Análises estaduais e exposições de especialistas encerram primeiro dia da audiência pública

A audiência pública sobre o sistema prisional brasileiro será retomada nesta terça-feira (14), a partir das 8h30. A audiência começou na manhã desta segunda-feira (13) e se estendeu ao longo do dia e, à noite, o ministro Gilmar Mendes, relator do processo que motivou a convocação, comunicou aos inscritos que as exposições terão continuidade amanhã de manhã.

No último período da tarde, foram ouvidos especialistas em saúde no sistema prisional e em dados e estatísticas sobre o tema e, ainda, parte dos expositores que apresentam análises específicas sobre a situação carcerária em diversos estados e no Distrito Federal.

Mortes

A médica e pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz Alexandra Sánchez apontou a tuberculose e o HIV como os principais motivos de mortes por causas naturais em presídios. Ela lamentou que 70% dos casos de doenças infecciosas são diagnosticados somente após o óbito, levando a crer que, em sua maioria, poderiam ser evitados.

Controle social

Já a coordenadora do Laboratório de Estudos sobre Trabalho, Cárcere e Direitos Humanos, Carolyne Reis Barros, usou seu tempo de exposição para indicar caminhos no sentido de conter a política de encarceramento. A professora de psicologia propôs a criação de espaços de controle social para monitorar e fiscalizar o sistema visando cumprir os termos do HC 165704, além de medidas de responsabilização que ajudem a “fechar a porta de entrada das prisões\”.

Saúde mental

A saúde mental dos servidores públicos de presídios foi abordada na apresentação da coordenadora Geral e perita do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, Bárbara Suelen Coloniese. Ela afirma ter entrevistado agentes penitenciários que faziam uso de medicação a ponto de apresentarem dificuldade para conversar. \”É importante ter políticas públicas para cuidar de quem cuida também\”, ponderou.

Caráter patriarcal

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) defendeu que o mesmo tratamento dado às mães no habeas corpus coletivo seja oferecido ao responsável pela guarda de criança ou portador de deficiência. \”Restringir à mãe a responsabilidade pela educação e proteção é reafirmar o caráter patriarcal do modo de lidar com as obrigações familiares, colocando a mulher em condição de culpabilização\”, argumentou Andrea Esmeraldo.

Descumprimento

Eloísa Machado de Almeida, professora da Fundação Getúlio Vargas e integrante do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (CADHu), observou que o Tribunal de Justiça de São Paulo, estado com o maior número de encarcerados, cumpre pouco a decisão da Segunda Turma do STF no HC coletivo 143641, impetrado pela entidade, que beneficiou gestantes e mães de crianças de até 12 anos com a conversão da prisão em domiciliar. Segundo ela, essa experiência talvez indique a necessidade da expedição de alvarás de soltura coletivos, para evitar descumprimento da decisão.

A professora Bruna Angotti, da Universidade Mackenzie e também integrante do CADHu, apontou a necessidade de uma mudança de paradigma, de forma que a imprescindibilidade da mãe para cuidar dos filhos deve ser presumida, e o ônus de provar o contrário deve ser da acusação.

Conflito humanitário

Segundo Luís Geraldo Sant’Ana Lanfredi, juiz auxiliar da Presidência do CNJ e coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF/CNJ), as prisões brasileiras revelam um conflito humanitário que fere a dignidade de milhares de pessoas. De acordo com ele, a realidade ainda indica a superlotação como tendência nas prisões, desprezando o custo social do encarceramento.

Ele observou que a manutenção de uma pessoa presa tem impacto nas vidas de outras 17 pessoas fora das prisões, em média. Defendeu, ainda, a revisão da Lei de Drogas, levando em conta o anteprojeto elaborado pela comissão de juristas presidida pelo ministro Ribeiro Dantas, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Comida estragada

Pelo Grupo de Pesquisa Ilhargas, Priscila Flores Serra relatou situações vivenciadas no Estado do Amazonas. Segundo ela, presos estão sendo torturados de forma física e psicológica, tendo em vista que são vítimas de espancamento e ameaça. Também afirmou que eles recebem comida estragada, permanecem em celas sem luz e ventilação e não têm atendimento médico adequado.

Superlotação

Coordenador do projeto Infocadeia-AM, o professor da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) Fábio Magalhães Candotti disse que o estado tem a maior taxa de superlotação do país e que, em 20 anos, houve um aumento da população carcerária de 550%. Ele defende a promoção de uma política mais radical de desencarceramento no Amazonas.

 

Minorias étnicas

A indígena Maria Cristina Silva dos Santos, uma das fundadoras da Associação dos Direitos Humanos de Familiares e Amigos de Reeducandos do Estado do Acre e articuladora da Frente Estadual pelo Desencarceramento do Acre, afirmou que a Região Norte é composta de minorias étnicas bastante negligenciadas em relação ao encarceramento. Segundo ela, muitos indígenas continuam presos, apesar de já terem cumprido a pena, em razão da falta de reanálise de seus processos. Maria Cristina solicitou, ainda, melhorias na qualidade de laudos médicos elaborados nos casos de denúncia de tortura de presos.

Cumprimento do HC no DF

A segunda vice-presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios e supervisora do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário do DF, desembargadora Sandra de Santis, ressaltou que, em relação às prisões domiciliares e humanitárias em geral, não ocorre descumprimento do HC 165704 no âmbito da justiça do DF. Contudo, a desembargadora defende uma reforma no sistema penitenciário brasileiro. Segundo Sandra de Santis, o sistema necessita de “um olhar apurado de todas as autoridades atuantes”, mas, em razão das dimensões continentais do Brasil, cada estado tem as próprias especificidades, e cada um deve ser tratado de forma diferenciada.

A desembargadora apresentou um panorama da única penitenciária feminina do DF, que dispõe de 1.028 vagas e conta com uma ala de berçário, brinquedoteca para parentes visitantes das presas e ala maternidade. Apesar de toda a estrutura, ela informou que não há bebês no presídio.

EC, GT, PR//CF

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Fonte STF

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