Comentários à Lei 14.356/2022: como ficam os gastos com publicidade dos órgãos públicos no primeiro semestre do ano de eleição


 

Márcio André Lopes Cavalcante

Juiz Federal integrante do pleno do TRE/AM no biênio 2020/2022

 

Robério Moreira Borges

Analista Judiciário do TRE/AM

 

A Lei 14.356/2022 tratou dos seguintes
assuntos:

– Alterou os limites de despesas com
propaganda institucional no ano eleitoral

– Introduziu normas relativas à contratação
de serviços de comunicação institucional

 

ALTERAÇÃO
DOS LIMITES DE DESPESAS COM PROPAGANDA INSTITUCIONAL NO ANO ELEITORAL

 

A
Lei nº 9.504/97 (Lei das Eleições) prevê, em seu art. 73, condutas que são vedadas
aos agentes públicos em campanhas eleitorais.

A
Lei nº 14.356/2022 promoveu relevantes alterações nesse dispositivo.

Antes
de apreciá-las, vamos rememorar alguns pontos que são importantes para
entendermos melhor o assunto.

 

O que são condutas vedadas?

Trata-se
de um mecanismo destinado a assegurar a igualdade de oportunidades entre os
candidatos, de forma a evitar que algum agente público possa se valer da
máquina pública para impulsionar sua candidatura ou a de terceiros.

Para
tanto, o legislador enumerou uma série de condutas e as interditou
expressamente, cominando sanções diversas, como multa e até mesmo cassação do
registro ou diploma.

Esse
rol está previsto nos arts. 73 a 77, da Lei das Eleições. Ele é taxativo e não admite
interpretação analógica.

Eventual
prática das condutas enumeradas nesses artigos é apurada mediante representação
por conduta vedada, a ser proposta por candidato, partido político, coligação
ou pelo Ministério Público.

 

Quem pode praticá-las?

O
agente público, assim considerado como “quem exerce, ainda que transitoriamente
ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer
outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nos
órgãos ou entidades da administração pública direta, indireta ou fundacional”
(art. 73, §1º, Lei nº 9.504/97).

 

Conduta vedada é sinônimo de abuso de poder político?

NÃO.
As principais diferenças entre eles são as seguintes:

 

CONDUTA VEDADA

ABUSO DE PODER

Bem jurídico tutelado

Igualdade
de oportunidade entre os candidatos (art. 73, caput, da Lei nº 9.504/97).

Normalidade
e legitimidade do pleito (art. 19, parágrafo único, LC 64/90).

Conduta

Rol
taxativo.

 

Forma
livre.

Legitimidade

A
conduta deve obrigatoriamente ser praticada por um agente público.

A
conduta lesiva pode ser praticada por qualquer pessoa.

Configuração

Configura-se
pela mera prática da conduta

Exige-se
prova de que a conduta praticada ostente gravidade suficiente para
comprometer a normalidade e legitimidade das eleições (art. 22, inc. XVI, da
LC 64/90)

Forma de apuração

Representação
por conduta vedada


Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE); ou


Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME)

A quem deve ser encami-nhada

Eleições municipais: juiz eleitoral

Eleições estaduais: Juiz Auxiliar (TRE)

Eleições presidenciais: Juiz Auxiliar (TSE)

 

(art.
96, §2º e 3º, da Lei 9.504/97)

 

AIJE:

Eleições municipais: juiz eleitoral

Eleições estaduais: Corregedor-Regional Eleitoral

Eleições presidenciais: Corregedor-Geral Eleitoral

(art.
22, I, e art. 24, da LC 64/90)

 

AIME:

Eleições municipais: juiz eleitoral

Eleições estaduais: TRE (a ser distribuída a um de seus
membros)

Eleições presidenciais: TSE (a ser distribuída a um de seus
membros)

Sanções

Multa
e/ou cassação de registro ou diploma

(em
caso de cassação de registro ou diploma, a inelegibilidade pode se dar de
forma indireta, a ser aferida por ocasião do registro de candidatura – art.
1º, I, “j”, LC 64/90).

