou outra lição importante: querer tirar a própria vida não é sinônimo de “querer morrer”. Pelo contrário, é apenas uma tentativa de se livrar de uma dor muito profunda, quando aparentemente não há outra saída. Contar com um rede de apoio – formada por profissionais, amigos e familiares – é outra estratégia bastante eficaz. É essa rede que dará “hospitalidade” para a situação que causa dor e encontrar, junto à pessoa que passa pelo problema, uma ou mais saídas.
E não encontrar saídas para um problema pode levar o indivíduo ao que a profissional chama de “processo de morrência”, ou seja, um quadro de definhamento existencial e falta de gosto pela vida. Como antídoto para essa situação ela orienta: “Olhe para a ferida. Olhe para o caos. Quando se é ferido, olhe a ferida e junte suas forças com outros.” Por esse caminho, assegura Fukumitsu, cada pessoa pode chegar à transcendência, que significa encontrar o “herói” dentro de si e a força necessária para superar uma situação difícil e inesperada.
Ao final da apresentação, a psicóloga ouviu o agradecimento emocionado do vice-presidente do STM, ministro Lúcio Mário de Barros Góes, além de certificado da juíza-auditora-corregedora Telma Angélica Figueiredo e lembrança da coordenadora de Serviços de Saúde, Aline Alan Guedes Cerqueira.