21/10/2022 – A 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) transformou em dispensa imotivada a despedida por justa causa aplicada a um trabalhador que não conseguiu retornar ao serviço devido à interrupção de voos gerada pelo início da pandemia do novo coronavírus, em 2020. Ele é senegalês e viajou para seu país de origem no período das férias, entre fevereiro e março daquele ano, mesmo momento em que fronteiras e aeroportos foram fechados como forma de prevenção contra o vírus. Ao não conseguir retornar, foi despedido por abandono de emprego.
Para os desembargadores da 4ª Turma, a conduta da empregadora foi inadequada, já que não ficou comprovada a intenção do empregado em abandonar o serviço, o que teria ocorrido por circunstâncias alheias à sua vontade. A decisão confirmou a sentença da juíza Veridiana Ullmann de Campos, da 2ª Vara do Trabalho de Porto Alegre.
De acordo com informações do processo, o empregado trabalhava desde 2015 na empresa, uma terceirizada de coleta de lixo. Ele teria informado imediatamente à empregadora a impossibilidade do retorno devido ao fechamento dos aeroportos em Senegal e no Brasil. A empresa teria afirmado que seu contrato ficaria suspenso no período. No entanto, ao retornar, em setembro de 2020, soube que havia sido dispensado por justa causa. Diante disso, solicitou a rescisão indireta do contrato e o pagamento das respectivas verbas.
Na análise do caso em primeira instância, a juíza observou que para a configuração do abandono de emprego são necessários dois requisitos, um objetivo e outro subjetivo. Quanto ao primeiro, exige-se a passagem de tempo de 30 dias sem comparecimento ao trabalho. O elemento subjetivo é a comprovação da intenção deliberada do empregado de abandonar o serviço.
Como ressaltou a magistrada, o único depoimento do processo confirmou as alegações do empregado, segundo as quais teria avisado à empregadora imediatamente a respeito da impossibilidade de retorno pela ausência de voos. Por outro lado, como observou a juíza, o argumento de que as férias do trabalhador teriam se encerrado no dia 2 de março, antes, portanto, do fechamento de aeroportos, não condiz com a realidade, já que os cartões de ponto registram trabalho até 28 de fevereiro. Por último, a julgadora também frisou que a proibição de viagens passou a vigorar no Senegal no dia 15 de março, justamente no período em que o empregado se encontrava no país.
Diante desses elementos, a juíza entendeu que a empregadora não conseguiu comprovar o alegado abandono de emprego. Descontente com o entendimento, a empregadora apresentou recurso ao TRT-4, mas os desembargadores da 4ª Turma mantiveram a sentença pelos seus próprios fundamentos. Conforme destacou a relatora do processo no colegiado, desembargadora Maria Silvana Rotta Tedesco, “em que pese a argumentação recursal, entende-se que não estão cabalmente demonstrados os elementos (objetivo e subjetivo) caracterizadores do abandono de emprego”. O entendimento foi acompanhado pelos demais integrantes da Turma, a juíza convocada Anita Jobbe Lübbe e a desembargadora Ana Luiza Heineck Kruse.
Fonte: TRT da 4ª Região (RS)