Cassação
do registro ou diploma e inelegibilidade pelo prazo de 8 anos

(a
inelegibilidade é declarada na sentença, conforme art. 22, XIV, da LC 64/90).

 

Como
se observa, cuidam-se de institutos diversos, que tutelam bens jurídicos
distintos. No entanto, é possível que uma conduta vedada eventualmente venha a
configurar abuso de poder político, desde que tal conduta ostente gravidade
suficiente para comprometer a normalidade do pleito.

De
igual forma, é possível que o agente público pratique uma conduta que não se
amolde a nenhuma daquelas enumeradas no rol de condutas interditadas, porém o
ato seja grave o suficiente para caracterizar abuso do poder político.

Essa
distinção é muito importante para definir tanto a ação a ser proposta, como
também a competência para processá-la.

 

Rol de condutas vedadas

De
uma forma bem simplificada, as condutas vedadas aos agentes públicos são as
seguintes:

ROL DE CONDUTAS VEDADAS


Ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens
móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União,
dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios,
ressalvada a realização de convenção partidária.

 

OBS: Há outras duas exceções: (1) o uso do transporte oficial do
Presidente e (2) o uso, em campanha, das residências oficiais por candidatos
à reeleição, desde que não tenham caráter de ato público.

 


Usar materiais ou serviços, custeados pelos Governos ou Casas Legislativas,
que excedam as prerrogativas consignadas nos regimentos e normas dos órgãos
que integram.

 


Ceder servidor público ou empregado da administração direta ou indireta
federal, estadual ou municipal do Poder Executivo, ou usar de seus serviços,
para comitês de campanha eleitoral de candidato, partido político ou
coligação, durante o horário de expediente normal, salvo se o servidor ou
empregado estiver licenciado.

 


Fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido político ou
coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social
custeados ou subvencionados pelo Poder Público

 


Nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa,
suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o
exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou
exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o
antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito,
ressalvados:

(a)
a nomeação ou exoneração de cargos em comissão e designação ou dispensa de
funções de confiança;

(b)
a nomeação para cargos do Poder Judiciário, do Ministério Público, dos
Tribunais ou Conselhos de Contas e dos órgãos da Presidência da República;
(c) a nomeação dos aprovados em concursos públicos homologados até o início
daquele prazo;

(d)
a nomeação ou contratação necessária à instalação ou ao funcionamento
inadiável de serviços públicos essenciais, com prévia e expressa autorização
do Chefe do Poder Executivo;

(e)
a transferência ou remoção ex officio de militares, policiais civis e
de agentes penitenciários.

 


Nos três meses que antecedem o pleito:

a)
realizar transferência voluntária de recursos da União aos Estados e
Municípios, e dos Estados aos Municípios, sob pena de nulidade de pleno
direito, ressalvados os recursos destinados a cumprir obrigação formal
preexistente para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma
prefixado, e os destinados a atender situações de emergência e de calamidade
pública;

 

b)
com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência
no mercado, autorizar publicidade institucional dos atos, programas, obras,
serviços e campanhas dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais,
ou das respectivas entidades da administração indireta, salvo em caso de
grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral
(Redação dada pela Lei 14.356/2022);

 

c)
fazer pronunciamento em cadeia de rádio e televisão, fora do horário
eleitoral gratuito, salvo quando, a critério da Justiça Eleitoral, tratar-se
de matéria urgente, relevante e característica das funções de governo.

 

OBS: As vedações contidas nas alíneas b e c, aplicam-se apenas
aos agentes públicos das esferas administrativas cujos cargos estejam em
disputa na eleição.

