Os valores decorrentes de empréstimo consignado em folha de pagamento podem ser penhorados?


Imagine a seguinte situação hipotética:

O banco ajuizou execução de
título extrajudicial contra João.

O juiz determinou a penhora de R$
5 mil que estavam depositados na conta bancária do devedor.

O executado apresentou embargos à
execução alegando e comprovando que o dinheiro penhorado é fruto de um
empréstimo consignado que ele contraiu e que tinha acabado de ser depositado em
sua conta.

O devedor
argumentou que os valores decorrentes de empréstimo consignado em folha de
pagamento recebem a mesma proteção da impenhorabilidade atribuída aos salários,
proventos de aposentadoria e pensões, devendo, portanto, ser enquadrados no
art. 833, IV, do CPC/2015:

Art. 833. São impenhoráveis:

(…)

IV – os vencimentos, os subsídios, os
soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as
pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por
liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família,
os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado
o § 2º;

O que o STJ entende a
respeito do tema? Os valores decorrentes de empréstimo consignado em folha de
pagamento podem ou não ser penhorados?

• Regra: SIM. Em regra, os valores
oriundos de empréstimo consignado são PENHORÁVEIS.

• Exceção: a penhora não será
permitida se o mutuário comprovar que os recursos são necessários à de sua
manutenção e de sua família.

Empréstimo consignado e seu
impacto na renda do trabalhador

O empréstimo consignado “é uma
modalidade de crédito em que o desconto da prestação é feito diretamente na
folha de pagamento ou de benefício previdenciário do contratante”, reduzindo o
risco de inadimplência e, por esse motivo, permite a redução da taxa de juros
cobrada pela instituição financeira (Fonte: https://www.bcb.gov.br/nor/relcidfin/docs/art7_emprestimo_consignado.pdf.).

Essa modalidade de empréstimo
compromete a renda do trabalhador, do pensionista ou do aposentado, podendo,
assim, reduzir o seu poder aquisitivo e, em certos casos, prejudicar a sua
subsistência. Isso porque o mutuário (devedor) recebe determinada quantia do
mutuante (instituição financeira ou cooperativa de crédito) e, em
contrapartida, ocorre a diminuição do salário devido aos descontos efetuados
diretamente na folha de pagamento.

Mesmo havendo esse impacto renda, os valores do empréstimo consignado
não têm natureza de salário

Ainda que as parcelas do
empréstimo contratado sejam descontadas diretamente da folha de pagamento do
mutuário, a origem desse valor não é salarial, pois não se trata de valores
decorrentes de prestação de serviço.

O salário tem origem no contrato
trabalho ou na prestação do serviço; o empréstimo tem origem em contrato de
mútuo celebrado entre o trabalhador (mutuário) e a instituição financeira ou
cooperativa de crédito (mutuante).

Assim, o empréstimo consignado
não pode ser considerado nem mesmo como adiantamento de salário. Somente se
poderia considerar como adiantamento salarial se fosse feito pelo empregador e
em função exclusiva do contrato de trabalho.

Logo, não sendo salarial, o
empréstimo consignado não possui, em regra, natureza alimentar.

Art. 833 do CPC deve ser
interpretado restritivamente

O empréstimo pessoal, ainda que
na modalidade consignada, não encontra previsão no rol do art. 833 do CPC. Por
constituir exceção ao princípio da responsabilidade patrimonial (art. 831 do
CPC/2015), não se admite, nesse aspecto, interpretação extensiva.

Desse modo, a regra geral
é:

Os valores decorrentes de
empréstimo consignado, em regra, não são protegidos pela impenhorabilidade, por
não estarem abrangidos pelas expressões vencimentos, subsídios, soldos,
salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, de que trata a
parte inicial do inciso IV art. 833 do CPC/2015.

Exceção:

Se o mutuário
(devedor) comprovar que os recursos oriundos do empréstimo consignado são
necessários à sua manutenção e à da sua família, tais valores recebem o manto
da impenhorabilidade. Essa interpretação decorre da aplicação da parte final do
art. 833, IV, do CPC/2015: “destinadas ao sustento do devedor e de sua família”:

Art. 833. São impenhoráveis:

(…)

IV – os vencimentos, os subsídios, os
soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as
pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por
liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de
trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o §
2º;

Em suma:

São penhoráveis os valores oriundos de empréstimo
consignado, salvo se o mutuário comprovar que os recursos são necessários à de
sua manutenção e de sua família.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.820.477-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas
Cueva, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

Artigo Original em Dizer o Direito

Deixe um comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.