Um soldado do Exército foi condenado a 18 anos e 9 meses de reclusão, em regime fechado, por homicídio qualificado, tipificado no artigo 205 do Código Penal Militar (CPM). O Superior Tribunal Militar (STM) entendeu que o crime foi praticado por motivo torpe – um desacerto ocasionado por uma dívida financeira existente – com surpresa e sem possibilidade de defesa.

A vítima do homicídio foi outro soldado que servia junto com o réu no Colégio Militar de Manaus (CMM). A motivação do crime, segundo consta na denúncia oferecida pelo Ministério Público Militar (MPM), foi uma dívida no valor de R$4 mil, consequência da compra de um carro.

De acordo com depoimento do acusado, ele teria sido o intermediário na compra do veículo que foi adquirido pelo militar assassinado do dono de uma oficina de carros em Manaus. A vítima efetuou o pagamento do montante de R$ 4mil ao civil e acertou de pagar mais mil reais quando recebesse o veículo.

No entanto, ainda de acordo com depoimento prestado à autoridade militar pelo acusado, a oficina foi fechada pela polícia. Nesse momento, o soldado que efetuou o pagamento teria começado a exigir seu dinheiro de volta, o que motivou um acerto entre o réu e o civil para a realização do homicídio, que ocorreu em dezembro de 2017, no bairro Industrial, em Manaus.

No dia do fato, a vítima pediu uma carona ao réu após um almoço de confraternização do efetivo da unidade militar. Eles saíram do CMM em um carro emprestado até a casa do soldado assassinado, momento em que foi feito um desvio de rota para um encontro com o civil. Ainda de acordo com o acusado, a vítima foi entregue ao dono da oficina, que desapareceu com ela. O soldado foi encontrado morto no dia seguinte, ainda fardado, com marcas de perfuração no corpo em função de golpes de arma branca, e carbonizado.

Após seu depoimento, o acusado foi preso preventivamente por determinação do juiz federal da Justiça Militar da 12ª Circunscrição Judiciária Militar (CJM).

Julgamento na 12ª CJM

O Conselho Permanente de Justiça para o Exército (CPJ/Ex), em novembro de 2018, por unanimidade de votos, julgou procedente a pretensão punitiva do Estado para condenar o soldado à pena de 22 anos e seis meses de reclusão, em regime prisional inicial fechado.

O depoimento prestado pelo acusado no Inquérito Policial Militar (IMP) aconteceu no dia seguinte ao homicídio. No entanto, em juízo, ele ofereceu versão diferente da prestada, passando a negar sua participação no assassinato.

Baseada nisso e inconformada com a decisão de primeira instância, o advogado constituído pelo réu impetrou recurso de apelação no STM com o objetivo de reformar a sentença. Requereu a absolvição do apelante por entender que se encontra comprovada sua inocência em instrução criminal, bem como pela ausência de provas de que este concorreu para a prática do crime, nos termos do art. 439, “c” do CPPM.

Acrescentou que o réu é primário e possui bons antecedentes, requerendo o recálculo da pena-base, com sua fixação no mínimo legal. A defesa informou ainda que o réu na data do fato possuía 20 anos de idade, e ao contrário do que foi informado na sentença, existe no mínimo uma circunstância atenuante, qual seja, o réu ser menor de 21 anos de acordo com o art. 72, I, do CPM. Por fim, pediu a desclassificação do crime de homicídio qualificado pela torpeza e impossibilidade de defesa da vítima ao ludibriar sua confiança.

Já o MPM afirmou que diante da inexistência das nulidades suscitadas pela defesa e, devidamente comprovada a materialidade e autoria delituosa do condenado, seria imperiosa a manutenção da sentença nos mesmos termos. “Dessa forma, o réu, livre e conscientemente, em comunhão de esforços e unidade de desígnios com o civil, planejou e determinou, ou, no mínimo, cooperou e pretendeu o homicídio da vítima, utilizando-se precipuamente da relação de confiança que possuía com ela, levando-a de forma dissimulada para uma emboscada que impossibilitou a defesa desta e que culminou na sua morte”, reforçou o MPM.

Manutenção da condenação no STM

O recurso de apelação da defesa foi analisado pelo ministro Alvaro Luiz Pinto. O magistrado afirmou que os argumentos trazidos pela defesa almejando a absolvição não se sustentam diante do consistente acervo probatório dos autos e que reverenciam a decisão condenatória proferida pelo juízo da primeira instância.

“É indubitável que estamos analisando a prática de um crime de homicídio doloso, qualificado, onde é plenamente possível distinguir a atuação do ora apelante que, de forma intencional, agiu para obter o resultado morte de um jovem companheiro de farda, incidindo na prática do crime previsto no art. 205”, frisou o magistrado.

O ministro continuou argumentando que a existência de provas testemunhais conflitantes não tem o condão de alterarem o resultado de um veredito que é decorrente de uma ampla e meticulosa avaliação de todo um conjunto probatório, inclusive, do relatado pelas testemunhas em juízo, propiciando o convencimento final por parte dos julgadores.

“Assim, é possível inferir que, durante o IPM, o apelante falou parte da verdade dos fatos com a clara finalidade de se eximir da participação no homicídio. Sua declaração se deu logo após o ocorrido, de forma mais espontânea, já que sem a influência de possíveis orientações. Contudo, após vislumbrar a possibilidade de ser preso e responder pelo crime de homicídio, buscou uma nova versão em prol da almejada absolvição”, explicou o ministro.

O relator do processo continuou argumentando que não havia a possibilidade de diminuição da pena-base como pretende a defesa em função da gravidade dos atos praticados, da reprovação social, do motivo alegado, bem como da personalidade do autor, cuja conduta demonstrou total insensibilidade e indiferença em relação à vida humana.

Sobre a aplicação da menoridade do réu na segunda fase da dosimetria da pena, o magistrado entendeu que tal demanda merecia ser provida, com a consequente reparação da decisão proferida pela primeira instância quanto à aplicação das circunstâncias agravantes e atenuantes, já que não foi observada a menoridade do autor.

Com a inclusão da atenuante, a pena resultou em 18 anos e 9 meses de reclusão, sendo mantidos os demais termos condenatórios.

APELAÇÃO Nº 7001037-23.2018.7.00.0000

A sessão de julgamento foi transmitida ao vivo

 

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