 

– Empenhar, no primeiro semestre do ano de eleição, despesas com
publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das
respectivas entidades da administração indireta, que excedam a 6 (seis) vezes
a média mensal dos valores empenhados e não cancelados nos 3 (três) últimos
anos que antecedem o pleito (Redação dada pela Lei 14.356/2022);

 


Fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração dos
servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder
aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir do início do prazo
estabelecido no art. 7º desta Lei e até a posse dos eleitos.

 


Distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da
Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de
emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução
orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá
promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa.

 

OBS: Veda-se, ainda, a execução desses programas por entidade
nominalmente vinculada a candidato ou por esse mantida.

 


Contratação de shows artísticos pagos com recursos públicos para realização
de inaugurações nos três meses que antecedem as eleições.

 


Comparecer, nos 3 (três) meses que precedem o pleito, a inaugurações de obras
públicas.

 

 

Como
se observa, são diversas as condutas vedadas aos agentes públicos.

Contudo,
o presente estudo se limitará às condutas vedadas relacionadas à propaganda
institucional, que foram objeto de alteração pela Lei nº 14.356/2022.

 

O que vem a ser propaganda institucional?

A
propaganda institucional, segundo José Jairo Gomes, pode ser conceituada como
aquela “promovida, autorizada e custeada por ente ou órgão público a fim de
divulgar seus atos, programas, obras, serviços, campanhas e políticas públicas”.
(GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 18ª ed. Barueri/SP: Atlas, 2022,
p. 824).

 

Mencionada
espécie de propaganda não se confunde com propaganda política.

Confira
as principais diferenças:

PROPAGANDA INSTITUCIONAL

PROPAGANDA POLÍTICA

Propaganda
promovida, autorizada e custeada por ente público para promover serviços e
campanhas públicas.

De
acordo com o art. 37, §1º, da CF/88, deve ser impessoal e ostentar caráter
educativo, informativo e de orientação social.

A
propaganda política é gênero que abrange as seguintes espécies:

Propaganda partidária: A propaganda partidária se presta
à difusão dos princípios ideológicos, atividades e programas dos partidos
políticos. Sua finalidade é a de angariar eleitores e cidadãos que simpatizem
com os ideais do partido. Nessa modalidade, é vedada a divulgação de
propaganda de candidatos a cargos eletivos (Art. 50-B, §4º, II, LPP). É
veiculada fora do período eleitoral.

 

Propaganda intrapartidária: propaganda dirigida somente a um
grupo específico de eleitores, com foco em uma “eleição interna”, em
âmbito partidário
.

 

Propaganda eleitoral: propaganda eleitoral é aquela que
se realiza antes de certame eleitoral e objetiva, basicamente, a obtenção de
votos, tornando-se instrumento de convencimento do eleitor, que pode, por seu
intermédio, ampliar seu conhecimento sobre as convicções de cada candidato ou
partido, fazendo a escolha que mais lhe convier. Veiculada após o dia 15 de
agosto do ano da eleição (Art. 36, LE)

 

E o que mudou?

Para
melhor compreensão, vamos comparar as redações antiga e a nova, destacando-se
as principais alterações:

REDAÇÃO ANTERIOR

NOVA REDAÇÃO

 

Art.
73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes
condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos
pleitos eleitorais:

 

VII
realizar, no primeiro semestre do ano de eleição, despesas
com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das
respectivas entidades da administração indireta, que excedam a média
dos gastos
no primeiro semestre dos três últimos anos que antecedem o
pleito
; (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

VII
empenhar, no primeiro semestre do ano de eleição, despesas
com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das
respectivas entidades da administração indireta, que excedam a 6 (seis)
vezes a média mensal
dos valores empenhados e não cancelados nos 3 (três)
últimos anos que antecedem o pleito
; (Redação dada pela Lei nº 14.356, de
2022)

 

§
14. Para efeito de cálculo da média prevista no inciso VII do caput deste
artigo, os gastos serão reajustados pelo IPCA, aferido pela Fundação
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou outro índice que
venha a substituí-lo, a partir da data em que foram empenhados.        (Incluído pela Lei nº 14.356, de 2022)

 

Note
que há duas alterações principais:


Alteração do núcleo da conduta vedada (“realizar” para “empenhar”);


Alteração da forma de cálculo do limite legal.

