Antes de 2009, a lei brasileira admitia a prisão civil do depositário infiel. Exatamente por isso é que a sua nomeação dependia de certas formalidades, ou seja, a pessoa tinha que aceitar o encargo de ser o depositário do bem penhorado, através da sua assinatura no termo de compromisso. Afinal, ele poderia ser preso, caso descumprisse a obrigação de guardar, conservar e restituir a coisa objeto de constrição judicial. Entretanto, em dezembro/2009, o Supremo Tribunal Federal-STF editou a Súmula 25, firmando o entendimento de que é “ilícita a prisão civil do depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”. A partir daí, a jurisprudência vem se inclinando pela desnecessidade de intimação pessoal do depositário para assumir o encargo, já que não mais se reveste de tamanha gravidade. Nesse quadro, passou a ser possível a nomeação compulsória do fiel depositário, assim como a sua notificação por edital, quando mal sucedidas todas as outras formas de comunicação processual.
A decisão é da 6ª Turma do TRT-MG que, acolhendo o voto do relator, juiz convocado Marcelo Furtado Vidal, deu provimento ao agravo de petição de um trabalhador para autorizar que a inventariante do espólio de um dos sócios (falecido) da executada fosse nomeada, de forma compulsória e por edital, como fiel depositária do imóvel penhorado no processo.
Entendendo o caso – A execução do crédito trabalhista já se arrastava há mais de 20 anos (desde 1996), até que, em 2013 o reclamante encontrou um imóvel (chácara) que pertencia ao sócio, que acabou sendo penhorado. A partir daí, inúmeras tentativas foram feitas para nomear um fiel depositário, mas, apesar de procurado em diversos endereços, o sócio jamais foi encontrado. Tentou-se, ainda, o contato com a esposa do sócio para que pudesse, ao menos, apresentar certidão de óbito, mas ela também não foi encontrada.
Após ser intimado para indicar meios de prosseguimento da execução, o ex-empregado diligenciou junto à Vara de Família e Sucessões e, então, obteve a informação de quem seria a inventariante do espólio do sócio executado, solicitando ao juiz da execução que a inventariante fosse nomeada como fiel depositária do imóvel constrito. Entretanto, não se tinha conhecimento do endereço atualizado dela, apesar das tentativas nesse sentido (pesquisa pelo InfoJud, no TRE e na Vara de Família). Mais uma vez, intimado a indicar meios de prosseguimento da execução, o trabalhador solicitou que a inventariante fosse nomeada fiel depositária do imóvel penhorado e notificada através de edital, mas seu pedido foi rejeitado pelo juiz da execução. Contra esta decisão é que o reclamante interpôs o agravo de petição e teve sua pretensão acolhida pela 6ª Turma do TRT mineiro, com base na Súmula 25 do STF.
A decisão da Turma e seus fundamentos – Conforme ressaltado pelo relator, o caso apresenta duas questões delicadas: a nomeação compulsória do fiel depositário e sua notificação por edital. É que, como explicou o desembargador, até 2009, nosso ordenamento jurídico admitia a prisão civil do depositário infiel, motivo pelo qual a nomeação para tal encargo exigia certa cautela e formalidade, com assinatura do termo de compromisso. Afinal, em caso de descumprimento da obrigação, as consequências que poderiam surgir eram graves, como a prisão do depositário infiel. Naquele contexto, o TST, inclusive, editou a OJ-89/SBDI-2, com o seguinte teor: “HABEAS CORPUS”. DEPOSITÁRIO. TERMO DE DEPÓSITO NÃO ASSINADO PELO PACIENTE. NECESSIDADE DE ACEITAÇÃO DO ENCARGO. IMPOSSIBILIDADE DE PRISÃO CIVIL (inserida em 27.05.2002) A investidura no encargo de depositário depende da aceitação do nomeado que deve assinar termo de compromisso no auto de penhora, sem o que, é inadmissível a restrição de seu direito de liberdade.”
Como lembrou o relator, a jurisprudência vinha seguindo esse posicionamento. Entretanto, em dez/2009, o STF editou a Súmula Vinculante 25, com o seguinte teor: “É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”. A partir daí, explicou o relator, a jurisprudência tem se inclinado no sentido de que o encargo de fiel depositário deixou de carregar o estigma e o peso de antes. E não sendo mais viável decretar a prisão do depositário infiel, torna-se compatível a sua nomeação compulsória e a sua citação por edital, quando houver dificuldade de encontrá-lo, destacou, no voto.
“No caso, todas as tentativas de execução do crédito trabalhista foram mal sucedidas, assim como todas as outras modalidades de comunicação processual. Sendo assim, deve ser acolhida a pretensão do exequente para a nomeação da inventariante como fiel depositária do bem constrito, com a sua notificação por edital”, concluiu o relator, no que foi acompanhado pela Turma revisora.
Fonte: TRT 3