 

Substituição do verbo “realizar” por “empenhar”

A
primeira alteração promovida pela Lei nº 14.356/2022 diz respeito ao núcleo da
conduta vedada, substituindo o verbo “realizar” por “empenhar”.

Para
compreender essa alteração, é necessário rememorar alguns conceitos de Direito
Financeiro contidos na Lei nº 4.320/64:

Empenho

Liquidação

Pagamento

É
o ato emanado de autoridade competente que cria para o Estado obrigação de
pagamento pendente ou não de implemento de condição (art. 58, da Lei nº
4.320/64).

Consiste
na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e
documentos comprobatórios do respectivo crédito (art. 63, da Lei nº 4.320/64).

É
o ato pelo qual a Administração reconhece o direito ao crédito e repassa o
numerário ao credor, recebendo a devida quitação. Segundo o art. 62, da Lei
4.320/64, “o pagamento da despesa só será efetuado quando ordenado após sua
regular liquidação”.

 

Em
palavras mais simples, pode-se dizer que a Administração, antes de efetuar uma
despesa, deve fazer uma espécie de reserva do valor correspondente, que ficará
bloqueado e vinculado à despesa informada. A essa reserva dá-se o nome de
empenho.

Trata-se
de uma etapa anterior e, em regra, obrigatória, tanto que o art. 60, da
Lei nº 4.320/64 dispõe que “é vedada a realização de despesa sem prévio
empenho”.

Em
seguida, após prestado o serviço, cabe à Administração realizar a liquidação da
despesa, ou seja, confirmar que o objeto do contrato foi efetivamente cumprido.

Após
a liquidação, cumpre à Administração realizar o pagamento ao credor.

 

A redação antiga do dispositivo mencionava “realizar despesa”. A
qual dessas etapas ela se referia?

O
Tribunal Superior Eleitoral, sob a égide da legislação anterior, definiu
que o verbo “realizar” corresponderia ao conceito de liquidação
previsto na Lei nº 4.320/64, ou seja, a vedação compreendia as despesas que
fossem efetivamente liquidadas no período vedado.

Nesse
sentido, confira:

O vocábulo
“despesas” deve ser entendido como liquidação
, isto é, o atesto oficial de que o
serviço foi prestado, independentemente da data do respectivo empenho ou
pagamento (arts. 62 e 63, § 2º, III, da Lei 4.320/64).

TSE –
RESPE – Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 37820 – ITAREMA – CE
– Acórdão de 17/10/2019 – Relator(a) Min. Jorge Mussi.

 

A melhor
interpretação da regra do art. 73, VII, da Lei das Eleições, no que tange à
definição – para fins eleitorais do que sejam despesas com publicidade -, é no
sentido de considerar o momento da liquidação, ou seja, do
reconhecimento oficial de que o serviço foi prestado – independentemente de se
verificar a data do respectivo empenho ou do pagamento, para fins de aferição
dos limites indicados na referida disposição legal.

TSE –
RESPE – Recurso Especial Eleitoral nº 67994 – GUARUJÁ – SP – Acórdão de
24/10/2013 – Relator(a) Min. Henrique Neves da Silva.

 

A
nova redação da Lei nº 14.356/2022, ao menos em princípio, altera essa
interpretação feita pelo TSE
, ao vedar o empenho de despesa
com propaganda institucional acima do limite legal
, e não mais sua
liquidação.

 

Assim,
a partir da vigência da nova lei, o simples fato de empenhar recursos para
propaganda institucional em montante superior ao limite legal caracterizará a
conduta vedada, independentemente da efetiva veiculação dessa propaganda.

 

A
nova redação parece, em um primeiro momento, ser mais restritiva que a anterior.
No entanto, é possível imaginar um cenário no qual ela seria mais favorável.
Suponhamos que a propaganda institucional está prevista para ser veiculada no
primeiro semestre do ano da eleição. Vale ressaltar, contudo, que o empenho foi
realizado ano anterior. Nesse caso, essa propaganda seria proibida segundo a
nova redação do art. 73, VII?

Pela
redação literal do dispositivo, a resposta é não, ou seja, a propaganda poderia
ser veiculada normalmente já que o empenho foi feito antes.

 

Importante
registrar, contudo, que é possível que a matéria seja levada ao TSE, tendo em
vista que aquela Corte, sob a égide da legislação anterior, vinha adotando
posicionamento bem restritivo sobre o tema, evitando tentativas de burla da
proibição:

A adoção
de tese contrária à esposada pelo acórdão regional geraria possibilidade
inversa, essa, sim, perniciosa ao processo eleitoral, de se permitir que a
publicidade realizada no ano da eleição não fosse considerada, caso a sua
efetiva quitação fosse postergada para o ano seguinte ao da eleição, sob o
título de restos a pagar, observados os limites impostos pela Lei de
Responsabilidade Fiscal.

TSE –
RESPE – Recurso Especial Eleitoral nº 67994 – GUARUJÁ – SP – Acórdão de
24/10/2013 – Relator(a) Min. Henrique Neves Da Silva.

 

Vamos agora tratar sobre a segunda mudança promovida pela Lei nº
14.356/2022 no dispositivo: qual é a forma de cálculo do limite legal?

A
redação anterior previa que o limite seria aferido a partir da média dos primeiros
semestres
dos três anos anteriores
ao pleito.

A
nova redação alterou essa fórmula de cálculo, passando a dispor que o limite
será aferido a partir da média mensal dos três anos anteriores ao
pleito.

A
novidade da redação reside no fato de que o cálculo passará a levar em consideração
as despesas empenhadas ao longo de todos os meses dos três anos
anteriores
ao pleito, e não mais as despesas liquidadas apenas no
primeiro semestre desse período.

Ficou
assim:

ANTES DA LEI 14.356/2022

DEPOIS DA LEI 14.356/2022

O
limite é aferido a partir da média de despesas liquidadas no primeiro
semestre
dos três anos anteriores ao pleito.

 

Inicialmente,
calcula-se a média mensal dos empenhos realizados (e não
cancelados) nos três últimos anos anteriores ao pleito.

Em
seguida, essa média mensal é multiplicada por seis.

O
resultado disso é o limite de despesas dessa natureza para o primeiro
semestre do ano da eleição.

 

Desse
modo, continua existindo a limitação para veiculação de propaganda
institucional no primeiro semestre do ano de eleição. No entanto, o limite passa
a considerar as despesas empenhadas (e não mais as liquidadas) e o cálculo
deverá ser efetivado a partir da média mensal de empenhos dos três anos anteriores
(e não mais o primeiro semestre desse mesmo período).

 

Além
disso, a Lei nº 14.356/2022 introduziu o §14 ao art. 73, da Lei das Eleições,
prevendo, para efeito dos cálculos supracitados, que os gastos com propaganda
nos anos anteriores sejam atualizados pelo Índice Nacional de Preços ao
Consumidor Amplo – IPCA a partir da data em que forem empenhados.

 

E no segundo semestre do ano eleitoral? É possível a veiculação de
propaganda institucional?

O
art. 73, VI, “b”, afirma que, em regra, é vedada a veiculação de
propaganda institucional nos três meses que antecedem o pleito.

 

O
mesmo artigo menciona duas exceções a essa regra:

1)
propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado;

2)
caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça
Eleitoral.

 

Na
prática, em caso de grave e urgente necessidade pública, o órgão público
interessado em veicular propaganda institucional durante esse período ingressa
com um pedido junto à Justiça Eleitoral, que poderá liberar ou não a
veiculação.

 

Art. 73.
São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas
tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos
eleitorais:

(…)

VI – nos
três meses que antecedem o pleito:

(…)

b) com
exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no
mercado, autorizar publicidade institucional dos atos, programas, obras,
serviços e campanhas dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou
das respectivas entidades da administração indireta, salvo em caso de grave e
urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral;

 

E como fica a propaganda institucional relativa ao coronavírus?

A
Lei nº 14.356/2022 trouxe uma exceção às vedações e limitações supracitadas na
hipótese de propaganda relacionada ao coronavírus, assim conceituada como sendo
a propaganda institucional destinada exclusivamente ao enfrentamento da
pandemia causada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e à orientação da população quanto
aos serviços públicos relacionados ao combate da pandemia.

Confira
o art. 4º da Lei nº 14.356/2022:

Art. 4º Não se sujeita às disposições dos incisos VI
e VII do caput do art. 73 da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, a
publicidade institucional de atos e campanhas dos órgãos públicos federais,
estaduais ou municipais e de suas respectivas entidades da administração
indireta destinados exclusivamente ao enfrentamento da pandemia causada pelo
coronavírus SARS-CoV-2 e à orientação da população quanto a serviços públicos
relacionados ao combate da pandemia, resguardada a possibilidade de apuração de
eventual conduta abusiva, nos termos da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de
1997.

 

Qual o impacto dessa novidade legislativa na propaganda institucional
veiculada no primeiro semestre do ano de eleição?

No
que tange à propaganda institucional veiculada no primeiro semestre, disciplina
o novo dispositivo que a propaganda relacionada ao coronavírus não se sujeitará
às disposições do inciso VII, do caput do art. 73, da Lei nº 9.504/97. 

Dessa
forma, a limitação de empenhos relativa ao primeiro semestre do ano da eleição
não considerará, em seu cômputo, as despesas relacionadas ao coronavírus.

Assim,
em se tratando de propaganda institucional relativa ao coronavírus, o agente
público ficará dispensado de observar esse limite legal.

 

E o impacto na vedação à propaganda institucional nos três meses
anteriores ao pleito?

De
igual forma, o novo dispositivo excluiu a propaganda institucional relativa ao
coronavírus da vedação contida no inciso VI, “b” do art. 73, da Lei nº 9.504/97
(vedação de propaganda institucional nos três meses anteriores ao pleito).

Assim,
eventual propaganda institucional relativa ao coronavírus poderá ser veiculada
pelo ente público dentro dos três meses que antecederem o pleito, sendo
dispensada a prévia autorização da Justiça Eleitoral.

 

E se houver abuso? É possível apurá-lo?

SIM.
De acordo com o art. 37, §1º, da CF/88, a propaganda institucional deve ser
impessoal e ostentar caráter educativo, informativo e de orientação social.

Por
essa razão, eventual extrapolação desses limites constitucionais pode
caracterizar abuso, o que, segundo o novo dispositivo legal, poderá ser apurado
nos termos da Lei nº 9.504/97.

 

Uma última pergunta: as alterações promovidas pela Lei nº 14.356/2022
no art. 73 da Lei nº 9.504/97 podem ser aplicadas nas eleições 2022?

Pensamos
que não. Isso porque haveria violação ao princípio da anterioridade da lei
eleitoral, previsto no art.
16 da CF/88:

Art. 16. A lei que alterar o processo
eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à
eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.

 

A exigência da
anterioridade da lei eleitoral (art. 16 da CF/88) consubstancia marco temporal
objetivo que tem por escopo impedir mudanças abruptas na legislação eleitoral,
como forma de assegurar o devido processo legal eleitoral, o direito das
minorias e a paridade de armas na disputa eleitoral. O princípio da
anterioridade – ou da anualidade – da lei eleitoral é um desdobramento do
postulado da segurança jurídica (STF. Plenário. ADI 6359 Ref-MC/DF, Rel. Min.
Rosa Weber, julgado em 14/5/2020).

Conforme já
explicado, as condutas vedadas do art. 73 da Lei nº 9.504/97 têm por objetivo assegurar
a igualdade de oportunidades entre os candidatos, de forma a evitar que algum
agente público possa se valer da máquina pública para impulsionar sua
candidatura ou a de terceiros. Desse modo, a alteração em uma dessas vedações,
por implicar potencial desequilíbrio do pleito e afronta à isonomia, precisa
respeitar o princípio da anuidade ou anterioridade eleitoral.

Além disso, imaginemos a situação em que um agente
público, candidato à reeleição, tenha efetuado despesas significativas com
propaganda institucional apenas no primeiro semestre dos três anos
anteriores ao pleito. Ao adotar a média mensal dos últimos três anos (todos os
meses), a nova fórmula de cálculo reduzirá significativamente esse limite.

Nesse caso, se aplicada a nova lei, o agente público que,
no início do ano, empenhou despesas com observância dos limites previstos na
lei revogada poderia, em tese, ser responsabilizado por conduta vedada, caso
superado o limite imposto pela lei nova (que ele até então sequer conhecia).

 

INTRODUÇÃO DE NORMAS RELATIVAS À CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS
DE COMUNICAÇÃO INSTITUCIONAL

 

A segunda alteração promovida pela Lei 14.356/2022 versa
sobre as regras de licitação e contratação de serviços de publicidade pela
Administração Pública.

Mas antes de estudá-la, vamos fazer uma breve introdução
sobre o tema.

 

Qual é a lei que rege a licitação e contratação de
serviços de publicidade?

É a Lei nº 12.232/2010, que dispõe sobre as normas gerais
de licitação e contratação de serviços de publicidade prestados por intermédio
de agências de propagandas à administração pública.

Trata-se de uma lei de caráter nacional, ou seja, é de
observância obrigatória por Administrações Públicas diretas, autárquicas e
fundacionais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
(Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário).

A exceção a essa regra é a contratação desses serviços por
empresas públicas e sociedades de economia mista, que possuem regras próprias
em seu estatuto (art. 28, da Lei 13.303/2016).

 

Essa lei continua valendo após a entrada em vigor da nova
Lei de Licitações (Lei 14.133/2021)?

SIM. A nova Lei de Licitações passou a incidir apenas de
forma subsidiária (art. 186, da Lei 14.133/2021).

 

Quais serviços podem ser licitados e contratados por meio
desse procedimento?

A Lei nº 12.232/2022 define serviço de publicidade como
sendo “o conjunto de atividades realizadas integradamente que tenham por
objetivo o estudo, o planejamento, a conceituação, a concepção, a criação, a
execução interna, a intermediação e a supervisão da execução externa e a
distribuição de publicidade aos veículos e demais meios de divulgação, com o
objetivo de promover a venda de bens ou serviços de qualquer natureza, difundir
ideias ou informar o público em geral” (art. 2º).

Admite-se, ainda, a inclusão de atividades complementares,
a saber:

I – ao planejamento e à execução de pesquisas e de outros
instrumentos de avaliação e de geração de conhecimento sobre o mercado, o
público-alvo, os meios de divulgação nos quais serão difundidas as peças e
ações publicitárias ou sobre os resultados das campanhas realizadas, respeitado
o disposto no art. 3o desta Lei;

II – à produção e à execução técnica das peças e projetos
publicitários criados;

III – à criação e ao desenvolvimento de formas inovadoras
de comunicação publicitária, em consonância com novas tecnologias, visando à
expansão dos efeitos das mensagens e das ações publicitárias (art. 2º, §1º).

 

Lado outro, o art. 2º, §2º, veda a inclusão de quaisquer
outras atividades, em especial as de assessoria de imprensa, comunicação e
relações públicas ou as que tenham por finalidade a realização de eventos
festivos de qualquer natureza, as quais serão contratadas por meio de
procedimentos licitatórios próprios, respeitado o disposto na legislação em
vigor.

 

E o que mudou?

A Lei 14.133/2021 introduziu os artigos 20-A e 20-B na
Lei 12.232/2010, passando a dispor que a contratação de serviços de relação
com a imprensa e de relações públicas estão compreendidos nos serviços de
comunicação institucional
e que sua contratação deveria observar o rito
licitatório previsto na Lei 12.232/2010.

Os novos dispositivos legais também autorizam a contratação,
pelo mesmo rito, dos serviços direcionados ao planejamento, criação,
programação e manutenção de páginas eletrônicas da administração pública, ao
monitoramento e gestão de suas redes sociais e à otimização de páginas e canais
digitais para mecanismos de buscas e produção de mensagens, infográficos,
painéis interativos e conteúdo institucional.

 

Mas o que vem a ser serviços de relação com a imprensa e
de relações públicas?

De acordo com nova lei, mencionados serviços possuem as
seguintes definições:

– Relações com a imprensa: ação que reúne estratégias organizacionais para
promover e reforçar a comunicação dos órgãos e das entidades contratantes com
seus públicos de interesse, por meio da interação com profissionais da
imprensa;

– Relações Públicas:
esforço de comunicação planejado, coeso e contínuo que tem por objetivo
estabelecer adequada percepção da atuação e dos objetivos institucionais, a
partir do estímulo à compreensão mútua e da manutenção de padrões de
relacionamento e fluxos de informação entre os órgãos e as entidades
contratantes e seus públicos de interesse, no Brasil e no exterior.

 

Confira a redação dos novos dispositivos:

 

Art. 20-A. A contratação de serviços de comunicação
institucional, que compreendem os serviços de relação com a imprensa e de
relações públicas, deverá observar o disposto no art. 5º desta Lei. (Incluído
pela Lei nº 14.356, de 2022)

 

§ 1º Aplica-se o disposto no caput deste artigo à
contratação dos serviços direcionados ao planejamento, criação, programação e
manutenção de páginas eletrônicas da administração pública, ao monitoramento e
gestão de suas redes sociais e à otimização de páginas e canais digitais para
mecanismos de buscas e produção de mensagens, infográficos, painéis interativos
e conteúdo institucional. (Incluído pela Lei nº 14.356, de 2022)

 

§ 2º O disposto no caput e no § 1º deste artigo não
abrange a contratação de espaços publicitários e de mídia ou a expansão dos
efeitos das mensagens e das ações de comunicação, que observarão o disposto no
caput do art. 2º desta Lei. (Incluído pela Lei nº 14.356, de 2022)

 

§ 3º O disposto no caput não exclui a possibilidade de os
serviços descritos no caput e no § 1º deste artigo serem prestados pelos
servidores dos respectivos órgãos e entidades da administração pública.
(Incluído pela Lei nº 14.356, de 2022)

 

Art. 20-B. Para fins desta Lei, os serviços de
comunicação institucional compreendem os serviços de relações com a imprensa e
de relações públicas, assim definidos: (Incluído pela Lei nº 14.356, de 2022)

 

I – relações com a imprensa: ação que reúne estratégias
organizacionais para promover e reforçar a comunicação dos órgãos e das
entidades contratantes com seus públicos de interesse, por meio da interação
com profissionais da imprensa; e (Incluído pela Lei nº 14.356, de 2022)

 

II – relações públicas: esforço de comunicação planejado,
coeso e contínuo que tem por objetivo estabelecer adequada percepção da atuação
e dos objetivos institucionais, a partir do estímulo à compreensão mútua e da
manutenção de padrões de relacionamento e fluxos de informação entre os órgãos
e as entidades contratantes e seus públicos de interesse, no Brasil e no
exterior. (Incluído pela Lei nº 14.356, de 2022).

 

 

Artigo Original em Dizer o Direito

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